Três professores do Departamento de Botânica da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) apresentaram dados, experiências e relatos sobre a crise da Amazônia e criticaram mudanças em políticas de meio ambiente no Brasil. As considerações foram feitas durante ciclo de palestras realizado nesta quarta, 18, no Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFJF. “Não é questão de preservar somente os povos da floresta, é de preservar a espécie Homo sapiens. Não tenho dúvidas de que estamos nos colocando em extinção. E estamos levando outras espécies junto”, destacou o professor Daniel Pimenta, ante os números e imagens sobre os ataques ao bioma apresentados nas duas palestras que antecederam a dele.
Parte do levantamento de dados coube ao professor Fabrício Alvim, que abordou tratados ambientais no mundo, com foco no Acordo de Paris, assinado em 2015. O documento traz metas para limitar o aquecimento global a 2ºC até 2100. A partir desse tratado, cada país também estipulou objetivos próprios. Entre as metas do Brasil, estão reflorestamento, combate a desmatamento e redução de 37% das emissões de gás carbônico (CO²) até 2025. “Do golpe para cá [impeachment da presidente Dilma Rousseff, em 2016], as coisas saíram dos trilhos. Outra meta é fortalecer o cumprimento do Código Florestal. Mas ele está sendo discutido no Congresso”, lamentou Alvim. Foram reabertos debates sobre redução do percentual mínimo de área que precisa ser preservada em propriedades rurais situadas na Amazônia, Cerrado e em campos gerais.
Alvim questionou ainda as intenções do atual governo de alterar a destinação do Fundo Amazônia, responsável por R$ 3,1 bilhões em 2018, doados pela Alemanha e pela Noruega, a mais de cem projetos ambientais. “Com base no relatório de 2018, publicado em 2019 pelo BNDES, gestor do fundo, um mito já cai: a maior parte dos recursos não vai para ONGs, mas para o próprio Estado, que recebe 60% da verba, como o Ibama.”
Para serem atendidas pelo Fundo, continua o professor, as ONGs precisam comprovar atuação na área e são fundamentais em ações onde o Estado não atua ou age de forma precária. “Mais de 23 mil ações contra incêndios já foram apoiadas pelo Fundo e também 465 publicações científicas ou informativas.”
Os dois países europeus já ameaçaram parar com o repasse de verbas caso as alterações propostas pelo governo atual sejam implementadas, como o afrouxamento nas leis de controle ambiental e nos sistemas de monitoramento do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O órgão recebeu críticas do presidente Jair Bolsonaro e do ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, quando foi divulgada alta na tendência de elevação do desmatamento na Amazônia. Os dados têm com base o Deter, sistema do Inpe que emite, em tempo real, alertas de alteração da cobertura florestal na Amazônia. Em julho de 2018, houve alerta de desmatamento de 596,6 km². Em julho de 2019, a área saltou para 2.254,9 km², correspondendo a uma tendência de 278% de aumento.
Se esses números já assustam como alertas detectados, a área desmatada calculada com mais acurácia pode ser muito mais alta. É o que apontou o professor Cristiano Ferrara com base nas comparações entre alertas do Deter e o desmatamento observado por outro sistema do Inpe, o Prodes.
Em 2015, no total, houve alertas do Deter correspondentes a 4.639 km² desmatados. Na verificação do Prodes, chegou-se a 6.947 km². A diferença se repete nos anos seguintes. Em 2018, a estimativa do Deter já foi de 6.833,9 km². O levantamento do Prodes ainda não foi divulgado. “Ou seja, os alertas do Deter estão aquém do Prodes, do desmatamento real. Então aquele número correspondente a 278%, em julho, que já foi o maior, será ainda mais alto.”
Outras informações:
Grupo de Estudos em Botânica
Fundo Amazônia
Relatório Fundo Amazônia 2018