"Por trás de todos os integrantes da sua playlist do Spotify, existe uma infinidade de expressões matemáticas", Luiz Castelões.

“Por trás de todos os integrantes da sua playlist do Spotify, existe uma infinidade de expressões matemáticas”, Luiz Castelões, pesquisador da UFJF.

“A música não é matemática. Mas, como a grande régua do mundo que é, a matemática serve à música, uma vez que a matéria-prima dessa — o som e o silêncio — pode ser mensurada”, explica o professor Luiz Castelões, da Faculdade de Música da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Apresentando, nessa quinta-feira (26), a palestra “A Matemática da Música” — parte da programação da 6ª Jornada de Divulgação Científica — o professor revela um Universo em que, por trás de todos os integrantes da sua playlist do Spotify, existe uma infinidade de expressões matemáticas.

Evidenciando os pontos de encontro entre essas áreas aparentemente tão distantes, Castelões ressalta duas propriedades da música que podem ser observadas numericamente. “Primeiramente, a altura das notas — o nome das notas, na linguagem técnica — representam frequências, já medidas pela Física. Por exemplo, o Lá 440 (à direita do Dó Central do piano) vibra a 440 hertz, ou 440 vibrações por segundo. O que difere uma nota de outra é, justamente, a quantidade de vibrações.”

A segunda característica, explica, seria a duração de cada nota. “Sendo contabilizáveis, essas propriedades podem ser expressas em números. Dessa forma, podemos realizar operações com elas, dialogando não só com a matemática, mas com todas as disciplinas que utilizem a matemática.” O professor alerta, porém, que os conceitos (em tese) matemáticos aplicados à música não necessariamente significam a mesma coisa nos dois campos.

2 + 2 = 2

“A música é tudo isso, racional e irracional”, afirma Castelões (Foto: Caique Cahon)

“A música é tudo isso, racional e irracional”, afirma Castelões (Foto: Caique Cahon)

Já na Antiguidade Clássica, os discípulos de Pitágoras defendiam a concepção que a proporção da distância entre os astros deveria equivaler à proporção da distância entre as notas da escala a ser usada pela música. “Se Mercúrio estava a uma distância de Vênus, e Vênus a uma distância da Terra, numa proporção de 1-para-2-para-3, então as notas musicais deveriam, também, estar nessa proporção.” Se opondo aos pitagóricos, conta Castelões, estavam os empiristas, instrumentistas que não queriam se submeter a essa concepção de afinação matemática da música.

“A matemática, na música, não defende nada. Ela pode ser usada para medir uma escala de um jeito ou de outro, é ‘neutra’. Porém, essa briga continua, desde então. Ainda hoje, existe o empirista — o cara que acredita em testar as coisas pelo ouvido — e o cara que quer impor uma certa pauta matemática, racional, sobre a música.” Vendo esse conflito, Castelões (assim como a Matemática) prefere permanecer neutro, integrando as duas correntes.

“A música é tudo isso, racional e irracional. E nisso ela é diferente da Ciência, que pressupõe métodos e critérios racionais para verificar uma realidade supostamente objetiva. A música pode incluir isso, mas também envolve modelos irracionais, baseados em categorias como desejo, vontade, gosto e opinião.”

Sendo um campo tão heterogêneo, a Teoria Musical é composta por diversas correntes de pensamento, muitas vezes caminhando de forma independente. Em meio a tanta diversidade, explica o professor, os conceitos matemáticos empregados na música podem não ser tão rigorosos. “Por exemplo, na Matemática de Intervalos — intervalos como a distância entre as notas —  uma segunda menor mais uma segunda menor resulta numa segunda Maior, ou seja: 2 + 2 = 2. Ou uma oitava mais uma oitava equivale a uma 15ª, e não a uma 16ª.

“Com isso, vamos vendo como é estranha essa matemática aplicada à música. Talvez daí decorra a dificuldade que muitas pessoas têm com a música, uma vez que ela pode incluir toda a abordagem racional presente nos números, mas também desafia a lógica matemática. A música é composta por várias lógicas. Por isso temos acompanhado tantas pesquisas apontando o benefício da música para os estudantes.”

Sobre a aplicação da música no ensino, Castelões sugere duas possibilidades. A primeira, seria utilizá-la apenas como uma ferramenta lúdica para trabalhar os conteúdos escolares tradicionais. A segunda, aponta, é o ensino da música para aprender música. “Ao ser instruído em música, o aluno desenvolve maiores capacidades matemáticas e verbais, por exemplo. Essa segunda opção me parece mais interessante, por pressupor um estudo forte de música nas Escolas, o que ainda não existe. Permanece como um desafio e uma utopia”, conclui.

A palestra do professor ocorre nessa quinta-feira (26), no Centro de Ciências da UFJF, às 10h. A inscrição é gratuita e pode ser realizada por esse link ou pelos telefones (32) 2102-6913 ou (32) 2102-6914.