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Informativo 89 – Amor e sementes

1 – Amor, estranho amor

2 – Sementes de espécies nativas contribuem para o reflorestamento em áreas degradadas

1 – Amor, estranho amor

Peixe de mangue brasileiro se reproduz há milhões de anos sem sexo; biólogos agora explicam por quê
Reinaldo José Lopes escreve para a “Folha de SP”:

A cena deve ter acontecido repetidas vezes com aquaristas incautos. O sujeito compra um peixinho solitário (só para garantir que seu aquário não seja vitimado por uma superpopulação) e, semanas depois, dá de cara com ovos -dos quais saem peixinhos, é claro.
Não vale dizer que a “fêmea” já veio prenhe da loja. O Kryptolebias ocellatus, conhecido como killifish entre os criadores de peixes ornamentais, é uma espécie de fertilização externa. O que significa que as “fêmeas”, por definição, não ficam prenhes, já que os machos lançam seu esperma sobre óvulos expelidos por “elas” na água. O que acontece é que o peixinho brasileiro é um dos dois únicos vertebrados que fecundam a si mesmos.
A esquisitíssima história natural e evolutiva desse comportamento está descrita num artigo recente na revista científica “PNAS”, que tem como um dos autores o doutorando Sergio Maia Queiroz Lima, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Lima e colegas dos EUA e da Austrália, com a ajuda de análises genéticas, mostraram que 97% dos indivíduos da espécie são gerados dessa maneira solitária.
Além disso, a comparação do DNA do bicho com o de uma espécie próxima que também se autofecunda (o K. marmoratus, do Caribe e da Flórida) sugere que toda essa linhagem de peixes pode ter adotado esse hábito há milhões de anos.
O dado é surpreendente porque se supõe que o sexo “tradicional”, não-solitário, é uma ferramenta indispensável para a saúde genética de uma espécie. A dupla de Kryptolebias, no entanto, parece se virar muito bem, obrigado, sem ele.
Idiossincrático
Lima conta que os hábitos e a fisiologia do K. ocellatus são pouco conhecidos. Até a distribuição geográfica da espécie é pouco conhecida, embora ela aparentemente ocorra nos mangues que vão de Santa Catarina ao Rio de Janeiro.
O killifish brasileiro está adaptado à vida nas áreas com água doce do manguezal. “Ele não aguenta nem água salobra [comum na área de contato entre mar e rio]”, diz Lima.
O parente caribenho do K. ocellatus, reconhecido adepto da autofecundação, tem sua população dividida em hermafroditas (com órgãos reprodutivos dos dois sexos) e machos. Lima se encarregou de analisar os tecidos genitais da espécie brasileira e verificou, em primeiro lugar, que todos os espécimes coletados eram hermafroditas.
“Quando você examina o animal, o que aparece é um tipo de mistura dos tecidos do macho e da fêmea”, diz o biólogo. “A fecundação normalmente seria externa, mas o que acontece é que ele já bota o ovo fecundado -às vezes um único ovo.”
Até aí, pareceria impossível distinguir a autofecundação de simples partenogênese, ou “nascimento virgem”. Na partenogênese, o óvulo origina um novo animal sem fecundação.
No entanto, há uma diferença importante. Na partenogênese, o óvulo e o indivíduo que surge a partir dele carregam apenas um conjunto de cromossomos, as estruturas enoveladas que guardam o DNA. No sexo “tradicional”, os animais resultantes têm dois conjuntos de cromossomos, um cedido pelo pai e o outro, pela mãe. A não ser, claro, que pai e mãe sejam o mesmo bicho.
O que vale para cromossomos vale também para genes: os indivíduos recebem duas cópias, uma de cada genitor. É comum que essas cópias apresentem versões diferentes, os chamados alelos. O que ocorre com o K. ocellatus, contudo, é a presença de alelos iguaizinhos na maioria dos genes -exatamente o que se esperaria se o bicho estivesse quase só cruzando consigo mesmo.
Vício antigo
Os pesquisadores, usando estimativas das taxas de mutação no DNA e comparando as várias espécies do gênero Kryptolebias (a maioria não se autofecunda), avaliam que esse modo de reprodução provavelmente surgiu no ancestral comum das duas espécies adeptas da estratégia. E isso há pelo menos centenas de milhares de anos -uma das estimativas chega a 2 milhões de anos de separação entre as linhagens de killifish.
É aqui que o mistério se aprofunda. A variabilidade genética associada ao sexo -inclusive o fato de ele permitir alelos diferentes no mesmo DNA- é um trunfo no jogo da evolução. A reprodução sexuada aumenta as chances de produzir crias resistentes a parasitas, doenças ou ambientes novos e hostis. Por que deixar isso de lado?
O pulo-do-gato, aposta Lima, é que uma pequena parcela das fecundações de K. ocellatus ainda acontecem à moda antiga. “É uma estratégia mista, na verdade. Esse fato impede que haja problemas muito graves ligados à falta de diversidade genética. E o “selfing” [autofecundação] permite que o animal colonize novos ambientes com muita facilidade. Um único indivíduo é capaz de fundar uma nova população”, diz.
A melhor maneira de encarar o peixinho, portanto, é vê-lo como um pioneiro -ou, quem sabe, uma estranha mistura de Adão e Eva, pronta para dar início a uma vasta família.
(Folha de SP, 23/8)

 

2 – Sementes de espécies nativas contribuem para o reflorestamento em áreas degradadas

Estudos sobre a caracterização morfológica dos propágulos de espécies florestais e tecnologia das sementes é ferramenta básica para recuperar ou restaurar áreas degradadas
“A semente é o principal meio de propagação das espécies e base da regeneração natural da floresta”. Assim afirma a pesquisadora Maria da Glória G. de Melo, que coordena o Laboratório de Sementes e Viveiros Florestais da EST/UEA, onde se desenvolvem trabalhos sobre caracterização morfológica de propágulos das espécies que ocorrem na Base de Operações Geólogo Pedro de Moura (BOGPM,) em Urucu, a fim de compreender a dinâmica da floresta e contribuir com o reflorestamento de áreas degradadas. 
As pesquisas desenvolvidas no laboratório vinculado à Rede CTPetro Amazônia, por meio do Projeto PT 2 – Tecnologia de regeneração artificial em clareiras abertas pela exploração e transporte de petróleo e gás natural – coordenado pelo Dr. Gil Vieira, possibilitam a identificação correta das espécies. Essas informações ajudam tanto no reflorestamento com espécies da região quanto nos inventários florestais, tendo em vista que, o uso de diversos nomes populares para uma mesma espécie ocasiona problemas na hora de tomar decisões de como trabalhar a floresta.
“A identificação correta das plântulas no campo é uma dificuldade encontrada pelos parabotânicos (antigo mateiro), porque nem sempre as características morfológicas do indivíduo adulto são similares às do indivíduo jovem. Para se reflorestar uma área degradada precisamos, por exemplo, de espécies pioneiras resistentes à alta luminosidade e que se adaptem às condições adversas de campo”.
Além disso, essa caracterização morfológica dará suporte aos pesquisadores para trabalharem na Amazônia com espécies locais e não exóticas, pois essas últimas, apesar de se adaptarem às condições locais, não são representativas da área. De acordo com a pesquisadora, “conhecer as fases de germinação e do desenvolvimento da plântula contribuirá para o entendimento da biologia das espécies, manejo, conservação e recuperação das áreas degradadas com espécies que já ocorrem na BOGPM”.
Sementes
Com os estudos realizados no laboratório e no viveiro é possível identificar quantos dias a semente leva para chegar à fase de plântula, qual o tempo necessário para ser repicada para uma embalagem a fim de se produzir uma muda e quanto tempo pode permanecer no viveiro antes de ser levada ao campo.
Dentre as várias informações obtidas com os estudos de morfologia e tecnologia de sementes, uma é de essencial importância: quais sementes são ortodoxas e quais são recalcitrantes. O desenvolvimento das pesquisas mostra que as primeiras podem ser mantidas em bancos de germoplasma para posterior uso; já as recalcitrantes – muitas das que ocorrem na BOGPM – não resistem ao dessecamento e, assim, não podem ser armazenadas, pois precisam imediatamente ser semeadas para a produção de mudas, caso contrário perderão sua viabilidade.
“Essas informações tecnológicas sobre dados físicos, como o teor de água das sementes são importantes para saber o comportamento das sementes no armazenamento. As espécies recalcitrantes devem ser logo semeadas para a produção de mudas que serão utilizadas no campo e reflorestadas”, afirma Maria da Glória.
Para se realizar a coleta, o primeiro passo consiste em marcar a árvore e observar a matriz com o intuito de verificar se a mesma possui boas características genéticas. As árvores selecionadas são georreferenciadas por GPS (Sistema de Posicionamento Global), anota-se o DAP (Diâmentro à Altura do Peito), faz-se a medição e coleta-se a amostra botânica. Vale ressaltar, que todo material botânico precisa ser fértil, isto é, ter flor ou fruto para ser identificado de forma correta no herbário do INPA (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia) e incorporadas ao acervo do Herbário da EST/UEA. 
Livro 
Conforme a pesquisadora, as pesquisas desenvolvidas irão resultar em um livro que compilará todos os trabalhos de morfologia, à priori, apenas em português.
“Vamos reunir essas informações, pois é importante registrar os resultados dos estudos que serão organizados e divulgados tanto em forma de artigos científicos como em um livro técnico e ilustrado para o público-alvo, estudantes de engenharia florestal e pesquisadores que já trabalham com sementes de espécies florestais”, completa Maria da Glória.
Recentemente, a coordenadora do grupo e as pesquisadoras Ângela Maria da Silva Mendes e Sheylla Fontes Pinto expuseram no “60 Congresso Nacional de Botânica”, ocorrido em Feira de Santana, Bahia, cinco trabalhos científicos que farão parte do livro intitulados: “Morfologia de sementes e plântulas de Protium hebetatum Daly. (Burseraceae)”; “Aspectos morfológicos de Pouteria laevigata (Mart.) Raldk: Frutos, sementes e desenvolvimento de plântula”; “Aspectos Morfológicos de frutos, sementes e plântulas de Glycydendron amazonicum Ducke”; e “Caracterização Morfológica de frutos, sementes e plântulas de Copaifera guyanensis Desf. (Legumimosae-Caesalpinioidea).
(Assessoria de Imprensa da Rede CTPetro Amazônia)