Única mulher entre os 24 motoristas da UFJF, Gilcilene é habilitada em todas as carteiras e, atualmente, faz a linha que vai do Hospital Universitário ao RU (Foto: Carolina de Paula)

Em 2015, Gilcilene Cardoso Reis da Costa Silva, de 32 anos, tirou sua carteira de motorista nas categorias AD (moto e caminhão). Depois de alguns cursos no Serviço Social do Transporte e o Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (Sest Senat), ela tentou a contratação em empresas de ônibus, porém acabava sendo sempre direcionada para outros setores, como de recepção.

Até que Gilcilene bateu à porta de uma empresa juiz-forana, onde começou a trabalhar como cobradora, foi promovida a manobrista e, depois, a motorista. Segundo dados do setor de recursos humanos desta mesma empresa, dos seus 477 motoristas, apenas quatro são mulheres – menos de 1%.

Vigilante da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), o pai de Gilcilene ficou sabendo de uma oportunidade para a filha. Após entregar seu currículo no setor de transportes da Pró-Reitoria de Infraestrutura e Gestão (Proinfra) e de realizar todos os testes, Gilcilene foi contratada, no dia 10 de março, como a primeira mulher motorista na história da Universidade.

“Desde pequena, gostava de dirigir. Meu pai tinha um Fusca e eu adorava entrar dentro dele. Em algum momento da minha adolescência, minha família precisava de alguém que levasse minha avó ao hospital para fazer suas sessões de fisioterapia. Como era pertinho de casa, eu mesma levava. Até que, quando fiz 18 anos, ela se propôs a pagar a retirada da minha carteira da categoria B”, recorda Gilcilene, que é a única mulher a compor a equipe de 24 motoristas da UFJF.

Mulheres no volante

O Brasil tem 25,8 milhões de condutoras de automóveis habilitadas, o equivalente a 35% do total. Os dados são de março de 2021, segundo mapeamento da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), a partir das informações do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran). Mesmo em menor número, no trânsito, elas são as mais prudentes.

Formada em Recursos Humanos, Gilcilene não troca o assento de motorista por nenhuma sala com ar condicionado (Foto: Carolina de Paula)

Segundo pesquisa realizada pela Secretaria de Mobilidade Urbana (SMU) da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF), em 2021, 5.478 acidentes de trânsito foram registrados, somando um total de 1.940 vítimas (fatais e não fatais, entre condutores, passageiros ou pedestres). Dessas, 229 pessoas são do sexo femino, ou seja, 11,8%. Dados que só reforçam o machismo e a misoginia contidos na antiquada expressão “mulher no volante, perigo constante”.

“O que eu falo é: se você tem vontade, corra atrás, porque todas somos capazes. É muito gratificante saber que sou a primeira mulher em um ambiente que só tem homens. Ainda quero ver outras muitas neste lugar. Quando saí da empresa onde eu trabalhava, uma cobradora me disse que eu era uma inspiração pra ela. E, inclusive, hoje ela trabalha como manobrista. Então, o que falta é maior oportunidade para as mulheres mostrarem o que sabem fazer”, finaliza Gilcilene. 

 Oportunidade é fundamental

Para transformar definitivamente essa visão deturpada e fomentar a participação feminina em cargos de condução, o projeto Habilitação Profissional para o Transporte – Inserção de Novos Motoristas do Sest Senat visa inserir motoristas no mercado por meio da mudança da categoria da B da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) para C, D ou E. E foi neste projeto que Gilcilene passou a dirigir carros, motos, ônibus e caminhões profissionalmente.

“Algumas pessoas me diziam: é isso mesmo que você quer? Sou formada em Recursos Humanos e muitos ficavam me perguntando se eu não queria trabalhar numa sala, com ar condicionado. Eu dizia: não, quero mesmo é dirigir”, afirma a motorista, completando que agora só falta mesmo fazer um curso de condução de emergência para guiar ambulâncias.

Para a pró-reitora adjunta de Infraestrutura e Gestão e também engenheira civil, Janezete Marques, o fato de Gilcilene se tornar a primeira motorista da UFJF é algo bastante representativo. “A evolução do papel das mulheres no mercado de trabalho brasileiro tem possibilitado que elas ocupem postos e lugares que, por muito tempo, foram tidos somente como masculinos. A força da representatividade feminina em espaços desse tipo é fundamental para quebrar os estereótipos de gênero, tão presentes na estrutura social do nosso país. A chegada da Gilcilene no nosso quadro vem consolidar essa conquista”, ressalta Janezete.