O livro “Drogas e Direitos Humanos. Reflexões em tempos de guerra às drogas”, que acaba de ser lançado, reúne textos produzidos por pesquisadores da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e da Universidade Federal de São João Del Rei (UFSJ).
Disponível para download gratuito, o livro discute as políticas públicas e sociais adotadas na questão das drogas, principalmente, na América Latina. As pesquisas da obra foram realizadas em diferentes áreas, como Direito, Psicologia, Serviço Social, Segurança Pública, tendo como foco a postura proibicionista às drogas e os impactos que ela tem na sociedade. Os organizadores escolheram a Editora Rede Unida, vinculada à Associação Brasileira de Saúde Coletiva, por ter o propósito de publicar coletâneas e manter o acesso aberto ao público em geral, aumentando a circulação do conhecimento.
Um dos organizadores da obra, Telmo Ronzani, professor do Departamento de Psicologia e coordenador do Centro de Referência em Pesquisa, Intervenção e Avaliação em Álcool e Outras Drogas (Crepeia) da UFJF explica que, “antes de convidarmos os autores, desenvolvemos um marco conceitual e selecionamos os trabalhos que eram coerentes, ou seja, que refletem as questões das drogas sob a perspectiva dos direitos humanos. No contexto atual, em que ações repressivas estão se tornando recorrentes e os ataques aos direitos humanos também, consideramos crucial discutir o tema, produzir e compartilhar diálogos sobre isso. Além disso, há um movimento internacional de questionamento a essas políticas repressivas, que tem iniciado discussões teóricas e ideológicas.”
Os debates relacionado a políticas sobre drogas têm crescido no ambiente externo às instituições de ensino também, uma pressão por mudanças começou a ser feita na última década, e, em alguns países, como o Uruguai, resultou em políticas mais humanitárias para abordar o assunto. Contudo, há interesses envolvidos na questão que impedem um diálogo mais aberto, os quais são analisados no livro.
O recorte regional da publicação se estende por toda a América Latina em razão do intenso tráfico de drogas praticado na região. “A partir do momento que você estabelece uma ideia de que as drogas causam mazelas sociais, você naturaliza que
essas relações se perpetuem no país. Os textos do livro questionam as políticas de drogas e o tratamento que é dado a este assunto em diferentes países latino americanos nos quais o tráfico de drogas está atrelado à ocupação de terras, corrupção, desenvolvimento social e econômico”.
Segundo o Ronzani, o debate sobre drogas no contexto brasileiro se restringe aos órgãos de segurança pública, quando deveriam ser tratados sob outras óticas, como as que são propostas na publicação. “Há mais de 40 anos estamos nessa história de guerra ao tráfico, com pessoas pobres morrendo ou sendo encarceradas e policiais morrendo. É uma guerra entre as classes mais baixas, e os grandes traficantes não são atingidos. O tráfico não diminuiu, o consumo não cessou. É evidente que está sendo abordado de forma equivocada, deveria ser analisado do ponto de vista humanitário.”
O livro apresenta também trabalhos sobre a população em situação de rua. Em janeiro, o Ipea estimou que mais de 101 mil pessoas se encontram nesta condição no Brasil, e, em Juiz de Fora, uma pesquisa identificou 880 pessoas nesta situação. “A ideia da epidemia do crack difundida no Brasil prega que as drogas é a causa para que os usuários se encontrem em situação de rua, porém, o consumo de entorpecentes é um resultado de fatores que a pessoa enfrenta vivendo nas ruas, e não a causa”, afirma Ronzani.