Tanto em cursos de mestrado quanto de doutorado na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), a porcentagem de mulheres é aproximadamente a mesma: 56%. No entanto, embora sejam a maioria entre os estudantes de pós-graduação, a representatividade percentual de pesquisadoras cai abaixo da metade conforme a carreira acadêmica evolui – também na UFJF, segundo os dados mais recentes, 27% é a porcentagem de mulheres contempladas com bolsas de produtividade em pesquisas do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), subsídio concedido aos cientistas avaliados como os mais produtivos do país.
A ciência, justamente por ser feita por e para a sociedade, não está imune às questões de gênero presentes em todos os campos sociais. Segundo pesquisadoras, determinados critérios e métricas de avaliação da carreira científica são baseados na experiência masculina, hegemônica em parte da história da ciência. Os impactos desse viés são evidenciados pelo “efeito tesoura”, como é chamado o corte drástico entre o número de mulheres na pós-graduação e o de cientistas reconhecidas por sua produtividade acadêmica.
“As bolsas de produtividade averiguam justamente a fase em que os pesquisadores estão com fôlego para extensas trocas e produções acadêmicas, incluindo experiências como intercâmbios – e, muitas vezes, esse período coincide com a fase em que a mulher torna-se mãe, por exemplo. Como a bolsa é averiguada de três em três anos, caso uma cientista tenha filhos nesse período, ela não retorna facilmente para o sistema”, ilustra a pró-reitora de Pós-graduação e Pesquisa (Propp) da UFJF, Mônica Oliveira.
Média histórica: mulheres seguem em minoria nas áreas de Ciências Exatas
Segundo dados levantados pela Propp, nos últimos dez anos, mulheres cientistas são a maioria estável entre os estudantes de todos os cursos de pós-graduação da UFJF, mantendo, de 2010 a 2020, uma média histórica entre 56% e 59%. No início da década, elas ainda eram minoria nos cursos de doutorado da universidade, quadro que inverteu-se após o ano de 2015.
“Essa inversão tem a ver com o crescimento de programas de pós-graduação nas áreas de Ciências Humanas, Ciências Sociais Aplicadas, Linguística, Letras e Arte – todas tradicionalmente relacionadas, em nossa sociedade, às mulheres. Nosso desafio é que a participação nas áreas de Ciências Exatas ainda é relativamente pequena. Então, em termos históricos, nós, mulheres, continuamos batendo na trave”, avalia Mônica Oliveira.
Os dados corroboram: entre as pesquisadoras matriculadas em cursos de pós-graduação da UFJF, a maior parte está concentrada na área de Ciências Humanas (31,1%). Em segundo lugar, estão as Ciências da Saúde, com aproximadamente 20%. As próximas áreas acumulam percentuais semelhantes: Ciências Sociais Aplicadas (11,7%), Linguística, Letras e Artes (11,6%) e Ciências Biológicas (10,1%). Os cursos voltados para os campos das Engenharias e das Ciências Exatas e da Terra (com 3,7% e 6,6%, respectivamente) estão entre os últimos lugares no quesito de participação de mulheres.
Atualmente, dos 3.307 estudantes matriculados nos 45 programas de pós-graduação da UFJF, 1.857 são mulheres (56,2% do total), sendo 1.244 mestrandas e 613 doutorandas. De acordo com dados fornecidos pela Plataforma Sucupira e o Centro de Gestão do Conhecimento Organizacional (CGCO), entre as alunas, 61% se autodeclaram como brancas, 20,6% como pardas, 7,7% como pretas, 1,1% como amarelas e 0,2% como indígenas. 9,4% não informaram a autodeclaração. A maioria encontra-se na faixa etária entre 25 e 29 anos, especialmente as mestrandas – entre as doutorandas, a maior parte tem entre 30 e 34 anos.
Sub-representação é preocupação mundial
A queda de representatividade de cientistas mulheres ao longo da carreira científica não é exclusividade da UFJF; tampouco do Brasil. Nacionalmente, em 2020, 53% das bolsas de mestrado e doutorado eram preenchidas por pesquisadoras, segundo dados do Ministério da Educação (MEC). Mesmo diante dessa maioria, em 2021, o CNPq divulgou que mulheres representam somente 33% do total de bolsistas contemplados pela própria instituição.
A disparidade constatada em Ciências Exatas, Ciências da Computação e Engenharias também é preocupação mundial: 75% dos artigos científicos referentes a essas áreas são assinados por homens. Essa desigualdade tornou-se uma das pautas defendidas pela Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU), que determinou como um dos seus objetivos o estabelecimento de diretrizes de igualdade de gênero e de raça na ciência.