Dando continuidade à sua contribuição com projetos internacionais no campo das mudanças climáticas e do papel dos reservatórios aquáticos na emissão de gases do efeito estufa, o professor Nathan Barros, do programa de Pós-graduação em Ecologia e do curso de Medicina Veterinária da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), participou da pesquisa promovida por um time internacional composto por pesquisadores dos Estados Unidos (EUA), Brasil, China, Canadá e Holanda. O trabalho, publicado hoje, dia 5, pela revista BioScience (periódico vinculado à Universidade de Oxford, na Inglaterra), aprofundou as investigações sobre o impacto de reservatórios de água na atmosfera e mostrou um cenário mais grave do que o avaliado até então.
“Uma alternativa para diminuir o nível das emissões é melhorar a qualidade da água utilizada nos reservatórios.”
O trabalho se diferencia de pesquisas anteriores por observar e mensurar a emissão de todos os principais gases de efeito estufa: o dióxido de carbono (CO2), o óxido nitroso (N2O), e o metano. Este último, menos presente no imaginário coletivo, tem seu potencial de aquecimento global 34 vezes maior que o CO2. Os pesquisadores avaliam que 80% dos impactos atmosféricos causados por reservatórios sejam devidos ao metano.
O estudo concluiu que ao menos 1,3% das emissões mundiais de gases do efeito estufa são provenientes de reservatórios artificiais. Considerando a área de reservatórios no mundo como um único agente poluidor, essas emissões ficariam na oitava posição, logo após o Brasil, no ranque das principais nações emissoras.
O artigo demonstra também que a emissão de gases de efeito estufa por unidade de área supera em 25% as estimativas anteriores. Essa medida é resultado dos recentes avanços metodológicos, que quantificam melhor não só as emissões difusivas na superfície dos reservatórios, como também as emissões por bolhas, que correspondem à maior parte do total das emissões de metano nos reservatórios.
Contrariando avaliações anteriores, a pesquisa apontou que reservatórios em regiões tropicais não necessariamente são mais poluentes do que os de zonas temperadas. Até então, as áreas alagadas na Amazônia eram tidas como as principais poluidoras do gênero, devido à grande quantidade de biomassa submersa e à alta temperatura em que essas se decompõem. No entanto, outros critérios passaram a ser tão importantes quanto a biomassa alagada e a temperatura, como, por exemplo, o nível de eutrofização (processo através do qual um corpo de água adquire níveis altos de nutrientes) na água.
A informação diminui a carga das hidrelétricas brasileiras nos danos atmosféricos e considera a presença da agricultura e do uso dos solos nos arredores dos reservatórios como outro fator para potencializar as emissões.
“A emissão de reservatórios na Amazônia e outras regiões tropicais ainda é alto, mas nós descobrimos que áreas em regiões temperadas, como no Canadá e nos EUA, emitem também grande quantidade de gases de efeito estufa. Isso acontece devido ao uso do solo nos arredores do reservatório, que pode causar um aumento na entrada de matéria orgânica, nitrogênio e fósforo para a água, o que torna essas áreas mais eutróficas, aumentando a produção de metano.” explicou o professor.
Poluição preocupante de reservatórios artificiais
Reservatórios artificiais, no entanto, continuam sendo mais poluidoras que lagos naturais. Lagos naturais, estabelecidos há milhares de anos, apresentam emissões bem menores que seus correspondentes construídos, uma vez que já consumiram boa parte de sua biomassa ao longo dos anos. O mesmo princípio se aplica a reservatórios mais recentes, que dispõe de uma grande quantidade de matéria orgânica para decompor, gerando mais CO2 e metano. Apesar disso, represamentos modernos têm menor impacto ambiental, construídos segundo o modelo de fio d’água, em que a área alagada é menor e não obstrui completamente o fluxo hídrico.
Barros ressalta que, apesar da associação negativa com as hidrelétricas ser natural, a pesquisa não é contrária a essa matriz energética. Para isso, ele afirma, seria necessário observar a proporção entre impactos ambientais versus energia gerada. “O que nós estamos dizendo é que todos os reservatórios do mundo, não apenas aqueles associados às usinas hidrelétricas, representam uma emissão relevante e que isso deve ser considerado.”
Esse ano, o Painel Internacional em Mudanças Climáticas (IPCC) — mais importante órgão da área — realizou duas reuniões dedicadas a avaliar a necessidade de incluir as emissões de reservatórios no Guia de Inventário de gases de efeito estufa que será publicado em 2019. O parecer dos especialistas convidados recomendou ao IPCC a inclusão das áreas alagadas no documento, que oferece orientações aos países signatários do Protocolo de Quioto (e, mais recentemente, do Acordo de Paris) sobre como registrar suas emissões de gases do efeito estufa.
Para Nathan Barros, que participou de ambas as reuniões, um dos resultados da pesquisa é reforçar a necessidade da inclusão dos reservatórios no Guia, o que será determinado na próxima reunião do IPCC, em outubro deste ano. O Brasil, que tem sua matriz energética baseada em usinas hidrelétricas, é signatário dos dois tratados internacionais sobre o tema.
O professor Nathan Barros também já havia contribuído em um artigo publicado pela revista Nature, uma das maiores publicações científicas mundiais. O artigo, intitulado “Emissions From Amazonian Dams”, mostrou o efeito das barragens, a exemplo da polêmica usina de Belomonte, no equilíbrio do ciclo de carbono na Amazônia. O grupo responsável pela pesquisa foi coordenado pelo também pesquisador da UFJF, Fabio Roland.
Outras informações:
Acesse aqui o artigo publicado na BioScience, “Greenhouse gas emissions from reservoir water surfaces: A new global synthesis” (“Emissões de gases com efeito de estufa de superfícies de água de reservatórios: Uma nova síntese mundial”, tradução livre)