Em 20 de janeiro de 1892, o professor canadense James Naismith colocou em prática as 13 regras criadas por ele para um novo jogo sem violência, que estimulasse seus alunos à prática esportiva durante o inverno, em Massachusetts (EUA). Com cestas de 3,05m de altura e bolas pouco maiores que as usadas no futebol, foi lançado o primeiro desafio de um dos esportes mais difundidos do mundo atualmente, o basquete. Em Juiz de Fora, em novembro de 2017, o professor Dilson Borges trouxe para as quadras da UFJF uma outra visão da modalidade: o mini-basquete, em que os equipamentos são adaptados para jogadores bem mais baixos.
No “Minibasquetebol: uma iniciação esportiva positiva”, Henrique da Silva, apelidado de Gigante, 7 anos, que tem 1,20m de altura. Ele ingressou no projeto de extensão seguindo os passos do irmão Bruno,12, e é um dos mais novos do grupo. “Ele tinha 6 anos, mas como havia poucas crianças na época, ele veio treinar”, conta um dos monitores e estudante de educação física na instituição, Pedro Henrique Lobão. “Quando ele começou, era muito agitado. No meio dos meninos mais velhos, brincava e disputava de igual para igual, então eu falei: ‘você é Gigante dentro de quadra’, e ficou o apelido.”
Assim como Henrique, outras 44 crianças que frequentam o projeto de extensão da Faculdade de Educação Física e Desporto da UFJF conseguem praticar a modalidade por conta da adequação dos equipamentos à faixa etária. A bola tem quase 20cm a menos na circunferência que uma bola comum, com 55,8cm, e possui a metade do peso, 311 gramas. A quadra tem a dimensão reduzida para 14mx10m (a tradicional tem 28mx15m), não existe linha de três pontos e os jogos duram dez minutos. Com cestas a 2,15m do chão para os mais novos e 2,60m para os mais velhos, a estatura deixa de ser problema para os pequenos atletas. “Quando eu vou fazer a cesta, vou correndo, pulo e tampo a bola para cima. Quero aprender enterrada, que pendura na cesta e acerta a bola”, conta Henrique. Com atividades duas vezes por semana, o projeto possui duas turmas mistas: 7 a 8 anos e 9 a 12 anos.
A iniciativa partiu da observação do coordenador Dilson Borges quanto à demanda da modalidade para este público. “As pessoas procuram clubes aos 13 anos por não irem bem no futebol ou terem crescido demais, e isso às vezes encurta o período de prática na modalidade, porque nessa idade já iniciam as competições e perde-se o encantamento. Por isso montamos o projeto, não para ser uma formação esportiva, mas uma iniciação ao basquetebol de maneira saudável e positiva. Temos três objetivos: que as crianças gostem de basquete, que queiram voltar no dia seguinte e se eles conseguirem fazer uma cesta todos os dias já está valendo. É claro que mais para frente, se algum deles se destacar e quiser continuar na modalidade, já terá uma base prévia”, explica o professor.
As aulas são preparadas pelos monitores e iniciadas com um momento de curiosidade, que instiga as crianças a saberem mais sobre o esporte além de estimular o aprendizado prático. “Outro dia os monitores trouxeram uma curiosidade sobre o Oscar Schmidt, que é chamado de Mão Santa, porque treinava muito e tinha um arremesso muito bom. Existia até uma história de que, nas ruas, as pessoas pediam para ele colocar a mão na cabeça delas para curá-las. Isso estimulou as crianças a pensar como se faz um arremesso e todos queriam arremessar com uma mão só, como ele”, conta Dilson.
Respeitando o desenvolvimento físico, cognitivo e emocional das crianças, as aulas envolvem elementos básicos do jogo: driblar, passar, pegar o rebote. Os monitores criam exercícios e estimulam a prática, independente da habilidade, e com o tempo os alunos vão adquirindo técnicas específicas. A tática é simples, seguindo o objetivo do jogo como no livro de regras: fazer cestas e impedir que o adversário faça pontos. Nessa dinâmica, meninos e meninas aprendem juntos. Segundo o coordenador, na faixa etária que o projeto aborda não há diferença na estrutura corporal das crianças que afete a interação e o ritmo de jogo, como níveis de força e coordenação motora. “Achar que meninos e meninas não podem jogar juntos é uma questão cultural”, enfatiza.
Através do projeto, começa-se a quebrar paradigmas e o basquete como esporte de atletas altos deixa de ser limitante. “As pessoas tendiam a se isolar de praticar o basquete por ter estatura menor, mas no mini-basquete isso não faz diferença, porque os maiores não dominam o jogo e os menores não se sentem excluídos. No alto rendimento o esporte é realmente seletivo, mas mesmo assim, hoje em dia, os baixinhos têm sua vez. Um dos melhores jogadores brasileiros da atualidade, Yago Mateus, tem 1,78m e isso para o basquete é considerada baixa estatura”, relembra.
A cada três meses, o projeto realiza o Festival de Mini-basquete, com equipes de Juiz de Fora e região jogando de forma harmoniosa, sem competição. A quarta edição está prevista para 8 de dezembro e espera receber 200 crianças. A iniciativa tem com o apoio da Federação Mineira de Basquete, que distribui medalhas a todos os participantes e, no último festival, trouxe para conhecer as crianças o ex-pivô da Seleção Brasileira, Gerson Victalino, medalhista de ouro no Pan-Americano em 1987 e embaixador da federação.
‘Não é quicar, é driblar’
Entre tantos benefícios, o basquete, quando trabalhado com crianças, estimula a socialização, o condicionamento físico e até o desenvolvimento comportamental. Segundo o monitor Pedro Henrique Lobão, a coordenação motora das crianças melhora naturalmente, com a prática esportiva e a idade. Mas é muito mais perceptível o desenvolvimento psicológico, afetivo, de organização e comprometimento. “Temos relatos de pais contando que os filhos querem que articulem os horários de escola para não chegarem atrasados ao treino. Eles também entendem a rotina da aula e cobram os termos certos, quando falo que temos que quicar a bola, eles corrigem: o termo certo é driblar”, comenta.
Os irmãos João Pedro, 9, e Maria Isabel, 11, participam do projeto desde fevereiro deste ano. “Eles adoram movimento, já fizeram natação e ficaram curiosos com o basquete”, relata a mãe, Maria Amália Cardi. “Eles acharam fantástica a experiência de jogar com outras crianças e aqui o projeto promove a harmonização do grupo e trabalham a saúde do corpo e da mente.”
Já Antônio Valverde, 7 anos, era bastante tímido e passou a socializar mais quando começou a fazer parte da turma. “Ele que escolheu a modalidade, coloquei na aula para interagir com outras crianças e agora adora tudo relacionado ao esporte”, comenta a mãe, Rogéria Valverde. Antônio completa: “Um amigo me incentivou a vir para cá e agora eu gosto do jogo e de fazer bandeja: dar dois passos e saltar”.
Para Vilma Aparecida Procópio, o basquete é além de tudo uma forma de concentrar em uma atividade física o excesso de energia da filha. Aos 7 anos, Maria Eduarda demonstra mais habilidade que as crianças da sua idade e hoje joga com os alunos mais velhos: “Gosto de fazer cesta, no jogo é o mais importante o time ganhar. Ninguém toca muito para mim porque sou muito pequena e acham que não vou conseguir fazer pontos”, conta a menina. A mãe destaca: “Ela ainda brinca ‘não tenho medo, eu enfrento os maiores’.”
Fonte: TRIBUNA DE MINAS