Com a pandemia de Covid-19, o uso de máscaras se tornou indispensável. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o novo coronavírus é transmitido principalmente por gotículas respiratórias expelidas por espirros, tosse ou pela fala. A máscara é uma das medidas de contenção da doença, devendo ser utilizada tanto por pessoas que apresentam sintomas, tanto por indivíduos saudáveis. Tendo isso em mente, pesquisadores do Grupo de Nanociências e Nanotecnologia (Nano) do Instituto de Ciências Exatas (ICE), do Centro de Estudos em Microbiologia e o Laboratório de Ecologia e Biologia Molecular de Microrganismos (LEBIOMM) do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFJF, com parceria com o Laboratório de Técnicas de Biologia do Núcleo de Biologia do IF Sudeste MG, desenvolvem projeto para o uso de nanotecnologia para funcionalização de tecidos normalmente utilizados na confecção de máscaras e vestimentas hospitalares, como algodão e TNT.
Pesquisa desenvolve tecidos com nanomateriais à base de carbono, conhecidos como óxidos de grafeno (GO) e/ou óxidos de grafeno reduzidos (rGO), e/ou uma mistura de GO e rGO com nanofios de prata.
Uma estrutura microscópica para uma ameaça microscópica
De acordo com o coordenador do projeto, Welber Quirino, a tecnologia aplicada visa a ação antimicrobiana dos tecidos e promete torná-los reutilizáveis mesmo após vários ciclos de lavagem e a temperaturas mais elevadas, possibilitando a aplicação de processos de esterilização mais rápidos e eficazes. Para isso, os tecidos são desenvolvidos com nanomateriais à base de carbono, conhecidos como óxidos de grafeno (GO) e/ou óxidos de grafeno reduzidos (rGO), e/ou uma mistura de GO e rGO com nanofios de prata. Por serem microscópicos, estes nanomateriais podem ser utilizados no combate a microrganismos como vírus e bactérias. “Os resultados preliminares mostram enorme afinidade dos nanomateriais empregados com as fibras dos tecidos estudados. O estudo está na fase de testes microbianos”, revela Quirino.
As interações mecânicas das bordas das nanofolhas de GO e rGO com os microrganismos podem causar pequenas rupturas, ou até mesmo, o completo rompimento das membranas celulares, causando sua destruição.
“As interações mecânicas das bordas das nanofolhas de GO e rGO com os microrganismos podem causar pequenas rupturas, ou até mesmo, o completo rompimento das membranas celulares, causando sua destruição”, explica Quirino. Segundo o pesquisador, esses materiais possuem, em geral, uma carga superficial negativa, que por sua vez, interagem com as cargas elétricas das membranas celulares de bactérias e de vírus. “As interações eletrostáticas podem dificultar que os microrganismos com cargas negativas (bactérias, por exemplo) fiquem fortemente aderidos em superfícies recobertas com o tecido desenvolvido, devido às interações repulsivas entre as cargas envolvidas”, aponta. Essa característica diminui a permeabilidade das bactérias através do tecido, e consequentemente diminui as taxas contaminação. Além disso, as nanofolhas de GO e rGO podem recobrir e inativar microrganismos com cargas superficiais positivas (vírus, por exemplo), impedindo que eles permeiem as superfícies celulares e causem infecções.
Próximos passos
De acordo com os pesquisadores, as interações químicas entre os tecidos e os microrganismos estão sendo consideradas como o principal mecanismo responsável pelo elevado potencial antimicrobiano dos nanomateriais de carbono. As ações químicas dos nanomateriais com microrganismos envolvem diferentes processos, como as interações oxidativas – também conhecidas como estresses oxidativos – nestes microrganismos. “O estresse oxidativo é oriundo das reações químicas entre grupos oxidantes altamente reativos (ROS) e os microrganismos. Os ROS podem ser formados a partir da interação dos elétrons transferidos dos microrganismos para os nanomateriais”, esclarece Quirino. Estes grupos oxidantes altamente reativos são capazes de causar danos irreversíveis aos microrganismos, levando à morte de bactérias e inativando a ação de vírus.
No momento o grupo está realizando testes microbianos, com análise de crescimento de microrganismos nas máscaras tratadas e não tratadas com GO e nanofios de prata. “Neste primeiro momento, estamos utilizando bactérias comuns no sistema respiratório humano, do grupo das bactérias gram-positivas (Staphyloccus aureus), e outra do grupo gram negativas, mais relacionada ao sistema digestivo (Escherichia coli)”, afirma Quirino. A partir destes testes, foi observada inibição do crescimento das bactérias nos tratamentos com os nanomateriais. De acordo com Welber Quirino, a próxima etapa é avaliar o crescimento de comunidade microbiana que inclua um coronavírus de outros animais, sem risco para saúde humana.
A importância do uso de máscaras
Diante do contexto atual de pandemia em que o mundo inteiro está vivenciando, a utilização de máscaras passou a ser indispensável para a população como forma de proteção individual e coletiva. De acordo com os critérios da OMS, as máscaras podem ser compradas ou podem ser caseiras, mas devem ter três camadas: idealmente um forro de algodão, uma camada externa de poliéster e um “filtro” médio feito de polipropileno ou algum outro material não tecido. Ainda que as máscaras de tecidos convencionais apresentem boa eficácia para a retenção dos microrganismos, elas não possuem a capacidade de eliminá-los e nem a capacidade de inibir sua proliferação nestes materiais. “Esse projeto tem como objetivo o desenvolvimento de tecidos tecnológicos para confecção de máscaras e vestimentas hospitalares (jalecos, toucas, lençóis, etc.), bem como filtros de ar para equipamentos médicos e ambientes fechados, que apresentem maior eficácia na retenção, eliminação e inibição do crescimento de microrganismos (como vírus e bactérias)”, apresenta Quirino. Além disso, o pesquisador acredita que o desenvolvimento desse projeto hoje é uma forma de precaução para futuras pandemias relacionadas ao trato respiratório.