Eventos climáticos extremos parecem se tornar cada vez mais frequentes no mundo – e essa discussão tem sido politizada, ainda que evidências científicas confirmem tal percepção. Para a professora do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Aline Procópio, o grande desafio atual não é apenas entender os fenômenos, mas “diminuir a lacuna entre informações climáticas disponíveis e sua utilização pelos tomadores de decisão”.
A docente explica que o efeito estufa é um processo natural de aquecimento da atmosfera causado por gases, responsável por manter a temperatura média da atmosfera nos limites que conhecemos, necessários para a vida na Terra. No entanto, as atividades humanas, impulsionadas pela industrialização, especialmente, a partir do século XX, intensificaram o impacto desses gases no mundo e nas mudanças climáticas. São os chamados efeitos antrópicos.
O grande desafio é diminuir a lacuna entre informações climáticas disponíveis e sua utilização pelos tomadores de decisão
Os processos antrópicos são recentes quando comparados aos naturais como as variações na órbita da Terra, por exemplo. Esses efeitos naturais, ao contrário dos antrópicos, ocasionam alterações numa escala temporal maior, tendo seus efeitos percebidos no decorrer de milhares de anos.
“Há diversos indicadores-chave das mudanças climáticas como o aumento da temperatura média global, a elevação do nível do mar, o derretimento das calotas polares e glaciais e o aumento na frequência de eventos extremos como furacões, ondas de calor, incêndios florestais, secas, inundações, entre outros.”
Por isso, não só o El Niño tem contribuído para a onda de calor sobre grande parte do Brasil e para as fortes chuvas na Região Sul, as mudanças climáticas também têm seu peso. Segundo a especialista, as chuvas extremas sempre ocorreram, mas as mudanças climáticas podem afetar o regime de precipitação e a frequência dos eventos, causando inundações bruscas e também as secas. “É fundamental identificarmos as vulnerabilidades locais para nos adaptarmos a essas situações, visto que podem ocorrer no futuro crises hídricas ligadas ao abastecimento urbano, crises energéticas, doenças de veiculação hídrica, entre outros.”
Além dos problemas causados no meio ambiente, elementos encontrados na atmosfera como material particulado, óxidos de enxofre, óxidos de nitrogênio, ozônio e monóxido de carbono também causam efeitos adversos à saúde humana. As principais fontes de emissão de poluentes para a atmosfera são os veículos automotores, processos industriais, as termelétricas, a queima de biomassa, a ressuspensão de poeira do solo, entre outros.
“Mesmo se todas as fontes de emissão gases poluentes lançadas pelo homem fossem eliminadas, num cenário utópico, ainda sentiríamos os efeitos das mudanças climáticas por décadas, dado o longo tempo de permanência desses gases na atmosfera terrestre. Contudo, as evidências atuais e as projeções futuras são claras, a temperatura média do planeta está aumentando e temos vulnerabilidades, logo precisamos tomar providências.”
Conforme a professora Aline Procópio, há dois pontos-chave: ações imediatas para estabilizar as emissões de gases de efeito estufa e os ajustes ambientais e socioeconômicos em resposta às mudanças climáticas. Para ela, as administrações públicas precisam inserir a gestão de risco da mudança do clima nos planos e políticas públicas setoriais e temáticas. Também é necessário uma elaboração de planos locais de adaptação urbana, cujas ações devem estar alinhadas com o fomento do setor produtivo e ajustadas com as metas nacionais de desenvolvimento socioeconômico e de redução das desigualdades regionais.
Preservação da vegetação
Um dos fatores que contribuem para o aumento das temperaturas e poluição é o desmatamento. No Brasil foram perdidos mais de dois milhões de hectares em seus biomas em 2022, segundo o Relatório Anual do Desmatamento do Brasil. O número representa um aumento de 22,3%, o que totaliza 20.572 km2 de área desmatada em relação ao ano de 2021.
A arborização contribui para a estabilização climática e para o equilíbrio do ecossistema. Porém, com cada vez menos vegetação em território nacional, a situação leva ao aumento de temperaturas, ao acúmulo de poluentes, desregula a umidade e fertilidade do solo, dentre outros fatores prejudiciais ao meio ambiente e à saúde.
No contexto urbano, estudos de diferentes campos do conhecimento já reconheceram a influência benéfica de áreas verdes. De acordo com o biólogo e diretor do Jardim Botânico da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Breno Motta, os fragmentos florestais e a arborização urbana representam melhoria da qualidade de vida local, trazendo benefícios ambientais, socioculturais e econômicos – entre eles, abrigo para a fauna, desenvolvimento de processos ecológicos, estabilidade do microclima, interceptação de chuvas e manutenção das nascentes.
Ainda de acordo com ele, as áreas verdes atuam reduzindo os índices de poeiras e alguns poluentes atmosféricos em suspensão, regulando a umidade e temperatura do ar, mantendo a permeabilidade, fertilidade e umidade do solo, protegendo-o contra erosão e reduzindo os níveis de ruídos sonoros, ampliando a qualidade de vida de forma geral. Além disso, geram a absorção da radiação solar, possuem a capacidade de modificar o microclima, aumentando a umidade e diminuindo a temperatura do ar, através de seus processos fisiológicos.
“As árvores proporcionam ainda um efeito de sombreamento, melhoram a qualidade do ar e conferem equilíbrio estético. A vegetação, portanto, tem um papel importante no estabelecimento da relação entre o homem e o meio natural, garantindo-lhe melhor qualidade de vida.”
A vegetação (ou a falta dela) é também causa e consequência das mudanças climáticas, porque também sofrem seus efeitos diretos. Breno Motta explica que, para entender a forma como as diferentes espécies de plantas irão responder a essas mudanças, é essencial compreender os seus mecanismos fisiológicos de adaptação ao microclima em que estão inseridas, por meio do estímulo à pesquisa de ecossistemas globais.
“Realizar projeções sobre a reação das diferentes espécies de plantas às mudanças climáticas revela grandes desafios e, por isso, estudos adicionais sobre a biodiversidade são necessários para apoiar o desenvolvimento de políticas públicas voltadas para a conservação ambiental e efeitos das mudanças climáticas sobre a biodiversidade.”
Indícios apontam que possivelmente algumas espécies de árvores e plantas poderão ser extinguidas ou passar por microsítios favoráveis, que são regiões com características ou condições únicas. Espécies que ocorrem em áreas de baixa altitude, por exemplo, irão migrar para áreas de maior altitude, para compensar o acréscimo de temperatura.
Unidades de conservação ambiental
O Jardim Botânico da UFJF integra um dos maiores remanescentes de Floresta Atlântica em área urbana do Brasil, a Mata do Krambeck. Mais de 500 espécies vegetais já foram identificadas na área do Jardim, entre plantas nativas, ornamentais, populações raras ou em extinção. Além dele, há outros pontos de Juiz de Fora que são considerados como unidades de conservação ambiental como Parque da Lajinha, Morro do Cristo, Parque Halfeld, Museu Mariano Procópio, além das florestas municipais em 11 pontos da cidade e as reservas biológicas municipal do Poço D’anta e Santa Cândida.