Telmo Ronzani representou o Brasil em rede científica da ONU e auxiliou na elaboração de documento que norteou decisões sobre novas políticas sobre drogas em assembleia internacional (Foto: Twin Alvarenga)

Telmo Ronzani auxiliou na elaboração de documento que norteou decisões sobre novas políticas sobre drogas em assembleia internacional da ONU (Foto: Twin Alvarenga)

A cada ano, cerca de 250 milhões de pessoas fazem uso de drogas ilícitas, um número que corresponde, aproximadamente, a 5% da população mundial. O impacto na saúde pública chega a contabilizar mais de 187 mil mortes por overdose anualmente, além de demais sequelas geradas pelo uso, como nascimento de bebês com sintomas de abstinência e propagação de doenças infecciosas.

Estes dados, fornecidos pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes (Unodc), endossam o alerta feito pela comunidade científica durante a assembleia mundial coordenada pela Organização das Nações Unidas (ONU). Entre os 25 cientistas escolhidos pela organização para compor o grupo, denominado Rede Científica Internacional para a Política de Drogas, figura o único representante brasileiro e professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Telmo Ronzani.

Em entrevista, o pesquisador adianta os resultados acordados na Sessão Especial da Assembleia Geral das Nações Unidas sobre Drogas (Ungass), que aconteceu entre os dias 19 e 21 de abril deste ano. “É preciso um certo cuidado com o assunto e considero que avançamos consideravelmente”, pondera Ronzani. “Os pontos principais acordados na assembleia já abordam a problemática do não funcionamento da guerra às drogas e promovem as políticas baseadas em evidências científicas, tirando-as da esfera do crime e inserindo na da saúde pública.”

Progresso na política mundial

Segundo o pesquisador, as decisões acordadas pelos chefes de Estado já demonstram um avanço na noção de políticas sobre drogas. “A ideia é uma mudança de perspectiva”, afirma Ronzani. “Antigamente, era entendido que, se fosse combatido o tráfico de drogas com foco na esfera criminal, diminuiria a disponibilidade de drogas, o número de usuários e problemas sociais. Só que o que aconteceu foi exatamente o contrário.”

O pesquisador explica que Rede Científica Internacional para a Política de Drogas foi reunida com o intuito de fornecer um respaldo científico para as decisões dos chefes de Estado presentes na assembleia. “Os dados que reunimos mostram que houve, inclusive, aumento no consumo de drogas”, aponta Ronzani. “A criminalização excessiva não só do tráfico, mas dos usuários, gerou mais crime organizado, aumentou seu poder bélico e os encarceramentos cresceram assustadoramente. Isso acabou impactando populações mais vulneráveis e, ainda, não diminuiu o consumo.”

“É preciso entender que não existe uma solução mágica”, reconhece. “O mundo sem drogas é algo impossível de se pensar. Elas fazem parte da sociedade; algumas têm funções terapêuticas, outras de auxílio no processo de cura de doenças, entre outras. O importante é lidarmos da melhor maneira, diminuindo, ao máximo, o impacto negativo.”

Recomendações científicas

Ronzani também adianta as conclusões conciliadas pela comunidade científica convidada pela ONU. “Nos norteamos pelos princípios da evidência, ética e direitos humanos”, atesta. “É preciso avaliar as consequências que as medidas podem ter sobre diferentes contextos nacionais e sociais, uma vez que políticas podem ser mais prejudiciais do que o próprio uso de drogas. Existem países, por exemplo, que ainda defendem a pena de morte e, outros, que não fornecem medicamentos necessários para a reabilitação de usuários.”

Ao final da reunião, foi produzido um documento com oito pontos principais diretos. Entre eles, figuram a eliminação do estigma em relação aos transtornos por uso de drogas, implementação de programas de tratamento e prevenção baseados em evidências científicas, apoio às pesquisas relacionadas às drogas, abordagem das sequelas pelo uso de drogas como problemas de saúde pública e asseguramento do acesso aos remédios de uso terapêutico de auxílio para pacientes.

As metas têm como objetivo prevenir a iniciação de pessoas no uso de substâncias e reduzir os casos emergentes de abuso de drogas. “Cada país tem sua soberania, mas, a partir do momento que são signatários da ONU, estão fazendo um acordo afirmando que vão direcionar as políticas de cada país para que essa mudança seja gerada.”

“É preciso entender que não existe uma solução mágica. O importante é lidarmos da melhor maneira, diminuindo, ao máximo, o impacto negativo.” (Foto: Twin Alvarenga)

“É preciso entender que não existe uma solução mágica. O importante é lidarmos da melhor maneira, diminuindo, ao máximo, o impacto negativo.” (Foto: Twin Alvarenga)

Outras informações: Centro de Pesquisa, Intervenção e Avaliação em Álcool e Outras Drogas 

Special Session of the United Nations General Assembly on the World Drug Problem 2016 (Ungass) 

Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (United Nations Office on Drugs and Crime)