1 – Saúde dos oceanos do planeta está crítica
2 – Cinco mamíferos são extintos da Mata Atlântica
1 – Saúde dos oceanos do planeta está crítica
Novo indicador sobre áreas costeiras de 171 países dá nota média 60, em 100, para a capacidade de prover serviços e manter a biodiversidade.
Um grupo internacional de pesquisadores aliado com algumas das principais organizações ambientais do mundo divulgou ontem o primeiro indicador sobre a saúde dos oceanos. O resultado mostrou que a capacidade de fornecer benefícios aos seres humanos e ao mesmo tempo manter a qualidade de seus ecossistemas é crítica e está bem aquém do que poderia ser.
Foram analisadas as condições de dez objetivos socioecológicos dos oceanos nas zonas econômicas exclusivas de 171 países e territórios costeiros. Com notas variando de zero a cem, chegou-se a uma média global de 60.
O ineditismo do trabalho foi pela primeira vez considerar não apenas a preservação dos mares, mas seu uso sustentável. Os dados avaliados foram desde a capacidade de prover alimentos até a de preservar sua biodiversidade, passando por poluição e uso em turismo. A interpretação é de que, quanto menor a nota, menos o país está sendo capaz de aproveitar os benefícios dos oceanos ou isso está sendo feito de modo insustentável.
O Brasil ficou bem na média, com 62 pontos, atingindo a 35.ª colocação. Serra Leoa, em último, teve nota 36. A mais bem colocada foi a Ilha Jarvis (território dependente dos EUA no Pacífico), com 86 pontos, mas o local é desabitado, assim como os Territórios Desabitados dos EUA no Pacífico, que aparecem em segundo lugar, e a Ilha Clipperton, em terceiro. Só em quarto lugar, com iguais 73 pontos, aparecem as primeiras nações propriamente ditas – Ilhas Seychelles e Alemanha.
Assim como ocorre em outros indicadores globais, há uma diferença clara entre os países desenvolvidos, com melhores notas, e os em desenvolvimento, com as piores. Nações africanas ocupam os dez últimos lugares.
“Sem dúvida nenhuma, os humanos têm impactos substancialmente negativos sobre o oceano, e as pontuações são negativamente correlacionadas com as populações costeiras”, escrevem os autores na revista Nature, que traz um artigo nesta semana mostrando a nova metodologia e os resultados.
O trabalho mostrou que entre os tópicos avaliados, a capacidade de prover alimentos é uma das mais críticas, refletindo o colapso dos estoques pesqueiros que já há alguns anos é denunciado pela comunidade científica. A nota média foi 24.
Abaixo dele, só ficou o turismo – com nota 10 -, mas os próprios autores admitem que o dado pode não refletir totalmente a situação dos países. O indicador foi mais complicado de trabalhar por não existirem muitas bases de dados globais com informações sobre turismo.
“O que esses dados mostram é que há muito espaço para melhorar. E a vantagem é que agora o indicador será calculado todo ano, o que vai permitir que saibamos muito rapidamente se as ações humanas estão melhorando ou piorando as condições desses objetivos”, explica a bióloga brasileira Cristiane Elfes, que colaborou com o estudo no Centro Nacional de Análise Ecológica e Síntese da Universidade da Califórnia, que liderou o trabalho.
A ideia, diz ela, é a partir de agora aplicar a metodologia em escalas regionais para conhecer melhor os indicadores de cada país e orientar ações mais específicas para melhorá-los. Cristiane está liderando essa iniciativa já para o Brasil, e a expectativa é que os dados sejam divulgados até o final do ano.
Estoque de carbono. No País, os indicadores variaram de zero (para o turismo) a 93 (armazenamento de carbono). O resultado ruim pode significar que o Brasil ainda não tem aproveitado bem esse potencial turístico ou, quando o faz, é de modo insustentável. Já o dado positivo lança um alerta para o futuro. É a análise de Guilherme Dutra, da Conservação Internacional, uma das ONGs que coordenou o projeto.
“Essa capacidade de armazenar carbono se deve particularmente aos enormes manguezais e gramas marinhas presentes na costa brasileira. Eles são capazes de guardar até dez vezes mais carbono que as florestas”, explica. “O temor é que os manguezais estão ameaçados pela mudança do Código Florestal”, alerta. Ele se refere à modificação que permite o uso de até 35% nas áreas remanescentes de manguezais nos estados, prevista na medida provisória editada pela presidente Dilma Rousseff.
(O Estado de São Paulo)
2 – Cinco mamíferos são extintos da Mata Atlântica
Não é de hoje que biólogos da conservação sabem que pequenos fragmentos de floresta tropical, em meio a fazendas ou cidades, pouco contribuem para a sobrevivência de animais de médio e grande porte, que precisam de espaço para locomoção, alimentação e reprodução. Novo estudo de pesquisadores brasileiros mostra que, pelo menos para a Mata Atlântica, a realidade desafia essa teoria clássica.
Mesmo grandes remanescentes estão sendo incapazes de manter a biodiversidade. Sem proteção efetiva que impeça a entrada de pessoas, a pressão histórica e atual de caçadores diminui os benefícios de ter uma área remanescente grande com uma floresta relativamente intacta, explica o biólogo Carlos Peres, da Universidade East Anglia, que liderou a pesquisa publicada na revista PLoS ONE.
O trabalho inventariou 18 espécies de mamíferos em 196 fragmentos ao longo da Mata Atlântica, o bioma mais ameaçado, que já perdeu cerca de 90 % da cobertura original. Mais de 205 mil km de estradas foram percorridos. Os pesquisadores descobriram que cinco delas tinham sido totalmente ou virtualmente extintas numa escala regional: queixada, onça-pintada, anta, muriqui e tamanduá-bandeira. E observaram que o fator que fez mais diferença para a manutenção da biodiversidade foi uma proteção efetiva da área. Isso ficou claro quando compararam fragmentos de tamanhos parecidos em que a diferença entre era o nível de proteção – os mais protegidos tinham mais animais.
E falar em proteção significa não apenas criar unidades de conservação. Em muitos casos elas existem, mas não estão implementadas nem têm segurança, sendo incapazes de impedir, por exemplo, a entrada de caçadores ou madeireiros. “Apenas cinco dos remanescentes investigados eram protegidos na prática e foram os que apresentaram as maiores taxas de retenção de espécies”, diz Peres.
A situação se mostrou mais crítica nos fragmentos da Mata Atlântica na porção oeste do Nordeste, onde há menos unidades de conservação. “A disponibilidade de proteína animal nessa região é baixa, por conta das altas taxa de densidade demográfica na zona rural. A economia de muitas casas de baixa renda é subsidiada por um padrão de caça que varia de recreativo à subsistência. Só a fauna relativamente tolerante a essa pressão persiste”, conta Peres.
Muitas espécies de mamíferos desapareceram até do folclore. “Ninguém nunca viu um muriqui ou um tamanduá-bandeira. Naquele caso, as reservas já chegariam atrasadas”, complementa Gustavo Canale, primeiro autor do artigo, que fez a pesquisa para seu doutorado na Universidade de Cambridge (Inglaterra). “Mesmo se existirem populações muito isoladas, elas estão tão reduzidas que já não são mais viáveis”, diz o biólogo, professor da Universidade Estadual de Mato Grosso. “A gente vê aquela mata bonita, acha que tem bicho, mas a verdade é que são florestas vazias.”
Entre janeiro de 2004 e janeiro de 2006, ele, Peres e colegas entrevistaram 8.846 pessoas que viviam no entorno dos remanescentes florestais havia pelo menos 15 anos. Tinham intimidade com a mata. Em muitos casos eram caçadores ou madeireiros, apesar de ninguém se declarar como tal. “Todo mundo fala que come a carne daqueles bichos, mas ninguém admite que caça”, conta Canale.
A análise mostrou uma taxa impressionante de extinções locais na fauna de mamíferos. De 3.528 populações possíveis de existir nos 196 fragmentos, 767 foram contabilizadas. Os remanescentes retinham 3,9 das 18 espécies investigadas.
(O Estado de São Paulo)