“São quinhentos e treze anos e vinte centavos”, “Não me representa”, “Vem pra rua”, “Queremos escolas e hospitais padrão FIFA” e “O gigante acordou” foram algumas das frases presentes em cartazes durantes as manifestações ocorridas recentemente no país. Com a repercussão na mídia e o interesse público, os protestos que ganharam as ruas de diversas cidades brasileiras desde junho levaram a Escola de Governo e Cidadania (EGC) da UFJF a promover, na última quinta (15), debate com o deputado federal Chico Alencar (PSOL-RJ) que expôs o tema e levantou os possíveis desdobramentos.
Durante a conversa, Alencar, que também é professor de história, abordou as reivindicações populares e realizou análises a respeito da influência das manifestações na vida cultural, social e, principalmente, política do país. A coordenadora técnica da EGC, professora Marta Mendes, ressaltou a “visão crítica do deputado para a reflexão sobre os vícios e virtudes das manifestações e o que essas trazem de novo e de arcaico”.
Para Alencar, a redução dos protestos atuais em contingente de pessoas não é sinônimo de extinção. O deputado não descarta a ideia de que o cenário das manifestações, como o de junho, possa voltar. “Apesar da imprevisibilidade, elas alcançaram notoriedade, tanto pelas revindicações como pelas multidões que foram às ruas. O ‘Gigante’ não pode adormecer novamente, mesmo que a conformidade social predomine.”
Sobre as impressões que ficaram dos principais motivos notados durantes os protestos, Alencar descreveu os problemas que considera ter sido o estopim da mobilização popular. Dentre eles, o político citou a infraestrutura dos municípios que, segundo ele, necessita de aporte financeiro em serviços básicos, como hospitais, mas que receberam investimentos destinados para a construção de estádios de futebol, como no caso do Rio de Janeiro, no qual o Maracanã precisou passar por duas reformas em um período de apenas seis anos.
Participação
Cerca de 140 pessoas, entre universitários, professores e lideranças sociais e políticas, estiveram presentes no evento. A aluna do quinto período de Serviço Social, Ana Beatriz, destaca o caráter esclarecedor da palestra para o momento atual das manifestações. “Ouvir o posicionamento de alguém que está no Congresso é importante para formarmos nossa opinião.” O aluno do primeiro período do curso de Direito, Lucas Fontes, que havia participado de outros encontros com o mesmo tema, destacou a relação do debate com sua formação acadêmica. “A palestra teve saldo positivo para o meu campo pessoal e profissional. Alencar fez comparações históricas com as manifestações atuais que merecem atenção da sociedade.”
Para o coordenador executivo da EGC, professor Vicente Riccio, o evento foi uma oportunidade de estabelecer diálogos constantes com atores relevantes da sociedade. “A palestra atribuiu importância para a interlocução entre o saber acadêmico e a sociedade em diversas expressões, seja por meio do estado civil, do poder jurídico ou do executivo.”
Reforma Política
Desde que as manifestações começaram, Alencar tem realizado palestras em universidades e diz que tem encontrado plateias “com muito entusiasmo e interesse para entender os movimentos. Essas reivindicações nos fazem sair de uma fase anestésica para uma de inquietação”.
Sobre a reforma política, o deputado afirma que existe um mal-estar da sociedade com a representabilidade política. Para o parlamentar, há uma crise de representação formal e refletir as implicações de uma reforma significa modificar, em primeira instância, os partidos. “As manifestações trouxeram como resultado o enfoque nos debates da vida política e a necessidade de mudança. As discussões sobre as manifestações são uma base inteligente de ação para partidos e não pode ser desprezada.”
Segundo o deputado, os poderes Executivo e Legislativo, que hoje teriam a possibilidade de realizar uma mudança política, estão inquietos e incomodados com os protestos contra a corrupção. Para ele, uma das consequências é a retomada das discussões sobre reforma política. “A outra é que essa reforma realmente aconteça. A continuidade das mobilizações tem que confirmar essa exigência por reforma. O Brasil só se democratiza de verdade se a voz das ruas pressionarem os palácios. O caminho é a cidadania participativa e mobilizada”, analisa. Otimista quanto às contribuições dos protestos, Chico Alencar acredita que os movimentos podem ser uma brecha para “redescobrir o Brasil nas suas atribuições culturais e étnicas singulares”.