1 – Cinco espécies de aves são registradas pela primeira vez no Brasil
2 – Cientistas americanos continuam presos em Mato Grosso do Sul
3 – Mapear para conservar
4 – Vacas verdes contra o aquecimento
1 – Cinco espécies de aves são registradas pela primeira vez no Brasil
Tese de doutorado mapeia 655 espécies de aves no Acre, rastreia os dados mais antigos já produzidos sobre o tema e realiza novos levantamentos em regiões que ainda não haviam sido visitadas por ornitólogos
O biólogo Edson Guilherme da Silva defendeu, no último dia 12, no Museu Goeldi, a tese “Avifauna do Estado do Acre: Composição, Distribuição Geográfica e Conservação”, sob a orientação de José Maria Cardoso da Silva, no âmbito do Programa de Pós-Graduação de Zoologia, mantido pelo Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG) e a Universidade Federal do Pará (UFPA).
A pesquisa objetivava contribuir para o conhecimento da avifauna do sudoeste amazônico respondendo a questões sobre quantas e quais são as espécies de aves do Acre, e como as espécies estão distribuídas dentro do estado.
“Ao final dos trabalhos, 655 espécies foram confirmadas para o Acre [distribuídas em 73 famílias e 23 ordens], sendo que cinco destas foram registradas pela primeira vez em território brasileiro”, conta o pesquisador, que é professor do Departamento de Ciências da Natureza da Universidade Federal do Acre (UFAC).
O Acre está situado no sudoeste da Amazônia e faz fronteira internacional com o Peru e a Bolívia. Trata-se de uma região reconhecidamente biodiversa localizada nas terras baixas da região amazônica, próxima ao sopé dos Andes. Embora a região seja considerada pelas instituições ligadas as questões ambientais como sendo prioritária para a realização de novos levantamentos biológicos, poucos estudos têm sido realizados nessa parte da Amazônia brasileira.
O autor da tese explica que o Acre foi o Estado da região amazônica que mais tardiamente recebeu a visita de ornitólogos. Segundo Edson, o conhecimento sobre as aves do Acre era escasso e estava disponível de forma difusa em poucos artigos científicos, em relatórios técnicos não publicados ou a partir de espécimes encontrados em diversos museus de história natural do Brasil e do exterior.
“Diante disso, era urgente e necessário realizar um trabalho que pudesse reunir o que já havia sido produzido e coletar novos dados dentro do Estado em áreas ainda não visitadas por ornitólogos”.
Além de organizar a informação que estava dispersa sobre a avifauna do estado, o novo doutor da Ufac foi o primeiro a realizar um inventário das aves da região central do Acre, situada no interflúvio entre os rios Juruá e Purus – pois, até então, só as porções oeste e leste do estado haviam sido inventariadas.
A pesquisa – Para realizar o estudo, Edson organizou uma ampla revisão bibliográfica, realizou dois anos de levantamentos em campo, que incluiu busca de registros e coletas de espécimes testemunhos, e também confeccionou o mapa de distribuição de cada espécie.
Após o término da revisão bibliográfica e das expedições em campo, que tiveram início em agosto de 2005 e se estenderam até dezembro de 2007, foram compilados 7.141 registros de aves para o todo o estado do Acre. “Destes registros, 4. 623 são de espécimes coletados, dos quais, 2.295 (49,6%) são oriundos de coletas feitas durante a realização deste estudo”, especifica o autor.
Os resultados – A pesquisa registrou 59 espécies migratórias, das quais, 30 (50,8%) são migrantes neárticas (aves provenientes do hemisfério norte), 11 (18,6%) foram consideradas como migrantes intratropicais, e 18 (30,5%) como migrantes austrais (provenientes do sul da América do Sul). E o pesquisador ainda completa: “Nós aumentamos de nove para 19 o número de localidades inventariadas com mais de 100 espécimes coletados dentro do Estado”.
O autor destaca como principais conclusões do seu estudo: que a riqueza avifaunística do estado do Acre já é bastante expressiva, porém, o número de espécies detectadas deverá aumentar à medida que novos levantamentos forem realizados; e que os rios Purus e Juruá não são as barreiras físicas que determinam o padrão de distribuição da maioria das aves residentes no estado do Acre.
A tese de Edson também apresenta uma análise de lacunas visando avaliar a eficiência do sistema de áreas protegidas do Estado na conservação das aves florestais residentes no Acre. Descobriu-se, a partir das análises, que o conjunto de todas as áreas protegidas (Unidades de conservação e Terras indígenas) ocupa uma área capaz de proteger quase 90% das aves florestais residentes no Estado.
“Apesar disso, observou-se que as aves associadas à vegetação de campinas e campinaranas do oeste do Acre estão desprotegidas uma vez que estes ambientes encontram-se fora do sistema de áreas protegidas do Estado”, finaliza Edson que, agora, pretende retornar ao Acre, seu estado de origem, com o intuito de orientar alunos que estejam interessados no estudo das aves.
(Assessoria de Comunicação do Museu Goeldi)
2 – Cientistas americanos continuam presos em Mato Grosso do Sul
Pesquisadores faziam extração de sedimentos minerais em lagoas no Pantanal para pesquisas
Rodrigo Vargas escreve para a “Folha de SP”:
Os pesquisadores americanos Mark Andrew Tress, Kellu Michael Wendt e Michael Matthew McGlue, presos pela Polícia Federal na semana passada quando faziam extração de sedimentos minerais em lagoas no Pantanal, foram vítimas de uma “sucessão de enganos”, diz o advogado Roberto Lins, que assumiu a defesa dos três.
“Eles não cometeram delito algum, não visavam lucro nem causar qualquer prejuízo ao ecossistema”, disse o advogado.
Lins disse que entraria ainda ontem com novo pedido de relaxamento da prisão dos americanos, que estão detidos desde quarta-feira na carceragem da PF em Corumbá (MS).
No sábado, a Justiça Federal negou o primeiro pedido de liberdade: faltava, segundo Lins, a tradução juramentada para o português de documentos que comprovassem residência fixa e bons antecedentes.
Os pesquisadores foram indiciados pelos crimes de usurpação ou exploração de matéria-prima pertencente à União e execução de pesquisa de recursos minerais sem autorização.
Dois pesquisadores brasileiros, Fabrício Aníbal Corradini e Aguinaldo Silva, alunos de pós-graduação da Unesp de Rio Claro, também foram detidos no mesmo local e depois liberados após pagamento de fiança.
Em nota, a Unesp disse existir uma “colaboração científica informal” de um grupo de pesquisa da instituição com a Universidade do Arizona. O estudo no Pantanal tem o objetivo de avaliar, a partir da coleta de sedimentos, as variações climáticas ocorridas na região nos últimos 30 mil anos.
A Unesp disse que a falta de um convênio formal a impede de “assumir na Justiça a defesa dos envolvidos”. Declara, porém, que atividades autorizadas pelo Ibama e previstas na pesquisa “não envolvem coleta de amostras de fauna e flora ou de minérios de valor comercial e nada têm a ver com biopirataria ou geopirataria”.
Para o Ministério Público Federal, que deu parecer contrário ao primeiro pedido de liberdade aos pesquisadores, a atividade científica estrangeira em território nacional “não pode ser realizada ao alvedrio das leis brasileiras, sem o conhecimento e autorização das autoridades públicas competentes”.
Alcides Faria, diretor da ONG Ecoa, que dava apoio logístico aos pesquisadores, disse que o trabalho é importante para entender a história do Pantanal e que a pesquisa não pode ser interrompida.
(Folha de SP, 24/6)
Nota da redação: Leia abaixo “Professor da Unesp esclarece episódio da prisão de seus doutorandos e de pesquisadores da Universidade do Arizona”.
3 – Mapear para conservar
Projetos do Biota-Fapesp reúnem conhecimento fundamental para estabelecer mecanismos mais eficientes de conservação e restauração da Mata Atlântica
Jussara Mangini escreve para a “Agência Fapesp”:
A biodiversidade da Mata Atlântica tem sido objeto de diversos estudos realizados no âmbito do programa Biota-Fapesp, que está completando dez anos. Um dos ecossistemas mais ricos em matéria de biodiversidade, a Mata Atlântica é também um dos mais ameaçados de extinção, estando hoje reduzida a menos de 8% de sua extensão original. São Paulo abriga 15% do que restou.
Um Projeto Temático ligado ao Biota-Fapesp reúne especialistas em solo, vegetação e luz com a tarefa de descobrir as razões das diferenças entre as florestas paulistas.
Para o coordenador do Temático, Ricardo Ribeiro Rodrigues, professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da Universidade de São Paulo (USP), saber como uma floresta se diferencia, se reorganiza e reage a fenômenos locais ou globais, como as mudanças climáticas – além de conhecer os elementos que atuam na seletividade de espécies que compõem os tipos florestais -, é fundamental para estabelecer mecanismos mais eficientes de conservação da biodiversidade e também de restauração dessas áreas.
“Não só para conservar a espécie, mas também o ambiente no qual a espécie ocorre, além de contribuir para criar mecanismos que levem à possibilidade de restauração de ambientes que foram historicamente degradados”, explicou Rodrigues, que coordenou o Biota-Fapesp de outubro de 2004 a março de 2009.
Intitulado Diversidade, dinâmica e conservação de árvores em florestas do Estado de São Paulo: estudos em parcelas permanentes, o Temático demarcou quatro áreas de 10 hectares cada e que representam os principais tipos de vegetação natural no Estado: uma amostra de Mata Atlântica do interior, o Cerradão, a restinga e uma amostra de Mata Atlântica da Serra do Mar.
A ideia era conseguir entender o funcionamento e os respectivos componentes de cada uma dessas amostras, de forma particular, e depois comparar os dados entre elas. “Os resultados revelaram que as florestas são organismos únicos, dotados de diferenças significativas no modo de funcionamento”, apontou Rodrigues.
Na Mata Atlântica do interior, integrada à Estação Ecológica de Caetetus, no sudoeste paulista, a fertilidade do solo contribui para a diversidade de árvores da floresta. Foram identificadas 150 espécies com até 30 metros de altura.
Para as plantas dessa floresta, não faltam nutrientes nem água, porque o solo retém a chuva que cai entre novembro e janeiro. Mas foi por causa da riqueza desse solo, somado ao relevo plano, que muitas matas desse tipo no interior paulista foram derrubadas para dar lugar às pastagens, ao café, à cana-de-açúcar ou à soja.
Na reserva de Mata Atlântica que integra o Parque Estadual Carlos Botelho foram identificadas 240 espécies de árvores. A área se caracteriza por árvores com troncos cobertos de bromélias e por ser a mais escura das quatro estudadas. As folhas mais próximas à superfície do solo recebem apenas 1% da luz que chega ao topo da floresta.
Já o Cerradão da Estação Ecológica de Assis, no município de Assis, sudoeste paulista, é o ambiente mais iluminado e seco dos quatro. Apresenta a maior densidade de árvores: 23.495 em 10 hectares, quase o dobro das outras áreas, embora a diversidade seja a menor: apenas 122 espécies. Mas as árvores raramente passam dos 15 metros por causa do solo pobre em nutrientes. E, por ser mais arenoso, o solo deixa escoar a água da chuva e seca rapidamente.
Na restinga do Parque Estadual da Ilha do Cardoso, em Cananeia, no extremo sul do Estado, foram identificadas 16.890 árvores de 177 espécies diferentes. Nesse ambiente, elas raramente passam dos 15 metros de altura por causa do solo pobre em nutrientes, como no Cerradão.
Rodrigues destaca que remedições periódicas precisam continuar a ser feitas, especialmente nas florestas da região oeste paulista, em que há fragmentos muito pequenos, mas com papel importante na conservação da biodiversidade remanescente. Uma parcela muito representativa da biodiversidade está em pequenos fragmentos dentro de propriedades privadas.
Palmeiras da Serra do Mar
Outro estudo ligado ao Biota-Fapesp procurou conhecer a riqueza de espécies de palmeiras na Serra do Mar. A partir do trabalho Distribuição da comunidade de palmeiras no gradiente altitudinal da floresta atlântica na região nordeste do Estado de São Paulo, coordenado por Simey Thury Vieira Fisch, 11 espécies foram estudadas.
“Pode parecer uma contribuição pequena, mas, anteriormente, pouco se sabia sobre essa família de plantas na Mata Atlântica. É a primeira vez que se chega ao nível de detalhamento obtido nesse trabalho, que vai da plântula ao adulto”, disse a professora de botânica do Departamento de Biologia da Universidade de Taubaté (Unitau), que realizou o estudo com apoio da Fapesp na modalidade Auxílio a Pesquisa – Regular no período de 2002 a 2005.
“No primeiro momento queríamos saber onde elas ocorriam, em que densidade, em que altitude, que tipo de floresta há em cada ambiente, enfim, saber como é que estão distribuídas ao longo do gradiente da Serra do Mar. Esses dados são importantes para podermos prever o que pode acontecer daqui a um certo tempo”, explicou.
A pesquisa permitiu conhecer, por exemplo, quais são as áreas de ocorrência de palmeiras ameaçadas de extinção. Segundo Simey, até então, quem ia a campo não sabia reconhecer essas espécies. O objetivo é fazer um catálogo virtual do material identificado.
A pesquisadora conta que, nas matas do Estado de São Paulo, as palmeiras são frequentemente associadas somente ao palmito e a existência das demais espécies – que, em geral, têm algum uso comercial, como paisagístico – é pouco conhecida.
Além disso, palmeiras são bioindicadores de áreas alteradas ou preservadas. Há espécies extremamente sensíveis a alterações ambientais, ao passo que outras predominam quando a área é alterada. São palmeiras mais resistentes e que são raras em áreas preservadas, como, por exemplo, o jerivá (Syagrus romanzoffiana).
“Diante disso, poderíamos indicar espécies para recompor áreas que estão degradadas e que foram empobrecidas, a partir do conhecimento da dinâmica delas”, disse.
Atualmente, Simey integra a equipe do Temático coordenado por Carlos Alfredo Joly, professor do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e atual coordenador do Biota-Fapesp. Com o Temático o grupo está refinando o conhecimento e buscando respostas que poderão subsidiar questões importantes como o impacto das mudanças climáticas. “A palmeira não gosta de clima frio. Ela é tropical. Se aquecer, será que vamos expandir as áreas de palmeira no mundo?”, questiona.
Segundo a botânica, com o aquecimento global já se nota a invasão de palmeiras no sopé dos Alpes suíços, anteriormente somente encontradas na Europa em situações especiais – em estufas de jardins botânicos, por exemplo. Estão sendo feitas análises para tentar modelar a abrangência desse fenômeno.
“Saber quais são as restrições e preferências ambientais das espécies são dados importantes para modelagem do sistema terrestre, para podermos prever onde vamos ter essas palmeiras ocorrendo, a partir de resultados de simulação de modelos climáticos”, disse.
(Agência Fapesp, 24/6)
4 – Vacas verdes contra o aquecimento
Genética e rações “light” são usadas para reduzir as emissões de metano desses animais
O ideal era que elas fossem bem educadas. Como isso é impossível, pesquisadores continuam tentando descobrir novas formas de reduzir as emissões de metano – um dos gases ligados ao aquecimento global – causadas pelas vacas quando arrotam e emitem flatulências.
No Canadá, cientistas usam técnicas de seleção para chegar a uma linhagem de vacas que emitiria menos gases. Nos Estados Unidos, as tentativas de reduzir as emissões desses animais – normalmente subestimadas, mas responsáveis por quase três quartos do metano lançado na atmosfera – têm se dado através de mudanças nas rações. Embora seja menos comum na atmosfera do que o dióxido de carbono, o metano (CH4) retém 20 vezes mais o calor.
Na Universidade de Alberta, no Canadá, um grupo de pesquisadores, liderados por Stephen Moore, um especialista em nutrição animal, está examinando os genes responsáveis pela produção de metano no estômago desses animais na tentativa de obter animais mais eficientes, ecologicamente falando, que emitiriam menos 25% de metano durante a digestão.
Os animais seriam cruzados e os pesquisadores esperam obter filhotes que produzam menos metano. Estes seriam usados para formar novas linhagens. Porém, os cientistas precisam saber se os genes de interesse são transmitidos de uma geração para outra.
– Estamos na fase inicial de testes – diz Moore, que publicou recentemente um trabalho sobre o assunto no “Journal of Animal Science”.
Outra forma de atenuar a pegada ecológica das vacas, explica Moore, seria reduzir o tempo em que os animais ficam pastando. Isso significaria criar animais capazes de se desenvolver mais rapidamente, convertendo de forma mais eficiente alimento em músculos e produzindo, assim, menos metano.
Um outro método de reduzir essas emissões de metano, já bastante debatido, gira em torno de mudanças na alimentação das vacas. Cientistas acreditam que uma dieta mais energética e rica em óleos comestíveis seria capaz de fermentar menos que a grama e outros alimentos.
Pecuaristas de New Hampshire, ligados ao grupo Danone, conseguiram reduzir as emissões dos seus animais em cerca de 12% ao adicionar alfafa, cânhamo e sementes de linho à sua ração, sem prejuízos para a produtividade. O mesmo método já está sendo usado em mais de 600 fazendas na França.
– Os animais parecem mais saudáveis – garante Guy Choiniere, um dos maiores produtores de leite da região. – Sua pele está mais brilhosa e até mesmo o hálito ficou melhor.
De acordo com os cientistas, essa dieta faz com que os animais produzam menos gases do que as rações tradicionais, à base de soja e milho. Estes ingredientes, porém, são fartos e mais baratos, o que explicaria a resistência de alguns pecuaristas em trocá-los.
O impacto ambiental, porém, fala mais alto. Analistas indicam que se todos os produtores de laticínios americanos reduzissem suas emissões de metano em 12%, isso seria o equivalente a tirar cerca de meio milhão de carros das ruas.
(O Globo, 24/6)