“Aqueles que desconhecem sua história, origem e cultura são como árvores sem raízes.” A reflexão do ativista jamaicano Marcus Garvey sintetiza a relevância de revisitar o legado africano no Brasil, especialmente no Dia da Consciência Negra, comemorado nesta quarta-feira, 20 de novembro.
Instituída como feriado nacional em 2023 pela Lei Nº 14.759, a data é um marco para que o país abrace sua história por completo, reconhecendo o papel histórico da população negra. A recente escolha do tema da redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) – “Desafios para a valorização da cultura africana no Brasil” – também evidencia a necessidade de promover este debate no ambiente educacional e na sociedade em geral.
A valorização dessa reflexão e o enfrentamento ao racismo passam, necessariamente, pelo conhecimento das raízes históricas e culturais brasileiras. A leitura é um dos caminhos para isso. Nesse contexto, a Editora UFJF apresenta obras em seu catálogo que resgatam e valorizam a memória afro-brasileira, tanto em nível local quanto nacional. Como parte da iniciativa da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) de democratização do conhecimento, os livros estão disponíveis gratuitamente.
As primeiras indicações abarcam as obras da professora Fernanda Thomaz, da UFJF, que também lidera a Coordenação-Geral de Memória e Verdade da Escravidão e do Tráfico Transatlântico de Pessoas Escravizadas (CGMET), no Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. Seus livros abordam as culturas dos povos africanos, reforçando a relevância de estudar esses temas nas escolas brasileiras. Com uma pesquisa profunda, ela analisa não apenas o impacto da escravidão no continente africano, mas também como os processos de migração forçada moldaram as Américas.
Para fechar as indicações, já no contexto local, a Editora apresenta o terceiro volume da coletânea Mosaico, uma coletânea que apresenta personalidades negras importantes para a cultura e a história de Juiz de Fora. Confira os detalhes e os links abaixo.
Afrikas: histórias, culturas e educação
Logo na apresentação, a autora destaca a escolha do título. A grafia de “Afrikas”, diferente do português, é proposital: reflete a forma como diversos grupos étnicos no continente a denominam em sua língua. “A Afrika nos cabe aqui por nos permitir compreender as múltiplas formas de perceber, sentir e vivenciar realidades em um continente múltiplo e diverso, mas que muitas vezes nos é apresentado dentro de uma uniformidade.” Nesse livro, a autora convida o leitor a conhecer a Afrika para além dos estereótipos que ainda permeiam o imaginário popular.
Casaco que se despe pelas costas: história do colonialismo, justiça e agências africanas em Moçambique
Nesta obra, Fernanda Thomaz foca nas culturas do norte de Moçambique, especialmente nas dinâmicas judiciais entre os macondes (grupo étnico bantu) sob a jurisdição de tribunais coloniais portugueses. A obra, fruto de uma pesquisa profunda, revela como as tradições locais e o sistema colonial dialogaram e se confrontaram em um contexto histórico complexo.
Um breve passeio pela história e culturas africanas
Nesta obra, a autora oferece um panorama abrangente sobre a história, a geografia e as culturas da África. O livro destaca as contribuições africanas para a cultura do nosso país, abordando a música, dança, culinária e práticas religiosas. Thomaz também ressalta o impacto do processo migratório forçado de africanos para as Américas, que trouxe concepções de mundo, ideias, hábitos, ritmos e técnicas para este lado do Atlântico. Todos os pontos abordados em suas obras ajudam a compreender melhor a história do continente africano, e a própria história do Brasil, questionando a visão eurocentrista ainda presente nas escolas.
Mosaico, vol. 3: memórias de Juiz de Fora
Lançado este ano, o Mosaico, vol. 3 é uma coletânea que resgata memórias de moradores de diversos bairros, personalidades importantes, espaços e instituições que ajudam a contar a história de Juiz de Fora. Neste volume, o projeto destaca algumas personalidades negras cujas histórias se entrelaçam com a cidade.
Entre elas, está Adenilde Petrina, uma das responsáveis pela criação da rádio comunitária Mega FM, fundada em 1997, tendo o seu funcionamento interrompido em 2007. Após o encerramento da rádio comunitária, Adenilde, juntamente a outras pessoas da comunidade, criaram no ano de 2013 o Coletivo Vozes da Rua.
Outra personalidade é o ex-jogador Ademilson Correa, com passagem pelo Tupi FC, que marcou a história do clube juiz-forano e se tornou um ídolo no coração dos torcedores. Aposentado dos gramados, ele segue atuando como técnico no Sport Clube Ypiranga.
Flávio Aloísio Carneiro, também conhecido como Flavinho da Juventude, também está no livro. Figura importante na cultura do samba de Juiz de Fora, participou da fundação da escola de samba Juventude Imperial, no bairro Vila Olavo Costa.
João Baptista Pereira é o nome de batismo de Joãozinho da Percussão, outra pessoa que está presente no Mosaico. Joãozinho foi um músico com grande destaque no cenário artístico brasileiro, atuando com grandes nomes da MPB. Seu talento não ficou restrito apenas à cidade, mas avançou pelo Brasil e as fronteiras de outros países, como o México e os Estados Unidos.
Um nome que, além de constar na obra, também se destacou recentemente no município, é Jeferson da Silva Januário, conhecido como Negro Bússola. Eleito este ano como vereador de Juiz de Fora, ele é um líder comunitário, produtor cultural, gestor de recursos humanos e presidente fundador da Casa de Cultura Evailton Vilela.
Egressa da UFJF, a artista Alessandra Crispin é outra presença confirmada nas páginas do Mosaico. Cantora, compositora e instrumentista, é um dos grandes nomes no cenário musical local, trazendo em suas letras a ancestralidade e o peso de ser uma mulher negra no Brasil.
Todas essas trajetórias são narradas ao lado de episódios que revelam a contribuição de profissionais da informação, esporte e cultura, ampliando nossa compreensão sobre a memória coletiva de Juiz de Fora.