Hattie McDaniel fez história sendo a primeira atriz – ou ator – negra a vencer um Oscar, em 1940, pelo papel de Mammy em “…e o vento levou.” Apesar da conquista em pleno século XX, ela vivenciou sucessivas críticas por interpretar papéis de domésticas que, segundo movimentos de direitos civis, perpetuavam estereótipos. Desde então, a sociedade avançou ou regrediu na redução de estigmas? A pergunta, meramente retórica, nos faz refletir sobre os monstros que criamos, reproduzindo discursos diariamente, muitas vezes de modo involuntário.
Da associação entre monstros, preconceitos e estereótipos é que surgiu “Pele de monstro”, documentário produzido pela ex-aluna de Cinema da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Bárbara Maria. O material é mais um filme com raízes no Instituto de Artes e Design (IAD) que estará na 21ª Mostra de Cinema de Tiradentes. O festival ocorre até o próximo dia 27, na histórica cidade mineira.
O documentário relaciona o racismo com os filmes de terror “A noite dos mortos vivos” (“Night of the living dead”) e “Mortos que matam” (“The last man on Earth”), produzidos nos anos 1960. A concepção fez parte do projeto do trabalho de conclusão de curso (TCC) da diretora, orientado pelo professor do IAD, Christian Pelegrini. “Pelo fato de eu ser negra, achei interessante relacionar a temática com o racismo, que é um preconceito com o qual eu lido costumeiramente. Então, escolhi dois filmes dos anos 1960 e fiz algumas sessões no estúdio do IAD, convidando vários alunos negros da UFJF para assistirem”, revelou.
Após a sessão, os alunos preencheram um questionário, associando os filmes e alguma situação vivenciada. Desse material, Barbara escolheu seis para entrevistar após mais uma exibição do filme, nas dependências do IAD. É dos cortes entre trechos dos filmes e entrevistas que a diretora constrói a narrativa do documentário de 20 minutos.
Segundo Bárbara, trata-se de um material que se apresenta mais ligado ao debate do preconceito do que a representação de negros nos personagens, algo que se tornaria secundário diante dos peso dos relatos dos entrevistados. Esse impacto fez o filme ser premiado na última edição do Festival Primeiro Plano e selecionado para ser exibido no Entretodos – Festival de Curtas-Metragens de Direitos Humanos, em 2016.
“É muito fácil você assistir e se identificar. Quis buscar a identificação do público com as situações. Por mais que uma pessoa branca assista e entenda que o racismo é uma coisa horrível, ela não vai sentir da mesma maneira que uma pessoa que vivencia isso todos os dias”, ressalta.
Esta será a primeira vez que a diretora participará da Mostra de Tiradentes. Seu documentário será exibido na próxima segunda, 22, às 21h, no Cine BNDES na Praça. Na ocasião, ela participará da roda de conversa “A mulher negra na direção do cinema no Brasil”, quando terá a oportunidade de conhecer outros negros no cenário cinematográfico brasileiro.
Trecho de “Pele de monstro”