Falar de tecnologia espacial pode parecer algo de outro mundo — mas você sabia que existem iniciativas sobre ciência aeroespacial bem perto de você, na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF)? Os estudos passam desde a modelarem de foguetes até sobre qual o melhor uso de combustíveis para os mesmos.
Tudo começou em 2016, quando o Centro de Excelência em Sistemas de Propulsão e Energia da UFJF foi convidado pela Fundación Carolina de Espanha para desenvolver pesquisas em parceria com a Escola Técnica Superior de Engenharia Aeronáutica e do Espaço (ETSIAE), da Universidad Politécnica de Madrid (UPM). Coordenado pelo professor Washington Bohorquez, o grupo de pesquisa, sediado na Faculdade de Engenharia da UFJF, se dedica ao estudo de diversas áreas afins à Ciência Aeroespacial, com foco no tema dos sistemas de propulsão em motores foguetes.
UFJF passa a fazer parte do pequeno circuito de instituições brasileiras dedicadas ao estudo das Ciências Aeroespaciais
O projeto apresentado à Fundación Carolina — instituição governamental espanhola para a aproximação com os países ibero-americanos, cujo presidente é o próprio Rei da Espanha — tem como objetivo solucionar os problemas envolvendo a instabilidade de combustão nos foguetes a combustíveis híbridos. O Brasil é um dos poucos a utilizar este tipo de combustível, considerado menos poluente.
Protótipos de foguetes
Trabalhando em conjunto com o Grupo de Pesquisa, a equipe de Foguete-modelismo, Supernova Rocketry UFJF, formada por alunos de graduação de diversos cursos de Engenharia, se dedica à construção de protótipos de foguetes que emulam as condições dessas estruturas em larga escala. Utilizando pilhas como ignitor e pólvora ou nitrato de potássio com sacarose como combustível, os modelos desenvolvidos pelos estudantes têm potencial para alcançar cerca de 120 metros de altitude, o que deverá ser demonstrado durante a participação em um festival de minifoguetes, em abril de 2017.
Dividida em departamentos que cuidam de cada etapa do processo de fabricação — que vão desde a criação dos circuitos eletrônicos necessários até a construção do próprio foguete e planejamento do sistema de propulsão –, os esforços da equipe, atualmente, estão voltados para aprimorar os equipamentos laboratoriais utilizados (muitas vezes criados pelos próprios alunos, como as ferramentas de medição de altitude e de empuxo realizada pela propulsão do motor) e para a participação em competições. “Com essa iniciativa, os discentes que participam têm a possibilidade de agregar conhecimento e se especializar na área”, apontou uma das integrantes do grupo, Amanda Rodrigues de Melo.
Intercâmbio e aproximação entre instituições
Para o professor Bohorquez, o uso de combustíveis híbridos é um tema bastante atual. “Universidades norte-americanas, que vêm realizando pesquisas com sistemas de propulsão ecologicamente adequados, têm pesquisado o uso de parafina como combustível. Aqui no Brasil, na Universidade de Brasília, já foram criados alguns protótipos de foguete que também utilizam parafina. É um material de menor custo, com menor tendência a apresentar microfissuras, além de ter emissões poluentes bem menos agressivas.”
Com o desenvolvimento do Centro de Excelência em Sistemas de Propulsão e Energia, a UFJF passa a fazer parte do pequeno circuito de instituições brasileiras dedicadas ao estudo das Ciências Aeroespaciais. Conforme Bohorquez, a parceria com a Fundación Carolina é o primeiro passo de um processo de aproximação entre as duas instituições. Atualmente, o professor participa de um período de intercâmbio como Professor Visitante na UPM e seu plano é fortalecer as relações com a Politécnica de Madrid para firmar um convênio entre a Universidade espanhola e a UFJF — uma colaboração que irá incluir o intercâmbio de alunos.
Futuros cientistas aeroespaciais
Além dos projetos já submetidos à aprovação do CNPq, Bohorquez pretende aplicar no Edital de Extensão da UFJF uma proposta de disseminação da Ciência Aeroespacial. “Esse é um campo muito específico, que parece ser restrito. Nossa ideia é aplicar a teoria e prática dessa área, de forma que até uma pessoa muito leiga consiga compreender e desenvolver modelos de foguetes. Por um lado, isso aproxima a comunidade do assunto, criando interesse. Por outro, possibilita a formação de futuros cientistas aeroespaciais.”
Como funciona o combustível híbrido em foguetes?
Neste método, um oxidante líquido ou gasoso é adicionado a um combustível sólido, gerando uma reação na câmara de combustão e propulsionando o foguete. No entanto, como explica o professor Bohorquez, é possível que alguns combustíveis sólidos apresentem microfissuras em seu interior. Nesse cenário, a taxa de regressão desse material (a velocidade radial de queima do grão combustível) é alterada, e a reação que se segue é incontrolável, podendo culminar com uma explosão.
Analisando os fatores envolvidos nesse processo, os pesquisadores criarão simulações numéricas antes de iniciar os testes práticos, utilizando os softwares OpenFOAM (simulador tridimensional do processo de combustão, utilizando como base a geometria da câmara de combustão) e Cantera (que descreve, por meio da cinética química, um processo de combustão), ambos de acesso livre. Para essa elaboração teórica, serão considerados a parafina como combustível sólido e o óxido nitroso gasoso ou o oxigênio líquido como oxidantes. No caso da parafina como combustível sólido, o processo de combustão é realizado através do mecanismo de chama difusiva turbulenta, similar à combustão de chamas de velas domésticas.