A Passiflora jorgeana foi coletada na serra de São Bartolomeu, BA (Foto: L. Calazans)

Três estudos liderados pela pesquisadora Ana Carolina Mezzonato da UFJF resultaram na descoberta de novas espécies de maracujá, uma das frutas tropicais mais conhecidas do mundo. Batizadas de Passiflora jorgeana, Passiflora bacabensis e Passiflora ita, as espécies foram publicadas em três periódicos diferentes (Novon, Nordic Journal of Botany e Willdenowia, respectivamente).

Ana Carolina, docente do Departamento de Botânica do Instituto de Ciências Biológicasé especialista neste grupo de maracujás e taxonomista – profissional responsável por identificar e dar nome às espécies. Ela explica que “essas três novas espécies foram descobertas por meio de estudos desenvolvidos em parceria com outros pesquisadores de universidades federais e estaduais brasileiras. Eles me enviaram coletas que são realizadas em campo. Trabalho com o reconhecimento de gênero e características morfológicas que separam as espécies, quando eu vi as fotos e os exemplares que eles me enviaram, percebi que estava um pouco diferente, nenhuma delas parecia com as espécies já catalogadas”, aponta. 

As novas espécies foram encontradas em diversas regiões brasileiras, de acordo com a bióloga. Descoberta no início de 2021, a Passiflora jorgeana foi coletada na serra de São Bartolomeu, localizada no município de Barreiras, no estado da Bahia, em ambiente de Cerrado. Já a Passiflora bacabensis foi encontrada em Nova Xavantina, Mato Grosso, no Parque Municipal do Bacaba, também no Cerrado. Por fim, a Passiflora ita foi descrita para o seguinte conjunto de municípios: Conselheiro Pena, em Minas Gerais; Santa Leopoldina, Serra e São Roque do Canaã, no estado de Espírito Santo, figurando em ambientes de Mata Atlântica.

Passiflora ita foi descrita em ambientes de Mata Atlântica (Foto: P. Gonella)

Descrição das três novas espécies

Uma característica em comum das três espécies é que todas são trepadeiras, de maneira que o desenvolvimento da planta se dá através do apoio físico em outros indivíduos e árvores. “O que conseguimos separar das outras espécies já descritas são as posições das glândulas no pecíolo da folha e também nas estruturas das flores. Quando falamos em maracujá, logo pensamos nos frutos, mas na verdade, na delimitação, na maioria das espécies, a característica mais importante na hora de determinar e identificar são as flores. Elas geralmente são muito coloridas, tendo filamentos com algumas estruturas internas”, explica Ana Carolina. 

Diante das escolhas dos nomes das novas espécies, a bióloga informa que a escolha do nome Passiflora jorgeana foi dado em homenagem ao seu pai. “Eu descrevi ela com esse epíteto em homenagem ao meu pai, Jorge, que também foi professor. Já a Passiflora bacabensis se refere ao local que ela foi coletada, de forma a homenagear o local no Parque Municipal de Bacabá. Por fim, Passiflora ita possui uma distribuição mais ampla e foi coletada em ambiente de Mata Atlântica, em afloramentos rochosos, e o epíteto `ita´ se refere à isso, a àquela passiflora da pedra, de origem tupi-guarani”, comenta.

Em 2021, um outro grupo de pesquisadores da UFJF descobriu uma nova espécie de planta do gênero Stachytarpheta. Batizada como Stachytarpheta salimenae, o nome é uma homenagem à professora aposentada Fátima Salimena, do Instituto de Ciências Biológicas. Desta forma, Ana Carolina vê as recém descobertas como uma maneira de ressaltar a importância do investimento na ciência de base, de forma que o descobrimento de novas espécies possibilita que outros trabalhos possam ser realizados, tais como a extração de algumas substâncias que podem vir a ser fármacos.

Possível ameaça de extinção e importância para a carreira da bióloga

De acordo com a taxonomista, em função da deficiência de dados, ainda não é possível apontar se as espécies Passiflora bacabensis e Passiflora jorgeana estão sob algum risco de extinção. Já a Passiflora ita pode ser considerada uma espécie com ameaça iminente de extinção. “Como ela é encontrada nos afloramentos rochosos, essas regiões possuem um risco de incêndio muito grande. Além disso, existe a pressão de espécies invasoras, que crescem desordenadamente, vindo a matar muitas espécies nativas. Por fim, há muita extração de rochas ornamentais na mesma região, o que nos levou a sugerir no artigo que ela fosse colocada na lista de espécies do Brasil que estão ameaçadas”, explica.

Desta forma, apesar da maioria da população conhecer somente as espécies de maracujá comercializadas em mercados, existem mais de 500 espécies do gênero catalogadas atualmente e que são distribuídas por toda a América. “Além disso, as espécies de maracujá tem uma grande importância ecológica, tendo em vista um processo de associação com um grupo de borboletas, de maneira que elas fazem a deposição de seus ovos especialmente em espécies de Passiflora. Logo, essas larvas vão se alimentar dessas folhas, desses brotos. E as Passifloras também fornecem néctar e grãos de pólen para outros animais de forma geral”, aponta a pesquisadora. 

Quando perguntada sobre a importância do descobrimento das novas espécies, a bióloga aponta que o Brasil é o segundo país mais rico em espécies de maracujá, perdendo somente para a Colômbia no quesito da variedade. Desta forma, com as publicações científicas das descobertas, podem surgir outros estudos que comprovem a presença das espécies em outras localidades e regiões. “Dentro dessa profissão, não há nada mais gratificante do que descobrir uma nova espécie para ciência, uma coisa que ninguém nunca viu no mundo todo”, comemora Ana Carolina.