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Coluna CIZ: A morte e exibição de uma onça negra: Uma sociedade doente?

Texto por: Vinícius Delpenho

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O descaso com a fauna brasileira é, infelizmente, algo extremamente comum. Um dos mais recentes casos é o de uma onça negra, uma variação genética rara da onça-pintada (Pantera onca), que, após ser caçada e morta na reserva indígena Arariboia, tem seu corpo exibido como prêmio pelos caçadores em um vídeo postado na internet. O vídeo e a foto podem ser acessados neste blog (cenas podem ser impactantes para algumas pessoas).

 

Onça negra é uma variação rara da onça-pintada. Fonte: Wikicommons.

Onça negra é uma variação rara da onça-pintada. Foto: Wikicommons.

Cada indivíduo do maior felino das américas vive em um território de aproximadamente 200 km2 (pouco menos da metade da área urbana de Juiz de Fora), o que por si só, já é uma ameaça, já que uma área tão ampla é muito difícil de ser encontrada com a vegetação e fauna nativa intactas, devido à imensa expansão humana. Atrelado à prática de caças ilegais, essa espécie acabou se tornando ameaçada de extinção. O problema aumenta ao considerarmos que espécies carnívoras de grande porte geralmente atuam como espécie-chave, servindo de controle populacional de grandes presas, sendo assim, sua perda tem impacto negativo  para toda a teia alimentar (relações alimentares entre espécies de um ambiente).

 

O caso exemplifica que nem mesmo em reservas indígenas, onde se há o costume de preservar a vida, esses animais estão seguros. No vídeo em que o homem segura a onça abatida em seus braços, ele também fala: “Se não quiser morrer, não pisa na frente, não. Ele arrisca com um bicho desse aqui, imagine um guardião”. O termo “Guardião”, dito pelo homem, refere-se a grupos indígenas que buscam combater e expulsar grileiros de suas reservas. Isso nos mostra então, que, além de um caçador, esse homem é provavelmente um funcionário de grileiros, o que põe em risco não apenas a vida dos animais que vivem na região, mas também a dos povos indígenas.

 

Em cerca de 60 anos, estima-se que foram mortos pela caça um total de 13,9 milhões de mamíferos brasileiros, muitas vezes em decorrência do uso dos produtos desses animais para a venda, como por exemplo o couro para fabricação de roupas e acessórios. O homem que caçou e matou a onça foi preso não por isso, mas sim por ser pego em flagrante com porte ilegal de arma. A punição  decorrente da caça foi apenas uma multa, o que indica a fragilidade do bem-estar desses animais. Sem medidas de punição e nem maneiras de prevenção adequadas, parece não haver muita esperança para o futuro de espécies ameaçadas.

 

Portanto, em meio a este cenário, a educação ambiental é de extrema importância desde os primeiros níveis básicos de ensino. Contudo, ela sozinha não é capaz de desbancar o lucrativo negócio da venda de produtos animais derivados da caça ilegal. Uma sociedade desmoralizada, com cidadãos passando fome, recorre aos mais diversos meios para que possa sobreviver, e a culpa passa a não ser exclusivamente daquele que cometeu o crime, mas também do governo que negligencia as necessidades do povo, e que acaba, assim, garantindo a sua própria falência.

 

Algo animador sobre isso é a repercussão tomada por essa notícia. Perceber o impacto dela sobre a sociedade nos mostra que existe, sim, algum lampejo de bom senso em nossa sociedade. O repúdio a esse ato criminoso revela que, com luta, podemos alterar o atual estado em que nos encontramos. Também traz uma grande esperança o crescente número de divulgadores científicos nas redes sociais, que são uma saída da desinformação. Por isso, abraçar causas protetoras do meio ambiente se mostra cada vez mais crucial.

 

Fontes bibliográficas:

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‌Polícia Civil do Maranhão prende um dos homens que matou onça preta e se gabou nas redes sociais – ((o))eco. ((o))eco. Disponível em: <https://oeco.org.br/salada-verde/policia-civil-do-maranhao-prende-um-dos-homens-que-matou-onca-preta-e-se-gabou-nas-redes-sociais/>. Acesso em: 26 Oct. 2021.

‌SURVIVAL INTERNATIONAL. Os Guardiões da Amazônia precisam da sua ajuda! Survivalbrasil.org. Disponível em: <https://www.survivalbrasil.org/mensagens/guajajara_guardioes>. Acesso em: 26 Oct. 2021.

‌Lei de Crimes Ambientais – Lei 9605/98 | Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, Presidência da Republica. Jusbrasil. Disponível em: <https://presrepublica.jusbrasil.com.br/legislacao/104091/lei-de-crimes-ambientais-lei-9605-98>. Acesso em: 26 Oct. 2021.

‌ANDRÉ JULIÃO. Os efeitos danosos da caça ilegal. Fapesp.br. Disponível em: <https://revistapesquisa.fapesp.br/os-efeitos-danosos-da-caca-ilegal/>. Acesso em: 26 Oct. 2021.

‌CARVALHO, Elildo AR. Jaguar hunting in Amazonian extractive reserves: acceptance and prevalence. Environmental Conservation, v. 46, n. 4, p. 334–339, 2019. Disponível em: <https://www.cambridge.org/core/journals/environmental-conservation/article/abs/jaguar-hunting-in-amazonian-extractive-reserves-acceptance-and-prevalence/CD8AFF8CD483643C30FB301A0E0B54A5#>. Acesso em: 26 Oct. 2021.

PESSOA, Diego. Cidade | Características. Mg.gov.br. Disponível em: <https://pjf.mg.gov.br/cidade/caracteristicas_gerais.php>. Acesso em: 26 Oct. 2021.

‌LIMA, GILBERTO. Caçador é preso após matar onça-preta na terra indígena Arariboia em Arame; outros envolvidos são procurados. Gilbertolima.com.br. Disponível em: <https://www.gilbertolima.com.br/2021/10/cacador-e-preso-apos-matar-onca-preta.html>. Acesso em: 26 Oct. 2021.