Professora Prisca Agustoni participa de mesa sobre migração, deslocamentos e criação literária (Foto: Edimilson Pereira)

Escritora e professora do Departamento de Letras Estrangeiras Modernas da Faculdade de Letras (Fale) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Prisca Agustoni é uma das autoras convidadas para a mesa “A literatura em que habito”, da 20ª Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), nesta quinta-feira, 24, às 12h. Prisca divide o encontro, mediado por Noemi Jaffe, com a gaúcha Carol Bensimon e a belga, Bessora. As escritas das três autoras estarão em debate, com obras ligadas ao deslocamento entre culturas, línguas e formas de fazer arte, além da possibilidade de a literatura ser uma via para a criação de caminhos de pertencimento. 

No encontro, a docente irá trazer considerações de “O mundo mutilado” (Quelônio, 2020), finalista na categoria “Poesia” da edição 2021 do Prêmio Jabuti. A obra aborda a questão da fuga de africanos, sírios e libaneses de regiões de conflitos armados e perseguição religiosa em direção à Europa, onde encontram dificuldades políticas e humanitárias na fronteira com o Mar Mediterrâneo e no interior do continente europeu.

Indicado como finalista na categoria Poesia do Prêmio Jabuti 2021, “O mundo mutilado” serve como base para a fala de Prisca Agustoni em mesa da Flip

No livro, Prisca também trata de processos de migração empreendidos por personagens históricos. “Falo de personagens como o Walter Benjamin e a Ágora Kristóf, autora húngara que se exilou na Suíça no final da década de 1960, cuja obra estou traduzindo para o Brasil. E também de pessoas que tiveram uma outra forma de migração, como, por exemplo, o caso do escritor Robert Walser, um suíço que não migrou, mas que foi exilado para dentro do seu país, internado em asilos psiquiátricos. Toda forma de atravessamento das fronteiras, físicas, geopolíticas, mentais e simbólicas estão tematizadas no meu livro”, conta a escritora. 

A questão da migração e da vivência entre diferentes línguas e culturas faz parte da trajetória pessoal de Prisca Agustoni. Nascida na região de língua italiana da Suíça, a docente vive entre seu país de origem e o Brasil há 20 anos. Como a Suíça é uma confederação com quatro línguas nacionais (alemão, francês, italiano e romanche), o trânsito entre culturas faz parte da vida da autora desde a infância. 

“Minha primeira língua estrangeira aprendida já na infância foi o francês. Vivi muitos anos em uma cidade francesa. Depois eu fui aprender inglês, espanhol – sou formada em Letras Hispânicas – português e alemão, que estudei durante muitos anos. E a minha língua, de fato, materna, a primeira que eu realmente ouvi, é um dialeto da minha região, o qual não consigo escrever”, relata.

Segundo a professora, “O mundo mutilado” acaba sendo, em parte, autobiográfico. “A ideia de trânsito é inscrita na minha formação, mas também a ideia de fronteira”, exemplifica ela sobre a região em que nasceu no sul da Suíça. “A gente costuma cruzar a fronteira (para a Itália) ao dia, inclusive, para fazer compras, visitar amigos, comprar jornal. A noção de fronteira é muito forte na nossa formação cultural e na formação da nossa mentalidade.” 

Outros lançamentos 

Manuscrito de “O gosto amargo dos metais” foi vencedor do Prêmio de Poesias da Cidade de Belo Horizonte, em 2021

Prisca Agustoni estreou na Flip em 2017, performando como poeta. Desde então, já esteve presente no evento como tradutora convidada, mediadora de mesa e escritora. Nesta edição, outros quatros livros de sua autoria serão apresentados em eventos paralelos à programação oficial da feira. Entre eles, “O gosto amargo dos metais” (7Letras, 2022), cujo manuscrito foi vencedor do Prêmio de Poesia da Cidade de Belo Horizonte no final do ano passado. O tema são os rompimentos das barragens da Samarco e da Vale em Mariana e Brumadinho, em 2015 e 2019, respectivamente. 

Escrito originalmente em italiano antes da pandemia, o livro foi publicado na Itália somente este ano, com o título “Verso la ruggine”, pela editora Interlinea, de Milão. A adaptação para versão para o português foi feita durante o isolamento social. 

Poemas da obra “Entre o que brilha e o que arde” dialogam com as artes plásticas

O período pandêmico também foi inspiração para outra produção – “Entre o que brilha e o que arde” (Urutau, 2022), com poemas que dialogam com as artes plásticas. “As artes plásticas foram a única forma de arte, além da leitura, que entraram na minha casa no período, já que não havia a possibilidade de sair para visitar museus, ir ao teatro ou a concertos. Tenho um grande carinho por esse livro porque uma das sessões foi escrita a partir de um fato terrível: a morte do último indígena falante da língua juma, causada pela Covid.” 

Outro trabalho é a plaquete “Rastros”, parte do projeto de assinatura mensal de poesia Círculo de Poemas, das editoras Luna Parque e Fósforo. Publicada em julho, a plaquete é um longo poema em diálogo com as pinturas rupestres da Caverna das Mãos, situada em um sítio arqueológico da Patagônia argentina. 

“Pólvora” também será lançado em evento realizado fora da programação oficial da Flip

Prisca lança, ainda, “Pólvora” (Macondo, 2022), sobre o feminino e a fertilidade, para além de gerar vidas. As páginas contam com desenhos do artista plástico suíço radicado na Finlândia, Davide Giovenzana. “O feminino está reivindicando a palavra para si justamente para gerar mundos. O feminino que foi secularmente calado. Ao qual foi proibido esse gesto de nomear o mundo, esse gesto de fertilizar o mundo com imaginários e palavras. Então é um livro que nasce a partir dessa experiência e dessa consciência da tomada para si da palavra criativa”, finaliza a professora da Faculdade de Letras.

Programação

Além da mesa “A literatura em que habito”, na quinta, 24, Prisca Agustoni participa de mesa sobre plaquetes do projeto “Círculo de Poemas” nesta quarta, dia 23, às 19h, e, no sábado, dia 26, às 9h, da Roda de Conversa “Literatura e Currículo Escolar: ocupações”.