Reflexo do descaso histórico para com os povos originários, a exposição “Todo dia e̵r̵a̵ é dia de ̵í̵n̵d̵i̵o̵ indígena” chega à Galeria Espaço Reitoria, no Campus da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). A mostra conta com trabalhos de 19 artistas que responderam ao edital de convocação e foram selecionados para participar do tributo que a Pró-reitoria de Cultura (Procult) da UFJF realiza como contribuição às vozes que se levantam, em todo o país, em prol da resistência de uma cultura que precisa ser preservada. A exposição pode ser visitada de segunda a sexta-feira, das 8h às 18h, respeitando os protocolos de biossegurança da UFJF, com uso obrigatório de máscara
Idealizada e organizada pela Procult, a mostra, que tem início nesta terça-feira, 30 de novembro, pretende apontar para um momento que é decisivo na restauração dos saberes e dos conhecimentos que espelham o modo de vida das aldeias, ressaltando seus costumes, sua religiosidade e sua cultura.
A pró-reitora de Cultura, Valéria Faria, ressalta as lições de convivência harmônica com a natureza e o contraste do modo de vida dos indígenas com a destruição que lhes foi imposta através dos tempos. Temas como a territorialidade aviltada pela ganância estão entre as abordagens que os trabalhos exaltam, assim como a necessidade de reconexão com as raízes históricas de nações que dependem de sua ancestralidade para a sobrevivência física e cultural.
As obras, em tamanhos diversos e técnicas variadas, trazem as interpretações dos artistas Abigail Guedes; Amandha de Moraes Silveira; Ângelo Abreu; Bruno Paixão; Dayse Lamas; Gilmar Rodrigues; Leo Ribeiro; Leonardo Paiva; Luiza Paletta; Luiz Thome Reis; Matheus Bertolini; Paola Sayão; Ramón Brandão; Ramon Rafaello; Regina Paletta; Rodrigo Dias; Tadeu Mattoso; Tarsila Palmieri; e Wesley Rocher.
Esta é a primeira exposição presencial a ocupar a Galeria Espaço Reitoria desde meados de março de 2020, quando a pandemia exigiu medidas de contenção mais severas. Ainda assim, foram realizadas mostras para visualizações on-line, a exemplo da coletiva “Renda-se como eu me rendi – 100 anos de Clarice” para conferência no canal da Pró-reitoria de Cultura no YouTube. No caso de “Todo dia e̵r̵a̵ é dia de í̵n̵d̵i̵o̵ indígena” serão adotadas todas as medidas de biossegurança da instituição, entre as quais o uso obrigatório de máscaras.
Chamas acesas
De suas vivências em viagens por diferentes tribos e aldeias, Ramon Rafaello apresenta imagens cuja beleza transparece mesmo diante de uma realidade permeada por conflitos e pela degradação do meio ambiente, dificultando as práticas tradicionais de caça, pesca e coleta, fundamentais para a sobrevivência em grupo. São registros etnofotográficos que autenticam parte da história desses povos, comprovando a situação em que vivem atualmente.
Inquieto em suas indagações, Leo Ribeiro imprime às suas histórias em quadrinhos observações a partir de leituras, palestras, histórias e memórias, inspirado em José Bessa, Eliane Pequeno e Daniel Munduruku. Nelas, estão explícitas constatações de como os indígenas estão mais aptos a dar lições sobre arquitetura ambiental, medicina tradicional, agricultura orgânica e manejo dos recursos ao seu redor: “Reconciliar-se com a visão de mundo dos povos da floresta é a única forma de reverter o abismo que a civilização cavou para si mesma”.
Também integrante da mostra, Dayse Lamas acredita que a Universidade sempre foi e sempre será o espaço das discussões acerca das questões sociais: “Quando a Procult promove uma exposição com este cunho, o debate se acende. Traz a arte para emocionar, para denunciar e para tocar na ferida aberta pelo ‘trator’ das políticas públicas que excluem, apagam e, se deixarmos, vão abrindo caminhos (numa metáfora de devastação) para a extinção de populações, de culturas e saberes”.
Espaço de reflexão
Para Ramón Brandão, que participa com “O índio vitruviano”, em uma alusão à obra de Leonardo Da Vinci, falar da questão indígena é como entrar num cipoal de premissas construídas muitas vezes à sua revelia: “Então, me pergunto se realmente vemos o indígena como pessoa, ou como arquétipo. Estaremos preparados para vê-los despidos do imaginário do colonizador? Talvez a arte não possa dar essas respostas, mas pode nos fazer refletir. Daí a importância de mostras que abordem esta questão”.
Rodrigo Dias apresenta uma interpretação sobre a relação que as demais culturas estabeleceram com os nativos, desde a colonização europeia até os dias atuais. Sobre uma de suas obras, “Moingo bé”, que significa “ressuscitar” na língua Tupi, ele assinala: “Do ensanguentado mapa territorial do Brasil, emerge um galho ressecado como se buscasse uma forma de se manter, se salvar. Em torno dele, a reprodução de pintura corporal Pataxó simboliza feminilidade, equilíbrio e proteção, à espera de que essa aldeia mãe, ainda que ferida e fixada em ambiente desfavorável, possa seguir com vida e se reestruturar”.
Regina Paletta vê como fundamental a participação na exposição: “São nações de grande sabedoria, que precisam ser preservadas. E devemos aprender com elas a relação com a natureza da qual tanto nos distanciamos. É importante levantarmos essa bandeira principalmente neste momento do Brasil”.
Outras informações: (32)2102-3964 (Procult-UFJF)