Você sabia que seres microscópicos presentes no organismo de ruminantes, como bovinos e caprinos, influenciam na produção de gases poluentes? Algumas iniciativas como melhorar a eficiência da digestão, por exemplo, podem reduzir essa emissão. Pesquisadores do mundo todo se dedicam a esta causa, visando minimizar os impactos ambientais. Parte dessa rede de investigação, uma equipe da UFJF do Laboratório de Protozoologia (LabProto/UFJF) se tornou a única equipe especializada no Brasil em identificar e analisar em profundidade os protozoários ciliados presentes no rúmen, primeiro compartimento do estômago dos ruminantes.

Os estudos em andamento envolvem a caracterização morfológica e molecular desses microrganismos, co-evolução (influência recíproca no processo evolutivo entre mais de uma espécie), taxonomia (classificação dos seres vivos) e a descrição de novas espécies.

Embora sejam microorganismos ainda muito desconhecidos, os protozoários apresentam um grande potencial para a indústria biotecnológica. Eles são parte importante dos processos que acontecem no rúmen, que influenciam na produção de carne e leite e na qualidade desses produtos. Além disso, eles participam na produção de gases poluentes, como o metano, e, a partir de estudos da área, ficou claro que é possível limitar essa emissão. Deixar a digestão mais eficaz reduz não só o prejuízo ecológico, como resulta em ganhos econômicos para o produtor.

Outro fator que justifica o estudo com protozoários é a sua participação na quebra de celulose, e o potencial de se utilizar as enzimas produzidas por alguns ciliados em exploram o potencial és de questões como a degradação de celulose. Marta Tavares D’Agosto, uma das líderes do laboratório, afirma que o potencial desses seres ainda é muito desconhecido e existe uma carência de pesquisas nessa área. Para ela, “é preciso entender e conhecer os protozoários para que seja possível identificar melhor sua contribuição em questões de interesse acadêmico, econômico e ambiental.”

O principal trabalho realizado pelo grupo é a caracterização morfológica e molecular desses microrganismos, possibilitando compreender melhor sua da função. No Brasil, pesquisas com esse nível de caracterização só têm acontecido na UFJF. Aluna do programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas da UFJF, Franciane Cedrola explica que no país é comum a utilização de apenas uma técnica morfológica, o que dificulta a visualização de estruturas que seriam necessárias para o reconhecimento do microrganismo. As informações recolhidas, portanto, podem apontar um gênero, mas não são capazes de revelar sua espécie.

Para garantir resultados satisfatórios, o grupo utiliza diversas técnicas, principalmente a observação in vivo, a coloração pela solução de lugol e a impregnação pela prata, que revelam grande parte dos caracteres necessários para a descrição de espécies. A observação de ciliados vivos permite a identificação de características, como a ciliatura, o comportamento e o formato do corpo. A solução de lugol é usada para corar a placa esquelética desses microrganismos, pois o lugol possui afinidade com carboidratos. Já a impregnação pela prata revela estruturas que têm afinidade por esse composto, principalmente a infraciliatura, que é a inserção da ciliatura no corpo do protozoário (assim como uma raiz do nosso cabelo fixada no couro cabeludo).

Todas as informações obtidas por meio dessas técnicas ajudam na identificação da espécie, mas outros métodos, como a coloração com verde de metila, a microscopia eletrônica e técnicas moleculares também são utilizadas para gerar resultados mais detalhados.

A professora Marta afirma que “trabalhar com ciliados de rúmen é complexo não só pelo número de técnicas que precisam ser empregadas, mas também porque muitas vezes as técnicas utilizadas para cada espécie pode ser diferente. As próprias adaptações voltadas para a sobrevivência da espécie no ambiente ruminal, como uma película de revestimento mais espessa, dificultam as análises. Por isso desenvolvemos uma linha de trabalho dedicada a testar, aprimorar e mesclar técnicas a fim de melhorar a visualização e o reconhecimento desses ciliados.” Como resultado desses estudos, os pesquisadores publicaram artigo de revisão no Zoological Science, jornal científico japonês focado em zoologia.

“Somos procurados por outras universidades para auxiliar na identificação de ciliados, além de oferecermos cursos para ensinar como esse processo deve ser feito”, acrescenta Franciane. O laboratório também tem parcerias com a Universidade Federal de Sergipe (UFS), a Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), a Universidade Federal Tecnológica do Paraná (UTFPR) e a Universidade Estadual de Londrina (UEL).

 Outras informações:

Laboratório de Protozoologia (LabProto/UFJF)