A obesidade é considerada um dos principais problemas de saúde pública do mundo. Trata-se de uma doença crônica, multifatorial, caracterizada pelo excesso de gordura corporal, o que leva a um estado inflamatório de baixo grau, conhecido como metainflamação. Esse estado inflamatório crônico permanente, traz diversas consequências negativas. Dentre elas, a baixa sensibilidade insulínica, com desenvolvimento de diabetes, síndrome metabólica, maior susceptibilidade à infecções e maior chance de complicações decorrentes destas enfermidades, redução da resposta imune antiviral e alterações nos parâmetros de coagulação.
Pesquisadores da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) estão desenvolvendo um estudo cujo objetivo é compreender como fatores associados ao desenvolvimento da obesidade podem impactar negativamente o sistema imunológico diante de infecções, alterando as funções primordiais das células no combate a vírus como (SARS-CoV-2), bactérias (Mycobacterium bovis) e protozoários (Trypanosoma cruzi).
Conforme explica a professora da UFJF, Patrícia Elaine de Almeida, coordenadora do estudo, várias moléculas e mecanismos importantes foram propostos como responsáveis por desencadear a inflamação no tecido adiposo branco, incluindo fatores genéticos, ambientais e desordens metabólicas. Porém, esses fatores não podem explicar totalmente a origem da inflamação e, além disso, as estratégias anti-inflamatórias atuais não são suficientes no tratamento da síndrome metabólica. “Em nossa pesquisa, usamos células provenientes do tecido adiposo – os adipócitos – e células do sistema imunológico, os macrófagos, os quais têm função direta na geração da resposta inflamatória crônica gerada na obesidade”.
O trabalho, intitulado “Modulação da ativação de macrófagos por fatores secretados por adipócitos durante a infecção por patógenos intracelulares, in vitro”, busca compreender como fatores associados ao desenvolvimento da obesidade, produzidos pelos adipócitos, podem impactar negativamente o sistema imunológico diante de diversos tipos de infecções. A pesquisa está sendo desenvolvida pela aluna de doutorado do PPGCBIO, Ana Luíza da Silva Albertoni, também do Departamento de Biologia do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFJF.
Até o momento, já foram identificados alguns dos fatores que podem causar a disfunção de células do sistema imunológico, o que permite entender os mecanismos moleculares pelos quais isso acontece. “Sabemos que esses fatores são responsáveis por uma série de alterações imunológicas que tornam o hospedeiro mais suscetível às infecções. Dentre eles, já identificamos alterações na produção e liberação de moléculas primordiais que medeiam respostas imunológicas e participam da defesa do hospedeiros contra infecções, como as citocinas e as adipocinas; alterações em organelas com função na sinalização celular e inflamação, como os corpúsculos lipídicos; alterações em proteínas receptoras que participam do metabolismo lipídico e resposta inflamatória, como o PPARgamma; e a participação de partículas denominadas ‘vesículas extracelulares’, que desempenham funções-chave no transporte de várias moléculas ativas como mediadores lipídicos, proteínas e ácidos nucleicos”, conta Patrícia.
Possibilidades terapêuticas
Após a finalização da caracterização desses fatores que alteram a resposta imunológica frente a infecções em um ambiente obeso, in vitro, os pesquisadores irão concluir os experimentos em modelo animal, com o objetivo de elucidar o papel e a importância dos fatores ativados, com foco na proteína “PPARgamma” como possível alvo terapêutico.
De acordo com a pesquisadora, o trabalho pode contribuir com estratégias que minimizem as consequências ao hospedeiro frente a doenças causadas por vírus como COVID-19, por bactérias como na Tuberculose e por protozoários como na Doença de Chagas e possibilitar o foco em terapias mais eficazes. “Apesar do impacto da obesidade em doenças metabólicas e cardiovasculares ser bem conhecido, o seu papel na ativação do sistema imune frente a infecções por patógenos intracelulares não é bem conhecido”, finaliza.
A pesquisa conta com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig).