A Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e a Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) firmaram uma parceria para a criação de um projeto de implantação de uma usina que transformará resíduos orgânicos da cidade em energia e combustível. A iniciativa visa promover a sustentabilidade e reduzir o impacto ambiental, tornando a administração municipal de Juiz de Fora a primeira do Brasil a desenvolver um projeto desse tipo.
O projeto, coordenado pelo professor Emanuel Brandt, do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFJF, conta com a participação dos professores Marcos Borges, Sue Ellen Bottrel e Samuel Castro, do mesmo departamento, além do professor Marcos Borges, do curso de Engenharia de Produção da UFJF. A iniciativa abrange estudos de viabilidade técnica e econômica, a elaboração de projetos de engenharia e a obtenção das licenças necessárias para a construção da usina.
Capacidade e processo de tratamento
Com conclusão prevista para 2027, a usina será instalada em um terreno de 16 mil m², localizado no bairro Benfica, próximo à BR-040. A escolha do local se deve à sua proximidade com a rede da Companhia de Gás de Minas Gerais (Gasmig), facilitando a injeção de biometano no gasoduto, além de contar com a infraestrutura elétrica necessária para a operação.
Com capacidade para processar até 100 toneladas diárias de resíduos, a usina poderá receber materiais de alguns grandes geradores, como shoppings, supermercados, indústrias alimentícias, estações de tratamento de esgoto e da coleta seletiva da cidade. O tratamento será realizado por biodigestores, garantindo alta eficiência na conversão dos resíduos em energia e subprodutos reaproveitáveis.
A usina será capaz de gerar três produtos essenciais: energia elétrica a partir do biogás gerado no tratamento dos resíduos orgânicos; biometano, um combustível semelhante ao gás natural, que poderá abastecer a frota de ônibus municipais e outras instalações públicas; e biofertilizantes, que serão usados tanto nas áreas verdes da cidade quanto por produtores rurais da região.

Projeto prevê uma usina com capacidade para processar até 100 toneladas diárias de resíduos orgãnicos (Imagem ilustrativa/divulgação)
O biometano gerado terá capacidade para abastecer entre 30 e 40 ônibus municipais, proporcionando uma economia de até R$1,1 milhão por mês com a substituição do diesel. Além disso, a produção diária de oito toneladas de biofertilizantes contribuirá para reduzir a necessidade do uso de fertilizantes químicos na cidade e na região.
Para o coordenador do projeto, a iniciativa coloca Juiz de Fora na vanguarda da gestão de resíduos no Brasil. A ação faz parte da proposta ratificada pela Lei Municipal de Orgânicos nº 14.402, de 2022, e também está incluída no programa Lixo Zero, um projeto de lei municipal encaminhado à Câmara.
“Segundo a caracterização gravimétrica dos resíduos de Juiz de Fora, realizada pela UFJF em convênio anterior, as frações com potencial de destinação alternativa para recuperação material e energética representaram mais de 65% do total. Assim, estamos dando um grande passo rumo ao aproveitamento dessas frações dos resíduos da cidade”, explica o coordenador.
Referência nacional em inovação

Professor Emanuel Brandt, do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFJF, coordenará o projeto, que, segundo ele, contribuirá para a descarbonização e a sustentabilidade urbana (Foto: Arquivo pessoal)
Atualmente, o Brasil possui mais de 1.500 usinas de biogás em operação, sendo Paraná e Minas Gerais os estados com maior representatividade no setor. No entanto, apenas cerca de 30 dessas plantas produzem biometano, enquanto outras 30 estão em processo de autorização pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Nos próximos cinco anos, espera-se que cerca de 140 novos projetos entrem em operação, totalizando aproximadamente 200 usinas de biometano em funcionamento no país.
O projeto desenvolvido para Juiz de Fora leva em consideração esse avanço tecnológico e o atual grau de maturidade das instalações já existentes no Brasil e no mundo. Além disso, está alinhado às diretrizes da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que incentiva a valorização energética dos resíduos urbanos. A iniciativa também se baseia em projetos anteriores da UFJF, que, além da realização de estudos gravimétricos, envolveram visitas a empreendimentos de referência no país, análises de viabilidade, modelagens e simulações para subsidiar a tomada de decisão e definir as melhores alternativas para o município.
Segundo o professor Emanuel Brandt, a iniciativa tem como diferencial a produção e o uso do biometano pela própria prefeitura, algo ainda inédito no setor de saneamento municipal.
“As iniciativas de biometano são mais voltadas para o setor industrial ou agronegócio, não existindo iniciativa nessa escala que estamos propondo para o setor de saneamento municipal. Existem municípios que produzem biometano no aterro sanitário, como ocorre na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, em Nova Iguaçu. Entretanto, a ideia é diferente, vem antes do aterro”, explica Brandt.
O professor destaca que grandes cidades brasileiras, como São Paulo, Rio de Janeiro e Goiânia, já discutem a adoção de ônibus movidos a biometano e gás natural no transporte público. No entanto, até o momento, nenhum município implementou um sistema integrado que gere o próprio biocombustível a partir dos resíduos urbanos.
Outro fator que reforça a relevância do projeto é a Lei do Combustível do Futuro, que estabelece metas para a mistura de biometano no gás natural, começando com 1% e atingindo 10% até 2034. Esse cenário impulsiona a busca por fontes sustentáveis de energia nos municípios brasileiros.
“O projeto coloca Juiz de Fora no mapa da inovação em gestão de resíduos no Brasil. Com a produção local de biometano, o município não apenas reduzirá custos operacionais, mas também contribuirá para a descarbonização e a sustentabilidade urbana”, ressalta Brandt.