A química Alice Ball (1892 – 1916) — criadora do primeiro tratamento efetivo contra a hanseníase — conquistou seu lugar no panteão da Ciência ainda jovem. Primeira mulher e primeira pessoa negra a obter um mestrado na Universidade do Havaí, a pesquisadora logo aplicou o conhecimento adquirido na Academia para solucionar um dos principais problemas de saúde pública de sua época.
Sem nenhum tratamento bem-sucedido até então, a hanseníase condenava seus enfermos a uma vida de isolamento nos leprosários. No Havaí, era comum que os doentes fossem submetidos a uma terapia de óleo de chaulmoogra, pouco eficaz (e com efeitos colaterais dolorosos). Determinada a mudar essa realidade, Alice desenvolveu uma solução injetável desse mesmo óleo, isolando seus elementos terapêuticos.
Falecendo antes de publicar os resultados, a pesquisadora não pode ver o início da produção de seu tratamento. Em 1918, cerca de 78 pacientes tiveram alta do hospital havaiano onde estiveram isolados. Enquanto o extrato criado por Alice permaneceria como o único tratamento eficaz contra a hanseníase até a década de 1940, o reconhecimento pelo trabalho da pesquisadora só chegaria 90 anos após sua morte.
Assim como Alice, a professora Paula Chagas — da Faculdade de Fisioterapia da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) — começou a atuar na carreira científica desde cedo, adentrando o corpo docente da UFJF logo após sua graduação. “Assim que me formei, escolhi a carreira docente, iniciando minhas atividades aqui na Universidade apenas com a graduação. Então, tive a oportunidade de fazer mestrado e doutorado sendo professora, e de trilhar meu caminho na carreira científica como docente da UFJF.”
Atualmente compondo o recém-criado Programa de Pós-graduação em Ciência da Reabilitação e Desempenho Físico-Funcional (MCreab), Paula pesquisa as alterações de marcha em crianças com disfunções neuromotoras. “Trabalhando com crianças com síndrome de down e paralisia cerebral, que desempenham atividades funcionais de forma diferenciada, eu procuro observar quais são os recursos motores utilizados por elas e quais as melhores tecnologias assistivas para auxiliá-las.”
Atendendo principalmente usuários do SUS, a professora investiga como seus pacientes realizam atividades cotidianas (descarregando pesos e andando). Dessa forma, ela busca determinar as melhores estratégias de tratamento fisioterapêutico, além dos melhores recursos tecnológicos (órteses ou eletroestimuladores, por exemplo) para auxiliar essas crianças a desempenhar essas atividades. “Agora, com o MCreab, estou entrando na área de Realidade Virtual. Um dos trabalhos da minha orientanda de mestrado será investigar o efeito do uso dessa tecnologia, por meios de jogos, na reabilitação de crianças com paralisia cerebral mais leve, que se locomovem de forma independente. Com isso, iremos verificar se a Realidade Virtual pode auxiliar esses jovens e adolescentes a adquirirem equilíbrio, função motora grossa, e marcha mais otimizada para o seu dia a dia.”
Nascida em 1934, Jane Goodall dedicou 50 anos de sua vida a pesquisa sobre o comportamento dos chimpanzés. Aos 26 anos, a jovem britânica partiu para sua primeira expedição na Tanzânia — sem nenhum diploma universitário ou artigos publicados –, onde começou suas descobertas. Jane utilizava uma abordagem incomum, que gerava incômodo na comunidade científica da época: para se aproximar dos animais que estudava, deu nome a cada um deles.
A partir do contato direto com os primatas, ela contribuiu para o avanço da primatologia e para a preservação desses animais, além de revitalizar o meio científico com sua perspectiva humanizada. A pesquisadora revelou a complexidade do comportamento, do raciocínio e da cultura dos chimpanzés selvagens. Hoje, aos seus 84 anos de vida, Jane é reconhecida como pioneira em seu campo de estudos e como divulgadora da Ciência e da consciência ambiental.
A professora Vera Petters — diretora do Centro de Biologia da Reprodução da UFJF (CBR) — também trabalha com um colaborador frequentemente ignorado no desenvolvimento científico. Os animais, utilizados nos experimentos laboratoriais de diversas pesquisas, auxiliam os cientistas a determinar o potencial de suas investigações, e garantem a segurança dos pacientes nos testes clínicos posteriores.
A frente do Núcleo Interdisciplinar de Experimentação Animal (Nideal), Vera coordena projetos para aperfeiçoar as técnicas laboratoriais, tornando-as mais precisas e confiáveis. “Através das minhas atividades, busco contribuir para a formação de pessoal capacitado, aperfeiçoamento de técnicas laboratoriais e inovações tecnológicas, de modo a tornar, progressivamente, nossos profissionais mais competentes e atualizados.”
Membro do corpo docente da UFJF desde 1978, a professora também pesquisa a fisiologia dos embriões humanos e animais — os processos físico-químicos que ocorrem nas células e tecidos –, trabalho que levou a uma incursão em diversos centros de pesquisa no exterior (como na Escócia, na Inglaterra e na Argentina).
“Em 1970, ingressei no curso de Ciências Biológicas, recém-iniciado na UFJF. Ao cursar a disciplina que envolvia o estudo da Embriologia Humana, travei contato com o grupo de pesquisadores do CBR, que integravam uma rede multicentros chancelada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Me candidatei como estagiária e meu interesse pela pesquisa desabrochou.”
“Através desta trajetória como docente e pesquisadora, não encontrei barreiras discriminatórias por ser mulher, tendo sido caracterizado como fator preponderante para o sucesso na carreira, a dedicação, o empenho, a competência, a postura e o profissionalismo, além do amor pelo que faço.”
No mês da Mulher, a Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) desenvolveu uma campanha com mulheres que fizeram e continuam a fazer parte do desenvolvimento científico, social e tecnológico. Exemplos fortes de como a mulher, mesmo com possibilidades limitadas por sociedades opressoras, foram fundamentais para evolução da humanidade. Nesta campanha, vamos lembrar algumas das mulheres que fizeram história — com seus feitos na Ciência e com suas próprias trajetórias — e homenagear aquelas que, na UFJF, continuam a fazer. Esta é a terceira matéria desta série especial; confira aqui a primeira e a segunda.