Como medir o impacto da ação antrópica como mecanismo causador de pandemias? Quanto de culpa tem o ser humano na ocorrência de desastres e catástrofes ambientais? Essas e outras questões nortearam a análise feita pela docente Ione Matos, do campus Governador Valadares da Universidade Federal de Juiz de Fora. Para a professora do Departamento de Ciências Básicas da Vida, “doenças como AIDS, febre hemorrágica decorrente do vírus Ebola e, mais recentemente, a Covid-19 resultam, em grande parte, da destruição de ecossistemas naturais”.

Para embasar suas considerações, Ione cita os estudos do entomologista Marc Dourojeanni, professor da Universidade Nacional Agrária de Lima, no Peru. O pesquisador afirma que “a principal causa da pandemia atual é a alta densidade da população humana, cujos indivíduos e atividades transbordam sobre o que resta da natureza mais ou menos natural. Basta lembrar o que acontece nas florestas tropicais ou nos mares”. E completa: “mais de 70% das doenças novas e emergentes que infectam seres humanos se originaram em animais. Os patógenos desses animais, cada vez mais escassos devido à caça e à destruição de seus ecossistemas, em busca de novos hospedeiros, atravessam a fronteira entre animais e humanos e se espalham rapidamente. Além disso, os animais selvagens que são forçados a viver em habitats degradados ou antropogênicos têm alimentação inadequada ou insuficiente e saúde debilitada, portanto, são mais propensos a serem afetados por vírus e, quando consumidos ou manipulados, infectam seres humanos”.

No mesmo sentido, Ione comenta a relação entre o pangolim, mamífero semelhante ao tatu-bola, e o novo coronavírus. Segundo artigo publicado na revista científica Nature, o pangolim seria o elo mais provável do vírus Sars-Cov-2, causador da COVID-19, entre morcegos e humanos. “O morcego é um mamífero voador e reservatório natural para diferentes vírus, não sendo uma exceção para o coronavírus. É importante ressaltar que o problema não são os morcegos, e sim o desequilíbrio e destruição de habitats naturais. No anseio para se expandir, a humanidade invade o terreno alheio — e traz problemas de lá”.

O que a pandemia tem a nos ensinar?

Para a professora, a chegada do novo coronavírus ao planeta pode desencadear mudanças no trato do homem com a natureza. “Acredito que a pandemia vai nos alertar sobre a responsabilidade que devemos ter com o meio ambiente. Se não nos conscientizarmos dessa responsabilidade, vamos viver dias muito mais difíceis daqui para frente. Acho que educação é o caminho para resolver essa questão, e acredito, sim, que a humanidade vai melhorar seus costumes”. Como ensinamento a ser aprendido ao final dessa experiência, que já dura meses, Ione destaca: “A lição é que precisamos urgentemente controlar o consumo desenfreado, não negar os fatos e a ciência, e que não existe uma separação. Estamos todos interligados através da consciência e da inteligência universal; nossos atos impactam na vida do planeta”.

“A degradação ambiental tem potencial para causar a extinção dos humanos” – Ione Matos, professora da UFJF-GV

Para contribuir com a preservação da natureza, a docente reforça atitudes já conhecidas, porém pouco praticadas pela sociedade, tais como o desenvolvimento da agricultura sustentável, a proteção aos habitats selvagens, o investimento em energias renováveis, a mudança de hábitos de consumo exagerados e a cobrança dos órgãos públicos para uma efetiva conservação do meio ambiente. “A Covid-19 é uma consequência de constantes agressões naturais causadas, principalmente, por intervenções humanas. Portanto, outras pandemias podem ser deflagradas se não houver mudanças na relação do ser humano com a natureza”.

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