1 – Gás emitido pela agricultura ameaça camada de ozônio
2 – Rede monitora alta do nível do mar
1 – Gás emitido pela agricultura ameaça camada de ozônio
Óxido nitroso, ou gás hilariante, não foi banido pelo acordo internacional que proibiu os CFCs
Parece piada, mas não é: a maior ameaça à camada de ozônio da Terra no século 21 é o gás hilariante. Conhecido oficialmente como óxido nitroso (N2O), esse gás produzido principalmente pela agricultura e pelas queimadas já ultrapassou os clorofluorcarbonos, os infames CFCs, como principal agente de destruição do ozônio.
A conclusão é de um estudo realizado por três pesquisadores da Noaa (Agência Nacional de Oceanos e Atmosfera dos EUA) e publicado ontem no site do periódico “Science”.
O químico Akkihebbal Ravishankara e seus colegas John Daniel e Robert Portmann calcularam pela primeira vez o potencial de aniquilação de ozônio do N2O. Eles concluíram que, embora ele seja baixo comparado ao dos CFCs, as emissões crescentes de óxido nitroso por seres humanos compensam esse fator, e em 2050 esse gás sozinho representaria 30% do potencial de destruição da camada de ozônio que todos os CFCs (e há dezenas desses gases) somados em seu pico, nos anos 1980.
O papel dos CFCs e do N2O na destruição do ozônio é conhecido desde meados da década de 1970, quando os químicos Mario Molina, Sherry Rowland e Paul Crutzen elucidaram a maneira como esses gases reagem com o ozônio na estratosfera. Mas ele só se tornou motivo de pânico global em 1985, quando pesquisadores britânicos descobriram um buraco sazonal na camada de ozônio sobre a Antártida.
Como o ozônio estratosférico protege a Terra da radiação ultravioleta do Sol – permitindo que a Terra seja habitável -, sua destruição demandava ação imediata. Em 1987 as Nações Unidas assinaram o Protocolo de Montréal, que baniu a produção de CFCs. O gás hilariante, porém, ficou de fora.
“Esse gás é muito estável na atmosfera, e pode durar centenas de anos, o que aumenta nossa responsabilidade no controle das emissões”, disse à Folha Paulo Artaxo, especialista em química atmosférica da USP e membro do IPCC, o painel do clima da ONU. Pior ainda, continua Artaxo, “temos o forte efeito do N2O como gás de efeito estufa, que também terá de ser regulado”.
Ravishankara e seus colegas afirmam que, embora o gás hilariante não tenha impacto sobre o ozônio antártico, ele dificulta a recuperação da camada de ozônio global, que já foi reduzida em 6%, em média.
(Folha de SP, 28/8)
2 – Rede monitora alta do nível do mar
Brasil investe na pesquisa em dez áreas com o objetivo de avaliar impactos do aquecimento global
Carolina Stanisci escreve para “O Estado de SP”:
O Brasil dará no próximo mês o primeiro passo para criar uma série histórica e inédita sobre a elevação do nível do mar em todo o litoral. A consolidação dos dados será possível com a formação da Rede Clima, que une pesquisadores para investigar o impacto das mudanças climáticas em áreas consideradas estratégicas, como agricultura e zonas costeiras.
Para discutir a dimensão da elevação do nível das águas no País, 40 cientistas vão se reunir em Rio Grande (RS), entre os dias 13 e 16 de setembro.
O método de pesquisa em rede ganhou relevância após a divulgação do relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), ao tratar do aquecimento global, em 2007. Com a proximidade do encontro das Nações Unidas (ONU) sobre o clima em Copenhague, em dezembro, os pesquisadores têm intensificado os estudos. “É preciso construir um novo conhecimento”, diz o climatologista Carlos Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Membro do painel sobre mudanças climáticas na ONU, ele coordena as duas iniciativas do governo para enfrentar o desafio: a Rede Clima e o Instituto Nacional para Mudanças Climáticas. Foram quase R$ 20 milhões de investimento.
A rede, criada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia em 2007, recebeu no ano passado R$ 10 milhões por meio da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), empresa pública ligada ao Ministério da Ciência e Tecnologia. Nela, 150 pesquisadores de 40 instituições brasileiras estão interligados virtualmente. Os pesquisadores estão divididos em dez áreas – agricultura, saúde, zonas costeiras, biodiversidade e ecossistemas, recursos hídricos, energias renováveis, cidades, economia, desenvolvimento regional e modelagem das mudanças climáticas.
Cada nó desse emaranhado virtual é chefiado por uma instituição. É o caso da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que coordena outras 15 instituições da sub-rede de agricultura. Segundo o pesquisador Eduardo Assad, os cenários climáticos são do Inpe e eles fazem a simulação do que pode ocorrer com culturas de milho, café, soja, cana-de-açúcar e outras quando há aumento da temperatura.
As projeções dão ideia de como as culturas vão reagir com a possível alta de até 2°C, limite máximo de aquecimento em relação à era pré-industrial que os países do G-8, em reunião na Itália, neste ano, acordaram como meta.
Na Universidade Federal de Viçosa (MG), oito pesquisadores e 30 estudantes vão além da simulação. Há dois anos, eles investigam o impacto do aquecimento no plantio de milho e feijão. O experimento consiste em aumentar a concentração de gás carbônico e a temperatura das culturas. “Elas gostaram do gás carbônico, mas não da temperatura aumentada”, diz Luiz Cláudio Costa, reitor da universidade.
No mar
O diretor do Instituto de Oceanografia da Universidade Federal do Rio Grande (Furg), Carlos Garcia, destaca a gravidade da questão. “O planeta está aquecendo e há excesso de energia. Cerca de 80% dessa energia fica retida nos oceanos, causando a expansão da água.”
Coordenador da sub-rede das zonas costeiras, ele crê que a reunião de setembro dará subsídio para avaliação de componentes afetados pelo aumento do nível do mar, como as regiões de manguezais. O objetivo da pesquisa é obter informações para que cidades vulneráveis enfrentem o problema. “Tudo é afetado pelas mudanças climáticas”, conclui Nobre.
Por isso profissionais de quase todas as áreas do conhecimento caíram nas redes. É o caso da saúde. Há quem aponte que doenças cujo transmissor seja o mosquito registrarão expansão de casos. Não é o que pensa o geógrafo Christovam Barcellos, do Centro de Informação Científica e Tecnológica e integrante da Rede Clima ao lado de outros dez pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
“Dizer que dengue e malária vão aumentar com o aquecimento global é especulação”, afirma. Para ele, a dengue pode até se espalhar pois o mosquito está mais “urbanizado”. Mas no caso da malária, Barcellos refuta a generalização. “Se o clima está mudando, a paisagem na Amazônia, onde está o mosquito da malária, também vai mudar”, afirma, concluindo que não é possível saber como o transmissor da doença continuará na região.
A Fiocruz prepara um observatório com dados sobre saúde e mudanças climáticas. O material ficará online e terá acesso diferenciado para pesquisadores e público em geral. O projeto-piloto está previsto para novembro.
(O Estado de SP, 28/8).