Veículo: G1 Zona da Mata
Editoria: Notícias
Data: 13/12/2018
Título: UFJF lança desafio em redes sociais que oferece R$ 1 mil em prêmios
A Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) lança nesta quinta-feira (13) um desafio nas redes sociais para incentivar o público a reconhecer o maior número de locais do campus.
O concurso “UFJF em Detalhes” vai distribuir R$ 1 mil em prêmios, como forma de comemorar os 58 anos da instituição, que serão celebrados no dia 23 de dezembro.
As imagens publicadas no Instagram e no Facebook registram particularidades de 10 pontos localizados dentro e fora do campus.
Para concorrer, os interessados devem seguir as redes sociais da universidade, marcar dois amigos nas respectivas postagens e preencher o formulário de inscrição com os dados pessoais e os palpites.
Podem participar alunos regularmente matriculados nos cursos de graduação e pós-graduação, docentes, técnicos-administrativos em educação (TAEs) e funcionários terceirizados, que comprovem vínculo com a Universidade.
Os três primeiros inscritos que acertarem o total de respostas ou a maior parcial, em caso de não haver pelo menos três participantes que respondam corretamente a totalidade das fotos, serão premiados com R$ 500, R$ 300 e R$ 200, respectivamente.
Eles também receberão um kit de livros da Editora UFJF, juntamente com colocados em quarto e quinto lugares.
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Veículo: Rádio CBN
Editoria: Podcast
Data: 13/12/2018
Título: Melhor Idade- A medicalização da morte- Com participação do Professor e filósofo da UFJF, Luciano Camerino
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Veículo: Tribuna de Minas
Editoria: Coluna Cesar Romero
Data: 13/12/2018
Link: https://tribunademinas.com.br/colunas/cesar-romero/13-12-2018/q-2.html
Título: Medalha JK
Será nesta sexta feira, no anfiteatro do MAMM a solenidade de entrega da “Medalha JK”, instituída há 15 anos pelo Conselho Superior da UFJF.
Entre os homenageados, José Ventura, Jorge Baldi, José Carlos de Castro Barbosa, Maria Lúcia (Malu) Campanha da Rocha, Maria da Assunção Calderano, Vânia Bara e a vice-reitora Girlene Alves da Silva.
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Veículo: Tribuna de Minas
Editoria: Coluna Cesar Romero
Data: 13/12/2018
Link: https://tribunademinas.com.br/colunas/cesar-romero/13-12-2018/q-2.html
Título: 40 anos de odontologia
Amanhã, no Hotel Green Hill, Alberto Rihan comanda jantar dançante da turma de 1978 de odontologia da UFJF, ao som de Edmar Augusto.
A comemoração continua sábado, com almoço no Casa de Minas, no Salvaterra.
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Veículo: Tribuna de Minas
Editoria: Coluna Cesar Romero
Data: 13/12/2018
Link: https://tribunademinas.com.br/colunas/cesar-romero/13-12-2018/q-2.html
Título: Voo livre
Marcelo Silva Silvério é o novo diretor da Faculdade de Farmácia da UFJF, que tem como vice Frederico Pittella Silva.
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Veículo: Aos fatos
Editoria: Notícias
Data: 13/12/2018
Título: Kit satânico, nazismo de esquerda, globalismo: investigamos o que já disseram ministros de Bolsonaro
Maconha causa câncer; agrotóxicos não fazem mal à saúde; escolas públicas promovem erotização infantil; PT tem ligações com o PCC. Informações falsas ou controversas têm pontuado declarações de ministros anunciados pelo presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), mostra levantamento de Aos Fatos em posts e vídeos nas redes sociais, em reportagens e em entrevistas concedidas pelos novos integrantes do primeiro escalão do Executivo federal.
Damares Alves, futura ministra de Direitos Humanos, da Família e dos Direitos da Mulher notabiliza-se por palestras, todas disponíveis online, onde aborda temas que se destacaram entre as notícias falsas propagadas nas eleições presidenciais. Exemplo disso são as hipóteses de que as crianças são erotizadas ou receberam ‘kit satânico’ nas escolas públicas.
Para defender a existência de uma suposta erotização infantil, Damares distorceu, em uma palestra de 2013, a origem e a faixa etária indicada de cartilhas educativas. Na ocasião, ela afirmou que o livro francês Aparelho Sexual e Cia ( Zep, pseudônimo do suíço Phillipe Chappuis, e Hélène Bruller, 2007) é vendido para crianças de 2 a 3 anos. A editora da publicação no Brasil, a Companhia das Letras afirmou, porém, que o livro destina-se a adolescentes. Nos últimos meses, as redes sociais foram tomadas por vídeos, imagens e links que afirmavam categoricamente que a obra era parte do famigerado ‘kit gay’, o projeto Escola Sem Homofobia, o que não é verdade. A informação falsa chegou a ser propagada inclusive pelo presidente eleito Bolsonaro em entrevista ao Jornal Nacional.
Na mesma palestra, a agora futura ministra também disseminou informações falsas ao dizer que a gestão de Marta Suplicy (ex-PT, hoje MDB) na Prefeitura de São Paulo contratou uma ONG para “ensinar professores de creches sobre ereção de bebês e masturbação”. Como fonte, Damares citava uma reportagem de 2004 do Estado de S. Paulo, que, por sua vez, não traz a informação citada por ela na palestra.
O que o jornal denunciou, na verdade, foi a contratação dos serviços do Grupo de Trabalho e Pesquisa em Orientação Sexual (GTPOS), ONG ligada à própria Marta Suplicy, “para desenvolver um projeto de sexualidade e direitos reprodutivos nas escolas”. Não há qualquer menção a “ereção de bebês”.
Já em uma palestra em 2016, Damares afirmou que um “kit satânico” estaria sendo distribuído nas escolas pelo governo, mas essa informação provou-se falsa, como Aos Fatos checou durante as eleições. Na realidade, o kit nada mais era do que o material de apoio ao projeto educacional BÚ! Histórias de Medo e Coragem.
Distribuído em algumas escolas, o material pretendia incentivar os alunos a produzirem conteúdos sobre medos e coragem por meio da leitura e produção de contos. Esse projeto é uma das ações de incentivo a literatura do Programa Endesa Brasil de Educação e Cultura e do Ministério da Cultura.
Damares Alves é advogada e pastora da Igreja do Evangelho Quadrangular. Sua carreira política começou em meados de 2010, quando trabalhou para o senador Arolde de Oliveira (PSD). Desde 2015, ela é assessora parlamentar do senador Magno Malta (PR).
O futuro ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta (DEM), já divulgou informações controversas sobre o consumo de maconha durante uma audiência da Comissão da Seguridade Social e Família de maio de 2015 na Câmara dos Deputados. Para ele, não há sentido legalizar a droga, já que ela “dá câncer”. Nesse mesmo discurso, Mandetta chegou a ironizar o consumo da erva dizendo que: “se o cara começa na maconha, passa pra cocaína, vai no crack, acaba votando no PT no final do processo todo”.
Por mais que o consumo de maconha traga riscos à saúde, como o aparecimento de sintomas de bronquite crônica e interferências em funções cognitivas e motoras, ainda não é possível correlacionar o câncer com a droga. Segundo o estudo de 2015 “An epidemiologic review of marijuana and cancer: an update”, da revista Cancer, Epidemiology, Biomarkers & Prevention, que reuniu 34 estudos epidemiológicos sobre maconha e câncer, não há como ter certeza se o consumo aumenta o risco de contrair a doença.
Um estudo deste ano, publicado na revista americana Chest, revisou outros artigos que tratam somente da correlação com doenças do pulmão. Segundo o artigo, “um grande estudo de corte e uma análise conjunta de seis estudos de caso bem realizados não encontraram evidências de uma ligação entre o fumo de maconha e o câncer de pulmão”.
Os dois estudos citados apontam que os riscos só serão realmente conhecidos quando forem realizadas mais pesquisas em comunidades onde o acesso a droga é maior (como acontece com o cigarro de tabaco, por exemplo).
Mandetta é médico ortopedista e entrou para a política em 2005, quando assumiu a pasta de Saúde da prefeitura de Campo Grande (MS), durante o governo de Nelson Trad Filho (MDB). Em 2010 foi eleito deputado federal, cargo no qual permanece até hoje. Também foi presidente da Unimed da capital de Mato Grosso do Sul de 2001 a 2004.
Quando aceitou o convite de Bolsonaro, o futuro ministro da Educação, Ricardo Veléz Rodriguez, disse que adotaria uma posição de “elaboração de normas no contexto da preservação de valores caros à sociedade brasileira, que, na sua essência, é conservadora”. Porém, o resultado das duas últimas pesquisas nacionais sobre a aceitação de pautas e visões conservadoras e progressistas no país mostram uma realidade distinta.
O levantamento realizado pelo Datafolha concluiu que a maioria das pessoas acredita que imigrantes “contribuem com o desenvolvimento e a cultura” (70%), que a homossexualidade “deve ser aceita por toda a sociedade” (74%) e que os cidadãos não deveriam ter o direito à posse de armas (55%). Tais resultados aproximam a opinião pública da visão progressista.
A pesquisa do Ideia Big Data, por sua vez, apontou que 65,5% dos brasileiros acreditam que pessoas do mesmo sexo devem ter o direito de se casar; que 62,6% concordam que esses casais possam adotar crianças; e que 62,4% acham que direitos humanos devem valer para todos, incluindo bandidos. As posições também são distintas do pensamento conservador a que Veléz Rodriguez se referia.
Por outro lado, os brasileiros são, de fato, mais conservadores quando o assunto é a liberação de drogas e do aborto, de acordo com os dois levantamentos: 55,4% não acham que a maconha deve ser legalizada, segundo o Ideia Big Data. A regulamentação do aborto é reprovada por 70% dos entrevistados pelo Datafolha.
Ricardo Veléz Rodriguez é professor-colaborador do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Religião da UFJF (Universidade Federal de Juiz de Fora). Em suas falas, já se posicionou favoravelmente ao Escola Sem Partido e criticou o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio). Foi indicado pelo professor Olavo de Carvalho logo após a bancada evangélica se posicionar contra o primeiro nome, do educador Mozart Neves.
“Tenho certeza de que não há ‘veneno’ nenhum. É discurso porque, primeiro, as pessoas só usam defensivos quando necessário, como remédios”, disse a deputada federal e futura ministra da Agricultura Tereza Cristina (DEM-MS) em um evento na Câmara de Campo Grande em junho deste ano. Defensora ferrenha do uso do agrotóxicos, a líder da bancada ruralista na Câmara Federal foi apelidada por seus colegas de Musa Veneno pelo empenho na tramitação do PL 6299/2002, que flexibiliza regras de controle de agrotóxicos no Brasil.
A certeza de que os defensivos agrícolas não causam mal à saúde vai, porém, contra diversos estudos científicos, como o Science and Total Environment de 2017. Segundo a pesquisa, que reuniu a bibliografia de diversos outros artigos sobre o tema, “as associações estatísticas entre a exposição a certos agrotóxicos e a incidência de algumas doenças são convincentes e não podem ser ignoradas”, ainda que seja difícil elucidar os impactos dos produtos na saúde humana devido a vários fatores, como tipo de pesticida, tempo de exposição e características ambientais.
Os dados disponíveis sobre danos à saúde causados pelos defensivos no Brasil também são alarmantes. Foram registrados 4.003 casos de intoxicações por agrotóxicos agrícolas no país em 2017, cerca de 11 por dia, segundo o Ministério da Saúde e a Fundação Fiocruz.
Dentre os efeitos mais preocupantes associados à exposição a agrotóxicos, segundo o Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva, “os mais preocupantes são as intoxicações crônicas, caracterizadas por infertilidade, impotência, abortos, malformações , neurotoxicidade, manifestada através de distúrbios cognitivos e comportamentais e quadros de neuropatia e desregulação hormonal, ocorrendo também em adolescentes, causando impacto negativo sobre o seu crescimento e desenvolvimento dentre outros desfechos durante esse período”. As informações constam do Dossiê Científico e Técnico contra o PL 6299/02 (parte 1 e parte 2).
Já o Atlas dos Agrotóxicos calcula que, de 2007 a 2014, pelo menos 1.186 pessoas morreram intoxicadas por defensivos agrícolas, uma média de 148 mortes por ano. Ainda assim, o documento alerta para uma subnotificação das ocorrências: calcula-se que, para cada caso de intoxicação notificada, outros 50 não sejam notificados.
Tereza Cristina é engenheira agrônoma, produtora rural e deputada federal pelo Mato Grosso do Sul desde 2015, quando ainda era filiada ao PSB. Ela foi uma das responsáveis pelo apoio declarado da Frente Parlamentar da Agropecuária (que reúne hoje 262 parlamentares) a Jair Bolsonaro ainda antes do primeiro turno das eleições.
O futuro ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles (Novo), publicou em setembro deste ano um artigo na plataforma Medium em que sustenta que o nazismo era parte da esquerda e classificou o movimento liderado por Adolf Hitler de “socialismo de preto” (em um paralelo com o comunismo, que seria o “socialismo de vermelho”).
A informação, claro, é falsa, mas chegou a circular com tal força que a Embaixada da Alemanha no Brasil fez um vídeo explicando a história do nazismo naquele país e explicando que o movimento era uma ideologia cunhada na extrema-direita: “devemos nos opor aos extremistas de direita, não devemos ignorar, temos que mostrar nossa cara contra neonazistas e antissemitas”.
Ricardo de Aquino Salles foi candidato a deputado federal pelo Partido Novo nessas eleições, mas não conseguiu ser eleito. Antes da pasta, o advogado também foi secretário do ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB) e também ocupou a pasta de Meio Ambiente paulista durante o governo tucano.
Durante a campanha eleitoral deste ano, ele defendeu uma política da “Tolerância Zero” em que propunha balas de fuzil como a solução para questões como “praga do javali” e “esquerda e o MST”. O partido Novo, ao qual Salles é filiado, manifestou-se dizendo que não aprovava a mensagem.
O futuro ministro da Secretaria Geral da Presidência e coordenador da campanha vitoriosa de Jair Bolsonaro, Gustavo Bebianno (PSL), já lançou mão de pesquisas falsas em favor do seu candidato em publicações no Instagram, rede social que mais usa.
A primeira era uma suposta pesquisa de político mais honesto do Brasil. A imagem compartilhada por Bebianno é de um post do site Hoje Notícias, que já foi tirado do ar. A Fundação Transparência Política Internacional, à qual é atribuído o ranking, também não existe. Um versão semelhante da notícia falsa publicada por Bebianno já foi checada por Aos Fatos, durante o período eleitoral.
Outra falsa pesquisa compartilhada por Bebianno foi sobre apoio feminino a Bolsonaro. Ele compartilhou a imagem de um post do site Jornal Publi Cidade sobre um suposto aumento do apoio das mulheres por conta da defesa à castração química de estupradores. O texto do próprio post contradiz o título ao não mencionar nenhuma pesquisa e ao citar como fonte da informação uma reportagem do UOL com entrevistas de simpatizantes de Bolsonaro. A reportagem do UOL, de junho desse ano, cita a rejeição das mulheres, de acordo com pesquisas de intenção de votos da época, e busca entender o que motivava as que apoiavam o então candidato do PSL.
Advogado, Bebianno aproximou-se de Bolsonaro em 2017 e, no começo de 2018, assumiu a presidência do PSL, logo após a filiação do hoje presidente eleito. A partir daí, tornou-se um dos principais coordenadores da campanha. Logo após a eleição de Bolsonaro, Bebianno deixou a presidência do PSL e, em 12 de novembro, foi indicado ao primeiro escalão do futuro governo.
Símbolo da Operação Lava Jato e futuro ministro da Justiça, o ex-juiz Sérgio Moro minimizou a importância do projeto Escola Sem Partido para o governo que integrará a partir de janeiro. Na entrevista coletiva após a confirmação da sua indicação, no começo de novembro, ele disse que não havia “proposta concreta sobre este tema” por parte da administração Bolsonaro. A fala ignora que pilares do Escola Sem Partido constam na plataforma de governo apresentada pelo hoje presidente eleito nas eleições, como o ensino “sem doutrinação e sexualização precoce”.
O futuro ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta (DEM), também disseminou informações falsas a respeito do programa Mais Médicos, que será tutelado por ele a partir de 1º de janeiro. Segundo o ortopedista e deputado federal publicou em sua biografia oficial, o governo federal “tratou esses trabalhadores [médicos cubanos], não como trabalhadores individuais, mas como trabalhadores de um país como uma commodity, atingindo os trabalhadores, retendo seus salários, retendo seus documentos, proibindo seu deslocamento livre no território brasileiro”.
Mas não é verdade que o governo brasileiro fazia a retenção de salários dos médicos cubanos. Como Aos Fatos já explicou em uma checagem anterior, graças a um acordo com a Opas (Organização Panamericana de Saúde), o Brasil pagava o salário dos profissionais é destinado à organização, que dividia o valor para o médico e para o governo de Cuba, que ficava com a maior parte.
Também não foram identificadas informações que atestem o fato de o governo reter os documentos dos médicos cubanos e a suposta proibição de deslocamento pelo território brasileiro.
O futuro ministro da Educação, Ricardo Veléz Rodriguez, também cercou-se polêmicas em 2014 ao dizer, em seu perfil no Facebook, que o PT estaria ligado aos “criminosos da facção mais perigosa que opera no Brasil, com táticas de guerrilha urbana, o PCC”.
O suposto vínculo entre o partido e a facção vem de 2006, quando o então secretário de Segurança Pública de São Paulo, Saulo de Castro Abreu Filho, disse que haviam inquéritos que apontavam uma “correlação” entre os dois. Segundo uma ligação interceptada de criminosos do PCC, a facção criminosa combinou ataques contra políticos, menos os do PT, o que poderia indicar alguma ligação.
Logo após, o presidente do PFL da época, Jorge Bornhausen, e o então candidato José Serra (PSDB) acusaram o PT de envolvimento com a facção. Foi aberto um inquérito para apurar a ligação entre os dois. Aos Fatos não encontrou nenhuma atualização sobre o caso. Portanto, além de não haver provas que atestem o vínculo, o caso também se referia apenas ao Estado de São Paulo.
Houve ainda o caso do deputado estadual Luiz Moura (PT-SP), que teria participado de uma reunião na qual estariam presentes integrantes do PCC, segundo a polícia. A suspeita fez com que ele fosse expulso do partido. Mais uma vez, o caso não angariou provas que pudessem atestar ligações diretas e formais entre o PT e o PCC.
Futuro ministro do Desenvolvimento Social, Osmar Terra (MDB), que também é médico, publicou no Twitter em agosto deste ano que “maconha reduz o QI” ao compartilhar uma reportagem do G1 sobre uma tese da UFMG de que usuários de maconha tinham mais dificuldade para passar nas matérias da faculdade.
Porém, a reportagem não traz qualquer afirmação parecida: houve comparação de rendimento escolar entre usuário e não-usuários (apenas 50,7% dos estudantes que fumam maconha passaram direto em todas as disciplinas, enquanto entre os não usuários a proporção foi de 66,1%, por exemplo), mas sem definição de causalidade.
Por mais que existam estudos que sugerem que o consumo de maconha por adolescentes podem diminuir sua capacidade mental, há outros que mostram o contrário: em 2016, um artigo da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos estudou a influência da erva em gêmeos e constatou que foram encontradas “poucas evidências para sugerir que o uso de maconha adolescente tem um efeito direto sobre o declínio intelectual”.
Esta será a segunda vez do médico Osmar Terra no comando de uma pasta ministerial. O emedebista foi ministro do Desenvolvimento Social no governo de Michel Temer (MDB). Em sua carreira política ele também foi prefeito de Santa Rosa (RS), secretário de Saúde do Rio Grande do Sul e é deputado desde 2001.
O futuro ministro da Casa Civil e atual ministro extraordinário de Transição, Onyx Lorenzoni (DEM), foi um crítico contumaz da Reforma da Previdência enviada ao Congresso pelo presidente Michel Temer (MDB) em dezembro de 2016. Para barrar o projeto, ele lançou mão, inclusive, de informações incorretas.
Durante audiência da comissão especial que analisava o projeto, em abril de 2017, Lorenzoni afirmou que o problema principal do Regime Geral de Previdência Social é a unificação da previdência rural, “que, na verdade, é assistência e, por isso, deficitária” com a urbana, que seria, de acordo com Lorenzoni, superavitária.
Porém, em 2016, a previdência urbana teve déficit de R$ 46,3 bilhões e a rural, R$ 103,4 bilhões, em valores nominais, de acordo com o Ministério da Fazenda. Esse era o dado mais recente disponível na época da fala do hoje ministro.
Ernesto Araújo, futuro ministro das Relações Exteriores, também é conhecido por ter opiniões controversas, muitas das quais não podem ser comprovadas factualmente. Em seu blog pessoal, por exemplo, ele cita a existência de uma política globalista: “Globalismo é a globalização econômica que passou a ser pilotada pelo marxismo cultural. Essencialmente é um sistema anti-humano e anti-cristão”.
Posição que também é adotada pelo presidente americano, Donald Trump, a teoria propaga que ONU, União Europeia, China e ONGs financiadas por bilionários como George Soros comandariam um plano para dominação global e substitução das culturas tradicionais por uma moral secular, cosmopolita e esquerdista.
De acordo com o professor de Relações Internacionais da FAAP e da PUC-SP, David Magalhães, a tese, originalmente defendida no Brasil por Olavo de Carvalho em seu texto “Do Marxismo Cultural”, publicado no jornal O Globo em 2002, foi concebida pelo escritor Willian S. Lind. Segundo ele, o movimento revolucionário comunista preconizava introduzir seus ideais em todas as instituições que influenciavam a cultura, como igrejas, universidades, escolas e imprensa.
Ainda segundo essa teoria, os marxistas teriam conseguido ocupar todos os “meios de pensamento” dos EUA, das universidades aos estúdios de Hollywood. Segundo Olavo de Carvalho: “seus dogmas macabros, vindos sem o rótulo de ‘marxismo’, são imbecilmente aceitos como valores culturais supra-ideológicos pelas classes empresariais e eclesiásticas, cuja destruição é o seu único e incontornável objetivo. Dificilmente se encontrará hoje um romance, um filme, uma peça de teatro, um livro didático onde as crenças do marxismo cultural” não apareçam.
Ernesto Araújo atualmente é diplomata há 29 anos e diretor do Departamento dos Estados Unidos, Canadá e Assuntos Internacionais do Itamaraty. Junto com Ricardo Veléz, é o segundo ministro indicado pelo filósofo Olavo de Carvalho.
O levantamento realizado por Aos Fatos nos perfis de redes sociais, blogs, artigos, reportagens e entrevistas concedidas pelos futuros ministros de Bolsonaro esbarrou na falta de informações públicas e verificáveis de outros membros da futura Esplanada dos Ministérios. É o caso de Roberto Campos Neto (Banco Central), André Luiz de Almeida Mendonça (AGU), General Carlos Alberto dos Santos Cruz (Secretaria de Governo), Tarcísio Gomes de Freitas (Ministério da Infraestrutura), Gustavo Henrique Canuto (Desenvolvimento Regional), General Fernando Azevedo e Silva (Ministério da Defesa), Wagner Rosário (Controladoria Geral da União), General Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), Paulo Guedes (Ministério da Economia) e Bento Costa Lima Leite (Ministério de Minas e Energia).
Outro lado. Aos Fatos entrou em contato com os dez ministros que tiveram declarações analisadas nesta reportagem, mas não obteve respostas até a publicação desta reportagem.
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Veículo: Tribuna de Minas
Editoria: Cultura
Data: 14/12/2018
Título: Reprodução do vestido de Maria Amália será exibido em mostra especial no Museu
Após pesquisa e trabalho minucioso, com alguns detalhes costurados à mão, a reprodução do vestido de Maria Amália está finalizada. A peça, confeccionada pela professora do curso de Design de Moda do Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora (CES-JF), Andrea Portela, com participação de algumas de suas alunas, será exibida em mostra especial no Museu “Mariano Procópio”, com previsão para o início de 2019. A intenção é expor a roupa com alguns objetos que pertenciam à matriarca da família Ferreira Lage, contextualizando a personagem e o comportamento da mulher do século 19.
O trabalho acadêmico é continuidade da tese de doutorado, apresentada por Andrea à Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), dando seguimento ao projeto de inicialização científica. Nesta sexta-feira, 14, será produzido ensaio fotográfico em alguns ambientes do castelinho e no prédio do Museu, na Galeria “Maria Amália”, que recebeu esse nome como homenagem do filho Alfredo Ferreira Lage, fundador da instituição. As fotos serão divulgadas nas redes sociais, com objetivo de apresentar a reprodução do vestido, que será exibido na mostra. A parceria com o CES reforça o vínculo com o meio acadêmico, que, assim como a sociedade, deve se apropriar do espaço público cultural.
O vestido de Maria Amália faz parte do acervo de indumentárias do Museu, assim como os fardões da maioridade e do casamento de Dom Pedro II, dentre outras peças, como chapéus e sapatos. A fundação recebe periodicamente solicitações para estudos em diferentes temas, e os interessados em realizar pesquisas podem solicitar o agendamento para atendimento pelo telefone 3690-2200 ou pelo portal de serviços da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF).
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Veículo: Agora RN
Editoria: Cidades
Data: 14/12/2018
Título: Secretaria de Educação do RN dispensa licitação para contrato de R$ 1 milhão
Restando poucos dias para o fim da atual do governo, a Secretaria de Educação do Rio Grande do Norte (SEEC) publicou nesta sexta-feira, 14, extrato de dispensa de licitação, com valor total de R$ 1,105 milhão, para contratar uma empresa de avaliação e monitoramento dos índices da educação pública. O valor será pago à Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), de Minas Gerais.
Esta é terceira vez que a secretaria promove a avaliação do aprendizado dos alunos, que é chamada de Sistema Integrado de Monitoramento e Avaliação Institucional (Simais). O valor do contrato deste ano é 110% maior que o de 2017, quando se também contratou a mesma instituição de ensino mineira. O contrato do ano passado foi de R$ 525 mil.
Em 2016, no primeiro ano da atividade, o contrato foi de R$ 4,4 milhões, mas envolveu processo licitatório. À época, a concorrência pública foi vencida pelo Instituto Avaliar.
Em 2018, a avaliação foi feita para atingir 50 mil alunos e 551 escolas públicas da rede estadual, com foco nas turmas do 5º e 9º ano do ensino fundamental e da 3ª e 4ª série do ensino médio. No ano passado, o registro de preço foi feito para atender 24 mil alunos de 276 unidades de ensino, para turmas da 3ª série do ensino médio. E em 2016 foram 120 mil estudantes de 600 escolas, para as turmas do 5º, 6º e 9º ano do ensino fundamental e 1ª e 3ª série do ensino médio.
Segundo a secretária adjunta de educação, Mônica Guimarães, a dispensa de licitação é justificada por ser uma contratação de serviço técnico, como preconiza a lei de licitações e contratos da administração pública (8.666/93). “A Coordenação de Avaliação da Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora é especializada neste tipo de pesquisa. A avaliação promovida por eles é aplicada em outras 14 unidades da Federação, além de diversos municípios brasileiros”, diz.
O processo foi aberto em 24 de maio e o contrato foi assinado em 18 de outubro. “Na tramitação do processo, a assessoria jurídica [da Secretaria de Educação] percebeu que não havia sido feita a publicação do termo de homologação da dispensa de licitação. O processo passou pela Procuradoria Geral do Estado [PGE] e seguiu toda a tramitação legal”, justifica Mônica Guimarães.
Os recursos para a realização das provas são provenientes do Projeto RN Sustentável, que é fruto de um empréstimo feito pelo Banco Mundial ao governo do Rio Grande do Norte.
Para a adjunta, o contrato com a instituição de ensino mineira foi uma ação isolada e o gasto estava dentro do planejamento da pasta em 2018. “A avaliação é continuada e não uma ação isolada. Não foi feita em cima da hora em razão das eleições. O processo de ensino e aprendizagem é inerente à Secretaria de Educação, para garantir nossas metas educacionais”, explica Mônica Guimarães.
De acordo com informações da Secretaria de Educação, a taxa de participação da prova foi de 57% do total previsto, cerca de 14 mil estudantes. À época, os participantes conseguiram a média de 2,96 no índice de proficiência, o que representa que os estudantes conseguiram ultrapassar a meta estabelecida para o ano.
A adjunta explica que os resultados obtidos pela avaliação própria são comparáveis com os números do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), que é aplicado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). “Temos como trabalhar com os números semelhantes ao da avaliação nacional. Com o sistema próprio, nós conseguimos avaliar melhor as escolas públicas, a partir dos índices em português e matemática. É um ganho efetivo para educação, pois as unidades de ensino têm metas próprias para serem alcançadas”, reforça.
De acordo com dados do Ministério da Educação, a educação do Rio Grande do Norte se encontra no 22º em relação ao país em relação ao Saeb. Em 2017, o Estado obteve 244 pontos na avaliação, contra os 247 pontos de 2015, da última prova nacional.
“Precisamos manter os estudos e analisar a série histórica de três a cinco anos para termos resultados. O ideal é que seja mantido o método ao longo tempos, pois as modificações na metodologia podem gerar mudanças nos indicadores obtidos”, conclui a secretária adjunta de educação.
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Veículo: Tribuna de Minas
Editoria: Coluna Cesar Romero
Data: 15/12/2018
Link: https://tribunademinas.com.br/colunas/cesar-romero/15-12-2018/298947.html
Título: Antenado
Muito elogiada por quem circulou no Campus a iniciativa “Adote um livro, sinta-se à vontade para pegar o seu”, da ONG Engenheiros sem Fronteiras.
Em pouco mais de três horas, os exemplares oferecidos foram consumidos por estudantes e funcionários da UFJF. Incentivar o hábito da leitura é sempre bem vindo.
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Veículo: Tribuna de Minas
Editoria: Coluna Cesar Romero
Data: 15/12/2018
Link: https://tribunademinas.com.br/colunas/cesar-romero/15-12-2018/298947.html
Título: Voo livre
A publicitária Talita Magnolo fecha o ano com chave de ouro: foi aprovada no doutorado da UFJF.
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Veículo: BBC Brasil
Editoria: Brasil
Data: 15/12/2018
Link: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-46547305
Título: 50 anos do AI-5: os integrantes da equipe de Bolsonaro considerados ‘subversivos’ e ‘infiltrados comunistas’ pela ditadura
Ao debater o regime militar (1964-1985), integrantes da equipe de transição e do futuro governo Bolsonaro dizem que a repressão da época – que deixou mais de 400 pessoas mortas e desaparecidas, de acordo com o relatório da Comissão Nacional da Verdade – ocorria no contexto de uma guerra: entre o Estado brasileiro e grupos armados que tentaram impor o comunismo.
Mas um levantamento da BBC News Brasil nos arquivos daquela época mostra que a repressão e a vigilância não se resumia à esquerda armada. Até mesmo pessoas que hoje fazem parte da equipe de transição do presidente eleito foram vigiadas de perto pelo aparato de inteligência dos militares – alguns, inclusive, foram considerados “infiltrados comunistas” e “subversivos”.
“(O golpe de 64) Foi um contragolpe contra um movimento crescente de comunistas. Os militares assumiram o poder, e tivemos uma guerra”, disse ao jornal O Globo o cientista político e professor aposentado da UnB, Antônio Flávio Testa. Ele participou do grupo de militares e intelectuais que formulavam propostas para Bolsonaro, e hoje faz parte da equipe de transição. Na década de 1970, porém, o próprio Testa foi alvo de um inquérito aberto contra si e chegou a ser detido “por algumas horas”, por participar de atividades ligadas ao movimento estudantil.
Quem investigava?
O Serviço Nacional de Informações (SNI) foi criado em junho de 1964, poucos meses depois do golpe militar – que, em 31 de março daquele ano depôs o presidente João Goulart e estabeleceu um regime autoritário que durou até 1985.
O SNI foi idealizado pelo general Golbery do Couto e Silva, e era composto por um Agência Central, em Brasília, e agências e escritórios espalhados por todo o país e em todos os órgãos do governo. O SNI existiu até 1990, quando foi substituído por uma estrutura menor e sob controle civil. O conjunto todo era chamado de “comunidade de informações” do regime.
Como os integrantes da equipe de transição de Bolsonaro e do futuro governo aparecem nos arquivos do SNI?
O futuro presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o economista Carlos Doellinger, foi nomeado num documento de 1985 como “infiltração comunista” no governo de José Sarney, que havia acabado de tomar posse. Já o guru econômico de Bolsonaro, Paulo Guedes, teve sua ficha levantada quando pediu um passaporte de viagem, nos anos 1970 – mas nada pesava contra ele.
O cientista político Antônio Flávio Testa, que fez parte do grupo de formuladores das políticas de Bolsonaro e integra o gabinete de transição, era considerado “subversivo” porque participava do movimento estudantil da Universidade de Brasília (UnB), nos anos 1970, e chegou a ser detido por algumas horas, segundo contou à reportagem.
O próximo ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, foi vigiado por ser estrangeiro e por participar de congressos de filosofia na década de 1980. A inteligência da ditadura também mencionou textos dele contra a Teologia da Libertação, uma ala de esquerda da Igreja Católica, em análises de conjuntura.
O futuro ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno – que foi comandante militar na Amazônia e chefe da missão de paz no Haiti, a Minustah – aparece como integrante de uma chapa apoiada pelo governo do general João Figueiredo na disputa pelo Clube Militar. Dickson Melges Grael, pai dos velejadores Lars e Torben Grael, fazia parte da chapa adversária.
As pessoas mencionadas nos documentos foram procuradas pela reportagem, mas só Antônio Flávio Testa quis comentar o assunto.
‘Até quem nunca sonhou em ser comunista era vigiado’
A maioria das pessoas monitoradas pela inteligência do regime militar nunca teve qualquer envolvimento com o comunismo organizado ou com a esquerda, de acordo com o historiador especializado em história política Antônio Barbosa.
Isso porque quando o SNI surgiu, em 1964, o mundo vivia uma tensão crescente entre os Estados Unidos – capitalista – e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, capitaneada pela Rússia comunista. Ao tomarem o poder no Brasil, os militares justificaram o novo regime como uma forma de evitar que o país aderisse ao bloco soviético – e esse discurso se manteve ao longo de todo o período militar, diz Barbosa, que é professor da Universidade de Brasília (UnB).
“Depois de 1961, quando Cuba se declara marxista-leninista, a Guerra Fria atravessou o Oceano Atlântico e veio da Europa para as Américas. Nesse momento ocorre uma série de golpes militares de direita, anticomunistas, na América Latina, inclusive no Brasil”, diz ele.
“Muito do trabalho dos órgãos de segurança, como o SNI, era o que eles chamavam de ‘luta contra a subversão’. Na verdade, era a luta contra as esquerdas (…), que ia muito além da parcela que fazia a luta armada. O espectro dos inimigos do regime era muito amplo. Entravam aí liberais, democratas de forma geral, socialistas, e qualquer um que não rezava pela cartilha do regime”, diz ele.
De 251 acervos, só 40 foram encontrados até hoje
Ao longo dos anos, o SNI produziu um acervo gigantesco. Os dossiês principais eram identificados com a sigla ACE – Arquivo Cronológico de Entrada – e iam sendo numerados em ordem direta, conforme eram produzidos. “Só na Agência Central, a numeração (dos ACEs) chegou a cem mil em 1978. E aí eles zeraram a conta. É por isso que, a partir deste ano, a numeração fica baixa”, explica o historiador Pablo Franco, que trabalha com o acervo da ditadura no Arquivo Nacional, onde o material está guardado hoje.
Infelizmente, apenas uma pequena parte desse material se salvou. O restante não foi encontrado até hoje, e o destino desses documentos é incerto.
“O SNI era a ‘cabeça’ do sistema de informações, mas os outros órgãos que foram criados no regime alimentavam o SNI. Então você tinha o Centro de Informações do Exército, o Cenimar (da Marinha) e o Cisa (da Aeronáutica). Eles vigiavam os militares das forças, mas também a sociedade de forma geral. Dentro de cada órgão público, de cada universidade, tinha uma estrutura dessas”, conta Pablo.
“A gente sabe por fontes documentais, por exemplo, que dentro do Ministério da Educação tinha uma DSI (Divisão de Segurança e Informações). Mas o MEC nunca encontrou os papéis produzidos por essa Divisão. A gente sabe que existiu, mas não se sabe o paradeiro dos documentos”, diz ele.
Desde 2008, historiadores do Arquivo Nacional que investigam esse período histórico já identificaram 251 agências e diretorias de inteligência, mas apenas 40 dessas tiveram seus documentos recuperados, segundo Pablo.
Vélez Rodríguez e a Teologia da Libertação
Nascido em Bogotá, na Colômbia, e naturalizado brasileiro, Vélez Rodríguez é filósofo e teólogo de formação. Chegou ao cargo de ministro da Educação do futuro governo depois de indicado pelo também filósofo e guru conservador Olavo de Carvalho. Em seu blog, Vélez diz que os brasileiros viveram nos últimos anos como “reféns de um sistema de ensino alheio às suas vidas e afinado com a tentativa de impor, à sociedade, uma doutrinação de índole cientificista e enquistada na ideologia marxista, travestida de ‘revolução cultural gramsciana'”.
Como professor – e estrangeiro – Vélez não escapava do olhar atento da Comunidade de Informações do regime.
Num documento de 1985, a Assessoria de Segurança e Informações (ASI) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) pede uma checagem das informações sobre ele na base de dados do Serviço Nacional de Informações (SNI), antes dele assumir o cargo de professor. Outro trecho de dossiê do mesmo ano registra a presença de Vélez num seminário de filosofia organizado pela Arquidiocese do Rio de Janeiro e pela Sociedade Brasileira de Filósofos Católicos, em outubro daquele ano – e visto com desconfiança pelos militares.
Além disso, os relatórios do SNI também citam Vélez em alguns momentos como autor de estudos e artigos críticos à Teologia da Libertação – uma ala de esquerda da Igreja Católica, surgida na América Latina, e para a qual os ensinamentos de Jesus incluem a luta contra injustiças sociais.
Um dos dossiês, da década de 1980, reproduz um trecho de um artigo do futuro ministro, no qual ele afirma que a corrente do teólogo Leonardo Boff representava uma “progressiva penetração da URSS (União Soviética) no nosso continente, através da politização e da radicalização (…)”. Em outro artigo, este publicado no jornal O Estado do Paraná e citado pelos militares, Rodríguez diz que a Teologia da Libertação faz uma “releitura tendenciosa” do texto bíblico.
Augusto Heleno contra o pai de Lars Grael
Paranaense de Curitiba, Augusto Heleno Ribeiro Pereira é o militar mais próximo do presidente eleito Jair Bolsonaro. Antes mesmo do começo da disputa eleitoral, comandava as reuniões do grupo de formuladores do programa de governo do candidato do PSL. Quase foi candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro, no lugar de Hamilton Mourão – o que só não aconteceu porque o partido de Heleno, o PRP, não topou.
Nos papéis da ditadura já digitalizados e acessíveis ao público, Heleno aparece uma única vez. Trata-se de um dossiê de janeiro de 1984 sobre a eleição para a diretoria do Clube Militar, no Rio de Janeiro, que aconteceria em maio.
Heleno – que na época era major do Exército – integrava a chapa “governista” na disputa pelo comando do clube. Conforme o dossiê, o grupo dele tinha o apoio do ministro do Exército da época, Walter Pires de Carvalho e Albuquerque. A chapa de Heleno era encabeçada por um general de três estrelas chamado Tasso Villar de Aquino. Heleno era suplente do Conselho Fiscal.
Do outro lado estava a chapa “Soberania Nacional”.
“Dentre os integrantes desta Chapa (‘Soberania’) encontram-se militares contestadores e indisciplinados, como os coronéis Tarcísio Célio Carvalho Nunes e Dickson Melges Grael, cujos comportamentos inconvenientes são sobejamente conhecidos”, diz um trecho do dossiê.
Dickson Melges Grael é pai dos velejadores Lars e Torben Grael. No ano seguinte, 1985, ele publicou um livro revelando informações sobre o atentado do Riocentro – quando dois militares tentaram explodir uma bomba num show de música em comemoração ao Dia do Trabalhador, no Rio.
Contando com o apoio do governo do então presidente João Figueiredo, a chapa de Heleno ganhou – teve 4.175 votos contra 2,5 mil do grupo de oposição.
Futuro presidente do Ipea era visto como”infiltração comunista”
Em novembro deste ano, o economista carioca Carlos Von Doellinger foi indicado pelo guru econômico de Bolsonaro, Paulo Guedes, para assumir a presidência do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Doellinger já foi pesquisador do Ipea – também deu aulas na Universidade Federal do Rio de Janeiro e presidiu o Banco do Estado do Rio, o antigo Banerj. Mas em maio 1985, no primeiro governo civil, ele era visto como uma “infiltração comunista” pelo Cisa (Centro de Informações da Aeronáutica).
Doellinger foi para o governo em 15 de março de 1985, quando o maranhense José Sarney tomou posse como o primeiro presidente civil depois do ciclo de generais no poder no Brasil. No mesmo dia, o Diário Oficial trouxe a nomeação da Esplanada de Sarney. Francisco Dornelles, hoje governador interino do Rio, foi escolhido ministro da Fazenda. E levou consigo Doellinger, que foi nomeado secretário-geral adjunto do Ministério.
Em maio de 1985, o Cisa produziu um dossiê batizado de “Infiltração comunista nos diversos setores de atividade”. “(…) os elementos abaixo, nomeados para cargos e funções de confiança em órgãos do Poder Executivo, registraram antecedentes negativos neste Centro”, dizia o documento.
A lista de pessoas com “antecedentes” é extensa e ideologicamente heterogênea. Inclui Cláudio Lembo (que seria governador de SP pelo PSDB), Dilson Funaro (veio a ser ministro da Fazenda); Dorothea Werneck (chegou a ministra do Trabalho); Carlos Alberto Menezes Direito (foi ministro do STF); Cláudio Fonteles (ex-Procurador-Geral da República) e até o jornalista de economia Carlos Alberto Sardenberg.
O documento segue descrevendo outras esferas em que teria havido “infiltração comunista”, inclusive na reformulação da educação superior.
Embora o governo já fosse civil, o SNI continuou existindo, e sob o comando de militares. O órgão só foi desmantelado completamente em 1990.
Carlos Von Doellinger acabou deixando o governo poucos meses depois, em agosto de 1985. Há outros documentos que mencionam o economista – geralmente informes sobre sua participação em congressos da área.
Ex-professor da UnB considerado “subversivo”
Antônio Flávio Testa é cientista político e professor aposentado da Universidade de Brasília (UnB), além de assessor técnico do Senado Federal. Antes mesmo do começo da campanha oficial, colaborou com o grupo de militares e especialistas responsáveis por formular propostas para Jair Bolsonaro. Próximo dos generais Augusto Heleno e Oswaldo Ferreira, Testa disse ao jornal O Globo que seu envolvimento com o grupo não envolve identificação ideológica.
“Eu não sou de esquerda nem de direita. E não considero Bolsonaro de direita, nem Lula de esquerda. São dois programáticos”, disse ele ao jornal O Globo, em setembro de 2018.
Na década de 1970, porém, Testa era estudante de graduação da UnB – e envolvido com o movimento estudantil da época. Por isso, foi alvo de vigilância constante da Assessoria de Segurança e Informações (ASI) da UnB, que era o braço do SNI dentro da universidade.
Em 1976, Testa integrava uma das chapas que disputou o comando do Diretório Central dos Estudantes (DCE), a principal entidade estudantil da universidade. Concorreu como diretor de Esportes, na chapa Oficina.
Para a ASI da UnB, tanto o grupo de Testa quanto a chapa adversária, batizada de Unidade, eram “subversivas”. “Os panfletos distribuídos por ambas as chapas continham incitações à indisciplina (…), além de aleivosias ao Governo e à Administração da UnB. (…) Além de conter incitações à luta de classes, à discórdia e à desordem”. A eleição nunca aconteceu: foi suspensa pela direção da universidade, e os integrantes das duas chapas – inclusive Testa – tiveram inquéritos abertos contra si.
À reportagem da BBC News Brasil, testa disse que não respondeu realmente ao inquérito, e que o episódio não trouxe maiores consequências para ele. “Nada (de consequência). Fiquei detido algumas horas”, disse.
O nome de Antônio Flávio Testa aparece em vários outros documentos produzidos pela ASI-UnB ao longo da década de 1970. Toda participação numa palestra ou protesto eram devidamente registradas pelo braço do SNI na universidade, às vezes inclusive com fotografias.
Pouco depois da publicação da reportagem, Testa procurou a BBC News Brasil para frisar que nunca foi, “de jeito nenhum”, um “subversivo”.
“Sou karateca, dava aulas no DCE, daí a fama. Me chamaram para compor a chapa dos estudantes, como diretor de Esportes. Apenas isso. nada político, só treinos. Era e sou ainda muito conhecido. Me relaciono com todo mundo”, conta ele, sobre o período – ele acrescenta que nunca foi “contra o capitalismo”, e que considera o termo “subversivo” obsoleto.
“Eram outros tempos”, diz ele. “Se você fosse poeta e escrevesse letras de música para festivais estudantis, tinha que passar pelo crivo da censura. Foi um tempo de grande desconfiança”.
“Depois (da UnB), passei em concurso para antropólogo da Funai em pleno regime militar. Se fosse subversivo, não teria sido aceito. Trabalhei em áreas sensíveis, delimitando terras indígenas (…). Nunca tive problemas com militares. Dei aulas de karatê para os Fuzileiros Navais e no RCG (Regimento de Cavalaria de Guardas) do Exército. Tive centenas de alunos militares”, disse ele à reportagem.
*Este texto foi atualizado às 19h35 do dia 15/12/2018 para incluir mais informações.
**Às 20h30, foi atualizdo novamente para corrigir o nome do Serviço Nacional de Informações (SNI), grafado incorretamente como ‘Sistema Nacional de Informações’ na versão anterior do texto.
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Veículo: MSN
Editoria: Notícias
Data: 15/12/2018
Título: Os integrantes da equipe de Bolsonaro considerados ‘subversivos’ e ‘infiltrados comunistas’ pela ditadura
Ao debater o regime militar (1964-1985), integrantes da equipe de transição e do futuro governo Bolsonaro dizem que a repressão da época – que deixou mais de 400 pessoas mortas e desaparecidas, de acordo com o relatório da Comissão Nacional da Verdade – ocorria no contexto de uma guerra: entre o Estado brasileiro e grupos armados que tentaram impor o comunismo.
Mas um levantamento da BBC News Brasil nos arquivos daquela época mostra que a repressão e a vigilância não se resumia à esquerda armada. Até mesmo pessoas que hoje fazem parte da equipe de transição do presidente eleito foram vigiadas de perto pelo aparato de inteligência dos militares – alguns, inclusive, foram considerados “infiltrados comunistas” e “subversivos”
“(O golpe de 64) Foi um contragolpe contra um movimento crescente de comunistas. Os militares assumiram o poder, e tivemos uma guerra”, disse ao jornal O Globo o cientista político e professor aposentado da UnB, Antônio Flávio Testa. Ele participou do grupo de militares e intelectuais que formulavam propostas para Bolsonaro, e hoje faz parte da equipe de transição. Na década de 1970, porém, o próprio Testa foi alvo de um inquérito aberto contra si e chegou a ser detido “por algumas horas”, por participar de atividades ligadas ao movimento estudantil.
Quem investigava?
O Serviço Nacional de Informações (SNI) foi criado em junho de 1964, poucos meses depois do golpe militar – que, em 31 de março daquele ano depôs o presidente João Goulart e estabeleceu um regime autoritário que durou até 1985.
O SNI foi idealizado pelo general Golbery do Couto e Silva, e era composto por um Agência Central, em Brasília, e agências e escritórios espalhados por todo o país e em todos os órgãos do governo. O SNI existiu até 1990, quando foi substituído por uma estrutura menor e sob controle civil. O conjunto todo era chamado de “comunidade de informações” do regime.
Como os integrantes da equipe de transição de Bolsonaro e do futuro governo aparecem nos arquivos do SNI?
O futuro presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o economista Carlos Doellinger, foi nomeado num documento de 1985 como “infiltração comunista” no governo de José Sarney, que havia acabado de tomar posse. Já o guru econômico de Bolsonaro, Paulo Guedes, teve sua ficha levantada quando pediu um passaporte de viagem, nos anos 1970 – mas nada pesava contra ele.
O cientista político Antônio Flávio Testa, que fez parte do grupo de formuladores das políticas de Bolsonaro e integra o gabinete de transição, era considerado “subversivo” porque participava do movimento estudantil da Universidade de Brasília (UnB), nos anos 1970, e chegou a ser detido por algumas horas, segundo contou à reportagem.
O próximo ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, foi vigiado por ser estrangeiro e por participar de congressos de filosofia na década de 1980. A inteligência da ditadura também mencionou textos dele contra a Teologia da Libertação, uma ala de esquerda da Igreja Católica, em análises de conjuntura.
O futuro ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno – que foi comandante militar na Amazônia e chefe da missão de paz no Haiti, a Minustah – aparece como integrante de uma chapa apoiada pelo governo do general João Figueiredo na disputa pelo Clube Militar. Dickson Melges Grael, pai dos velejadores Lars e Torben Grael, fazia parte da chapa adversária.
As pessoas mencionadas nos documentos foram procuradas pela reportagem, mas só Antônio Flávio Testa quis comentar o assunto.
‘Até quem nunca sonhou em ser comunista era vigiado’
A maioria das pessoas monitoradas pela inteligência do regime militar nunca teve qualquer envolvimento com o comunismo organizado ou com a esquerda, de acordo com o historiador especializado em história política Antônio Barbosa.
Isso porque quando o SNI surgiu, em 1964, o mundo vivia uma tensão crescente entre os Estados Unidos – capitalista – e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, capitaneada pela Rússia comunista. Ao tomarem o poder no Brasil, os militares justificaram o novo regime como uma forma de evitar que o país aderisse ao bloco soviético – e esse discurso se manteve ao longo de todo o período militar, diz Barbosa, que é professor da Universidade de Brasília (UnB).
“Depois de 1961, quando Cuba se declara marxista-leninista, a Guerra Fria atravessou o Oceano Atlântico e veio da Europa para as Américas. Nesse momento ocorre uma série de golpes militares de direita, anticomunistas, na América Latina, inclusive no Brasil”, diz ele.
“Muito do trabalho dos órgãos de segurança, como o SNI, era o que eles chamavam de ‘luta contra a subversão’. Na verdade, era a luta contra as esquerdas (…), que ia muito além da parcela que fazia a luta armada. O espectro dos inimigos do regime era muito amplo. Entravam aí liberais, democratas de forma geral, socialistas, e qualquer um que não rezava pela cartilha do regime”, diz ele.
De 251 acervos, só 40 foram encontrados até hoje
Ao longo dos anos, o SNI produziu um acervo gigantesco. Os dossiês principais eram identificados com a sigla ACE – Arquivo Cronológico de Entrada – e iam sendo numerados em ordem direta, conforme eram produzidos. “Só na Agência Central, a numeração (dos ACEs) chegou a cem mil em 1978. E aí eles zeraram a conta. É por isso que, a partir deste ano, a numeração fica baixa”, explica o historiador Pablo Franco, que trabalha com o acervo da ditadura no Arquivo Nacional, onde o material está guardado hoje.
Infelizmente, apenas uma pequena parte desse material se salvou. O restante não foi encontrado até hoje, e o destino desses documentos é incerto.
“O SNI era a ‘cabeça’ do sistema de informações, mas os outros órgãos que foram criados no regime alimentavam o SNI. Então você tinha o Centro de Informações do Exército, o Cenimar (da Marinha) e o Cisa (da Aeronáutica). Eles vigiavam os militares das forças, mas também a sociedade de forma geral. Dentro de cada órgão público, de cada universidade, tinha uma estrutura dessas”, conta Pablo.
“A gente sabe por fontes documentais, por exemplo, que dentro do Ministério da Educação tinha uma DSI (Divisão de Segurança e Informações). Mas o MEC nunca encontrou os papéis produzidos por essa Divisão. A gente sabe que existiu, mas não se sabe o paradeiro dos documentos”, diz ele.
Desde 2008, historiadores do Arquivo Nacional que investigam esse período histórico já identificaram 251 agências e diretorias de inteligência, mas apenas 40 dessas tiveram seus documentos recuperados, segundo Pablo.
Vélez Rodríguez e a Teologia da Libertação
Nascido em Bogotá, na Colômbia, e naturalizado brasileiro, Vélez Rodríguez é filósofo e teólogo de formação. Chegou ao cargo de ministro da Educação do futuro governo depois de indicado pelo também filósofo e guru conservador Olavo de Carvalho. Em seu blog, Vélez diz que os brasileiros viveram nos últimos anos como “reféns de um sistema de ensino alheio às suas vidas e afinado com a tentativa de impor, à sociedade, uma doutrinação de índole cientificista e enquistada na ideologia marxista, travestida de ‘revolução cultural gramsciana'”.
Como professor – e estrangeiro – Vélez não escapava do olhar atento da Comunidade de Informações do regime.
Num documento de 1985, a Assessoria de Segurança e Informações (ASI) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) pede uma checagem das informações sobre ele na base de dados do Serviço Nacional de Informações (SNI), antes dele assumir o cargo de professor. Outro trecho de dossiê do mesmo ano registra a presença de Vélez num seminário de filosofia organizado pela Arquidiocese do Rio de Janeiro e pela Sociedade Brasileira de Filósofos Católicos, em outubro daquele ano – e visto com desconfiança pelos militares.
Além disso, os relatórios do SNI também citam Vélez em alguns momentos como autor de estudos e artigos críticos à Teologia da Libertação – uma ala de esquerda da Igreja Católica, surgida na América Latina, e para a qual os ensinamentos de Jesus incluem a luta contra injustiças sociais.
Um dos dossiês, da década de 1980, reproduz um trecho de um artigo do futuro ministro, no qual ele afirma que a corrente do teólogo Leonardo Boff representava uma “progressiva penetração da URSS (União Soviética) no nosso continente, através da politização e da radicalização (…)”. Em outro artigo, este publicado no jornal O Estado do Paraná e citado pelos militares, Rodríguez diz que a Teologia da Libertação faz uma “releitura tendenciosa” do texto bíblico.
Augusto Heleno contra o pai de Lars Grael
Paranaense de Curitiba, Augusto Heleno Ribeiro Pereira é o militar mais próximo do presidente eleito Jair Bolsonaro. Antes mesmo do começo da disputa eleitoral, comandava as reuniões do grupo de formuladores do programa de governo do candidato do PSL. Quase foi candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro, no lugar de Hamilton Mourão – o que só não aconteceu porque o partido de Heleno, o PRP, não topou.
Nos papéis da ditadura já digitalizados e acessíveis ao público, Heleno aparece uma única vez. Trata-se de um dossiê de janeiro de 1984 sobre a eleição para a diretoria do Clube Militar, no Rio de Janeiro, que aconteceria em maio.
Heleno – que na época era major do Exército – integrava a chapa “governista” na disputa pelo comando do clube. Conforme o dossiê, o grupo dele tinha o apoio do ministro do Exército da época, Walter Pires de Carvalho e Albuquerque. A chapa de Heleno era encabeçada por um general de três estrelas chamado Tasso Villar de Aquino. Heleno era suplente do Conselho Fiscal.
Do outro lado estava a chapa “Soberania Nacional”.
“Dentre os integrantes desta Chapa (‘Soberania’) encontram-se militares contestadores e indisciplinados, como os coronéis Tarcísio Célio Carvalho Nunes e Dickson Melges Grael, cujos comportamentos inconvenientes são sobejamente conhecidos”, diz um trecho do dossiê.
Dickson Melges Grael é pai dos velejadores Lars e Torben Grael. No ano seguinte, 1985, ele publicou um livro revelando informações sobre o atentado do Riocentro – quando dois militares tentaram explodir uma bomba num show de música em comemoração ao Dia do Trabalhador, no Rio.
Contando com o apoio do governo do então presidente João Figueiredo, a chapa de Heleno ganhou – teve 4.175 votos contra 2,5 mil do grupo de oposição.
Futuro presidente do Ipea era visto como”infiltração comunista”
Em novembro deste ano, o economista carioca Carlos Von Doellinger foi indicado pelo guru econômico de Bolsonaro, Paulo Guedes, para assumir a presidência do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Doellinger já foi pesquisador do Ipea – também deu aulas na Universidade Federal do Rio de Janeiro e presidiu o Banco do Estado do Rio, o antigo Banerj. Mas em maio 1985, no primeiro governo civil, ele era visto como uma “infiltração comunista” pelo Cisa (Centro de Informações da Aeronáutica).
Doellinger foi para o governo em 15 de março de 1985, quando o maranhense José Sarney tomou posse como o primeiro presidente civil depois do ciclo de generais no poder no Brasil. No mesmo dia, o Diário Oficial trouxe a nomeação da Esplanada de Sarney. Francisco Dornelles, hoje governador interino do Rio, foi escolhido ministro da Fazenda. E levou consigo Doellinger, que foi nomeado secretário-geral adjunto do Ministério.
Em maio de 1985, o Cisa produziu um dossiê batizado de “Infiltração comunista nos diversos setores de atividade”. “(…) os elementos abaixo, nomeados para cargos e funções de confiança em órgãos do Poder Executivo, registraram antecedentes negativos neste Centro”, dizia o documento.
A lista de pessoas com “antecedentes” é extensa e ideologicamente heterogênea. Inclui Cláudio Lembo (que seria governador de SP pelo PSDB), Dilson Funaro (veio a ser ministro da Fazenda); Dorothea Werneck (chegou a ministra do Trabalho); Carlos Alberto Menezes Direito (foi ministro do STF); Cláudio Fonteles (ex-Procurador-Geral da República) e até o jornalista de economia Carlos Alberto Sardenberg.
O documento segue descrevendo outras esferas em que teria havido “infiltração comunista”, inclusive na reformulação da educação superior.
Embora o governo já fosse civil, o SNI continuou existindo, e sob o comando de militares. O órgão só foi desmantelado completamente em 1990.
Carlos Von Doellinger acabou deixando o governo poucos meses depois, em agosto de 1985. Há outros documentos que mencionam o economista – geralmente informes sobre sua participação em congressos da área.
Ex-professor da UnB considerado “subversivo”
Antônio Flávio Testa é cientista político e professor aposentado da Universidade de Brasília (UnB), além de assessor técnico do Senado Federal. Antes mesmo do começo da campanha oficial, colaborou com o grupo de militares e especialistas responsáveis por formular propostas para Jair Bolsonaro. Próximo dos generais Augusto Heleno e Oswaldo Ferreira, Testa disse ao jornal O Globo que seu envolvimento com o grupo não envolve identificação ideológica.
“Eu não sou de esquerda nem de direita. E não considero Bolsonaro de direita, nem Lula de esquerda. São dois programáticos”, disse ele ao jornal O Globo, em setembro de 2018.
Na década de 1970, porém, Testa era estudante de graduação da UnB – e envolvido com o movimento estudantil da época. Por isso, foi alvo de vigilância constante da Assessoria de Segurança e Informações (ASI) da UnB, que era o braço do SNI dentro da universidade.
Em 1976, Testa integrava uma das chapas que disputou o comando do Diretório Central dos Estudantes (DCE), a principal entidade estudantil da universidade. Concorreu como diretor de Esportes, na chapa Oficina.
Para a ASI da UnB, tanto o grupo de Testa quanto a chapa adversária, batizada de Unidade, eram “subversivas”. “Os panfletos distribuídos por ambas as chapas continham incitações à indisciplina (…), além de aleivosias ao Governo e à Administração da UnB. (…) Além de conter incitações à luta de classes, à discórdia e à desordem”. A eleição nunca aconteceu: foi suspensa pela direção da universidade, e os integrantes das duas chapas – inclusive Testa – tiveram inquéritos abertos contra si.
À reportagem da BBC News Brasil, testa disse que não respondeu realmente ao inquérito, e que o episódio não trouxe maiores consequências para ele. “Nada (de consequência). Fiquei detido algumas horas”, disse.
O nome de Antônio Flávio Testa aparece em vários outros documentos produzidos pela ASI-UnB ao longo da década de 1970. Toda participação numa palestra ou protesto eram devidamente registradas pelo braço do SNI na universidade, às vezes inclusive com fotografias.
Pouco depois da publicação da reportagem, Testa procurou a BBC News Brasil para frisar que nunca foi, “de jeito nenhum”, um “subversivo”.
“Sou karateca, dava aulas no DCE, daí a fama. Me chamaram para compor a chapa dos estudantes, como diretor de Esportes. Apenas isso. nada político, só treinos. Era e sou ainda muito conhecido. Me relaciono com todo mundo”, conta ele, sobre o período – ele acrescenta que nunca foi “contra o capitalismo”, e que considera o termo “subversivo” obsoleto.
“Eram outros tempos”, diz ele. “Se você fosse poeta e escrevesse letras de música para festivais estudantis, tinha que passar pelo crivo da censura. Foi um tempo de grande desconfiança”.
“Depois (da UnB), passei em concurso para antropólogo da Funai em pleno regime militar. Se fosse subversivo, não teria sido aceito. Trabalhei em áreas sensíveis, delimitando terras indígenas (…). Nunca tive problemas com militares. Dei aulas de karatê para os Fuzileiros Navais e no RCG (Regimento de Cavalaria de Guardas) do Exército. Tive centenas de alunos militares”, disse ele à reportagem.
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Veículo: R7
Editoria: BBC Brasil
Data: 15/12/2018
Título: Os integrantes da equipe de Bolsonaro considerados ‘subversivos’ e ‘infiltrados comunistas’ pela ditadura
Ao debater o regime militar (1964-1985), integrantes da equipe de transição e do futuro governo Bolsonaro dizem que a repressão da época – que deixou mais de 400 pessoas mortas e desaparecidas, de acordo com o relatório da Comissão Nacional da Verdade – ocorria no contexto de uma guerra: entre o Estado brasileiro e grupos armados que tentaram impor o comunismo.
Mas um levantamento da BBC News Brasil nos arquivos daquela época mostra que a repressão e a vigilância não se resumia à esquerda armada. Até mesmo pessoas que hoje fazem parte da equipe de transição do presidente eleito foram vigiadas de perto pelo aparato de inteligência dos militares – alguns, inclusive, foram considerados “infiltrados comunistas” e “subversivos”
“(O golpe de 64) Foi um contragolpe contra um movimento crescente de comunistas. Os militares assumiram o poder, e tivemos uma guerra”, disse ao jornal O Globo o cientista político e professor aposentado da UnB, Antônio Flávio Testa. Ele participou do grupo de militares e intelectuais que formulavam propostas para Bolsonaro, e hoje faz parte da equipe de transição. Na década de 1970, porém, o próprio Testa foi alvo de um inquérito aberto contra si e chegou a ser detido “por algumas horas”, por participar de atividades ligadas ao movimento estudantil.
Quem investigava?
O Serviço Nacional de Informações (SNI) foi criado em junho de 1964, poucos meses depois do golpe militar – que, em 31 de março daquele ano depôs o presidente João Goulart e estabeleceu um regime autoritário que durou até 1985.
O SNI foi idealizado pelo general Golbery do Couto e Silva, e era composto por um Agência Central, em Brasília, e agências e escritórios espalhados por todo o país e em todos os órgãos do governo. O SNI existiu até 1990, quando foi substituído por uma estrutura menor e sob controle civil. O conjunto todo era chamado de “comunidade de informações” do regime.
Como os integrantes da equipe de transição de Bolsonaro e do futuro governo aparecem nos arquivos do SNI?
O futuro presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o economista Carlos Doellinger, foi nomeado num documento de 1985 como “infiltração comunista” no governo de José Sarney, que havia acabado de tomar posse. Já o guru econômico de Bolsonaro, Paulo Guedes, teve sua ficha levantada quando pediu um passaporte de viagem, nos anos 1970 – mas nada pesava contra ele.
O cientista político Antônio Flávio Testa, que fez parte do grupo de formuladores das políticas de Bolsonaro e integra o gabinete de transição, era considerado “subversivo” porque participava do movimento estudantil da Universidade de Brasília (UnB), nos anos 1970, e chegou a ser detido por algumas horas, segundo contou à reportagem.
O próximo ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, foi vigiado por ser estrangeiro e por participar de congressos de filosofia na década de 1980. A inteligência da ditadura também mencionou textos dele contra a Teologia da Libertação, uma ala de esquerda da Igreja Católica, em análises de conjuntura.
O futuro ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno – que foi comandante militar na Amazônia e chefe da missão de paz no Haiti, a Minustah – aparece como integrante de uma chapa apoiada pelo governo do general João Figueiredo na disputa pelo Clube Militar. Dickson Melges Grael, pai dos velejadores Lars e Torben Grael, fazia parte da chapa adversária.
As pessoas mencionadas nos documentos foram procuradas pela reportagem, mas só Antônio Flávio Testa quis comentar o assunto.
‘Até quem nunca sonhou em ser comunista era vigiado’
A maioria das pessoas monitoradas pela inteligência do regime militar nunca teve qualquer envolvimento com o comunismo organizado ou com a esquerda, de acordo com o historiador especializado em história política Antônio Barbosa.
Isso porque quando o SNI surgiu, em 1964, o mundo vivia uma tensão crescente entre os Estados Unidos – capitalista – e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, capitaneada pela Rússia comunista. Ao tomarem o poder no Brasil, os militares justificaram o novo regime como uma forma de evitar que o país aderisse ao bloco soviético – e esse discurso se manteve ao longo de todo o período militar, diz Barbosa, que é professor da Universidade de Brasília (UnB).
“Depois de 1961, quando Cuba se declara marxista-leninista, a Guerra Fria atravessou o Oceano Atlântico e veio da Europa para as Américas. Nesse momento ocorre uma série de golpes militares de direita, anticomunistas, na América Latina, inclusive no Brasil”, diz ele.
“Muito do trabalho dos órgãos de segurança, como o SNI, era o que eles chamavam de ‘luta contra a subversão’. Na verdade, era a luta contra as esquerdas (…), que ia muito além da parcela que fazia a luta armada. O espectro dos inimigos do regime era muito amplo. Entravam aí liberais, democratas de forma geral, socialistas, e qualquer um que não rezava pela cartilha do regime”, diz ele.
De 251 acervos, só 40 foram encontrados até hoje
Ao longo dos anos, o SNI produziu um acervo gigantesco. Os dossiês principais eram identificados com a sigla ACE – Arquivo Cronológico de Entrada – e iam sendo numerados em ordem direta, conforme eram produzidos. “Só na Agência Central, a numeração (dos ACEs) chegou a cem mil em 1978. E aí eles zeraram a conta. É por isso que, a partir deste ano, a numeração fica baixa”, explica o historiador Pablo Franco, que trabalha com o acervo da ditadura no Arquivo Nacional, onde o material está guardado hoje.
Infelizmente, apenas uma pequena parte desse material se salvou. O restante não foi encontrado até hoje, e o destino desses documentos é incerto.
“O SNI era a ‘cabeça’ do sistema de informações, mas os outros órgãos que foram criados no regime alimentavam o SNI. Então você tinha o Centro de Informações do Exército, o Cenimar (da Marinha) e o Cisa (da Aeronáutica). Eles vigiavam os militares das forças, mas também a sociedade de forma geral. Dentro de cada órgão público, de cada universidade, tinha uma estrutura dessas”, conta Pablo.
“A gente sabe por fontes documentais, por exemplo, que dentro do Ministério da Educação tinha uma DSI (Divisão de Segurança e Informações). Mas o MEC nunca encontrou os papéis produzidos por essa Divisão. A gente sabe que existiu, mas não se sabe o paradeiro dos documentos”, diz ele.
Desde 2008, historiadores do Arquivo Nacional que investigam esse período histórico já identificaram 251 agências e diretorias de inteligência, mas apenas 40 dessas tiveram seus documentos recuperados, segundo Pablo.
Vélez Rodríguez e a Teologia da Libertação
Nascido em Bogotá, na Colômbia, e naturalizado brasileiro, Vélez Rodríguez é filósofo e teólogo de formação. Chegou ao cargo de ministro da Educação do futuro governo depois de indicado pelo também filósofo e guru conservador Olavo de Carvalho. Em seu blog, Vélez diz que os brasileiros viveram nos últimos anos como “reféns de um sistema de ensino alheio às suas vidas e afinado com a tentativa de impor, à sociedade, uma doutrinação de índole cientificista e enquistada na ideologia marxista, travestida de ‘revolução cultural gramsciana'”.
Como professor – e estrangeiro – Vélez não escapava do olhar atento da Comunidade de Informações do regime.
Num documento de 1985, a Assessoria de Segurança e Informações (ASI) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) pede uma checagem das informações sobre ele na base de dados do Serviço Nacional de Informações (SNI), antes dele assumir o cargo de professor. Outro trecho de dossiê do mesmo ano registra a presença de Vélez num seminário de filosofia organizado pela Arquidiocese do Rio de Janeiro e pela Sociedade Brasileira de Filósofos Católicos, em outubro daquele ano – e visto com desconfiança pelos militares.
Além disso, os relatórios do SNI também citam Vélez em alguns momentos como autor de estudos e artigos críticos à Teologia da Libertação – uma ala de esquerda da Igreja Católica, surgida na América Latina, e para a qual os ensinamentos de Jesus incluem a luta contra injustiças sociais.
Um dos dossiês, da década de 1980, reproduz um trecho de um artigo do futuro ministro, no qual ele afirma que a corrente do teólogo Leonardo Boff representava uma “progressiva penetração da URSS (União Soviética) no nosso continente, através da politização e da radicalização (…)”. Em outro artigo, este publicado no jornal O Estado do Paraná e citado pelos militares, Rodríguez diz que a Teologia da Libertação faz uma “releitura tendenciosa” do texto bíblico.
Augusto Heleno contra o pai de Lars Grael
Paranaense de Curitiba, Augusto Heleno Ribeiro Pereira é o militar mais próximo do presidente eleito Jair Bolsonaro. Antes mesmo do começo da disputa eleitoral, comandava as reuniões do grupo de formuladores do programa de governo do candidato do PSL. Quase foi candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro, no lugar de Hamilton Mourão – o que só não aconteceu porque o partido de Heleno, o PRP, não topou.
Nos papéis da ditadura já digitalizados e acessíveis ao público, Heleno aparece uma única vez. Trata-se de um dossiê de janeiro de 1984 sobre a eleição para a diretoria do Clube Militar, no Rio de Janeiro, que aconteceria em maio.
Heleno – que na época era major do Exército – integrava a chapa “governista” na disputa pelo comando do clube. Conforme o dossiê, o grupo dele tinha o apoio do ministro do Exército da época, Walter Pires de Carvalho e Albuquerque. A chapa de Heleno era encabeçada por um general de três estrelas chamado Tasso Villar de Aquino. Heleno era suplente do Conselho Fiscal.
Do outro lado estava a chapa “Soberania Nacional”.
“Dentre os integrantes desta Chapa (‘Soberania’) encontram-se militares contestadores e indisciplinados, como os coronéis Tarcísio Célio Carvalho Nunes e Dickson Melges Grael, cujos comportamentos inconvenientes são sobejamente conhecidos”, diz um trecho do dossiê.
Dickson Melges Grael é pai dos velejadores Lars e Torben Grael. No ano seguinte, 1985, ele publicou um livro revelando informações sobre o atentado do Riocentro – quando dois militares tentaram explodir uma bomba num show de música em comemoração ao Dia do Trabalhador, no Rio.
Contando com o apoio do governo do então presidente João Figueiredo, a chapa de Heleno ganhou – teve 4.175 votos contra 2,5 mil do grupo de oposição.
Futuro presidente do Ipea era visto como”infiltração comunista”
Em novembro deste ano, o economista carioca Carlos Von Doellinger foi indicado pelo guru econômico de Bolsonaro, Paulo Guedes, para assumir a presidência do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Doellinger já foi pesquisador do Ipea – também deu aulas na Universidade Federal do Rio de Janeiro e presidiu o Banco do Estado do Rio, o antigo Banerj. Mas em maio 1985, no primeiro governo civil, ele era visto como uma “infiltração comunista” pelo Cisa (Centro de Informações da Aeronáutica).
Doellinger foi para o governo em 15 de março de 1985, quando o maranhense José Sarney tomou posse como o primeiro presidente civil depois do ciclo de generais no poder no Brasil. No mesmo dia, o Diário Oficial trouxe a nomeação da Esplanada de Sarney. Francisco Dornelles, hoje governador interino do Rio, foi escolhido ministro da Fazenda. E levou consigo Doellinger, que foi nomeado secretário-geral adjunto do Ministério.
Em maio de 1985, o Cisa produziu um dossiê batizado de “Infiltração comunista nos diversos setores de atividade”. “(…) os elementos abaixo, nomeados para cargos e funções de confiança em órgãos do Poder Executivo, registraram antecedentes negativos neste Centro”, dizia o documento.
A lista de pessoas com “antecedentes” é extensa e ideologicamente heterogênea. Inclui Cláudio Lembo (que seria governador de SP pelo PSDB), Dilson Funaro (veio a ser ministro da Fazenda); Dorothea Werneck (chegou a ministra do Trabalho); Carlos Alberto Menezes Direito (foi ministro do STF); Cláudio Fonteles (ex-Procurador-Geral da República) e até o jornalista de economia Carlos Alberto Sardenberg.
O documento segue descrevendo outras esferas em que teria havido “infiltração comunista”, inclusive na reformulação da educação superior.
Embora o governo já fosse civil, o SNI continuou existindo, e sob o comando de militares. O órgão só foi desmantelado completamente em 1990.
Carlos Von Doellinger acabou deixando o governo poucos meses depois, em agosto de 1985. Há outros documentos que mencionam o economista – geralmente informes sobre sua participação em congressos da área.
Ex-professor da UnB considerado “subversivo”
Antônio Flávio Testa é cientista político e professor aposentado da Universidade de Brasília (UnB), além de assessor técnico do Senado Federal. Antes mesmo do começo da campanha oficial, colaborou com o grupo de militares e especialistas responsáveis por formular propostas para Jair Bolsonaro. Próximo dos generais Augusto Heleno e Oswaldo Ferreira, Testa disse ao jornal O Globo que seu envolvimento com o grupo não envolve identificação ideológica.
“Eu não sou de esquerda nem de direita. E não considero Bolsonaro de direita, nem Lula de esquerda. São dois programáticos”, disse ele ao jornal O Globo, em setembro de 2018.
Na década de 1970, porém, Testa era estudante de graduação da UnB – e envolvido com o movimento estudantil da época. Por isso, foi alvo de vigilância constante da Assessoria de Segurança e Informações (ASI) da UnB, que era o braço do SNI dentro da universidade.
Em 1976, Testa integrava uma das chapas que disputou o comando do Diretório Central dos Estudantes (DCE), a principal entidade estudantil da universidade. Concorreu como diretor de Esportes, na chapa Oficina.
Para a ASI da UnB, tanto o grupo de Testa quanto a chapa adversária, batizada de Unidade, eram “subversivas”. “Os panfletos distribuídos por ambas as chapas continham incitações à indisciplina (…), além de aleivosias ao Governo e à Administração da UnB. (…) Além de conter incitações à luta de classes, à discórdia e à desordem”. A eleição nunca aconteceu: foi suspensa pela direção da universidade, e os integrantes das duas chapas – inclusive Testa – tiveram inquéritos abertos contra si.
À reportagem da BBC News Brasil, testa disse que não respondeu realmente ao inquérito, e que o episódio não trouxe maiores consequências para ele. “Nada (de consequência). Fiquei detido algumas horas”, disse.
O nome de Antônio Flávio Testa aparece em vários outros documentos produzidos pela ASI-UnB ao longo da década de 1970. Toda participação numa palestra ou protesto eram devidamente registradas pelo braço do SNI na universidade, às vezes inclusive com fotografias.
Pouco depois da publicação da reportagem, Testa procurou a BBC News Brasil para frisar que nunca foi, “de jeito nenhum”, um “subversivo”.
“Sou karateca, dava aulas no DCE, daí a fama. Me chamaram para compor a chapa dos estudantes, como diretor de Esportes. Apenas isso. nada político, só treinos. Era e sou ainda muito conhecido. Me relaciono com todo mundo”, conta ele, sobre o período – ele acrescenta que nunca foi “contra o capitalismo”, e que considera o termo “subversivo” obsoleto.
“Eram outros tempos”, diz ele. “Se você fosse poeta e escrevesse letras de música para festivais estudantis, tinha que passar pelo crivo da censura. Foi um tempo de grande desconfiança”.
“Depois (da UnB), passei em concurso para antropólogo da Funai em pleno regime militar. Se fosse subversivo, não teria sido aceito. Trabalhei em áreas sensíveis, delimitando terras indígenas (…). Nunca tive problemas com militares. Dei aulas de karatê para os Fuzileiros Navais e no RCG (Regimento de Cavalaria de Guardas) do Exército. Tive centenas de alunos militares”, disse ele à reportagem.
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Veículo: Terra
Editoria: Notícias
Data: 15/12/2018
Título: 50 anos do AI-5: os integrantes da equipe de Bolsonaro considerados ‘subversivos’ e ‘infiltrados comunistas’ pela ditadura
Ao debater o regime militar (1964-1985), integrantes da equipe de transição e do futuro governo Bolsonaro dizem que a repressão da época – que deixou mais de 400 pessoas mortas e desaparecidas, de acordo com o relatório da Comissão Nacional da Verdade – ocorria no contexto de uma guerra: entre o Estado brasileiro e grupos armados que tentaram impor o comunismo.
Mas um levantamento da BBC News Brasil nos arquivos daquela época mostra que a repressão e a vigilância não se resumia à esquerda armada. Até mesmo pessoas que hoje fazem parte da equipe de transição do presidente eleito foram vigiadas de perto pelo aparato de inteligência dos militares – alguns, inclusive, foram considerados “infiltrados comunistas” e “subversivos”.
“(O golpe de 64) Foi um contragolpe contra um movimento crescente de comunistas. Os militares assumiram o poder, e tivemos uma guerra”, disse ao jornal O Globo o cientista político e professor aposentado da UnB, Antônio Flávio Testa. Ele participou do grupo de militares e intelectuais que formulavam propostas para Bolsonaro, e hoje faz parte da equipe de transição. Na década de 1970, porém, o próprio Testa foi alvo de um inquérito aberto contra si e chegou a ser detido “por algumas horas”, por participar de atividades ligadas ao movimento estudantil.
Quem investigava?
O Serviço Nacional de Informações (SNI) foi criado em junho de 1964, poucos meses depois do golpe militar – que, em 31 de março daquele ano depôs o presidente João Goulart e estabeleceu um regime autoritário que durou até 1985.
O SNI foi idealizado pelo general Golbery do Couto e Silva, e era composto por um Agência Central, em Brasília, e agências e escritórios espalhados por todo o país e em todos os órgãos do governo. O SNI existiu até 1990, quando foi substituído por uma estrutura menor e sob controle civil. O conjunto todo era chamado de “comunidade de informações” do regime.
Como os integrantes da equipe de transição de Bolsonaro e do futuro governo aparecem nos arquivos do SNI?
O futuro presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o economista Carlos Doellinger, foi nomeado num documento de 1985 como “infiltração comunista” no governo de José Sarney, que havia acabado de tomar posse. Já o guru econômico de Bolsonaro, Paulo Guedes, teve sua ficha levantada quando pediu um passaporte de viagem, nos anos 1970 – mas nada pesava contra ele.
O cientista político Antônio Flávio Testa, que fez parte do grupo de formuladores das políticas de Bolsonaro e integra o gabinete de transição, era considerado “subversivo” porque participava do movimento estudantil da Universidade de Brasília (UnB), nos anos 1970, e chegou a ser detido por algumas horas, segundo contou à reportagem.
O próximo ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, foi vigiado por ser estrangeiro e por participar de congressos de filosofia na década de 1980. A inteligência da ditadura também mencionou textos dele contra a Teologia da Libertação, uma ala de esquerda da Igreja Católica, em análises de conjuntura.
O futuro ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno – que foi comandante militar na Amazônia e chefe da missão de paz no Haiti, a Minustah – aparece como integrante de uma chapa apoiada pelo governo do general João Figueiredo na disputa pelo Clube Militar. Dickson Melges Grael, pai dos velejadores Lars e Torben Grael, fazia parte da chapa adversária.
As pessoas mencionadas nos documentos foram procuradas pela reportagem, mas só Antônio Flávio Testa quis comentar o assunto.
‘Até quem nunca sonhou em ser comunista era vigiado’
A maioria das pessoas monitoradas pela inteligência do regime militar nunca teve qualquer envolvimento com o comunismo organizado ou com a esquerda, de acordo com o historiador especializado em história política Antônio Barbosa.
Isso porque quando o SNI surgiu, em 1964, o mundo vivia uma tensão crescente entre os Estados Unidos – capitalista – e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, capitaneada pela Rússia comunista. Ao tomarem o poder no Brasil, os militares justificaram o novo regime como uma forma de evitar que o país aderisse ao bloco soviético – e esse discurso se manteve ao longo de todo o período militar, diz Barbosa, que é professor da Universidade de Brasília (UnB).
“Depois de 1961, quando Cuba se declara marxista-leninista, a Guerra Fria atravessou o Oceano Atlântico e veio da Europa para as Américas. Nesse momento ocorre uma série de golpes militares de direita, anticomunistas, na América Latina, inclusive no Brasil”, diz ele.
“Muito do trabalho dos órgãos de segurança, como o SNI, era o que eles chamavam de ‘luta contra a subversão’. Na verdade, era a luta contra as esquerdas (…), que ia muito além da parcela que fazia a luta armada. O espectro dos inimigos do regime era muito amplo. Entravam aí liberais, democratas de forma geral, socialistas, e qualquer um que não rezava pela cartilha do regime”, diz ele.
De 251 acervos, só 40 foram encontrados até hoje
Ao longo dos anos, o SNI produziu um acervo gigantesco. Os dossiês principais eram identificados com a sigla ACE – Arquivo Cronológico de Entrada – e iam sendo numerados em ordem direta, conforme eram produzidos. “Só na Agência Central, a numeração (dos ACEs) chegou a cem mil em 1978. E aí eles zeraram a conta. É por isso que, a partir deste ano, a numeração fica baixa”, explica o historiador Pablo Franco, que trabalha com o acervo da ditadura no Arquivo Nacional, onde o material está guardado hoje.
Infelizmente, apenas uma pequena parte desse material se salvou. O restante não foi encontrado até hoje, e o destino desses documentos é incerto.
“O SNI era a ‘cabeça’ do sistema de informações, mas os outros órgãos que foram criados no regime alimentavam o SNI. Então você tinha o Centro de Informações do Exército, o Cenimar (da Marinha) e o Cisa (da Aeronáutica). Eles vigiavam os militares das forças, mas também a sociedade de forma geral. Dentro de cada órgão público, de cada universidade, tinha uma estrutura dessas”, conta Pablo.
“A gente sabe por fontes documentais, por exemplo, que dentro do Ministério da Educação tinha uma DSI (Divisão de Segurança e Informações). Mas o MEC nunca encontrou os papéis produzidos por essa Divisão. A gente sabe que existiu, mas não se sabe o paradeiro dos documentos”, diz ele.
Desde 2008, historiadores do Arquivo Nacional que investigam esse período histórico já identificaram 251 agências e diretorias de inteligência, mas apenas 40 dessas tiveram seus documentos recuperados, segundo Pablo.
Vélez Rodríguez e a Teologia da Libertação
Nascido em Bogotá, na Colômbia, e naturalizado brasileiro, Vélez Rodríguez é filósofo e teólogo de formação. Chegou ao cargo de ministro da Educação do futuro governo depois de indicado pelo também filósofo e guru conservador Olavo de Carvalho. Em seu blog, Vélez diz que os brasileiros viveram nos últimos anos como “reféns de um sistema de ensino alheio às suas vidas e afinado com a tentativa de impor, à sociedade, uma doutrinação de índole cientificista e enquistada na ideologia marxista, travestida de ‘revolução cultural gramsciana'”.
Como professor – e estrangeiro – Vélez não escapava do olhar atento da Comunidade de Informações do regime.
Num documento de 1985, a Assessoria de Segurança e Informações (ASI) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) pede uma checagem das informações sobre ele na base de dados do Serviço Nacional de Informações (SNI), antes dele assumir o cargo de professor. Outro trecho de dossiê do mesmo ano registra a presença de Vélez num seminário de filosofia organizado pela Arquidiocese do Rio de Janeiro e pela Sociedade Brasileira de Filósofos Católicos, em outubro daquele ano – e visto com desconfiança pelos militares.
Além disso, os relatórios do SNI também citam Vélez em alguns momentos como autor de estudos e artigos críticos à Teologia da Libertação – uma ala de esquerda da Igreja Católica, surgida na América Latina, e para a qual os ensinamentos de Jesus incluem a luta contra injustiças sociais.
Um dos dossiês, da década de 1980, reproduz um trecho de um artigo do futuro ministro, no qual ele afirma que a corrente do teólogo Leonardo Boff representava uma “progressiva penetração da URSS (União Soviética) no nosso continente, através da politização e da radicalização (…)”. Em outro artigo, este publicado no jornal O Estado do Paraná e citado pelos militares, Rodríguez diz que a Teologia da Libertação faz uma “releitura tendenciosa” do texto bíblico.
Augusto Heleno contra o pai de Lars Grael
Paranaense de Curitiba, Augusto Heleno Ribeiro Pereira é o militar mais próximo do presidente eleito Jair Bolsonaro. Antes mesmo do começo da disputa eleitoral, comandava as reuniões do grupo de formuladores do programa de governo do candidato do PSL. Quase foi candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro, no lugar de Hamilton Mourão – o que só não aconteceu porque o partido de Heleno, o PRP, não topou.
Nos papéis da ditadura já digitalizados e acessíveis ao público, Heleno aparece uma única vez. Trata-se de um dossiê de janeiro de 1984 sobre a eleição para a diretoria do Clube Militar, no Rio de Janeiro, que aconteceria em maio.
Heleno – que na época era major do Exército – integrava a chapa “governista” na disputa pelo comando do clube. Conforme o dossiê, o grupo dele tinha o apoio do ministro do Exército da época, Walter Pires de Carvalho e Albuquerque. A chapa de Heleno era encabeçada por um general de três estrelas chamado Tasso Villar de Aquino. Heleno era suplente do Conselho Fiscal.
Do outro lado estava a chapa “Soberania Nacional”.
“Dentre os integrantes desta Chapa (‘Soberania’) encontram-se militares contestadores e indisciplinados, como os coronéis Tarcísio Célio Carvalho Nunes e Dickson Melges Grael, cujos comportamentos inconvenientes são sobejamente conhecidos”, diz um trecho do dossiê.
Dickson Melges Grael é pai dos velejadores Lars e Torben Grael. No ano seguinte, 1985, ele publicou um livro revelando informações sobre o atentado do Riocentro – quando dois militares tentaram explodir uma bomba num show de música em comemoração ao Dia do Trabalhador, no Rio.
Contando com o apoio do governo do então presidente João Figueiredo, a chapa de Heleno ganhou – teve 4.175 votos contra 2,5 mil do grupo de oposição.
Futuro presidente do Ipea era visto como”infiltração comunista”
Em novembro deste ano, o economista carioca Carlos Von Doellinger foi indicado pelo guru econômico de Bolsonaro, Paulo Guedes, para assumir a presidência do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Doellinger já foi pesquisador do Ipea – também deu aulas na Universidade Federal do Rio de Janeiro e presidiu o Banco do Estado do Rio, o antigo Banerj. Mas em maio 1985, no primeiro governo civil, ele era visto como uma “infiltração comunista” pelo Cisa (Centro de Informações da Aeronáutica).
Doellinger foi para o governo em 15 de março de 1985, quando o maranhense José Sarney tomou posse como o primeiro presidente civil depois do ciclo de generais no poder no Brasil. No mesmo dia, o Diário Oficial trouxe a nomeação da Esplanada de Sarney. Francisco Dornelles, hoje governador interino do Rio, foi escolhido ministro da Fazenda. E levou consigo Doellinger, que foi nomeado secretário-geral adjunto do Ministério.
Em maio de 1985, o Cisa produziu um dossiê batizado de “Infiltração comunista nos diversos setores de atividade”. “(…) os elementos abaixo, nomeados para cargos e funções de confiança em órgãos do Poder Executivo, registraram antecedentes negativos neste Centro”, dizia o documento.
A lista de pessoas com “antecedentes” é extensa e ideologicamente heterogênea. Inclui Cláudio Lembo (que seria governador de SP pelo PSDB), Dilson Funaro (veio a ser ministro da Fazenda); Dorothea Werneck (chegou a ministra do Trabalho); Carlos Alberto Menezes Direito (foi ministro do STF); Cláudio Fonteles (ex-Procurador-Geral da República) e até o jornalista de economia Carlos Alberto Sardenberg.
O documento segue descrevendo outras esferas em que teria havido “infiltração comunista”, inclusive na reformulação da educação superior.
Embora o governo já fosse civil, o SNI continuou existindo, e sob o comando de militares. O órgão só foi desmantelado completamente em 1990.
Carlos Von Doellinger acabou deixando o governo poucos meses depois, em agosto de 1985. Há outros documentos que mencionam o economista – geralmente informes sobre sua participação em congressos da área.
Ex-professor da UnB considerado “subversivo”
Antônio Flávio Testa é cientista político e professor aposentado da Universidade de Brasília (UnB), além de assessor técnico do Senado Federal. Antes mesmo do começo da campanha oficial, colaborou com o grupo de militares e especialistas responsáveis por formular propostas para Jair Bolsonaro. Próximo dos generais Augusto Heleno e Oswaldo Ferreira, Testa disse ao jornal O Globo que seu envolvimento com o grupo não envolve identificação ideológica.
“Eu não sou de esquerda nem de direita. E não considero Bolsonaro de direita, nem Lula de esquerda. São dois programáticos”, disse ele ao jornal O Globo, em setembro de 2018.
Na década de 1970, porém, Testa era estudante de graduação da UnB – e envolvido com o movimento estudantil da época. Por isso, foi alvo de vigilância constante da Assessoria de Segurança e Informações (ASI) da UnB, que era o braço do SNI dentro da universidade.
Em 1976, Testa integrava uma das chapas que disputou o comando do Diretório Central dos Estudantes (DCE), a principal entidade estudantil da universidade. Concorreu como diretor de Esportes, na chapa Oficina.
Para a ASI da UnB, tanto o grupo de Testa quanto a chapa adversária, batizada de Unidade, eram “subversivas”. “Os panfletos distribuídos por ambas as chapas continham incitações à indisciplina (…), além de aleivosias ao Governo e à Administração da UnB. (…) Além de conter incitações à luta de classes, à discórdia e à desordem”. A eleição nunca aconteceu: foi suspensa pela direção da universidade, e os integrantes das duas chapas – inclusive Testa – tiveram inquéritos abertos contra si.
À reportagem da BBC News Brasil, testa disse que não respondeu realmente ao inquérito, e que o episódio não trouxe maiores consequências para ele. “Nada (de consequência). Fiquei detido algumas horas”, disse.
O nome de Antônio Flávio Testa aparece em vários outros documentos produzidos pela ASI-UnB ao longo da década de 1970. Toda participação numa palestra ou protesto eram devidamente registradas pelo braço do SNI na universidade, às vezes inclusive com fotografias.
Pouco depois da publicação da reportagem, Testa procurou a BBC News Brasil para frisar que nunca foi, “de jeito nenhum”, um “subversivo”.
“Sou karateca, dava aulas no DCE, daí a fama. Me chamaram para compor a chapa dos estudantes, como diretor de Esportes. Apenas isso. nada político, só treinos. Era e sou ainda muito conhecido. Me relaciono com todo mundo”, conta ele, sobre o período – ele acrescenta que nunca foi “contra o capitalismo”, e que considera o termo “subversivo” obsoleto.
“Eram outros tempos”, diz ele. “Se você fosse poeta e escrevesse letras de música para festivais estudantis, tinha que passar pelo crivo da censura. Foi um tempo de grande desconfiança”.
“Depois (da UnB), passei em concurso para antropólogo da Funai em pleno regime militar. Se fosse subversivo, não teria sido aceito. Trabalhei em áreas sensíveis, delimitando terras indígenas (…). Nunca tive problemas com militares. Dei aulas de karatê para os Fuzileiros Navais e no RCG (Regimento de Cavalaria de Guardas) do Exército. Tive centenas de alunos militares”, disse ele à reportagem.
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Veículo: UOL
Editoria: Últimas notícias
Data: 15/12/2018
Título: 50 anos do AI-5: os integrantes da equipe de Bolsonaro considerados ‘subversivos’ e ‘infiltrados comunistas’ pela ditadura
Ao debater o regime militar (1964-1985), integrantes da equipe de transição e do futuro governo Bolsonaro dizem que a repressão da época – que deixou mais de 400 pessoas mortas e desaparecidas, de acordo com o relatório da Comissão Nacional da Verdade – ocorria no contexto de uma guerra: entre o Estado brasileiro e grupos armados que tentaram impor o comunismo.
Mas um levantamento da BBC News Brasil nos arquivos daquela época mostra que a repressão e a vigilância não se resumia à esquerda armada. Até mesmo pessoas que hoje fazem parte da equipe de transição do presidente eleito foram vigiadas de perto pelo aparato de inteligência dos militares – alguns, inclusive, foram considerados “infiltrados comunistas” e “subversivos”.
“(O golpe de 64) Foi um contragolpe contra um movimento crescente de comunistas. Os militares assumiram o poder, e tivemos uma guerra”, disse ao jornal O Globo o cientista político e professor aposentado da UnB, Antônio Flávio Testa. Ele participou do grupo de militares e intelectuais que formulavam propostas para Bolsonaro, e hoje faz parte da equipe de transição. Na década de 1970, porém, o próprio Testa foi alvo de um inquérito aberto contra si e chegou a ser detido “por algumas horas”, por participar de atividades ligadas ao movimento estudantil.
Quem investigava?
O Serviço Nacional de Informações (SNI) foi criado em junho de 1964, poucos meses depois do golpe militar – que, em 31 de março daquele ano depôs o presidente João Goulart e estabeleceu um regime autoritário que durou até 1985.
O SNI foi idealizado pelo general Golbery do Couto e Silva, e era composto por um Agência Central, em Brasília, e agências e escritórios espalhados por todo o país e em todos os órgãos do governo. O SNI existiu até 1990, quando foi substituído por uma estrutura menor e sob controle civil. O conjunto todo era chamado de “comunidade de informações” do regime.
Como os integrantes da equipe de transição de Bolsonaro e do futuro governo aparecem nos arquivos do SNI?
O futuro presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o economista Carlos Doellinger, foi nomeado num documento de 1985 como “infiltração comunista” no governo de José Sarney, que havia acabado de tomar posse. Já o guru econômico de Bolsonaro, Paulo Guedes, teve sua ficha levantada quando pediu um passaporte de viagem, nos anos 1970 – mas nada pesava contra ele.
O cientista político Antônio Flávio Testa, que fez parte do grupo de formuladores das políticas de Bolsonaro e integra o gabinete de transição, era considerado “subversivo” porque participava do movimento estudantil da Universidade de Brasília (UnB), nos anos 1970, e chegou a ser detido por algumas horas, segundo contou à reportagem.
O próximo ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, foi vigiado por ser estrangeiro e por participar de congressos de filosofia na década de 1980. A inteligência da ditadura também mencionou textos dele contra a Teologia da Libertação, uma ala de esquerda da Igreja Católica, em análises de conjuntura.
O futuro ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno – que foi comandante militar na Amazônia e chefe da missão de paz no Haiti, a Minustah – aparece como integrante de uma chapa apoiada pelo governo do general João Figueiredo na disputa pelo Clube Militar. Dickson Melges Grael, pai dos velejadores Lars e Torben Grael, fazia parte da chapa adversária.
As pessoas mencionadas nos documentos foram procuradas pela reportagem, mas só Antônio Flávio Testa quis comentar o assunto.
‘Até quem nunca sonhou em ser comunista era vigiado’
A maioria das pessoas monitoradas pela inteligência do regime militar nunca teve qualquer envolvimento com o comunismo organizado ou com a esquerda, de acordo com o historiador especializado em história política Antônio Barbosa.
Isso porque quando o SNI surgiu, em 1964, o mundo vivia uma tensão crescente entre os Estados Unidos – capitalista – e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, capitaneada pela Rússia comunista. Ao tomarem o poder no Brasil, os militares justificaram o novo regime como uma forma de evitar que o país aderisse ao bloco soviético – e esse discurso se manteve ao longo de todo o período militar, diz Barbosa, que é professor da Universidade de Brasília (UnB).
“Depois de 1961, quando Cuba se declara marxista-leninista, a Guerra Fria atravessou o Oceano Atlântico e veio da Europa para as Américas. Nesse momento ocorre uma série de golpes militares de direita, anticomunistas, na América Latina, inclusive no Brasil”, diz ele.
“Muito do trabalho dos órgãos de segurança, como o SNI, era o que eles chamavam de ‘luta contra a subversão’. Na verdade, era a luta contra as esquerdas (…), que ia muito além da parcela que fazia a luta armada. O espectro dos inimigos do regime era muito amplo. Entravam aí liberais, democratas de forma geral, socialistas, e qualquer um que não rezava pela cartilha do regime”, diz ele.
De 251 acervos, só 40 foram encontrados até hoje
Ao longo dos anos, o SNI produziu um acervo gigantesco. Os dossiês principais eram identificados com a sigla ACE – Arquivo Cronológico de Entrada – e iam sendo numerados em ordem direta, conforme eram produzidos. “Só na Agência Central, a numeração (dos ACEs) chegou a cem mil em 1978. E aí eles zeraram a conta. É por isso que, a partir deste ano, a numeração fica baixa”, explica o historiador Pablo Franco, que trabalha com o acervo da ditadura no Arquivo Nacional, onde o material está guardado hoje.
Infelizmente, apenas uma pequena parte desse material se salvou. O restante não foi encontrado até hoje, e o destino desses documentos é incerto.
“O SNI era a ‘cabeça’ do sistema de informações, mas os outros órgãos que foram criados no regime alimentavam o SNI. Então você tinha o Centro de Informações do Exército, o Cenimar (da Marinha) e o Cisa (da Aeronáutica). Eles vigiavam os militares das forças, mas também a sociedade de forma geral. Dentro de cada órgão público, de cada universidade, tinha uma estrutura dessas”, conta Pablo.
“A gente sabe por fontes documentais, por exemplo, que dentro do Ministério da Educação tinha uma DSI (Divisão de Segurança e Informações). Mas o MEC nunca encontrou os papéis produzidos por essa Divisão. A gente sabe que existiu, mas não se sabe o paradeiro dos documentos”, diz ele.
Desde 2008, historiadores do Arquivo Nacional que investigam esse período histórico já identificaram 251 agências e diretorias de inteligência, mas apenas 40 dessas tiveram seus documentos recuperados, segundo Pablo.
Vélez Rodríguez e a Teologia da Libertação
Nascido em Bogotá, na Colômbia, e naturalizado brasileiro, Vélez Rodríguez é filósofo e teólogo de formação. Chegou ao cargo de ministro da Educação do futuro governo depois de indicado pelo também filósofo e guru conservador Olavo de Carvalho. Em seu blog, Vélez diz que os brasileiros viveram nos últimos anos como “reféns de um sistema de ensino alheio às suas vidas e afinado com a tentativa de impor, à sociedade, uma doutrinação de índole cientificista e enquistada na ideologia marxista, travestida de ‘revolução cultural gramsciana'”.
Como professor – e estrangeiro – Vélez não escapava do olhar atento da Comunidade de Informações do regime.
Num documento de 1985, a Assessoria de Segurança e Informações (ASI) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) pede uma checagem das informações sobre ele na base de dados do Serviço Nacional de Informações (SNI), antes dele assumir o cargo de professor. Outro trecho de dossiê do mesmo ano registra a presença de Vélez num seminário de filosofia organizado pela Arquidiocese do Rio de Janeiro e pela Sociedade Brasileira de Filósofos Católicos, em outubro daquele ano – e visto com desconfiança pelos militares.
Além disso, os relatórios do SNI também citam Vélez em alguns momentos como autor de estudos e artigos críticos à Teologia da Libertação – uma ala de esquerda da Igreja Católica, surgida na América Latina, e para a qual os ensinamentos de Jesus incluem a luta contra injustiças sociais.
Um dos dossiês, da década de 1980, reproduz um trecho de um artigo do futuro ministro, no qual ele afirma que a corrente do teólogo Leonardo Boff representava uma “progressiva penetração da URSS (União Soviética) no nosso continente, através da politização e da radicalização (…)”. Em outro artigo, este publicado no jornal O Estado do Paraná e citado pelos militares, Rodríguez diz que a Teologia da Libertação faz uma “releitura tendenciosa” do texto bíblico.
Augusto Heleno contra o pai de Lars Grael
Paranaense de Curitiba, Augusto Heleno Ribeiro Pereira é o militar mais próximo do presidente eleito Jair Bolsonaro. Antes mesmo do começo da disputa eleitoral, comandava as reuniões do grupo de formuladores do programa de governo do candidato do PSL. Quase foi candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro, no lugar de Hamilton Mourão – o que só não aconteceu porque o partido de Heleno, o PRP, não topou.
Nos papéis da ditadura já digitalizados e acessíveis ao público, Heleno aparece uma única vez. Trata-se de um dossiê de janeiro de 1984 sobre a eleição para a diretoria do Clube Militar, no Rio de Janeiro, que aconteceria em maio.
Heleno – que na época era major do Exército – integrava a chapa “governista” na disputa pelo comando do clube. Conforme o dossiê, o grupo dele tinha o apoio do ministro do Exército da época, Walter Pires de Carvalho e Albuquerque. A chapa de Heleno era encabeçada por um general de três estrelas chamado Tasso Villar de Aquino. Heleno era suplente do Conselho Fiscal.
Do outro lado estava a chapa “Soberania Nacional”.
“Dentre os integrantes desta Chapa (‘Soberania’) encontram-se militares contestadores e indisciplinados, como os coronéis Tarcísio Célio Carvalho Nunes e Dickson Melges Grael, cujos comportamentos inconvenientes são sobejamente conhecidos”, diz um trecho do dossiê.
Dickson Melges Grael é pai dos velejadores Lars e Torben Grael. No ano seguinte, 1985, ele publicou um livro revelando informações sobre o atentado do Riocentro – quando dois militares tentaram explodir uma bomba num show de música em comemoração ao Dia do Trabalhador, no Rio.
Contando com o apoio do governo do então presidente João Figueiredo, a chapa de Heleno ganhou – teve 4.175 votos contra 2,5 mil do grupo de oposição.
Futuro presidente do Ipea era visto como”infiltração comunista”
Em novembro deste ano, o economista carioca Carlos Von Doellinger foi indicado pelo guru econômico de Bolsonaro, Paulo Guedes, para assumir a presidência do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Doellinger já foi pesquisador do Ipea – também deu aulas na Universidade Federal do Rio de Janeiro e presidiu o Banco do Estado do Rio, o antigo Banerj. Mas em maio 1985, no primeiro governo civil, ele era visto como uma “infiltração comunista” pelo Cisa (Centro de Informações da Aeronáutica).
Doellinger foi para o governo em 15 de março de 1985, quando o maranhense José Sarney tomou posse como o primeiro presidente civil depois do ciclo de generais no poder no Brasil. No mesmo dia, o Diário Oficial trouxe a nomeação da Esplanada de Sarney. Francisco Dornelles, hoje governador interino do Rio, foi escolhido ministro da Fazenda. E levou consigo Doellinger, que foi nomeado secretário-geral adjunto do Ministério.
Em maio de 1985, o Cisa produziu um dossiê batizado de “Infiltração comunista nos diversos setores de atividade”. “(…) os elementos abaixo, nomeados para cargos e funções de confiança em órgãos do Poder Executivo, registraram antecedentes negativos neste Centro”, dizia o documento.
A lista de pessoas com “antecedentes” é extensa e ideologicamente heterogênea. Inclui Cláudio Lembo (que seria governador de SP pelo PSDB), Dilson Funaro (veio a ser ministro da Fazenda); Dorothea Werneck (chegou a ministra do Trabalho); Carlos Alberto Menezes Direito (foi ministro do STF); Cláudio Fonteles (ex-Procurador-Geral da República) e até o jornalista de economia Carlos Alberto Sardenberg.
O documento segue descrevendo outras esferas em que teria havido “infiltração comunista”, inclusive na reformulação da educação superior.
Embora o governo já fosse civil, o SNI continuou existindo, e sob o comando de militares. O órgão só foi desmantelado completamente em 1990.
Carlos Von Doellinger acabou deixando o governo poucos meses depois, em agosto de 1985. Há outros documentos que mencionam o economista – geralmente informes sobre sua participação em congressos da área.
Ex-professor da UnB considerado “subversivo”
Antônio Flávio Testa é cientista político e professor aposentado da Universidade de Brasília (UnB), além de assessor técnico do Senado Federal. Antes mesmo do começo da campanha oficial, colaborou com o grupo de militares e especialistas responsáveis por formular propostas para Jair Bolsonaro. Próximo dos generais Augusto Heleno e Oswaldo Ferreira, Testa disse ao jornal O Globo que seu envolvimento com o grupo não envolve identificação ideológica.
“Eu não sou de esquerda nem de direita. E não considero Bolsonaro de direita, nem Lula de esquerda. São dois programáticos”, disse ele ao jornal O Globo, em setembro de 2018.
Na década de 1970, porém, Testa era estudante de graduação da UnB – e envolvido com o movimento estudantil da época. Por isso, foi alvo de vigilância constante da Assessoria de Segurança e Informações (ASI) da UnB, que era o braço do SNI dentro da universidade.
Em 1976, Testa integrava uma das chapas que disputou o comando do Diretório Central dos Estudantes (DCE), a principal entidade estudantil da universidade. Concorreu como diretor de Esportes, na chapa Oficina.
Para a ASI da UnB, tanto o grupo de Testa quanto a chapa adversária, batizada de Unidade, eram “subversivas”. “Os panfletos distribuídos por ambas as chapas continham incitações à indisciplina (…), além de aleivosias ao Governo e à Administração da UnB. (…) Além de conter incitações à luta de classes, à discórdia e à desordem”. A eleição nunca aconteceu: foi suspensa pela direção da universidade, e os integrantes das duas chapas – inclusive Testa – tiveram inquéritos abertos contra si.
À reportagem da BBC News Brasil, testa disse que não respondeu realmente ao inquérito, e que o episódio não trouxe maiores consequências para ele. “Nada (de consequência). Fiquei detido algumas horas”, disse.
O nome de Antônio Flávio Testa aparece em vários outros documentos produzidos pela ASI-UnB ao longo da década de 1970. Toda participação numa palestra ou protesto eram devidamente registradas pelo braço do SNI na universidade, às vezes inclusive com fotografias.
Pouco depois da publicação da reportagem, Testa procurou a BBC News Brasil para frisar que nunca foi, “de jeito nenhum”, um “subversivo”.
“Sou karateca, dava aulas no DCE, daí a fama. Me chamaram para compor a chapa dos estudantes, como diretor de Esportes. Apenas isso. nada político, só treinos. Era e sou ainda muito conhecido. Me relaciono com todo mundo”, conta ele, sobre o período – ele acrescenta que nunca foi “contra o capitalismo”, e que considera o termo “subversivo” obsoleto.
“Eram outros tempos”, diz ele. “Se você fosse poeta e escrevesse letras de música para festivais estudantis, tinha que passar pelo crivo da censura. Foi um tempo de grande desconfiança”.
“Depois (da UnB), passei em concurso para antropólogo da Funai em pleno regime militar. Se fosse subversivo, não teria sido aceito. Trabalhei em áreas sensíveis, delimitando terras indígenas (…). Nunca tive problemas com militares. Dei aulas de karatê para os Fuzileiros Navais e no RCG (Regimento de Cavalaria de Guardas) do Exército. Tive centenas de alunos militares”, disse ele à reportagem.
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