Em 2021 celebramos os 50 anos do Projeto Gutenberg, uma ação pioneira na digitalização e distribuição gratuita de livros, o que deu origem ao que consideramos a mais antiga biblioteca digital. A ação teve início em 1971 e boa parte do acervo já era de livros de domínio público, mas que, fisicamente, ficavam restritos a uma pequena parcela da população.
Ou seja, sem dúvida a tecnologia é uma ferramenta importante na democratização do acesso à produção cultural em todo o mundo. Mas, junto à democratização, surgem muitos dilemas, como a proteção dos direitos autorais, ou seja, os direitos que todo criador, de uma obra artística ou intelectual, tem sobre a sua produção.
Os direitos autorais estão presentes em diversos tratados e convenções internacionais, sendo a Convenção de Berna a mais significativa. Adotada em setembro de 1886, na Suíça, o documento estabelece critérios de proteção a obras literárias e artísticas. No Brasil, os direitos autorais são regidos pela Lei nº. 9.610, de 1998.
Apesar da maioria dos países utilizarem a Convenção de Berna na estruturação de seus direitos autorais, cada nação estabelece quando uma obra passa a ser de domínio público, podendo ser reproduzida, distribuída, traduzida, publicada ou adaptada, sempre indicando sua autoria, sem a necessidade de autorização do criador ou de seus herdeiros. No Brasil a proteção aos direitos autorais para livros, produção audiovisual e patrimônio duram 70 anos, contados a partir do primeiro dia do ano seguinte ao da morte do autor.
Nesta edição, o Vamos Ler! apresenta alguns autores e textos em língua portuguesa, que já podem ser acessados no portal Domínio Púbico. Mas este não é o único site com uma variedade impressionante de obras. Outros sites interessantes são o Open Library; Amazon; Livros Digitais; Free e-books e Portal Educabras.
LIVRE! do livro Últimos Sonetos de Cruz e Souza
Livre! Ser livre da matéria escrava,
Arrancar os grilhões que nos flagelam
E livre, penetrar nos Dons que selam
A alma e lhe emprestam toda a etérea lava.
Livre da humana, da terrestre bava
Dos corações daninhos que regelam
Quando os nossos sentidos se rebelam
Contra a Infâmia bifronte que deprava.
Livre! bem livre para andar mais puro,
Mais junto à Natureza e mais seguro
Do seu amor, de todas as justiças.
Livre! para sentir a Natureza,
Para gozar, na universal Grandeza,
Fecundas e arcangélicas preguiças.
João da Cruz e Sousa, o Cruz e Souza, nasceu em 1861 (Florianópolis / Santa Catarina) e morreu em Sítio (Minas Gerais) em 14 de março de 1898. Seus pais eram escravizados alforriados. Através de apadrinhamento, recebeu educação formal. É considerado o mais importante poeta simbolista brasileiro. Seu livros Missal e Broquéis, publicados em 1983, inauguraram oficialmente o Simbolismo no Brasil. Cruz e Souza também é considerado um dos precursores da literatura afro-brasileira, apesar de ter crescido em um território hostil para os negros – o sul do país.
Fonte: Revista Prosa, Verso e Arte
Livro Alma Inquieta de Olavo Bilac
Primavera
Ah! Quem nos dera que isto, como outrora,
Inda nos comovesse! Ah! Quem nos dera
Que inda juntos pudéssemos agora
Ver o desabrochar da primavera!
Saíamos com os pássaros e a aurora.
E, no chão, sobre os troncos cheios de hera,
Sentavas-te sorrindo, de hora em hora:
“Beijemo-nos! Amemo-nos! Espera!”
E esse corpo de rosa recendia,
E aos meus beijos de fogo palpitava,
Alquebrado de amor e de cansaço.
A alma da terra gorjeava e ria…
Nascia a primavera… E eu te levava,
Primavera de carne, pelo braço!
Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac, o Olavo Bilac, nasceu em 1865 e morreu em 28 de dezembro de 1918, no Rio de Janeiro. Foi jornalista, contista, cronista e poeta brasileiro, sendo considerado o principal representante do Movimento Parnasiano, que valoriza o cuidado formal do poema, em busca de palavras raras, rimas ricas e rigidez das regras da composição poética. Olavo também foi membro fundador da Academia Brasileira de Letras. Sua obra retrata seu perfil republicano e nacionalista, sendo o responsável pela criação da letra do Hino à Bandeira.
Fonte: Academia Brasileira de Letras
Livro Desassosego, de Fernando Pessoa
Somos todos escravos de circunstâncias externas: um dia de sol abre-nos campos largos no meio de um café de viela; uma sombra no campo encolhe-nos para dentro, e abrigamo-nos mal na casa sem portas de nós mesmos; um chegar
da noite, até entre coisas do dia, alarga, como um leque [que] se abra lento, a consciência íntima de dever-se repousar.
Fernando Pessoa nasceu em 1888 e faleceu em 30 de novembro de 1935, em Lisboa (Portugal). Foi um dos mais importantes poetas da língua portuguesa, sendo central do Modernismo português. Seus textos são voltados aos temas tradicionais de Portugal, tendo um lirismo saudosista, que reflete suas inquietações, sua solidão e seu tédio. Mesmo que tenha assinado boa parte de sua obra, Fernando Pessoa também criou heterônimos, que eram poetas com personalidades próprias que escreveram sua poesia.
Fonte: E-biografia
Livro A Mensageira das Violetas de Florbela Espanca
EU…
Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada … a dolorida …
Sombra de névoa tênue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!…
Sou aquela que passa e ninguém vê…
Sou a que chamam triste sem o ser…
Sou a que chora sem saber por quê…
Sou talvez a visão que alguém sonhou.
Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!
Florbela da Alma da Conceição, a Florbela Espanca, nasceu em 1894 e faleceu em 8 de dezembro de 1930, com apenas 36 anos,em Matosinhos (Portugal). Florbela foi autora de sonetos e contos importantes na literatura portuguesa, tendo um estilo com forte teor emocional. Sua obra contempla temas como amor, erotização, angústia e sofrimento, sempre trazendo a figura feminina para o centro das produções. Considerada uma mulher à frente de seu tempo, foi a primeira mulher a entrar no curso de Direito da Universidade de Lisboa. Formou-se também em Letras.
Fonte: E-biografia e Brasil Escola
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