Ainda há muitas lacunas que permeiam as pesquisas relacionadas sobre os impactos que a religiosidade e a espiritualidade trazem para a saúde mental dos indivíduos. Diante deste cenário, o livro “Spirituality and Mental Health Across Cultures” – em tradução literal: Espiritualidade e saúde mental entre as culturas -, editado pelo professor e coordenador do Núcleo em Espiritualidade e Saúde (Nupes) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Alexander Moreira de Almeida -, reúne 38 dos principais especialistas nas áreas de espiritualidade e saúde mental de 11 países para dialogar sobre o estado da arte das evidências disponíveis, cobrindo diferentes perspectivas culturais e geográficas sobre o tema.

Confira o vídeo explicativo:

Atualmente, há um crescente número de pesquisas que demonstram como a religiosidade e a espiritualidade impactam diretamente na saúde mental, podendo estar associadas a temas, como, por exemplo, a níveis mais baixos de depressão, suicídio, mortalidade, abuso de substâncias e estão positivamente correlacionadas com bem-estar e qualidade de vida.

“O envolvimento religioso e espiritual, como, por exemplo, a frequência semanal em um grupo religioso ou a procura por vivenciar intensamente as suas crenças e práticas, tendem a fazer com que as pessoas tenham menores níveis de depressão, recuperação mais rápida de um quadro depressivo, menores níveis de pensamentos e comportamentos suicidas e menor problema com o uso ou abuso de álcool e outras drogas”, explica o coordenador do Núcleo em Espiritualidade e Saúde (Nupes) da UFJF.

Mesmo auxiliando na melhoria da qualidade de vida e do bem-estar, o uso da religiosidade e da espiritualidade também podem trazer aspectos negativos se percebidos de forma difusa. “Por exemplo, quando a pessoa tem uma posição passiva achando que Deus vai resolver o problema sem que ela faça a parte dela. Também pode apresentar uma visão de sentir-se abandonado ou punido por Deus. Esses fatores podem estar relacionados com a pior qualidade de vida e com maiores níveis de depressão. Felizmente o uso negativo da religiosidade é bem menos frequentemente que o uso positivo”, explica Almeida.

Espiritualidade e tratamento

Sobre a integração da espiritualidade no tratamento e na psicoterapia, Almeida aponta que o trabalho deve ser realizado de forma ética pelos profissionais de saúde e que existe uma importância em conhecer e abordar todos os fatores da vida do paciente que impactam a sua saúde.

“Precisamos coletar uma história espiritual, ou seja, perguntar sobre a sua religiosidade, sobre a sua espiritualidade, se a pessoa frequenta algum lugar e como sua espiritualidade impacta o modo como lida com os problemas que está enfrentando. A partir disso, nós vamos identificar quais aspectos positivos devem ser estimulados”, ressalta o médico.

Almeida detalha que é importante perguntar ao paciente se possui o hábito de fazer uma oração, meditação ou alguma leitura que ajude a diminuir a ansiedade e estimular esse tipo de comportamento. “Por exemplo, procurar saber se frequenta um grupo religioso para reuniões de culto, se faz trabalhos voluntários, é preciso saber dessa ativação comportamental para tirar a pessoa da inércia. A partir dessas frequências, também é possível melhorar o seu círculo social e sair de algum tipo de isolamento. Esses são  alguns exemplos que podem ser utilizados de modo saudável à espiritualidade do paciente.”

Prevenção

Quando trata-se de espiritualidade e da prevenção de doenças mentais, o psiquiatra narra que a religiosidade está muito ligada, por exemplo, ao menor uso de álcool e drogas, assim como na prevenção de comportamentos suicidas. “A pessoa que está em um grupo em que não haja o uso de drogas acaba aprendendo a socializar sem uso delas, pois possui o exemplo de outras pessoas que também superaram essas dificuldades. Há um ditado que diz “Deus dá o frio conforme o cobertor” e isso significa que devemos acreditar que temos recursos e a capacidade necessária para enfrentar os desafios de modo bem-sucedido. Assim como a ideia de sentido existencial, esses são alguns exemplos de mecanismos pelos quais a espiritualidade pode prevenir doenças mentais.”

Sentido da vida para pessoas sem religião

Apesar do paciente não seguir uma religião, isso não significa que haja uma falta de relação com a espiritualidade ou algo transcendente ao mundo material, seja a crença em Deus, espíritos, orixás, anjos ou entre várias percepções de entidades transcendentes. “Uma pessoa pode não ter uma religião, mas ter uma espiritualidade. A maioria desses indivíduos possuem alguma crença espiritual. Diante desse cenário, tentamos entender esse paciente e aquilo que ele percebe como dimensão espiritual e como enxerga o propósito de vida, até mesmo nas práticas espirituais que desenvolve”, aponta Almeida.

O médico ainda diz que caso a pessoa não tenha nenhuma espiritualidade e que acredite apenas na existência da terra, e nada além disso, é preciso buscar conhecer o íntimo desse paciente. “Nós temos também que identificar o que que dá valor para esse indivíduo e qual é o propósito que pode ter na sua vida e ajudá-la nessa caminhada”, finaliza.

Spirituality and Mental Health Across Cultures

O livro foi editado pelos psiquiatras brasileiros Alexander Moreira de Almeida (ex-coordenador das Seções de Espiritualidade e Psiquiatria das Associações Mundial e Brasileira de Psiquiatria); Bruno Mosqueiro (coordenador da Seção de Espiritualidade da Associação Brasileira de Psiquiatria); e por Dinesh Bhugra (ex-presidente da Associação Mundial de Psiquiatria).

A obra está disponível na Amazon e no site da Oxford University Press, inclusive com possibilidade de visualização gratuita do primeiro capítulo que traz um panorama do campo, das evidências, razões de resistências e motivos para integrar a espiritualidade na clínica e pesquisa, bem como definições de espiritualidade e religião são discutidas e propostas.

Publicado pela editora universitária Oxford University Press, possui contribuições de pesquisadores do Brasil, do Canadá, do Egito, da Alemanha, da Índia, de Israel, da Holanda, da Nigéria, da Suécia, do Reino Unido e dos  Estados Unidos.

Outras informações: Núcleo de Espiritualidade e Saúde (Nupes)

Youtube: TV Nupes

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