Você já ouviu uma música e se perguntou se ela realmente foi tocada por um ser humano? É bem provável que essa dúvida nunca tenha passado pela sua cabeça. Desde o fim do século XIX, já existem canções produzidas para serem tocadas sem a necessidade do músico, por um instrumento conhecido como pianola ou piano mecânico. Com a era digital, surgiram as pianolas digitais, apelidadas de “piano-robô”. O professor do Bacharelado em Composição Musical da UFJF, Luiz Castelões, produziu uma música para essa engenhoca. Intitulada “Black MIDI”, a composição de sua autoria foi selecionada como finalista da MAP Competição Internacional de Música 2023 (MAP-IMC, da sigla em inglês), de Los Angeles, Califórnia.
Enquanto as pianolas transformavam em melodias as notas marcadas em rolos de papel perfurado, de forma automática e sem a necessidade da presença física de um pianista, atualmente os pianos digitais trazem uma versão mais moderna, que se diferenciam das antigas por serem alimentadas por arquivos digitais em formato MIDI, ao invés de papel. Por isso, já é possível trazer à vida composições que extrapolam não só a presença humana, como seus limites físicos – obras impossíveis de serem tocadas por nós, porém executadas pelas máquinas que criamos.
O processo de compor uma música para esse tipo de instrumento é muito semelhante à criação para um pianista humano: o compositor escreve a partitura à mão (com lápis e papel mesmo), transcreve para o computador, gera um arquivo digital e, caso seja necessário, o corrige conforme julgar correto. Porém, Castelões diz que o objetivo geral em criar para um piano-robô é deixar a imaginação musical ainda mais livre.
De acordo com ele, as obras pensadas para o robô representam uma possibilidade de liberdade para o compositor, já que, com esse tipo de tecnologia, é possível deixar a imaginação livre para criar músicas que estejam muito além dos limites do corpo humano. “Imagina que o pianista, sendo humano, tem cinco dedos em uma mão e cinco na outra. Agora imagina que o compositor faz uma música que precise de dezenove dedos em uma mão e vinte e três dedos na outra, como é que o ser humano vai tocar? O robô consegue tocar, porque ele tem uma paleta debaixo de cada tecla e pode, inclusive, tocar todas as oitenta e oito teclas do piano ao mesmo tempo, se ele quiser.”
Ainda assim, diferente do que se pode ver em filmes de ficção científica, ele ressalta que, neste caso, o robô não é usado para substituir o pianista ou o intérprete, mas que o piano-robô é utilizado para fazer o que o ser humano não consegue. “Ele apenas toca literalmente o que está escrito na partitura que eu compus. Ele não adiciona, nem retira, nem altera nada do que eu escrevi.” Além disso, Castelões frisa a importância de entender que esse tipo de instrumento não envolve inteligência artificial, não possui musicalidade e é capaz, apenas, de executar a partitura criada pelo humano.
Embora o piano-robô tenha “o potencial de expandir o que é possível fazer em música”, o professor conta ter sido possível perceber algumas poucas falhas em sua performance e brinca que, ao ouvi-lo tocando, chegou a imaginar que talvez o instrumento já estivesse se tornando um pouco humano. Tratando-se do futuro, o músico vê as coisas por uma ótica que julga ser utópica. Enquanto o robô poderá seguir por uma musicalidade extremamente humana, os músicos humanos terão a oportunidade de usufruir de um corpo infinitamente mais capaz, descrito por ele como “super-heróico”.
Finalista no MAP
O MAP International Music Competition (MAP-IMC) é uma competição de música anual e online apresentada pelo Marker and Pioneer International Culture Exchange Center (MAP-ICEC), uma organização sem fins lucrativos que possui sede em Los Angeles, Califórnia, nos EUA. Dividido em categorias como cordas, sopro, vocal e piano, o concurso tem participação aberta a tocadores de música, alunos de música e amantes da música de qualquer nacionalidade e idade.
O objetivo da competição é encontrar músicos talentosos que já atingiram um nível profissional e introduzi-los ao cenário internacional. A música “Black MIDI” de Luiz Castelões, selecionada na primeira fase, foi gravada pelo produtor juizforano Nando Costa no estúdio XpandMusic (também em Los Angeles), no final de dezembro de 2022 e lançada no Youtube.
“Música não é esporte, não é competição, mas, obviamente, obter reconhecimento internacional por uma obra composta aqui mesmo em Juiz de Fora é gratificante”, diz Castelões sobre essa conquista. E finaliza: “Creio que serve como valorização do Bacharelado em Composição Musical da UFJF, curso que tem menos de 10 anos, e de seus alunos – que em breve certamente estarão em finais de concursos como esse”.
Se ficou interessado em ouvir e ver o piano-robô tocando a música de Castelões, acesse o vídeo da estreia: