As discussões incitadas por movimentos feministas, políticos e sociais em busca de assegurar direitos permeiam a sociedade contemporânea. Contextos de sensibilidade coletiva, como os recentes conflitos no Oriente Médio, a emergência de governos de extrema direita em países da América Latina e ataques que visam principalmente mulheres e crianças, intensificam as reflexões sobre esses temas, tanto do ponto de vista coletivo quanto individual.
Nesse sentido, para alavancar o diálogo não só no cenário social, mas também no meio acadêmico, o Laboratório de História Política e Social (Lahps), da Universidade Federal de Juiz de Fora, promove um seminário para sediar discussões sobre ditaduras, ultradireitas, “novas direitas”, história transnacional, mulheres em contextos políticos autoritários, entre outros temas que ecoam do passado para a atualidade.
Em sua quinta edição, o Seminário do Lahps acontece entre os dias 4 e 8 de dezembro, com simpósios temáticos, mesas de debates e minicursos abertos para o público geral e para a comunidade acadêmica. É possível fazer inscrição on-line para os minicursos e acompanhar a programação completa no Instagram do laboratório.
O professor Odilon Caldeira Neto, coordenador do Lahps e organizador do evento, destaca a importância de analisar as dinâmicas político-sociais, tanto à esquerda quanto à direita, em diferentes períodos históricos. “Pensar sobre esses padrões e naturezas políticas comuns em um espaço, seja ele de circulação de ideias ou também de articulação política, é pensar em como se articula a defesa da democracia, dos direitos humanos, de minorias e de movimentos sociais – seja em contraposição a essas ideias, seja também, em alguma medida, em promoção de ideias comuns.”
Minicursos mapeiam o autoritarismo durante o século XX até as “novas direitas”
Ainda que o regime ditatorial do Brasil tenha terminado em 1985, cerca de 72% da população mundial ainda vive sob regimes autoritários. Essa porcentagem demonstra que 7 em cada 10 pessoas vivem em países classificados como “sem liberdade e sem democracia”, de acordo com dados do Instituto V-dem e do relatório da Freedom House de 2022, respectivamente. Essa realidade ressalta a contínua relevância dos estudos sobre regimes autoritários e movimentos políticos, abordados no minicurso “‘Novas direitas’: Modos de usar”.
Para compreender esse cenário, Neto destaca que o evento discutirá, a partir de uma perspectiva historiográfica, crítica e analítica, como a memória desses regimes e movimentos autoritários ainda ressoam na sociedade – desde o fascismo na primeira metade do século XX até ditaduras civis-militares ao longo da segunda metade do mesmo século – e como as expressões das “novas direitas” se rearticulam a partir dessas experiências.
O professor explica que é importante considerar a dinâmica regional para entender tanto fenômenos históricos – como a propagação de ideias de movimentos autoritários e fascistas na América Latina e no espaço ibero-americano ao longo do século XX – quanto para refletir sobre a formação de características comuns entre ditaduras e processos de transição democrática nessas regiões. Neto destaca que as correntes conhecidas como “novas direitas”, assim como outras tendências direitistas, compartilham alguns desses traços similares.
Conforme o pesquisador, o fenômeno das “novas direitas” possui um reflexo direto no Brasil e na América Latina, evidenciando uma forma de comemoração às ditaduras já vencidas no território, mas que continuam sendo aclamadas em grupos conservadores, autoritários e antidemocráticos. O seminário oferecerá uma análise abrangente sobre esse cenário, de forma a compreender o fenômeno em sua pluralidade. Um exemplo será o minicurso “História comparada, história transnacional: circulação de ideias entre fronteiras”, que se concentrará em examinar esses fenômenos sob uma abordagem analítica que engloba estudos de casos comparativos e a dinâmica de intercâmbio de ideias entre diferentes nações e continentes.
As diferentes perspectivas sobre o papel das mulheres em regimes autoritários, onde a sobrevivência está ligada à resistência, fecham o ciclo de temáticas abordadas no seminário. O olhar sob a mulher também se reinventa no contexto da ascensão das “novas direitas”, como será trabalhado no minicurso “História das Mulheres em contextos políticos autoritários em uma perspectiva transnacional no entreguerras”.
Caldeira Neto ainda pontua que os movimentos feministas estão presentes nos discursos dos grupos que fazem parte desssa ascensão, pois “muitos deles querem estabelecer um tipo específico de sociedade e de participação das mulheres, sob uma tônica e uma ótica conservadora, heteronormativa e patriarcal”. Tendo isso em mente, o minicurso será focado na análise da interação entre mulheres e contextos políticos autoritários, abordando tanto a perseguição a movimentos e lideranças feministas quanto a abordagem adotada por regimes autoritários ou fascistas para definir o papel das mulheres na sociedade.
Diálogos históricos nas mesas-redondas e nos seminários temáticos
A mesa de abertura do V Seminário do Laboratório de História Política e Social será na segunda-feira, dia 4 de novembro, às 19h, no Anfiteatro 3 do ICH. O evento contará com os professores Rodrigo Patto Sá Motta da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Tatyana de Amaral Maia e Fernando Perlatto, ambos da UFJF, para discutir sobre o tema “Ditaduras: história e historiografia”.
Já na quarta-feira, dia 6 de dezembro, às 19h, o seminário prossegue com uma mesa dedicada ao estudo do fascismo, com a participação da professora Maria Ines Valdivida da Universidade de San Martín de Porres, professora Toni Morant da Universitat de València, professora Cláudia Viscardi e professor Leandro Pereira Gonçalves, ambos da UFJF. Eles explorarão o tema “Fascismos em debate”, também no Anfiteatro 3.
A mesa de encerramento do seminário, programada para 7 de dezembro, quinta-feira, às 19h, focará nas ultradireitas, com a presença da professora Isabela Kalil da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (Fespsp), David Magalhães da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (Puc-SP), Jorge Chaloub da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e UFJF, e Odilon Caldeira Neto da UFJF. Ela acontecerá no Anfiteatro 3, que também sediará, neste mesmo dia e local, às 14h, uma mesa-redonda a fim de discutir sobre as pesquisas pós-doutorais em desenvolvimento, bem como os resultados das já finalizadas.
Além das mesas-redondas, o seminário inclui apresentações no Simpósio Temático, cobrindo uma variedade de tópicos relacionados às novas direitas, como os desdobramentos do movimento Escola Sem Partido, por exemplo. As apresentações também abordarão assuntos como identitarismo, a memória da ditadura militar, nacionalismo autoritário, e questões de gênero, raça e classe.
Os temas específicos como a construção da mulher ideal na imprensa, lusotropicalismo e integralismo, e o movimento libertário serão igualmente explorados. O simpósio ainda oferecerá análises sobre o simbolismo na extrema direita e as metodologias de pesquisa pertinentes.
“Em torno dessas temáticas chaves, o laboratório compreende uma grande diversidade de pesquisadores e estudantes que estão em atuação e em formação. Eles auxiliam a complexificar esses emaranhados e essas tramas ainda tão atuais nas sociedades globais. A questão do autoritarismo e dos discursos anti-democráticos, são temas muito complexos, que demandam uma análise muito apurada, do ponto de vista analítico, para se pensar essa urgência”, pontua Odilon Caldeira Neto.
Os interessados podem fazer as inscrições através do formulário online. Os participantes irão receber certificados de participação e a equipe de organização está disponível para contato por meio do Instagram e do X (antigo Twitter).