E se eu te dissesse que você não sabe sobre tudo aquilo que come? Mesmo com descrições detalhadas em seus rótulos, alguns alimentos podem apresentar componentes  com quantidades acima das descritas, gerando potenciais riscos aos consumidores. Diante desse cenário, pesquisadores como Rafael Arromba de Sousa, do Departamento de Química da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), trabalham para evidenciar irregularidades em produtos alimentícios presentes no mercado e, assim, emitir alertas à população e principalmente às agências reguladoras.

Juntamente com aluno de pós-graduação, Thalles Pedrosa Lisboa, o cientista analisou amostras de suplementos alimentares derivados do soro do leite, popularmente conhecidos como whey protein. Utilizando como método a espectrometria atômica, um fenômeno de absorção que permite detectar minerais e metais pesados, buscou-se nas amostras traços de Cromo e Manganês. Para o último elemento, os resultados constatados não fugiram dos padrões rotulados — entretanto, os valores encontrados para Cromo foram superiores às descritas pelo fabricante em todas as amostras, ainda que nem todos declarem os valores desse mineral no rótulo.

Como boa parte dos resultados se mostraram muito acima dos declarados pelos fabricantes, a equipe realizou cálculos para detalhar melhor o problema. A constatação foi de que, para alguns suplementos, com apenas uma dose o usuário atinge ou excede a Ingestão Diária Recomendada (IDR) para esse micronutriente. A excessiva ingestão de qualquer elemento carece de cuidados, é o que explica Sousa. “Normalmente, as pessoas não consomem uma única dose do suplemento e muitas vezes fazem uso sem a indicação de um especialista, além disso dificilmente essa será a única fonte de cromo do usuário. Existem pessoas ingerindo o elemento em excesso e isso pode gerar danos à saúde.”

Outro alerta feito pelo pesquisador é com relação aos alimentos fortificados, aqueles que recebem adição de algum nutriente. “Hoje em dia ingerimos farinha fortificada, biscoito fortificado, leite fortificado, suco fortificado. Até que ponto esses elementos que estão sendo adicionados são necessários? Embora sejam nutrientes, o excesso pode fazer mal. Além disso, pode haver uma competição química entre os elementos. Um excesso de Cromo pode atrapalhar a absorção de ferro, por exemplo”, esclarece o cientista.

O projeto é uma continuidade dos trabalhos realizados ainda na pós-graduação do pesquisador e partem, segundo ele, de uma demanda comum na região por pesquisas relacionadas a produtos lácteos. O objetivo principal é unir a experiência acadêmica com as demandas e tendências mundiais de pesquisa. “Buscamos utilizar métodos de análise que se aproximam das formas de detecção de substâncias cada vez menores, já que os comumente utilizados muitas vezes não atendem as legislações atuais”, explica Rafael.

Carne de frango é boa fonte para consumo do nutriente de ferro, segundo análise (Foto: topntp26 / Freepik)

Carne de frango é boa fonte para consumo do nutriente de ferro, segundo análise (Foto: topntp26 / Freepik)

Descoberta
A equipe, composta também pela aluna de pós-graduação, Náira da Silva Campos Almeida, revelou ainda outro resultado relevante no campo dos estudos nutritivos. Ao analisar a carne de frango comercializada, em específico as vísceras do animal, em busca de traços de chumbo e ferro, constatou-se uma quantidade elevada de ferro em forma de nutriente nas amostras do fígado. Para o chumbo, não foram identificados inadequações.

A descoberta é tão relevante quanto inovadora, pois, segundo o pesquisador, não é comum a análise da presença desse micronutriente na carne de frango, somente em carnes vermelhas ou vegetais. “Em um outro estudo que contou com colaboradores da nutrição, avaliamos o teor bioacessível —  o mais próximo daquilo que, de fato, o corpo consegue absorver do nutriente — do ferro na carne de frango. Os resultados foram promissores, do ponto de vista que se mostram adequados como fonte deste micronutriente, não sendo a mais tradicional, porém muito viável. Como a carne de frango tem se tornado um alimento de grande preferência devido ao preço, se torna uma excelente opção para quem necessita ingerir esse nutriente”, conclui o pesquisador.