Planta arquitetônica do Cine-Theatro Central (Foto: Divulgação)

Dois espaços culturais da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) se uniram em prol da preservação da memória. O Museu de Arte Murilo Mendes (Mamm) realizou a restauração e acondicionamento técnico de 37 plantas arquitetônicas do Cine-Theatro Central. Os procedimentos foram realizados com a participação da bolsista de Iniciação Artística (Pibiart/Pró-reitoria de Cultura – Procult), Nathália Castro, orientada pelos conservadores-restauradores Aloisio Castro e Lauro Bohnenberger, membros da equipe técnica do Laboratório de Conservação e Restauração de Papel do museu. Os documentos remontam às décadas de 1910, 1990 e 2000 e possuem uma valoração intrínseca multifacetada.

“Historicamente, este acervo oferece fontes primárias abrangentes que atravessam décadas. Além disso, como repositório de dados técnicos arquitetônicos e de engenharia civil, é inestimável para compreender a evolução do próprio edifício. Sua unicidade é evidenciada por anotações e correções manuscritas, destacando a singularidade do lote documental. Por fim, o acervo também preserva a memória institucional do Cine-Theatro Central, traçando seu desenvolvimento e sua interação com o contexto universitário”, avalia Castro, que também é superintendente do Mamm.

De acordo com Nathália, a participação neste procedimento foi de grande importância para sua formação: “eu pude colaborar em várias etapas de restauração que ainda não tinha realizado. Além disso, tive contato com a história do Cine-Theatro Central através das plantas”.

Entrega do lote documental, com a presença de Luiz Cláudio Ribeiro (Cacáudio) (de camisa preta) e de Aloisio Castro (de camisa branca) (Foto: Divulgação)

O lote documental foi entregue ao diretor do Cine-Theatro Central, Luiz Cláudio Ribeiro, o Cacáudio, no último dia 7 de maio. Na ocasião, o gestor esteve no Mamm, acompanhado de parte da equipe técnica e bolsistas do museu. Em visita ao Laboratório de Conservação e Restauração de Papel, foram apresentados os procedimentos realizados com as plantas arquitetônicas do Central, que completou 95 anos em março deste ano.

“Antes, eu via esses documentos e ficava com receio: curioso, mas com medo de que, se eu mexesse, eles se deteriorassem e perdêssemos plantas que têm um valor histórico tão importante. Quando surgiu a proposta do Mamm de realizar essa restauração, foi maravilhoso”, celebra Cacáudio.

Na conversa, o superintendente do Mamm reiterou que a consolidação deste trabalho se constitui numa ação efetiva contra o risco de dissociação. “A restauração destes documentos promove a mitigação de danos gerados a partir da perda total ou parcial de informações inerentes ao bem cultural, que podem impossibilitar a associação de dados, o controle e o conhecimento sobre o item do acervo. Ao salvaguardar esse significativo patrimônio documental, a Procult reafirma o compromisso de interlocução da UFJF com a sociedade, garantindo o acesso à pesquisa e fomentando a difusão de seu conteúdo informacional à comunidade acadêmica e ao público em geral”, avalia Castro.

Memória e preservação

Remoção de fitas adesivas dos documentos (Foto: Divulgação)

Quando chegou ao Mamm, no final de 2023, o lote documental encontrava-se enrolado e armazenado em uma caixa de papelão. Como primeiro passo para a restauração, foi realizado o diagnóstico do estado de conservação do acervo, identificando as características de deterioração presentes. “Além de estarem enroladas, as plantas apresentavam rasgos nas bordas, perda de suporte, áreas faltantes e sujidades em geral. Também podemos ressaltar que estes documentos foram danificados devido à ação danosa da luz e a acidez do papel”, enumera Castro.

Em seguida, foram realizados procedimentos de limpeza mecânica das plantas arquitetônicas, com a remoção de fitas adesivas afixadas e de vestígios de tintas incrustados no verso das obras. As dobras e vincos foram abrandados com a aplicação de uma espátula térmica, enquanto as sujidades foram removidas utilizando-se um pó de borracha específico.

Para desenrolar o acervo, a equipe associou o processo de umidificação com a varredura de trincha (tipo de pincel). “Com cada documento aberto, foi aspergida uma solução de hidróxido de cálcio, que, com o auxílio da ação mecânica da trincha, favorece o aplanamento dele”, explica.

Aloisio Castro realiza processo de imersão do documento em solução aquosa desacidificante (Foto: Divulgação)

Observada a resistência do papel e dos pigmentos, procedeu-se à imersão do documento em solução aquosa desacidificante. Esse procedimento foi realizado a fim de remover as manchas d’água presentes nos documentos, bem como atenuar o processo de desedificação do suporte celulósico. O banho foi seguido da secagem da obra com o processo de disposição sobre papel mata-borrão, material que permite um alto poder de absorção. As áreas faltantes do documento foram reconstituídas a partir da técnica de velatura e obturação com papel japonês.

“Após estes tratamentos, podemos observar que as manchas se atenuaram bastante, mas não ao ponto de desaparecerem. É importante, também, observar que as reposições de partes que faltam ou que se deterioraram devem se integrar harmoniosamente com o ‘todo’. Isso garante que a restauração não falsifique a autenticidade histórica ou artística”, afirma Castro.

Premissa parecida é adotada no procedimento de reintegração estética dos documentos arquivísticos. Segundo o superintendente do Mamm, a equipe segue os conceitos estabelecidos pelo professor belga Paul Philippot (1925-2016): “o pesquisador afirma que, embora seja impossível resumir o processo criativo, a reconstituição é concebível, até completamente justificada, se a entendermos como um ato de interpretação crítica que pretende restabelecer a continuidade formal quebrada”.

Acondicionamento das plantas arquitetônicas em caixa Solander (Foto: Divulgação)

Para finalizar a restauração, o lote documental recebeu um novo acondicionamento técnico. Foram confeccionadas jaquetas em filme de poliéster sob medida para cada item. Além disso, uma caixa Solander, fabricada em papelão com reserva alcalina e revestimentos neutros e inertes de espuma de poliestireno expandido, foi disponibilizada para guardar as plantas arquitetônicas.

“As jaquetas de poliéster possibilitam o manuseio direto com os documentos sem que seja realizado o contato direto com o material, evitando o contato com sujidades e o desgaste abrasivo. Já a caixa Solander funciona como o primeiro nível envoltório que protege o bem cultural contra a ação de agentes de deterioração físicos, químicos e biológicos. Estas duas camadas de proteção promovem o prolongamento da vida útil do bem cultural”, finaliza.

Outras informações: (32) 2102-3583 – Museu de Arte Murilo Mendes (Mamm)

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