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Informativo 70 – Clima, El Niño, óleo e tucano

1 – Ciência reforça papel do homem na mudança do clima

2 – Desafios das metrópoles frente às mudanças climáticas exigem multidisciplinaridade

3 – El Niño pode trazer seca ao Nordeste e à Amazônia, diz agência dos EUA

4 – Detergente contra a poluição de óleo

5 – Bico ”monstruoso” do tucano serve de radiador biológico

1 – Ciência reforça papel do homem na mudança do clima

Trabalhos dos principais centros científicos do mundo publicados em 2008 foram reunidos pelo World Resources Institute e apontam a humanidade como principal responsável pelo aquecimento global
Quando postos lado a lado, estudos e pesquisas com assuntos tão diversos quanto o degelo em montanhas e a morte de corais revelam dois preocupantes pontos em comum: as mudanças climáticas estão acelerando e o homem é o principal responsável pelo fenômeno.
Estas são as principais conclusões do “Climate Science 2008: Major New Discoveries”, uma compilação de trabalhos reunidos pela World Resources Institute (WRI) divulgada na última semana.
“Os impactos das mudanças climáticas estão acontecendo agora. Isto não é um fenômeno distante. E muitos dos impactos estão aparecendo em um ritmo mais acelerado do que era previsto”, afirmou um dos co-autores da compilação, Kelly Levin.
O “Climate Science 2008: Major New Discoveries” foi dividido em quatro grandes tópicos: física do clima; ciclo hidrológico; ecossistemas e serviços ambientais; e tecnologias de mitigação.
Dentro do tópico “física do clima” foram selecionados estudos sobre mudanças abruptas, aumento de temperatura, concentração de gases do efeito estufa e de aerossóis na atmosfera e comportamento dos oceanos.
Um dos trabalhos que mais chama a atenção nessa sessão é o “How natural and anthropogenic influences alter global and regional surface temperatures: 1889 to 2006”, algo como “Como as influências naturais e antropogênicas alteraram as temperaturas globais e regionais: 1889 a 2006”.
Publicado em setembro de 2008 no periódico Geophysical Research Letters, o estudo contraria as análises existentes até então de que causas naturais, como sol, teriam 69% de responsabilidade sobre a elevação das temperaturas. Os pesquisadores descobriram que a participação do astro no aquecimento global não ultrapassaria os 10%, chegando assim a conclusão de que a maior responsabilidade sobre o aquecimento é mesmo do homem.
Nesta mesma sessão é apresentado um outro estudo que reforça essa idéia ao afirmar que a taxa de crescimento das emissões de dióxido de carbono (CO2) entre 2000 e 2007 foi quatro vezes maior que na década anterior.
Na sessão de ciclo hidrológico foram incluídos trabalhos nas áreas de derretimento, suprimento de água e tempestades. Entre as descobertas está a de que a taxa de perda de gelo da Antártica cresceu 75% entre 1996 e 2006. Também que o degelo de nove cadeias de montanhas ao redor do mundo dobrou entre os períodos de 2004/2005 e 2005/ 2006.
Novamente demonstrando a responsabilidade antrópica sobre o clima, o estudo “Human-induced changes in the hydrology of the western United States” (“Mudanças na hidrologia causadas pelo homem no oeste dos Estados Unidos), aponta que 60% das mudanças hidrológicas no oeste dos EUA são causadas pelo homem. E que essas alterações, se mantidas, devem levar a uma séria crise no abastecimento.
Sobre ecossistemas, o trabalho “Attributing physical and biological impacts to anthropogenic climate change”, publicado na revista Nature no dia 15 de maio de 2008, destaca a também ação humana como principal fator na mudança de comportamento de 28.800 sistemas biológicos e 829 sistemas físicos.
Nesta mesma sessão são apresentados estudos que mostram que até um terço dos corais que formam os recifes correm risco de extinção e que se as emissões de CO2 continuarem inalteradas, as ‘zonas mortas’ dos oceanos tropicais podem crescer 50% até 2100.
Esperança
Se a compilação “Climate Science 2008: Major New Discoveries” deixa claro que é o homem o principal responsável pelas mudanças climáticas, ela também responde que é dele e de sua criatividade que devem vir as soluções para o problema.
Na última sessão do relatório, aparecem as tecnologias que ajudariam a minimizar as conseqüências detalhadas nos estudos anteriores. Foram reunidos trabalhos da área solar, termoelétrica, biocombustíveis, energia das ondas, baterias e captura de carbono.
Por exemplo, cientistas do Instituto Tecnológico de Massachusetts (MIT) desenvolveram uma nova solução de energia solar inspirada na fotossíntese das plantas. Eles construíram uma célula solar que consegue dividir moléculas de água, produzindo assim hidrogênio que pode ser usado em células de combustível.
Em outra iniciativa, engenheiros britânicos criaram um mecanismo, chamado de Anaconda por sua semelhança com uma cobra gigante, que produz energia ao oscilar sobre a passagem das ondas do mar. Como é feita de borracha, a tecnologia é muito mais leve e barata que outros produtos semelhantes, que geralmente são de metal.
Com relação à captura de carbono, a Universidade de Calgary, no Canadá se destaca por sua máquina que promete coletar CO2 do ar. Ela seria capaz de capturar até 20 toneladas do gás por ano, ao custo energético de 100 kWh para cada tonelada. O projeto, divulgado em setembro de 2008, ainda segue em fase de pesquisa e desenvolvimento. Fonte: Fabiano Ávila, CarbonoBrasil/WRI de 20.07.2009

 

2 – Desafios das metrópoles frente às mudanças climáticas exigem multidisciplinaridade

Enfrentar os impactos das mudanças climáticas, com medidas de adaptação e mitigação das emissões de gases de efeito estufa, exigirá esforços em todos os setores: a academia precisará de um enfoque mais multidisciplinar, o governo deverá se sensibilizar para a urgência do tema e a sociedade terá que compreender a necessidade de uma profunda mudança cultural.
Esses desafios foram debatidos nesta terça-feira (21/7) por cientistas e formuladores de políticas públicas no Painel Internacional de Especialistas em Megacidades, Vulnerabilidade e Mudança Climática Global, na sede da FAPESP, em São Paulo.
O evento, liderado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), tem o objetivo de traçar um mapa das vulnerabilidades das regiões metropolitanas de São Paulo e do Rio de Janeiro frente aos efeitos do aquecimento global, com o objetivo de subsidiar políticas públicas de adaptação às mudanças climáticas.
Segundo o coordenador do Fórum Paulista de Mudanças Climáticas Globais, Fábio Feldman, a criação dos fóruns estaduais, em 2005, foi um avanço que permitiu aos estados uma maior articulação com as políticas municipais e federais. Ainda assim, prevalecem as dificuldades históricas na implantação de políticas nacionais relacionadas ao clima.
“Há dificuldades dos governantes para compreender que o clima é um tema para hoje, não para daqui a 20 anos. No Ministério da Ciência e Tecnologia, por exemplo, a estrutura para trabalhar nesse tema é muito pequena, mantendo o mesmo número de pessoas há mais de 15 anos”, disse.
Segundo ele, as principais propostas dos fóruns têm foco na elaboração de marcos regulatórios relacionados às mudanças climáticas em todos os níveis de governo. “Em São Paulo elaboramos uma política para criar um processo – ou seja, incluir na agenda governamental a obrigatoriedade de inventários e mapas de vulnerabilidades. Acreditamos que isso vá mobilizar a sociedade brasileira para um avanço concreto”, explicou.
Feldman declarou que há grandes dificuldades políticas para o estabelecimento de metas de emissões de gases de efeito estufa. “O problema é que as metas são entendidas como punição e não como oportunidade de inovação tecnológica”, afirmou.
Outra dificuldade importante no Brasil, segundo Feldman, é articular as políticas públicas de clima com políticas setoriais como as de transportes e saúde. Um exemplo disso, segundo ele, é a redução dramática do imposto sobre produtos industrializados (IPI) concedida pelo governo brasileiro, por causa da crise financeira.
“Com essa redução do IPI teremos uma imensa frota renovada de caminhões. Mas perdemos a oportunidade de articular essa iniciativa com as políticas climáticas, já que essa renovação será feita com uma tecnologia atrasada do ponto de vista do padrão de emissões. O padrão do diesel comercializado no Brasil é muito ruim, comparável apenas a alguns países da África”, declarou.
Segundo Feldman, a legislação não conseguirá, por si só, implantar as políticas de adaptação e mitigação. “Os dois avanços em políticas ambientais mais importantes que surgiram nos últimos anos foram o indicador de sustentabilidade ambiental da Bovespa e a decisão das redes de supermercados de só comprar carne com rastreabilidade, para evitar os produtos que devastem a Amazônia. Esses dois avanços não envolveram legislação”, disse.
Mudança cultural
O presidente da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb), Fernando Rei, afirmou que propor medidas de adaptação e mitigação implica uma mudança cultural que, muitas vezes, é rechaçada pela sociedade.
“Muita gente acha que vai haver alguma revolução tecnológica que nos permitirá manter os atuais níveis de consumo. Há uma grande dificuldade da academia e dos órgãos ambientais para se confrontar com esse tipo de contrapropaganda”, disse Rei.
Para Rei, a resistência à mudança de hábitos por parte dos cidadãos indica que há uma tendência de transferir as responsabilidades ao poder público. “Embora a Constituição Cidadã já tenha completado 21 anos, seguimos construindo um projeto de nação no qual o cidadão tem muito poucos deveres. A Carta Magna, no entanto, destaca o compromisso da coletividade e do poder público na preservação da qualidade ambiental”, declarou.
Segundo Rei, é preciso também que a academia trate o problema do clima de forma mais multidisciplinar. “Nosso processo de ensino encaminha os alunos para um universo de certezas. Não geramos na academia alunos que trabalhem com dúvidas. A burocracia acadêmica dificulta a construção de um olhar científico multidisciplinar. No entanto, o tema da mudança climática é essencialmente multidisciplinar e, por isso, será preciso repensar a forma de se produzir conhecimento”, disse.
Rei afirmou que, em sua avaliação, as principais vulnerabilidades na Região Metropolitana de São Paulo dizem respeito à questão da saúde – com novos vetores de epidemias e qualidade da saúde pública – e ocupações em áreas sensíveis, especialmente em torno de mananciais.
“Para combater a ameaça que essas vulnerabilidades representam com a possível ocorrência de eventos extremos, será preciso discutir as políticas públicas. Mas temos perdido a oportunidade de fazer isso porque o mercado e a sociedade estão ainda muito ausentes do debate. Essa não pode ser uma discussão exclusiva da academia e do poder público”, declarou. Fonte: Fábio de Castro, da Agência Fapesp

3 – El Niño pode trazer seca ao Nordeste e à Amazônia, diz agência dos EUA

 

Fenômeno climático também poderá provocar enchentes no sul do país entre 2009 e 2010
A chegada do fenômeno climático El Niño poderá provocar seca no nordeste brasileiro e na região amazônica e enchentes no sul do país entre o fim deste ano e o começo de 2010, segundo avaliação da agência nacional e atmosférica dos Estados Unidos (NOAA, na sigla em inglês).
Após registrar um aumento constante das temperaturas da superfície do Oceano Pacífico central nos últimos seis meses, a NOAA confirmou o início do El Niño.
O fenômeno climático é caracterizado pelo aumento das temperaturas na zona equatorial do Pacífico, que ocorre a cada quatro ou cinco anos e afeta o clima em todo mundo.
Para muitos, a simples menção ao El Niño é um sinal de alarme. Há pouco mais de uma década, entre 1997 e 1998, ocorreu um dos mais fortes El Niño da história, com catástrofes climáticas que deixaram milhares de mortos.
Danos
As inundações nas Américas (que afetaram principalmente vastas regiões do Chile, da Bolívia, do Equador e dos Estados Unidos) e na África destruíram colheitas na maioria dos países afetados.
As secas se propagaram pela Austrália e partes do sudeste asiático, provocando incêndios florestais. O fenômeno afetou ainda a pesca na América do Sul, por conta da redução nos estoques de peixes.
O furacão Mitch, em 1998, cuja força também foi relacionada ao fenômeno climático, provocou intensas inundações na América Central que deixaram mais de 9 mil mortos.
Calcula-se que os danos totais provocados pelo El Niño em todo o mundo chegaram a US$ 34 bilhões.
Prognósticos
Ainda é cedo para prever se o fenômeno neste ano terá uma força semelhante à da década passada, mas os prognósticos da NOAA refletem um consenso sobre o seu crescimento e o seu desenvolvimento.
“As condições atuais e as tendências recentes favorecem o desenvolvimento contínuo de um fortalecimento de leve a moderado do El Niño até o outono de 2009 no hemisfério norte, com possibilidade de fortalecimento a partir de então”, diz a agência.
Segundo Michelle L’Heureux, diretora da NOAA para Previsão do El Niño, se a potência do fenômeno climático for de moderada a forte, “as condições no centro e no leste da Bacia Amazônica serão mais áridas que o normal entre novembro de 2009 e março de 2010, e entre janeiro e maio de 2010 estarão mais secas no nordeste do Brasil”.
“Ao mesmo tempo, as condições estarão mais úmidas na costa oeste da América do Sul. O Equador e o norte do Peru o sentirão entre janeiro e abril de 2010, e o Uruguai, o nordeste da Argentina e o sul do Brasil entre novembro de 2009 e fevereiro de 2010”, disse L’Heureux à BBC.
Efeitos positivos
A pesar de a chegada do El Niño ser vista por muitos como um anúncio de tragédia a caminho, a especialista explica que os seus efeitos positivos ou negativos devem depender de sua força.
“O El Niño pode, por exemplo, trazer chuvas benéficas no fim do ano ao sudeste do Texas, que atualmente enfrenta uma seca. Mas se chover demais, isso pode se converter em uma ameaça, por causa das possíveis inundações”, diz L’Heureux.
Outro possível efeito positivo, segundo ela, seria a redução da intensidade dos furacões no Caribe.
L’Heureux diz ainda que não existem ainda evidências de que a incidência do El Niño poderia estar sendo reforçada pelo aquecimento global.
“O El Niño é um fenômeno natural que vem ocorrendo há milhares de anos. Até o momento não há evidências de uma relação entre esse fenômeno e as mudanças climáticas”, diz ela. “O último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas diz claramente que não há indícios consistentes sobre futuras mudanças na amplitude ou na frequência do El Niño no século 21”, conclui.
(Da BBC) (G1, 24/7)

 

4 – Detergente contra a poluição de óleo

 

Coppe cria produto biodegradável para a limpeza de derramamentos
Carlos Albuquerque escreve para “O Globo”:
Chega de manchas. Uma nova tecnologia, 100% nacional, desenvolvida nos laboratórios da Coppe/UFRJ, vai permitir que áreas poluídas com derramamento de óleo sejam limpas sem causar maiores danos ambientais.
Os pesquisadores criaram, pela primeira vez no país, um detergente, biodegradável, capaz de limpar essas manchas sem deixar resíduos colaterais, como espumas e bolhas.
Sua produção vai ser incrementada com a inauguração, hoje, do primeiro laboratório – oficialmente, Unidade Piloto para Produção de Biossurfactante – do gênero no Brasil, o que vai reduzir os gastos com o uso desse produto por aqui, já que atualmente o país importa quase todo material que consome.
– Esse processo que estamos desenvolvendo é único e com a inauguração dessa unidade vamos poder testar essa tecnologia para usá-la em grande escala – diz Cristiano Borges, do Programa de Engenharia Química da Coppe, um dos coordenadores do projeto, feito em parceria com a Petrobrás.
Estimativa de produção industrial em dois anos
O laboratório vai produzir cerca de 200 litros por semana desse detergente à base de glicerina. Material suficiente para que sejam feitos testes na remoção de manchas, tanto na água como no solo, em diversos níveis de poluição.
– O uso da glicerina, comum na produção de sabão, é uma das coisas que tornam esse projeto diferente, já que no exterior a maioria dos detergentes é feita com produtos sintéticos – explica o engenheiro químico Frederico de Araújo Kronemberger, que desenvolveu essa tecnologia em sua tese de doutorado. – A glicerina é o principal subproduto do biodiesel feito no país. O seu uso torna a produção viável, já que a tendência é que a glicerina se torne cada vez mais abundante.
Sabão, como se sabe, cria espuma e bolhas. Para que isso não aconteça durante o processo de limpeza das manchas de óleo, os pesquisadores aperfeiçoaram um método, devidamente patenteado, que elimina esses danos.
Para a produção do detergente biodegradável, é preciso que aconteça a fermentação da bactéria e para isso ela precisa de oxigênio – explica Kronemberger. – Isso poderia ser feito borbulhando oxigênio, como fazemos para manter um aquário, mas esse método produz espuma. Então, em parceria com o Instituto de Química da UFRJ, desenvolvemos um método que usa membranas para que esse oxigênio seja dissolvido na água, molécula por molécula, sem a produção de bolhas ou espumas.
Segundo o pesquisador, o desafio seguinte é descobrir as concentrações exatas para o uso desse detergente biodegradável em larga escala.
O primeiro passo, que era superar esse gargalo tecnológico, foi vencido. Agora, vamos fazer testes para saber as concentrações necessárias para limpar uma determinada área. É a etapa que antecede a produção industrial, que esperamos atingir em dois anos.
(O Globo, 24/7)

 

5 – Bico ”monstruoso” do tucano serve de radiador biológico

 

Pássaro altera o fluxo de sangue para o órgão como forma de controlar sua temperatura
Herton Escobar escreve para “O Estado de SP”:
Poucas pessoas classificariam o bico de um tucano como uma “monstruosidade”. Mas foi assim que Buffon, um famoso naturalista francês, o descreveu no século 18. Até hoje, para os biólogos modernos, o tamanho “mostruoso” do bico do tucano – o maior entre as aves, proporcionalmente ao corpo – é algo que clama por explicação.
Alimentação, defesa e comunicação visual são algumas funções mais óbvias já conhecidas. Agora, cientistas do Brasil e do Canadá acrescentaram mais um item a essa lista: termoregulação. Em um trabalho publicado hoje na revista Science, eles mostram que os tucanos podem controlar o fluxo de sangue para o bico como uma forma de controlar a sua temperatura corporal – algo semelhante ao que fazem os elefantes com suas orelhas.

Segundo o estudo, o bico do tucano é altamente vascularizado e transfere calor rapidamente para o ambiente. Funciona como um radiador. Quando o tempo está quente, o pássaro aumenta o fluxo de sangue para o bico, para irradiar calor. Quando está frio, faz o oposto, para reter calor.
O biólogo Augusto Abe, especialista em fisiologia animal, teve a ideia de investigar essa possibilidade na década de 80, depois de ver, em um livro de ornitologia, o desenho de um tucano com o bico enfiado debaixo da cauda – como alguém que enfia a cabeça debaixo de um cobertor. A imagem ficou gravada em sua mente, mas não havia tecnologia na época para fazer os experimentos necessários de temperatura. A possibilidade só surgiu recentemente, quando seu colega canadense, Glenn Tattersall, comprou uma câmara de termografia infravermelha, que “enxerga” gradientes de temperatura.
“Quando você leva uma criança para um zoológico e ela vê um tucano, a primeira coisa que pergunta é: por que esse bico tão grande?”, diz Abe, de 62 anos, que durante muito tempo se perguntou a mesma coisa. “A pena é um isolante para o corpo. Mas, com um bico irrigado daquele tamanho, como é que o bicho evita perder calor?”
A resposta, comprovada pelas imagens em infravermelho, é que o tucano é capaz de controlar o fluxo de sangue para o bico – mediando, assim, a quantidade de calor que flui através dele pelos vasos.
“É provável que seja uma característica comum a todas as aves, mas que se torna especialmente relevante no tucano por causa da proporção do bico”, diz Denis Andrade, que assina o trabalho na Science com Abe e Tattersall. Os dois brasileiros são da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Rio Claro. Tattersall é da Brock University, em Ontario.
O bico do tucano é realmente enorme: pode representar até 50% do tamanho do animal. “Isso é com penas”, observa Andrade. “Sem penas, fica muito desproporcional mesmo.” Alguns diriam até “monstruoso”.
(O Estado de SP, 24/7)