O projeto neoliberal do capitalismo brasileiro não sofreu mudanças substanciais de 1990 até 2017. A análise, feita a partir de uma perspectiva histórica, foi feita pelo secretário-geral e professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Rodrigo de Souza Filho, na palestra “Pobreza e direitos humanos em um cenário de retrocessos e conservadorismo no Brasil”. A apresentação fez parte do I Simpósio Psicologia e Realidade Brasileira da UFJF, realizado no Instituto de Ciências Humanas (ICH), na tarde desta quinta-feira, 23.
Em sua exposição, o professor fez um resgate histórico da exploração trabalhista do capitalismo ao longo do tempo. Na sua opinião, é necessário analisar a sociedade brasileira a partir da sua estrutura para entender a conjuntura. “Isso se expressa ao longo do tempo de diferentes formas. O passado facilita essa exploração, afinal, qualquer remuneração é suficiente para um país com raízes escravistas”, afirmou o professor, relembrando que o caso é similar em outros locais da América Latina.
Segundo Filho, no período entre 1930 a 1985, houve a manutenção dos traços de uma estrutura agrária e oligárquica, que manteve a exclusão dos trabalhadores rurais do processo e intensificou a redução salarial nos centros urbanos. Nesse tempo, o país sofreu mudanças econômicas importantes, como o surgimento de uma indústria nacional. “O golpe de 1964 nada mais foi do que a viabilização da consolidação do capitalismo nesta fase monopolista, mantendo a super exploração, com traços patriarcais, racistas e machistas.”
As alterações dessa realidade aconteceram a partir do fim da Ditadura Militar, quando houve um resgate dos movimentos iniciados no começo do século XX, e que foram comuns na década de 1960 no governo João Goulart (1961-1964), em meio às “reformas de base”. Nesse época, houve críticas dos movimentos e proposição de mudanças sociais, que acabaram interferindo na Constituição Federal (CF). Entretanto, esta fase não teve grande duração. “A partir de 1990, começaram os ataques às conquistas obtidas na Constituição Federal. Desde então, nos últimos 25 anos, percebe-se o avanço do capital em busca da perda de direito, das perdas de ganho. E ainda estamos no mesmo ciclo”, frisou o professor.
O palestrante lembrou que a implementação do neoliberalismo no Brasil, em vigor em outros países do mundo, foi iniciado pelo então Ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, em 1993. Entretanto, ressaltou que esse modelo teve continuidade nos governos petistas, “de forma mais branda, mais moderada”. Ele justifica que os avanços sociais no governo petista foram possibilitados pela conjuntura favorável da economia brasileira, com aumento de demanda e crescimento do valor dos produtos exportados, o que possibilitou ao governo manter o modelo originado de FHC, com ganhos e melhorias sociais. “No fim, não desconcentramos renda e riqueza, ou seja, mantivemos o mesmo modelo anterior.”
Os últimos dois anos
Rodrigo acredita que as iniciativas tomadas ou propostas pelo presidente Michel Temer fazem parte do modelo que vigora no país desde a década de 1990. Na sua visão, a crise econômica vivenciada não tem permitido ganhos para o trabalhador, como ocorreu nos governos Lula e no primeiro mandato de Dilma. “O atual governo nada mais está fazendo do que manter o modelo, mas como a situação econômica se alterou desde 2014, há esse recuo e essa retirada de direitos, que culmina com um período de avanço das forças conservadoras”, afirma.
O palestrante sinalizou para a necessidade de resistências e luta dos movimentos sociais e da população para os próximos anos. Ele concluiu sua fala, repetindo um trecho da coluna escrita pelo filósofo Vladimir Safatle, em maio de 2016, no jornal Folha de S. Paulo. “Esse não é o país de Temer, Bolsonaro, Cunha, Renan, Malafaia, Alckmin. Esse é o país de Zumbi, Prestes, Pagu, Lamarca, Francisco Julião, Darcy Ribeiro, Celso Furtado e, principalmente, nosso. Há um corpo político novo que emergirá quando a oligarquia e sua claque menos esperar.”