Desenvolver conhecimentos e tecnologias para aprimorar as operações nas ferrovias brasileiras foi o intuito da Vale ao iniciar, em 2014, uma parceria com a USP e outras universidades, selecionadas em cada estado onde a empresa opera, para o projeto . Em Minas Gerais, a Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) foi escolhida, em função do grupo de pesquisa coordenado pelo professor Luiz Henrique Dias Alves. Atualmente o grupo conduz o projeto “Caracterização e modelagem estatística preditiva das soldas e regiões afetadas pela solda em trilhos”, para aumentar a resistência da solda e diminuir o risco de fraturas de trilhos e, assim, evitar acidentes.
Alguns artefatos ferroviários estão espalhados pela sala do professor, na Faculdade de Engenharia de Produção da UFJF. Ao lado de sua mesa, uma sessão de roda de trem serve de lembrança de seu mestrado sobre mecanismos de desgaste de material. Outro, com fins mais práticos, é o quite de soldagem de trilhos, tema da pesquisa atual.
“A soldagem é um processo clássico em qualquer tipo de produção com componentes de aço. No entanto, se formos avaliar um ponto provável de falha numa estrutura, será provavelmente na solda”, avaliou Luiz Henrique. Aproveitando o planejamento estratégico da Vale — que atualmente investe numa nova linha de soldagem, a ser implementada na Estrada de Ferro Carajás — o grupo de pesquisadores irá acompanhar todo o processo de fabricação em campo, compilando as técnicas e materiais utilizados. Posteriormente, amostras de trilhos soldados coletados nas visitas serão analisadas nos laboratórios da Faculdade, a partir de sua composição química, estrutura micro e macroscópica e por seu comportamento nos testes de resistência mecânica.
O resultado dessa investigação, somado aos conhecimentos científicos já estabelecidos sobre o tema, permitirão aos pesquisadores formular um modelo matemático capaz de prever como as variáveis afetam a soldagem dos trilhos, permitindo assim propor técnicas de fabricação mais segura e uma solda de melhor qualidade. Atualmente, o projeto, que tem três professores pesquisadores e cinco alunos de Iniciação Científica da UFJF envolvidos entra em sua 2ª fase e está focado no processo de soldagem por aluminotermia (realizado in loco, utilizando uma mistura de materiais metálicos em pó, colocados em um molde, sobre o espaço entre os trilhos, que são liquefeitos por uma reação química com forte liberação de calor atingindo uma temperatura de 2400°C).
Ferrovias, mineração e o Brasil
O casamento entre o Brasil e a mineração vem de séculos, e parece continuar forte, tendo imenso impacto para a economia e para a dinâmica do país. Só em 2013, o setor rendeu um lucro bruto de US$ 85 bilhões, o equivalente a 4% do PIB nacional no mesmo período. Quase tão antigo quanto essa relação é o papel central da ferrovia para a atividade extrativista, escoando o produto das minas até os portos e centros industriais.
Apesar da importância do campo e de sua tradição histórica no Brasil, a maior parte dos materiais e tecnologias utilizados na construção das estradas de ferro são importados. Escasso, também, é o conhecimento sobre o tema compilado ou desenvolvido no país. Buscando modificar esse cenário, nasceu o consórcio de pesquisa Cátedra Roda-Trilho, encabeçado pela Vale e pela USP, e dentro do qual se encontra o projeto de Luiz Henrique (1º a ser aprovado pelo programa).
Com duração de 10 anos, o Cátedra irá financiar pesquisas e a criação de estruturas laboratoriais nas instituições parceiras, além de promover o intercâmbio de pesquisadores. Para o professor, no entanto, o principal benefício do consórcio é o desenvolvimento e internalização do conhecimento além da formação de profissionais no campo, uma vez que o programa irá oferecer bolsas de Iniciação Científica e Pós-graduação para estudantes das IES, pesquisadores e pessoas-chave da própria empresa. “Ao longo do programa, nós deveremos apresentar artigos e trabalhos de conclusão de curso sobre o tema, dissertações de mestrado e teses de doutorado e pós-doutorado. Nosso plano é convidar pessoas da Vale para assistirem as apresentações das defesas das monografias e dissertações, colocando-as em contato com nossos alunos, que são realmente formidáveis e representam o verdadeiro conhecimento”
Importância estratégica
Uma das maiores empresas de minas e energia do mundo, a Vale é dona de duas ferrovias no Brasil, que juntas transportam cerca de 240 milhões de toneladas de minério, anualmente, ao longo de quase 1800 quilômetros de extensão de trilhos soldados. Nesse contexto, a pesquisa de Luiz Henrique tem grande importância para a própria estrutura logística da companhia.
Como explicou o professor, acidentes e descarrilamentos de trens tem como uma das principais causas a fratura dos trilhos e, dessa forma, as regiões soldadas são pontos de risco, cuja fabricação deve ser extremamente controlada. Trabalhando muito próximo do planejamento estratégico da empresa, Luiz Henrique avaliou que um dos desafios para a cooperação entre Universidade e iniciativa privada é sincronizar o cronograma das duas entidades.
“É necessário ter um senso de pressa, porque existe uma velocidade no mundo corporativo a qual nós temos que nos adequar. É interessante lembrar que os problemas a serem resolvidos não estão aqui dentro, na minha sala. Eles estão em campo. E quando você vai a campo, você tem coisas para ajudar resolver e para aprender, e depois melhorar a qualidade da sua aula. Além disso, nos dá a oportunidade de contribuir pararealmente melhorar o desempenho da indústria nacional”