Nossa equipe entrevistou a Profa. Dra. Juliane Lopes, que é especialista em ecologia e comportamento de formigas, e leciona disciplinas na área de Ecologia e Ensino de Educação Ambiental para o curso de Ciências Biológicas da UFJF. Na nossa entrevista, abordamos o papel da zoologia na educação ambiental, sustentabilidade, e perspectivas futuras após este tempo tão difícil. Confira o papo abaixo!
Equipe CIZ: Conte-nos um pouco da sua história como bióloga, zoóloga e educadora ambiental.
Juliane: Me formei na UFJF em 1996 e fui fazer pós-graduação na UNESP-Botucatu, onde iniciei minhas pesquisas com formigas cortadeiras. Em 2004, retornei a UFJF com uma bolsa de recem-doutor e em 2005 após aprovação em concurso público, me tornei docente do curso.
Durante meu percurso, minhas pesquisas e estudos sempre foram voltados à área de ecologia, que considero muito próxima a área da educação ambiental. Estudando e investigando como são as redes de interação ecológicas e compreendendo como todas as espécies e o ambiente estão conectados, a percepção que a educação ambiental é uma ferramenta com poder transformador na interação e conexão da nossa espécie nessa rede foi uma consequência. Há poucos anos assumi a disciplina de Ensino em Educação Ambiental, na qual é possível o desenvolvimento de projetos em conjunto com os alunos. Nesses projetos nosso objetivo principal é conscientizar sobre a importância da conservação e preservação do ambiente e mostrar ferramentas que permitem a integração dos seres humanos nesse contexto de forma sustentável.
Equipe CIZ: Na sua opinião, qual seria o melhor conceito de educação ambiental?
Juliane: Observa-se, no histórico do conceito de educação ambiental, que anteriormente esta disciplina visava a preservação e da conservação da biodiversidade, e atualmente o conceito considera sua importância para a emergência da manutenção da vida e das sociedades humanas.
Em 1997, na Declaração de Thessaloniki, indica-se a “educação ambiental como uma base para o 4o pilar da sustentabilidade no século XXI ” (UNESCO, 1997). E em 2007, na IV Conferência Internacional de Educação Ambiental, realizada em Ahmedabad, observa-se que a educação ambiental assume um papel de maior relevância como ferramenta de transformação dos modos de vida e visões de mundo. Inclusive, no documento gerado nesta conferência temos a citação de Gandhi: “Sejamos a mudança que queremos ver no mundo”.
Gosto muito de refletir sobre os objetivos da educação ambiental, que envolvem a formação de habilidades para agir e ter competência de ação com relação aos problemas ambientais. Nesse sentido a educação ambiental é muito mais que uma instrução acadêmica ou de modificação do comportamento, mas sim um instrumento para a busca de soluções através de mudanças na sociedade e no indivíduo. A educação ambiental transformadora busca por mudanças quantitativas (menor consumo de recursos, por exemplo), mas também qualitativos que vislumbram a busca por formas alternativas de desenvolvimento e construção de habilidades para agir de acordo com essas propostas.
Equipe CIZ: Como você aplica na prática os conceitos de zoologia na educação ambiental? Conte-nos um pouco sobre suas iniciativas e comente a importância de se utilizar a zoologia nesta área de ensino.
Juliane: Como eu pesquiso formigas, a aplicação dos conceitos de sua ecologia e comportamento são facilmente aplicáveis. São organismos que vivem em sociedades, assim como nossa espécie, e portanto são ótimos referenciais. Por exemplo, nesse momento de pandemia que estamos vivendo, as formigas são ótimos exemplos de como o isolamento social é efetivo na redução das taxas de transmissão de patógenos. O isolamento social é realizados por elas permitindo a emergência da imunidade social.
Formigas cortadeiras, meu grupo animal alvo de pesquisa, são consideradas espécies-praga dado o prejuízo econômico mas demonstrar como sua ação é benéfica em áreas não perturbadas ou não alteradas pelos humanos é muito evidente e uso recorrentemente como exemplo.
Também seu comportamento cooperativo e auto-coordenado (sem a existência de líder) é um ótimo exemplo para reflexão de como atitudes individuais tem um reflexo importante na sociedade.
Já fizemos, na disciplina de Ensino de Educação Ambiental, duas edições do evento Troca de Saberes, onde conceitos de zoologia aplicados à ecologia são discutidos e debatidos, na forma de palestras, mesas-redonda e oficinas. A zoologia é importante porque animais são carismáticos e despertam a sensibilidade nas pessoas, talvez por se reconhecerem e/ou se identificarem com os animais mais facilmente do que com plantas. Afinal, somos animais e muitos se esquecem disso.
Equipe CIZ: Ainda existe uma barreira entre a educação ambiental ensinada nas escolas e a que chega nas comunidades. Como podemos aperfeiçoar o ensino de zoologia e de educação ambiental para que estes se comuniquem com toda a sociedade?
Juliane: Acredito que a contextualização dos assuntos a serem ministrados é a melhor ferramenta. A construção do conhecimento a partir de experiências próprias é a chave para atingir esse objetivo, respeitando e valorizando esse conhecimento adquirido e/ou transmitido pelas comunidades.
Equipe CIZ: Você acredita que, após a pandemia do novo coronavírus, haverá maior interesse das pessoas pela educação ambiental, tendo em vista que o ocorrido iniciou-se a partir de um acidente que liga diversas áreas da biologia?
Juliane: Tenho esperança que sim, mas isso não quer dizer que acredito que isso vá acontecer. Temos exemplos que indicam que não vai acontecer. Citando um: a corrida aos shoppings, na reabertura do comércio, mostra que ainda estamos muito presos a um estilo de sociedade baseado no consumo exagerado, que sabemos que não é sustentável.
Por outro lado, o isolamento fez as pessoas ficarem mais contemplativas em relação a natureza e talvez isso desperte um maior respeito e responsabilidade ambiental. Houve um aumento de buscas por técnicas de cultivo de hortas urbanas nesse período que estamos passando. É uma luz no fim do túnel!
Equipe CIZ: Como podemos insistir na conscientização da conservação dos animais neste momento de grande aperto orçamentário, além das constantes investidas do governo para deslegitimar a sustentabilidade de forma geral?
Juliane: Os problemas econômicos são uma prova que o consumo exagerado não é mais possível. A vulnerabilidade econômica de muitos nos mostra isso. A conservação do ambiente, incluindo a dos animais, corre grande risco de ser colocada em último plano dada a preocupação e desespero com relação ao modelo econômico da maior parte (talvez totalidade) da sociedade humana. Mostrar como a conservação e atitudes sustentáveis é a melhor opção frente a este modelo consumista é a única saída que eu vejo. Continuar insistindo na comprovação desses resultados eu considero ser um bom caminho.
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