Artistas como Gláucia Faria doaram, em 2001, peças artísticas que sugerem acolhimento e um vislumbre do belo diante de uma nova vida (Foto: Alexandre Dornelas/UFJF)

A Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) vive momento especial, retomando, em caráter permanente, a visibilidade de grande parte das obras de arte que integram o acervo da antiga Casa de Parto, atualmente extinta. Trata-se do trabalho de cerca de 30 artistas da cidade, que doaram quadros e objetos de diferentes técnicas e estilos em abordagens que sugeriam acolhimento, proporcionando um vislumbre do belo diante de uma nova vida.

À época, a ideia era levar arte ao ambiente, dando mais vida e expressão ao espaço vazio, enriquecendo-o com obras capazes de inspirar gestantes, parturientes e familiares. Realizados para a inauguração do dia 14 de dezembro de 2001, esses trabalhos estiveram sob a guarda do Museu de Arte Murilo Mendes (Mamm) a partir de 2013 e, posteriormente, foram abrigados pela Faculdade de Enfermagem, em sala própria. Agora, as obras de arte voltam a integrar o panorama da Faculdade.

A proposta de reunir a coleção, dando-lhe nova e definitiva percepção, é uma iniciativa conjunta da Pró-reitoria de Cultura e da Faculdade de Enfermagem, que foi a idealizadora e gestora da Casa de Parto, inaugurada no final de 2001. Responsável pela convocação dos artistas originalmente, a pró-reitora de Cultura, Valéria Faria, destaca que a ideia partiu da então coordenadora do projeto, Betânia Maria Fernandes, hoje professora aposentada da UFJF, que aprova a atual destinação do acervo.

“O objetivo, na época, era humanizar o espaço. Os artistas receberam um tema central para trabalhar, “Maternidade”, e o resultado foi maravilhoso. É importante que essas obras de arte voltem a respirar, ganhando um novo significado”, diz Betânia, aplaudindo a iniciativa.

Chama renovada

Obra de Dnar Rocha pertence ao conjunto que ganha nova visibilidade (Foto: Alexandre Dornelas/UFJF)

O diretor da Faculdade de Enfermagem, Marcelo da Silva Alves, explica que um dos marcos simbólicos e ideológicos da Enfermagem se dá em torno dos temas Arte, Ciência e Ideal: “Ao destinarmos o acervo artístico da nossa Casa de Parto para ser exposto em nossa unidade de ensino de enfermagem estamos não apenas valorizando o momento e o movimento social e histórico de nossa Casa de Parto, mas, sobretudo, reascendendo a chama do estado da arte da Enfermagem, que de forma direta se relaciona com a vida e com a experiência existencial e humanística que envolve o ser humano ao longo do seu ciclo vital”.

“Este ‘expor as artes’ imediatamente nos submete ao mundo da subjetivação do sujeito, com suas emoções, sentimentos, demandas, necessidades e possibilidades integrando o espaço físico e o ambiente emocional da nossa unidade com as dimensões da humanização, da valorização da vida e da materialização das nossas políticas públicas de formação profissional e do sistema de saúde”, analisa Marcelo Alves.

Ressignificação
Segundo a pró-reitora de Cultura, apesar de uma década guardadas, as obras estão conservadas, sem prejuízos à sua mostra, obtendo uma ressignificação com o novo destino. Agora elas ocupam diversas salas do prédio da Faculdade de Enfermagem, parte integrante do Centro de Ciências da Saúde, no topo da entrada do Campus, logo após o pórtico Sul.

Entre os artistas que participaram do projeto estão Afonso Rodrigues, Alessandro Driê, Andréa Sena, Cacati, Carlos Ventura, César Brandão, Cláudio Melo, Daniela Brito, Dnar Rocha, Gerson Guedes, Gláucia Faria, Heloisa Curzio, Flávio Ferraz, Flávio Vitoi, Lourdes Siqueira, Maria Elza Melo, Ramon Brandão, Raquel Falcão, Ricardo Coimbra, Ricardo Cristofaro, Petrillo, Pinho Neves, Paulo Alvarez, Pedro Henrique Ferreira, Sandra Sato, Pedro Marcus e Priscila de Paula.

Ramon Brandão, que se inspirou no feminino referenciado por um nu do artista italiano Amedeo Modigliani, comemora essa revisita não apenas à sua obra, mas ao acervo como um todo, haja vista sua importância histórica, artística e afetiva. “Não é necessário uma galeria formal para essa retomada, basta que o trabalho esteja visível e a mensagem do artista possa ser repassada”, diz.

A origem

Heloísa Curzio também atendeu ao chamado da UFJF para a produção de obras que marcaram a Casa do Parto (Foto: Alexandre Dornelas/UFJF)

O projeto da Casa de Parto respeitava integralmente a fisiologia da mulher grávida, resgatando uma prática mais humanizada, a do nascimento de forma natural. O espaço era conveniado ao Sistema Único de Saúde (SUS), tendo contado com um investimento inicial de R$ 369 mil, R$ 122 mil dos quais vindos do Ministério da Saúde.

Ocupando cerca de 20 cômodos da Rua Santo Antônio, nos fundos do Restaurante Universitário Centro, e com capacidade para atender, simultaneamente, até três parturientes, o espaço dispunha de uma equipe de enfermeiras obstetras, auxiliares de enfermagem, auxiliares de serviços gerais, assistente social e estudantes da UFJF, tudo sob a coordenação da Faculdade de Enfermagem.

Betânia relembra o grande passo que foi a criação desse espaço, que beneficiava a mulher em um de seus momentos mais sublimes. A convocação dos artistas foi, justamente, para marcar com leveza o momento de “dar à luz” de acordo com a natureza feminina, restabelecendo a prática do parto normal, cada vez menos usual no país.

Com as atividades suspensas em agosto de 2007, foi criada uma Comissão de Transferência da Casa de Parto da UFJF, cujo relatório final, datado de agosto de 2008, concluiu que não haveria possibilidade de o Projeto de Centro de Parto Normal voltar a ser executado nas condições existentes até então.