Campanha publicitária de calças e camisas Us Top na década de 70. (Foto arquivo)

Campanha publicitária de calças e camisas Us Top na década de 70. (Foto arquivo)

A moda sem gênero começou a fazer parte das campanhas de algumas marcas e lojas de departamento no Brasil. Peças e cores neutras dominaram vídeos e fotos na internet, apresentando modelos básicos que serviriam muito bem para qualquer pessoa que os quisesse vestir. Mas a moda conhecida antigamente como unissex pararia aí? Segundo a professora do Instituto de Artes e Design (IAD) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) Maria Cláudia Bonadio, a resposta seria não.

As mudanças de hábitos e revoluções na sociedade sempre refletiram nos estilos de vida e na moda. “Até o século XVIII os homens usavam roupas coloridas, maquiavam, empoavam a peruca e usavam sapatos de salto”, explica a professora. Esse perfil começou a mudar no século XIX, quando deixou-se de cultuar a nobreza e passou-se a valorizar o trabalho. O homem começou a usar ternos e roupas mais neutras, que não relevavam tanto sobre sua personalidade, afastando-se muito do universo que passou a ser considerado feminino. Essa grande divisão de vestimentas só começa a mudar no século seguinte, a partir da década de 60.

Maria Cláudia Bonadio IAD

“Nos anos 70 a revolução sexual quebrou barreiras e mudou o cenário da moda. A calça jeans se torna peça dominante do guarda-roupa”, relembra Maria Cláudia. (Foto: Caique Cahon)

Na virada para os anos 70 houve uma transformação cultural que mais uma vez quebrou barreiras e a revolução sexual chegou para mudar o cenário da moda. Se antes disso as mulheres usavam mais vestidos e saias, depois passaram a ter a calça jeans como peça dominante do guarda-roupa. Tênis, camisetas e jaquetas também se tornaram populares para elas, mesmo que com o tempo começassem a ter um aspecto mais “feminino”, que valorizasse mais o corpo da mulher. Em um piscar de olhos, as mulheres passaram a vestir de tudo um pouco, enquanto os homens mudaram apenas um pouco, saindo das cores mais neutras e buscando tons mais fortes para suas roupas, como vermelho e amarelo. “Para o homem, essa gama de possibilidades (que as mulheres têm) ainda é mais restrita”, aponta Maria Cláudia.

A proposta apresentada agora por grandes marcas traz peças mais contidas, com cores neutras e que poderiam ser usadas por qualquer pessoa. Mas, segundo a professora de história da moda, ainda não há, por parte delas, a mesma quebra de barreiras que houve há quatro décadas. Assim como alguns estilistas, o mineiro Ronaldo Fraga acrescentou saias e vestidos aos modelos masculinos que criou para sua coleção, no fim do ano passado. “Isso sim me parece uma coisa muito mais legítima em termos de ultrapassar as fronteiras de gênero”, comenta Maria Cláudia. Algumas lojas internacionais já foram além, propondo que as definições “feminino” e “masculino” fossem retiradas das suas seções e colocando a moda como algo que naturalmente não deveria ser dividido por gêneros.

Pesquisa na área

A professora Maria Cláudia, em um artigo, analisa os costureiros que chegaram no Brasil na virada dos anos 50 para os 60. Os dois principais estilistas estudados são Clodovil e Dener. Na época, eles eram muito conhecidos por criarem peças para a alta sociedade, mas causavam certo estranhamento por romperem barreiras e optarem por roupas com babados e cabelos compridos. Receberam diversas vezes comentários ácidos da imprensa por viverem fora dos “padrões”, mesmo que alguns modelos de roupas que usavam fossem muito próximos ao estilo dos Beatles e da Jovem Guarda.