A médica pneumologista Margareth Dalcolmo, da Fiocruz, foi uma das primeiras a receber a vacina de Oxford/Astrazenca no Brasil (foto: Peter Ilicciev/ site Fiocruz)

Uma das vozes brasileiras mais atuantes durante a pandemia de Covid-19, a  pneumologista e pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Margareth Dalcolmo, participou na noite desta quinta-feira, 28, do III Congresso de Extensão e da V Mostra de Ações de Extensão da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). 

Dalcolmo ministrou a palestra “O enfrentamento à pandemia de Covid-19 e a função social das universidades públicas”, transmitida pelo canal da TV UFJF no YouTube.  A mediação da atividade foi realizada pela vice-reitora da UFJF, Girlene Silva. 

“Parabenizo a Pró-Reitoria de Extensão pela coragem de realizar um evento desse porte e dessa importância de maneira remota. Agradeço à pesquisadora Margareth Dalcolmo por dedicar parte de seu tempo a esse debate, sobre o papel da ciência brasileira nesta conjuntura de excepcionalidade. Em nome das cidades de Juiz de Fora e Governador Valadares, agradecemos e reconhecemos o seu papel nesta pandemia. De forma muito cuidadosa e dedicada, suas reflexões têm esclarecido a população brasileira”, afirmou a vice-reitora da UFJF.

Durante o evento, além de destacar a imprescindibilidade das universidades e demais instituições públicas de pesquisa brasileiras, Margareth Dalcolmo recordou a apreensão e a dedicação dos profissionais da saúde; a importância da ciência e das publicações científicas;  a ausência de tratamento medicamentoso para Covid-19; a relevância das vacinas; o enfrentamento à onda negacionista; o possível retorno às aulas presenciais; os grupos mais vulneráveis à doença; dentre outros temas.

O conteúdo completo da palestra está disponível no Canal da TV UFJF no YouTube.

95 mil artigos científicos 

Margareth Dalcolmo ressaltou a relevância do campo científico para o enfrentamento à pandemia. 

“Houve uma produção alucinante de papers [artigos científicos], cerca de 95 mil, ao longo do último ano em todo o mundo sobre a Covid-19. A Revista Science, por exemplo, que é uma  publicação de 1918, chegou a divulgar estudos à época da pandemia da gripe espanhola. Nós, pesquisadoras e pesquisadores, vamos resgatando conhecimentos. Para conseguir compreender a conjuntura atual, voltamos, por exemplo, ao final do século XIV, quando da peste negra.”

No caso brasileiro, a pesquisadora recordou que a ciência é produzida principalmente por instituições públicas. 

“O Brasil teve papel considerável na produção científica, especialmente, na área biomédica. As instituições públicas, as universidades brasileiras, têm prestado um serviço muito importante, seja com a realização de testes, com a produção de equipamentos de proteção e de equipamentos médicos de baixo custo, seja com a participação em estudos.”

Humanização de pesquisadores 

Além da reciclagem do conhecimento científico acumulado ao longo do tempo e em outros contextos, a médica enfatizou a humanização dos pesquisadores promovida pelo contexto de crise. 

“Podemos dizer que a pandemia promoveu uma humanização compulsória de todos nós pesquisadores. Entramos nas casas da população, dando explicações, desde quando começamos a compreender o que estava ocorrendo. Aos poucos fomos  entendendo a origem do SarsCov2, nos mercados de carnes na China. Sobre a origem do vírus, é importante ressaltar a necessidade de os centros de pesquisas estarem atentos ao modo como o meio ambiente vem sendo tratado, sobretudo, no Brasil.”    

O início da pandemia

Dalcolmo recordou as dúvidas dos profissionais de saúde e pesquisadores no início da pandemia e os aprendizados ao longo dos últimos meses.

“Imaginávamos que fosse uma pneumonia diferente e que matava. Não esperávamos que fosse se espalhar pelo mundo e tornar-se uma pandemia. É uma doença muito grave, sistêmica. É uma situação muito dolorosa. São perdas imensas: 215 mil brasileiros ao longo de um ano. Nos questionamos sobre o que fazia o paciente chegar andando e rapidamente entrar em falência respiratória. Compreender isso foi o nosso primeiro aprendizado. Hoje a primeira pergunta é: quando foi que você teve o primeiro sintoma?” 

Não há tratamento medicamentoso para a Covid-19

Conforme a médica, 80% dos casos de Covid-19 são leves, 10% são moderados, mas podem ser tratados em casa, e 10% são graves. Nesse sentido, Dalcolmo reiterou a relevância das medidas não farmacológicas para prevenção e redução das contaminações.  

“Medidas ditas não farmacológicas são muito importantes, fundamentais, como o isolamento, o uso de máscara, a higienização das mãos. Os órgãos públicos brasileiros foram fundamentais na busca por alternativas de telemedicina, projetos de saúde por meio de aplicativos e telefones, detecção de sinais e sintomas sem a presença física dos pacientes. Hoje a ciência já tem a certeza de que não há tratamento medicamentoso para a Covid-19. Para cientistas, o assunto sobre o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina está encerrado.” 

O melhor tratamento é a vacina

“ A Covi-19 é uma virose aguda e o melhor tratamento é a vacina. Nesse sentido, o Brasil teve um belo desempenho ao propiciar estudos de fase 3. Várias instituições públicas brasileiras participaram. Duas vacinas estão aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Duas vacinas serão produzidas por instituições públicas brasileiras: a Fiocruz e o Butantan”, destacou Dalcolmo 

Epidemia de tolices

“Temos duas epidemias no Brasil. Uma provocada pelo SarsCov2 e outras de tolices, de negacionismo, de sandices. Quando eu chego ao final do dia, eu me pergunto assim: quantas tolices eu ouvi hoje das mais variadas fontes? Neste momento, nós precisamos fazer um trabalho de persuasão. Temos tentado passar para as pessoas esse tipo de consciência. Quando vemos as pessoas indo para festas ou ônibus cheios, nos perguntamos: o que está acontecendo?”

Prognóstico mundial e o contexto brasileiro

De acordo com a pesquisadora, mesmo com todos os esforços e os avanços promovidos pelo campo científico na busca pela vacina, menos da metade da população mundial poderá ser imunizada este ano. Outros desafios mencionados estão relacionados aos sintomas e às sequelas da doença.

“Fato é que em 2021 não teremos vacina para todo o planeta. Ainda não sabemos quantas pessoas foram infectadas. Não conhecemos todo o arsenal clínico, nem sempre sabemos por qual motivo algumas pessoas desenvolvem formas graves ou não. Não conhecemos todas as sequelas. Não sabemos sobre quais são definitivas e quais são temporárias. Não sabemos o tempo de duração da imunidade. Sabemos que já temos uma segunda onda da doença.”

Sobre a vacina, conforme a pesquisadora, o objetivo é a transferência completa da tecnologia de produção para o Instituto Butantan e a Fiocruz 

“Com todas as vacinas e com 8 bilhões de habitantes no planeta, se somarmos todos os esforços, não chegaremos a 3 bilhões de doses em 2021. Essa é a verdade. Como o Brasil vai se comportar? Nós estamos fazendo a coisa certa no sentido de prover, Butantan e Fiocruz, com acordo de cooperação técnica para a transferência completa de tecnologia. Neste momento,  estamos esperando o insumo. Ao longo do ano, já estaremos produzindo o insumo no Brasil”, concluiu, ressaltando, também, a gratidão aos profissionais de saúde e pesquisadores brasileiros empenhados no combate à doença.  

Divulgação das práticas e ações de extensão 

As atividades do III Congresso de Extensão e da V Mostra de Ações de Extensão vão até esta sexta-feira, dia 29. Ambos os eventos têm por objetivo proporcionar espaços destinados à troca de saberes, integração e produção coletiva de conhecimentos, assim como à divulgação das práticas e ações de extensão desenvolvidas nos dois campi da UFJF. Esta é a primeira vez que Congresso e Mostra têm programação simultânea em Juiz de Fora e Governador Valadares. 

Outras informações: imprensa@comunicacao.ufjf.br