Desde o início das medidas de isolamento social e o fechamento das escolas das redes pública e privada em diversas cidades do país, os grupos de pais e mães no Whatsapp não param – são notícias sobre o coronavírus, preocupações compartilhadas e também muitas dicas sobre o que fazer com os pequenos neste período. Um dos memes sugere que as mães irão encontrar a vacina para o vírus em tempo recorde, dado o desafio de ter as crianças em casa.
“A Sofia nos solicita muito e então temos que a envolver nas atividades do dia. Se eu for preparar almoço, ler ou fazer algum trabalho no computador, tenho que ao mesmo tempo dar alguma função pra ela. Tem sido tranquilo, mas também desafiador”, diz a terapeuta ocupacional Renata Souza sobre a última semana em casa. Ela conta com o marido, que é consultor, para dividir o tempo com a filha.
Renata reuniu as orientações da própria escola com as dicas passadas no seu grupo de aplicativo de conversas, entre elas, livros para ler e colorir, links de vídeos com contação de histórias, receitas, ideias sobre atividades com material reciclável e brincadeiras. Mas não foi só, teve banho de mangueira e ainda sobrou tempo para renovarem a pintura das cadeiras da casa. “[O isolamento] está propiciando uma ligação maior entre a gente, estamos mais tempo juntos e conhecendo melhor nossa filha.”
Sofia, de 6 anos, é aluna de uma escola particular da cidade e, apesar do relato da mãe resumir a rotina de boa parte das famílias após a chegada do coronavírus, nem todos os lares estão preparados para tamanha mudança. Na casa de Núbia Filgueiras, ela, o pai e os dois filhos maiores (19 e 23 anos) se revezam para cuidar de Lorena, de 4 anos. Núbia trabalha em um hospital, na área de higiene e limpeza do CTI, em sistema de escala. Questionada se está com medo por estar mais exposta, ela disse “acho que todos nós estamos, né?”. Com exceção do filho de 19 anos, todos estão trabalhando fora de casa.
Segundo Núbia, Lorena está sentindo falta da rotina que tinha na Escola Municipal Antônio Faustino da Silva, mas tem conseguido entretê-la com brincadeiras sempre que está por perto. Para a professora da escola, Olinda da Silva, essa tem sido a principal preocupação das mães da turma – o que fazer com os filhos em casa. Desde o início do ano, ela mantém um grupo para troca de informações com os responsáveis pelas crianças e, agora, as mensagens se intensificaram.
Como a turma de Olinda é de primeiro período, muitos pais estão com receio de a interrupção demandar das crianças nova adaptação à escola. Na semana passada, a direção do colégio autorizou uma reunião para que os professores pudessem passar uma lista de atividades, incluindo exercícios de coordenação motora, com as letras iniciais dos nomes delas e sobre os sentidos do corpo humano. “O interessante é que as mães e avós me enviam vídeos com o que estão fazendo”, conta a professora.
Brincando também se aprende
Para a professora da Faculdade de Educação da UFJF, Ana Rosa Picanço Moreira, é necessário que os pais trabalhem a ansiedade durante o período de isolamento, informando as crianças mas sem alarmar, usando um vocabulário objetivo, com frases mais curtas dentro da capacidade delas de entender a situação.
Segundo a especialista em educação infantil, as crianças ao brincarem e interagirem aprendem bastante e, por isso, não é necessário se preocupar com os conteúdos escolares. “Temos que tomar cuidado para que a casa não vire um espaço escolarizado. É interessante que os pais possam retomar alguns conteúdos de forma lúdica, mas tenho a preocupação de eles didatizarem as relações. Acredito que as escolas podem tranquilizá-los de que, depois, o calendário será refeito e o aprendizado escolar será retomado.”
Entre as dicas sobre como vivenciar de maneira produtiva o período de isolamento social, Ana Rosa indica as histórias infantis que ajudam a fortalecer a constituição psíquica e a segurança emocional, atividades com o corpo, cantigas regionais, brincadeiras de faz de conta como casinha e carrinho. Manter as crianças em interação usando as tecnologias também pode ser uma alternativa interessante. “Temos que aproveitar essa nova realidade, criando estratégias para lidar com ela de uma maneira potente, sem esmorecer.”
A pesquisadora faz parte do Fórum de Educação Infantil e da Aliança pela Infância e está junto a esse grupo encaminhando uma carta para a Prefeitura de Juiz de Fora no sentido de dar apoio às famílias das crianças da rede pública em relação à merenda escolar. “É importante garantir o básico, pois se o organismo estiver saudável os danos serão menores.”