Ao contrário da afirmação do senso comum de que os alunos oriundos de escolas públicas ingressam menos em instituições públicas de ensino superior, dados levantados pela V Pesquisa do Perfil Socioeconômico e Cultural dos Estudantes de Graduação das Universidades Federais, realizada pelo Fórum Nacional de Pró-reitores de Assuntos Estudantis (Fonaprace) da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) apontam que 60,4% dos alunos da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) são oriundos da escola pública.
A pesquisa, desenvolvida no primeiro semestre de 2018, ainda indica que 32,1% dos estudantes vêm da escola particular e 7,5% também provêm da escola particular, mas estudando com bolsa. As informações sobre os alunos e alunas da UFJF foram divulgadas no último dia 16, em entrevista coletiva.
O estudante do 8º período de Jornalismo na Faculdade de Comunicação (Facom), Pedro Martins, estudou a vida toda em escola pública. Segundo o jovem, ter conseguido ingressar na UFJF representou uma mudança de paradigma em sua estrutura familiar. “Para mim, é uma grande conquista ter conseguido entrar em uma universidade pública. Sendo pobre e negro, o sistema está andando contra mim constantemente. Como sou o primeiro da minha família a entrar numa universidade pública, essa conquista não é apenas minha. Tenho toda uma carga de histórias e sonhos dos meus pais que não puderam estudar numa instituição como esta e que veem em mim as chances e as oportunidades que não tiveram”, relata.
Algo parecido acontece com o aluno do 7º período de Direito, Gabriel Almeida Nunes. Oriundo de Francisco Beltrão, no interior do Paraná, o estudante conta que a qualidade do ensino público oferecido pelas escolas fundamentais e secundárias do estado era bastante deficitária e que o sistema de cotas foi decisivo para seu ingresso num dos cursos mais concorridos da UFJF. “Meus avós não tinham ensino superior; parte da família, que é da geração dos meus pais, conseguiu fazer, mas só depois de já ter emprego estável. Agora, nessa minha geração, todos os primos estão se formando, o que é um bom avanço. Só entrei por causa da cota de colégio público; é algo que todo mundo valoriza muito.”
Metade dos estudantes é cotista
A reserva de vagas para estudantes de escola pública é realidade e o percentual de alunos que ingressaram por meio de cotas atesta o sucesso da política que, na UFJF, começou em 2006. Do total de graduandos, 50,4% ingressaram por meio de cotas e 49,6% pela ampla concorrência, o que reflete a reserva de metade das vagas para alunos da escola pública.
“Esse dado mostra que apesar de a reserva de vagas não abranger alunos que estudam em escola particular com bolsa, depois que eles entram, há demanda por políticas inclusivas na permanência, que são muito relevantes para a Universidade. A maior presença de alunos das escolas públicas é também um desafio para que a Universidade amplie seu diálogo com a comunidade escolar, de forma que ela reforce a defesa da universidade”, argumenta o pró-reitor adjunto de Graduação, Cassiano Caon Amorim.
Para o estudante do 6º período de Odontologia, Raphael Tavares, que cursou todo o ensino médio no Instituto Federal do Sudeste de Minas Gerais (IF Sudeste), as políticas afirmativas mostraram-se decisivas para a universalização do acesso ao Ensino Superior experimentada no Brasil nos últimos anos. “As cotas são fundamentais para que o acesso à universidade seja mais semeado e garantido a um maior público, suprindo essas diferenças de ensino quando comparamos uma escola particular e uma escola pública.”
Além do histórico escolar, a pesquisa traz conjuntos de informações sobre os universitários relativas ao perfil básico, moradia, origem familiar, trabalho, renda, vida acadêmica, atividades culturais, saúde e qualidade de vida, além de levantamento sobre dificuldades estudantis e educacionais. Os dados revelam a composição social das instituições federais de ensino superior e como o perfil universitário se aproxima das características sociodemográficas da população brasileira, nos aspectos da renda, cor ou raça e sexo.
A pesquisa nacional ocorreu em 63 universidade federais e dois centros federais de educação tecnológica (Cefet) em todos os estados. Os dados foram coletados entre fevereiro e junho de 2018, a partir de uma amostra de 35,34% do total de 1.200.300 estudantes matriculados em cursos presenciais naquele período. Os questionários foram aplicados diretamente aos alunos, via internet, com identificação por login e senha, garantindo que cada estudante responderia apenas uma vez. Na UFJF, foram validadas 3.344 respostas, representando 18,746% do total de 17.838 estudantes no período.