
Um dos projetos aprovados tem o propósito de tornar a aquicultura mais sustentável, aliando produção de alimentos e geração de energia limpa. (Foto: Carolina de Paula)
A Universidade Federal de Juiz de Fora conquistou cinco projetos aprovados no Programa de Atração e Fixação de Talentos do CNPq, garantindo mais de R$ 7 milhões em investimentos. A iniciativa, altamente competitiva, trouxe de volta ao Brasil pesquisadores que atuavam em instituições estrangeiras, fortalecendo a ciência nacional através de projetos inovadores.
Na chamada mais recente, foram aprovados 599 projetos em todo o país, selecionados entre mais de 2,5 mil propostas de cientistas que vivem em 34 países. Na UFJF, o resultado garantiu destaque nas áreas da Biologia, Engenharia, Física, Ecologia e Saúde, já que a Instituição teve cinco projetos aprovados com recursos que ultrapassam R$ 7 milhões. Alguns destes trabalhos já iniciaram, outros começam em 2026, mas a duração prevista é de quatro anos, com possibilidade de prorrogação por mais 12 meses.
No total, o investimento federal é de R$ 604 milhões, com bolsas de até R$ 13 mil mensais, auxílios à pesquisa que podem chegar a R$ 400 mil. Segundo a pró-reitora de Pós-Graduação e Pesquisa (Propp), Priscila Faria, captar editais desse porte fortalece a produção científica e a internacionalização, criando um ambiente mais competitivo e colaborativo. “Os novos projetos também ampliam a inserção da Universidade em agendas globais de pesquisa, aproximando a comunidade acadêmica local de temas contemporâneos urgentes, como sustentabilidade, inovação tecnológica e avanços em saúde”, completa Priscila.
Inovação contra doenças respiratórias crônicas
Uma das cientistas repatriadas é Giselle Santos Magalhães, que retorna ao Brasil para liderar pesquisas no Laboratório de Biologia Celular do Instituto de Ciências Biológicas (ICB/UFJF). Sua linha de investigação concentra-se em uma nova proposta terapêutica para doenças respiratórias com inflamação crônica, como asma e Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC). “Nosso objetivo é transformar esse conhecimento em um tratamento real, que melhore a vida dos pacientes”, destaca Giselle.
Ela explica que a equipe estuda a relação entre a inflamação pulmonar e riscos cardiovasculares, um campo ainda pouco explorado, e, em parceria com o grupo de Engenharia Elétrica da Universidade. Giselle também se dedica ao desenvolvimento de uma técnica inovadora de diagnóstico e monitoramento capaz de prever o agravamento da asma.
O trabalho prevê bolsas de iniciação científica, oportunidades para mestrado e doutorado, além de intercâmbio com instituições como UFMG, Fiocruz, USP e a própria UAM. De acordo com a pesquisadora, o objetivo é também expandir o projeto de extensão “O Primeiro Olhar para a Ciência”, criado em 2018, que aproxima crianças e adolescentes, sobretudo de escolas públicas, do universo científico.
Para ela, o retorno tem um forte significado pessoal. Mulher negra, nascida em uma favela de Belo Horizonte, ela diz sentir orgulho e senso de missão ao voltar ao Brasil com a aprovação neste edital. “Retornar é retribuir ao país todo o investimento que recebi e contribuir para o fortalecimento da saúde pública, unindo ensino, pesquisa, extensão e inovação”, contou. Giselle é doutora pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e estava na Universidad Autónoma de Madrid (UAM), na Espanha.
Entre o mundo Quântico e o Clássico
Cristhiano Duarte retorna à Universidade, onde fez graduação em Física e mestrado em Matemática, para liderar uma linha inédita de pesquisa em fundamentos de teoria quântica, conectando física, matemática e filosofia. Após experiências em instituições internacionais, como na Chapman University, nos EUA, e na University of Leeds, no Reino Unido, ele traz um projeto que investiga como acontece a transição do mundo quântico para o clássico, explorando o conceito de agência, ponto ainda pouco explorado, segundo Duarte, na física tradicional. “Queremos entender se existem princípios racionais que nos levam a descrever experimentos ora pela teoria clássica, ora pela quântica, ou até por teorias mais gerais”, explica.
A formação de estudantes é um pilar do trabalho, haja vista que o projeto prevê minicursos, seminários e parcerias com universidades nos EUA, Hungria e Alemanha, além de subprojetos pensados para iniciação científica, mestrado e doutorado. “Queremos que nossos alunos e alunas estejam em contato constante com pesquisadores de diferentes países e possam colaborar em projetos de ponta”, ressalta.
Para o pesquisador, voltar a Juiz de Fora tem um valor pessoal especial. “Mais do que retornar ao Brasil, estou voltando para a universidade que me criou. Sou fruto da expansão universitária e do Ciência Sem Fronteiras, programas que mudaram minha vida. Poder contribuir com uma linha de pesquisa nova e com a formação de novos cientistas é um sonho sendo realizado. O CNPq acertou ao buscar reverter a fuga de cérebros. Escrever o projeto foi empolgante e sou grato a todos que viabilizaram este edital”, conclui.
Modelagem do coração humano para prever doenças
Doutor em Modelagem Computacional pela UFJF e com experiência de pós-doutorado na University of Oxford (Reino Unido), Lucas Arantes Berg volta à Universidade que ajudou a construir sua trajetória acadêmica. Sua linha de pesquisa une eletrofisiologia cardíaca e computação de alto desempenho, com foco na criação de Gêmeos Digitais Cardíacos, representações computacionais personalizadas do coração humano que simulam e preveem respostas em diferentes contextos clínicos.
“Fiquei extremamente feliz quando recebi o resultado do edital. Enxergo essa oportunidade como uma forma de retribuir todo o conhecimento adquirido na UFJF, desde a graduação em Ciências Exatas até o doutorado”, conta o pesquisador. Segundo ele, seu período em Oxford foi decisivo para ampliar perspectivas. Lá, ele aprendeu técnicas inovadoras na área da computação e, segundo ele, “essas ferramentas permitem simulações mais realistas, que serão aplicadas em pacientes com cardiomiopatia dilatada, em parceria com o Hospital Universitário (HU/UFJF)”.
Atualmente, já em Juiz de Fora, Berg destaca que uma das primeiras atividades do projeto foi a realização do Workshop in Cardiac Digital Twins, em setembro, evento que promoveu a troca de experiências entre estudantes da UFJF e pesquisadores internacionais. Com uma trajetória que simboliza a internacionalização da UFJF, Berg deixa uma mensagem para jovens pesquisadores: “Ciência não se faz sozinho. É preciso curiosidade, dedicação e persistência. Quando um resultado não sai como planejado, a pergunta deve ser: ‘por que deu errado?’, e então buscar corrigir com estudo e diálogo. Nunca tenham medo de trocar experiências com pesquisadores de outros países. Ciência se constrói em comunidade”.
Medicamentos personalizados em 3D para a saúde do idoso
Laura de Andrade Junqueira volta à instituição, onde cursou da graduação ao doutorado em Ciências Farmacêuticas, para liderar uma linha de pesquisa voltada à aplicação da impressão 3D na personalização de medicamentos para o cuidado com a saúde do idoso. A proposta é desenvolver soluções farmacêuticas individualizadas capazes de atender às necessidades específicas de cada paciente, em especial aqueles que enfrentam dificuldades de deglutição ou precisam de doses ajustadas. “É uma área muito nova, que começou a se desenvolver por volta de 2013, e seguimos entre os pioneiros no país”, destaca Laura.
Durante o doutorado, Laura realizou um período sanduíche na University of Greenwich, no Reino Unido, onde trabalhou com diferentes tecnologias de impressão 3D e técnicas avançadas de caracterização, instrumentos caros e ainda pouco acessíveis no Brasil. “Lá, tive contato com todas as principais tecnologias de impressão 3D e pude aprender métodos de controle de qualidade específicos para esse tipo de produção”, explica. O projeto prevê a compra de novas impressoras 3D e insumos, além de bolsas de Iniciação Tecnológica Industrial (ITI) para estudantes de graduação, que atuarão nas etapas de pesquisa e desenvolvimento.
Com o edital de repatriação, ela viu a chance de voltar ao Brasil com estrutura e recursos para aplicar o conhecimento adquirido no exterior. “Sempre quis retornar, é um sentimento de voltar para casa. A UFJF é uma universidade de excelência, e poder coordenar um projeto nessa área emergente, aplicando o que aprendi no exterior, é uma oportunidade enorme. Mais do que um avanço científico, é um passo importante para a inovação em saúde e para o cuidado com a população idosa, que cresce cada vez mais no país”, conclui.
Aquicultura sustentável e energia solar
Com doutorado em ecologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pós-doutorados nos Estados Unidos e no Canadá, Pedro Maia Barbosa volta ao Brasil, após sete anos fora, trazendo na bagagem não apenas experiência em pesquisa internacional, mas também uma proposta ousada e desafiadora: tornar a aquicultura mais sustentável, aliando produção de alimentos e geração de energia limpa.
Seu projeto, com início das atividades em janeiro de 2026, busca integrar tanques de criação de peixes, especialmente tilápia, com painéis fotovoltaicos, com a ideia de aumentar a eficiência produtiva, reduzir custos energéticos e, ao mesmo tempo, diminuir impactos ambientais, como a emissão de gases de efeito estufa. “Nosso objetivo é testar se com esse sistema conseguimos reduzir a liberação de metano nos tanques, usando processos naturais de oxigenação da água, promovendo serviços ecossistêmicos, como o consumo desse gás por bactérias. Se der certo, teremos um método inovador e replicável para unir aquicultura e energia solar”, explica Barbosa.
O projeto, que prevê bolsas para estudantes de graduação e a inclusão de mestrandos e doutorandos, já conta com colaboradores no Brasil, na Holanda, nos Estados Unidos e na Amazônia. Segundo o pesquisador, “quando a gente sai do país, aprende a perder a timidez de buscar parcerias. Ciência se faz junto, e esse projeto só se viabiliza porque construímos uma rede de colaboração ampla.”
A decisão de retornar ao Brasil, porém, não foi simples. Com dois filhos nascidos no Canadá, onde realizou pós-doutorado na Université du Québec à Montréal admite que a escolha pesou no âmbito pessoal. Mas, do ponto de vista profissional, o entusiasmo é evidente. “Pela primeira vez vou coordenar meu próprio projeto, dar aulas na graduação e pós-graduação e buscar ampliar o alcance desta pesquisa. É um passo enorme. Estou animado com as expectativas e espero conseguir, junto com a equipe, dar uma contribuição concreta para um futuro mais sustentável”, finaliza.
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