Fechar menu lateral

Informativo 284 – O avanço do mar; Baleias-jubartes; Plantas multiuso e Vida complexa

1 – O avanço do mar

2 – Baleias-jubartes poderão ser caçadas no Ártico

3 – Plantas multiuso

4 – Vida complexa surgiu há 2 bilhões de anos

 

1 – O avanço do mar

Pesquisa da USP revela que o nível do oceano no Brasil sobe 4 mm por ano. Índice é considerado alto e coloca em risco áreas litorâneas do país
“Não há dúvida de que o nível do mar tem aumentado gradativamente no litoral brasileiro.” A conclusão consta de estudo realizado pelo Laboratório de Marés e Processos Temporais Oceânicos (Maptolab) do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (IO/USP). O alerta significa que o país pode sofrer, no futuro, com uma das piores consequências do aquecimento global: a destruição de regiões inteiras localizadas próximo à costa.
As informações obtidas pela equipe do laboratório mostram que o nível do mar vem aumentando cerca de 40cm por século, ou 4mm por ano. O dado surgiu a partir de medições realizadas em estações de pesquisa de Cananeia e de Ubatuba, ambas no litoral de São Paulo, e da análise de registros colhidos em portos do país entre 1957 e 1993. As possíveis consequências do fenômeno vão da perda da faixa de areia à destruição de cidades, passando por ressacas mais violentas e inúmeros outros transtornos.
A equipe coordenada pelo professor Afrânio Mesquita fez uso de equipamentos específicos, como o medidor de boia flutuadora, além de um radar. “Na nossa avaliação, os dados são extremamente preocupantes. A variação do nível do mar detectada é simplesmente absurda”, destaca Mesquita.
Medições feitas na região de Cananeia, por exemplo, mostram um movimento de afundamento vertical da costa na ordem de 0,11cm por ano. Isso faz com que o nível do mar suba em relação à costa 0,38cm no mesmo período. “Essa variação ameaça as praias, talvez, de toda a costa brasileira”, afirma Mesquita.
De acordo com a Marinha do Brasil, a elevação do nível do mar já afeta, direta ou indiretamente, as atividades costeiras. “No estado do Rio de Janeiro, por exemplo, existem áreas que apresentam indícios claros de erosão, tais como Atafona, Barra do Furado, Macaé e até a praia do Leblon. Essas estariam mais vulneráveis à elevação do nível do mar”, afirma Geraldo Nogueira, professor de marés da Diretoria de Hidrografia e Navegação da Marinha.
Monitoramento
A Marinha participa do Programa de Sistema Global de Observação do Nível do Mar (Gloss, na sigla em inglês) com seis estações maregráficas (de medição das marés) permanentes. O período mínimo de observação para estimar tendências de variação do nível do oceano é de 50 anos.
“Atualmente, no Brasil, apenas as estações maregráficas da Ilha Fiscal (RJ) e de Cananeia possuem observações com período acima de 50 anos”, explica Nogueira. O professor acredita que, por ter uma costa muito extensa, o país deveria contar com uma rede de medição permanente, a fim de elaborar planos estratégicos de ocupação ou remoção de construções nas áreas onde a variação relativa do nível do mar for mais significativa.
O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) é outra instituição brasileira participante do Gloss-Brasil, que compreende atividades relacionadas ao monitoramento do mar em águas jurisdicionais brasileiras.
“Entre os objetivos, está a implantação de rede permanente de monitoramento do nível do mar, geração de dados com qualidade científica que suportem análises de tendência de longo período, capacitação de pessoas para a produção e análise de informações sobre esse tema, entre outras atribuições”, explica Milton Kampel, chefe da Divisão de Sensoriamento Remoto do Inpe.
A ferramenta básica de uma estação é o marégrafo, que registra a altura da água ao longo do tempo, utilizando diferentes sistemas. “Para integrar a rede, os marégrafos devem estar de acordo com o Plano de Implementação do Gloss”, destaca Kampel, lembrando que as estações Gloss também podem fazer medições de outros parâmetros meteorológicos e oceanográficos, como pressão atmosférica, temperatura do ar e da água, evaporação, direção e intensidade do vento. 
O especialista do Inpe diz que a elevação do oceano preocupa porque as regiões costeiras costumam ter alta densidade populacional. “Milhões de pessoas vivem numa faixa entre 1m e 5m da linha de costa (maré alta). Bilhões de dólares em infraestrutura estão investidos em regiões imediatamente adjacentes à costa. A maioria das megalópoles mundiais, com populações de muitos milhões de habitantes, também estão na zona costeira”, lembra.
Kampel aponta ainda que o nível do mar global aumentou durante o século passado e estima-se que essa elevação se acelere no século 21. “Entretanto, a magnitude do problema permanece incerta”, destaca. “Ainda que os impactos da elevação sejam potencialmente grandes, a aplicação e o sucesso de medidas para amenizar esses efeitos permanecem duvidosos, requerendo mais esforço de pesquisa”, alerta. (Gisela Cabral) (Correio Braziliense, 27/6)

 

2 – Baleias-jubartes poderão ser caçadas no Ártico

Decisão foi tomada no final de reunião baleeira em Marrocos e beneficia nativos da Groenlândia
As baleias-jubartes, famosas por seu canto e por suas gigantescas nadadeiras, voltarão a ser caçadas legalmente por humanos no Ártico, decidiu na sexta-feira (25/6) a CIB (Comissão Internacional da Baleia).
A determinação, acordada durante a reunião anual do órgão em Agadir, Marrocos, significa que 27 jubartes poderão ser abatidas nos próximos três anos. É a primeira vez que se autoriza o abate da espécie em escala que pode ser considerada comercial.
A permissão foi dada aos povos indígenas da Groenlândia. Eles, como outras populações tradicionais do Ártico e do Caribe, são beneficiados pela chamada caça aborígine de subsistência.
Segundo esse mecanismo da CIB, povos que usem as baleias como alimento e como elementos importantes de sua cultura original podem capturar um número limitado de cetáceos.
A caça comercial de todas as espécies desses animais continua sob moratória.
Na prática, porém, há sérias dúvidas sobre o caso das jubartes da Groenlândia, uma vez que a carne das baleias da espécie fin, já capturada pelos nativos com permissão da CIB, frequentemente vai parar nos supermercados da Dinamarca.
“Até onde sei, os groenlandeses dificilmente estão passando fome. Trata-se de uma população com alta renda per capita e com acesso a vastos recursos pesqueiros. Então, há problemas no uso do termo “caça de subsistência” nesse caso”, disse o representante de Mônaco na CIB. Mônaco foi, aliás, o único país europeu a apoiar a oposição latino-americana à caça das jubartes. A Costa Rica teme que a morte das baleias no Ártico debilite seu turismo de observação de baleias.
É que os mesmos bichos que se alimentam na Groenlândia descem para o Caribe na época da reprodução.
Há também o fato de que as jubartes deixaram oficialmente o status de ameaçadas de extinção há apenas dois anos, o que faz biólogos e conservacionistas temerem a volta da captura.
Os países latinos chegaram perto de tentar melar a negociação, pedindo votação em vez de decisão por consenso. Seria necessária uma maioria de três quartos dos 88 países-membros da CIB para a vitória da proposta de caça à jubarte, colocada na mesa pela Dinamarca.
Na última hora, porém, os dinamarqueses conseguiram o apoio do resto da UE, bem como dos países caçadores.
A reunião encerrada na sexta-feira (25) pareceu seguir um roteiro há muito ensaiado.
Quase não houve consenso entre países conservacionistas e o grupo de apoiadores do Japão. A temperatura subiu um pouco no fim da manhã de ontem, quando o governo da Noruega acusou defensores dos direitos animais de forjarem um vídeo sobre a morte dolorosa e prolongada de uma baleia atacada por caçadores.
Apesar da sombra sobre as jubartes, o biólogo brasileiro José Truda, veterano de reuniões da CIB, vê com otimismo o resultado geral da reunião. “Achei muito bom que o pacotão não tenha sido aprovado”, disse Truda, referindo-se a uma tentativa de permitir, de forma restrita, a caça comercial por parte do Japão ao longo de dez anos.
“O lamentável é que o Japão não tenha aproveitado esse pacote para negociar. Seria possível aceitar a caça nas águas territoriais deles, mas não na Antártida”, diz. O problema, explica Truda, é que o Japão tente “privatizar” um recurso internacional (as baleias antárticas).
Os países da CIB decidiram que haverá uma pausa nas negociações até a próxima reunião, em setembro do ano que vem. “Esperamos que a CIB aborda cada vez mais a temática da conservação”, afirma Fábio Pitaluga, negociador-chefe do Brasil. (Reinaldo José Lopes) (Folha de SP, 26/6)

 

3 – Plantas multiuso

Espécies de algas encontradas na costa brasileira são ricas em substâncias que podem ser usadas para fins alimentares, medicinais e cosméticos, aponta estudo da USP
As algas são consideradas elementos fundamentais para o ciclo de vida do ambiente marinho, pois fazem parte do primeiro nível da cadeia alimentar do mar, sustentando todos os animais herbívoros que vivem no oceano. Um estudo brasileiro acaba de mostrar que quatro espécies desses vegetais muito comuns na costa brasileira podem beneficiar também o homem, sendo utilizadas para fins nutritivos, medicinais e cosméticos.
O estudo, realizado por pesquisadores da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP) e publicado na revista internacional Food Chemistry, descobriu que as algas vermelhas das espécies Laurencia filiformis, Laurencia intricata, Gracilaria domingensis e Gracilaria birdiae são verdadeiras fontes de proteínas, aminoácidos, lipídeos e ácidos graxos, essenciais para seres humanos e animais.
“As pesquisas revelaram baixas quantidades de gorduras, sendo que a pouca gordura encontrada é rica em ômega 3 e ômega 6, ou seja, ácidos graxos essenciais para o homem. O teor de proteínas encontrado foi relativamente alto e a composição de aminoácidos revelou que aproximadamente 50% são aminoácidos essenciais”, destaca o professor Ernani Pinto, do Departamento de Análises Clínicas e Toxicológicas.
As amostras analisadas foram todas colhidas na praia de Ubu, em Anchieta (ES). Entre os principais compostos encontrados está o ágar, um tipo de polímero de açúcares que pode ser usado na indústria alimentar para a fabricação de sucos e balas, entre outros produtos. Já na indústria farmacêutica, a substância costuma ser empregada na fabricação de supositórios, cápsulas e laxantes.
Constatou-se ainda que as espécies estudadas pela USP produzem a carragenana, um agente espessante usado na composição de gelatinas. Ele também serve para consumo medicinal, pois apresenta potencial anticoagulante, antitumoral e antiviral.
“As algas ainda apresentam compostos fotoprotetores, como os aminoácidos tipo micosporinas (chinorina, palitina, asterina e palitinol), que podem ser aplicados na produção de bloqueadores solares, além de compostos antioxidantes”, afirma a pesquisadora Vanessa Gressler.
As algas são conhecidas como alimentos altamente nutritivos, graças aos teores de vitaminas, proteínas, minerais e fibras, entre outros componentes. “Elas podem ser usadas em saladas, sopas, biscoitos e condimentos diversos. Em países como China, Japão e Coreia, as algas (principalmente as vermelhas e as pardas), são utilizadas tradicionalmente como alimento desde a antiguidade”, destaca a pesquisadora.
Segundo Vanessa, a espécie Gracilaria verrucosa, também chamada de ogonori, é comestível e bastante conhecida no Japão, onde geralmente é misturada ao sashimi. “Considerando também o desenvolvimento econômico, cultural e científico da sociedade, os hábitos alimentares e estilos de vida têm mudado, requerendo cada vez mais a expansão da produção de alimentos. Esses dados estimularam os estudos com algas marinhas que habitam o litoral brasileiro”, enfatiza a especialista.
De acordo com os pesquisadores, no Brasil há poucos grupos que se dedicam ao estudo de tais espécies. Os estudos realizados pelo departamento da USP, segundo o professor Ernani Pinto, foram executados com a autorização do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama). “Há registros de ocorrências dessas algas desde o litoral do Ceará até o Espírito Santo. As espécies do gênero Laurencia, por exemplo, são abundantes também no estado de São Paulo”, afirma Vanessa.
Diversidade
O Brasil é um país que possui uma grande diversidade de macroalgas marinhas. Segundo Mutue Toyota Fujii, especialista do Instituto de Botânica de São Paulo, existem hoje cerca de 700 espécies, incluindo alguns gêneros de importância econômica, como a Gracilaria, Gelidium, Hypnea, Porphyra, Pterocladiella e Sargassum.
“As algas destinadas à produção de ficocoloides (substâncias encontradas na parede celular das algas e empregadas por indústrias) devem receber tratamentos para retirada de impurezas e algas epífitas. Processos como o da clarificação (retirada de pigmentos) também costumam ser feitos”, explica.
De acordo com ela, o Instituto de Botânica desenvolve pesquisas voltadas para a taxonomia e a filogenia molecular, além da ecologia de comunidades e da fisiologia das espécies de interesse comercial. “Isso quer dizer que desenvolvemos pesquisas para saber quais espécies ocorrem no Brasil, onde e de que forma elas se interrelacionam com a comunidade na qual compartilham o mesmo ambiente”, explica Mutue. (Gisela Cabral) (Correio Braziliense, 29/6)

 

4 – Vida complexa surgiu há 2 bilhões de anos

Pesquisa acha fóssil de supostos seres de muitas células em rocha africana
Estranhos fósseis oriundos do Gabão, na África Ocidental, podem acabar com a pasmaceira biológica que parecia reinar na Terra até uns 600 milhões de anos atrás.
Essa era a data mais aceita para a origem da vida complexa, com muitas células, mas os tais fósseis têm 2,1 bilhões de anos e, segundo seus descobridores, representam seres multicelulares, como os animais e plantas tão comuns no planeta hoje.
A proposta, que se baseia numa análise química detalhada dos supostos cacos de seres vivos do Gabão, está na edição desta quinta-feira (1/7) da prestigiosa revista científica “Nature”.
O trabalho é assinado por Abderrazak El Albani, da Universidade de Poitiers (França), e Stefan Bengtson, do Museu Sueco de História Natural, entre outros membros da equipe internacional.
O primeiro passo do grupo foi mostrar que as estruturas, medindo no máximo uns poucos centímetros e com aparência que lembra vagamente flores ou corais, eram mesmo de origem biológica.
Tarefa relativamente fácil, já que a vida tem um gosto bem específico para átomos de carbono. Conforme se desenvolvem, os seres vivos absorvem preferencialmente uma forma desse elemento; portanto, estruturas com proporção elevada desse tipo de carbono quase certamente derivam de criaturas vivas.
“Outro argumento importante que eles usam é a presença de esteranos, substâncias que são uma forma alterada de moléculas que hoje só existem em eucariontes [formas de vida com células complexas]”, explica Thomas Rich Fairchild, pesquisador do Instituto de Geociências da USP, que comentou o estudo para a Folha.
É verdade, no entanto, que existem muitos eucariontes de uma célula só. Embora o homem pertença a essa categoria, os parasitas da malária e as amebas também são eucariontes, embora sejam unicelulares. Por isso, o argumento final da equipe tem a ver com a forma dos fósseis.
Após fazer uma tomografia dos restos, eles constataram uma estrutura complexa, radial (ou seja, em forma de raio), vagamente parecida com o que se vê numa estrela-do-mar ou anêmona.
A coisa, seja lá o que ela fosse, parece ter crescido lentamente, com a adição de camadas de matéria orgânica nas pontas, como um coral, mas sem rigidez -as “dobrinhas” parecem ter sido moles antes da fossilização.
Os pesquisadores nem se arriscam a especular que tipo de criatura era ou como vivia, mas afirmam que o mais provável é que se tratasse mesmo de um organismo multicelular, talvez formador de colônias -de novo, como os corais dos mares de hoje.
“O trabalho é importante, e os autores têm cacife para propor essa explicação, mas não fico muito satisfeito com alguns dos argumentos”, diz Fairchild. Um dos grandes problemas, lembra o pesquisador da USP, é explicar como essa suposta vida multicelular mais antiga estaria relacionada à que veio depois, essa sim bem documentada.
Como quase não há registros no buraco que separa 2,1 bilhões de anos de 600 milhões de anos, pode ser que se trate de um experimento abortado da vida multicelular, um ensaio que não vingou. Assim, as criaturas do Gabão não seriam ancestrais de nenhum ser vivo de hoje. E não dá para descartar a possibilidade de que sejam grupos de seres unicelulares. (Reinaldo José Lopes) (Folha de SP, 1/7)