Primeiro a reintroduzir o piano histórico – o chamado fortepiano – no circuito musical brasileiro da atualidade, durante o Ano Mozart, em 1991, Pedro Persone é destaque na programação do 27º Festival Internacional de Música Colonial Brasileira e Música Antiga do Centro Cultural Pró-Música-UFJF. Além de uma oficina sobre o instrumento, ministrada nesta edição pela primeira vez na história do evento, o fortepianista realiza nesta quinta-feira, dia 28, o recital Música Vienense para Fortepiano, a partir das 20h, no Museu de Arte Murilo Mendes (Mamm), com entrada franca.
Em um recital no qual se utiliza um fortepiano – cópia de um instrumento com mecânica alemã-vienense (Prellzungenmechanik) – o programa ideal, explica Persone, deve ser composto de obras dessa região. O músico inicia com uma sonata de Leopold Koželuh (1747-1818), precedida de um prelúdio de Muzio Clementi – criador da London Pianoforte School, portanto, para um instrumento bem diferente deste. Clementi escreveu seu Op. 19, Musical Characteristics, no qual apresenta prelúdios e cadenzas no estilo dos compositores mais célebres da época. Koželuh é originário da Bohemia – hoje República Tcheca -, uma região conhecida como o “conservatório musical da Europa”, graças aos inúmeros e excelentes músicos que dali saíram.
Koželuh mudou-se para Viena e logo se firmou como fortepianista, professor de fortepiano – o mais requisitado da capital austríaca, tendo sido professor de fortepiano da Imperatriz Leopoldina (1797-1826) -, compositor e editor de música. Atribui-se a ele o estabelecimento do estilo idiomático vienense que possibilitaria o abandono do velho cravo definitivamente. A Sonata em ré menor apresentada foi composta em 1796 e está catalogada por Milan Poštolka como P.XII:25. Destaca-se a estrita observação da forma sonata e da criação melódica, principalmente no que diz respeito ao Vierhebigkeit.
Segue-se um set de 12 variações de Joseph Eybler – compositor da corte vienense e amigo dileto da Imperatriz Maria Theresia (1772-1807), mãe da Imperatriz Leopoldina, do Brasil. Eybler foi a primeira sugestão de Wolfgang Amadé Mozart (1756-1791) para terminar seu Requiem. As variações, escritas em 1797, são sobre a conhecida canção A Schüsserl und a Reinl is all mei Kuchelgschirr e apresentam aspectos formais propostos por Mozart, principalmente a presença de uma variação lenta precedendo a variação final em ritmo ternário.
A primeira parte do recital fecha com um Capriccio de Antonín Štěpán (1726-1797), outro da região de Bohemia que mudou a música em Viena, uma vez que foi considerado o arauto do estilo clássico e do início do romantismo. O capriccio apresentado hoje é conhecido como Capriccio em sol menor, Š. 50, apesar de ser, de fato em mi bemol maior, e traz elementos que apontam claramente ao futuro da escrita fortepianistica, que virá na passagem do século XVIII para o XIX.
O genial Haydn
A segunda parte é dedicada a um único autor: Joseph Haydn. Este compositor genial e admirado por Mozart permanece menos explorado nos repertórios para piano do que deveria, avalia Persone. As obras apresentadas no programa são de diferentes gostos do autor. A primeira que integra o famoso ciclo de 1776 é em dois movimentos – apesar de conter um movimento intermediário de um “lirismo emocionante”, na avaliação do fortepianista – com as características formais e humor tão caros a Haydn. “O movimento final apresenta um minueto com variações numa distribuição admirável”, explica. Nas variações o público ouvirá invenção a duas vozes, a três vozes, tema ornamentado por acordes em tercinas e variação final com os elementos combinados.
Encerrando o programa, o recital terá a Sonata em Do maior – como a de Koželuh, precedida de um prelúdio estilizado de Clementi. O andante com espressione faz parte das obras de inspiração Sturm und Drang de Haydn. O rondo final dentro da melhor rondo-sonata de Haydn com seus momentos de humor.
Programa
[Muzio Clementi (1752-1832)
Preludio alla Kozeluch]
Leopold Koželuh (1747-1818)
Sonata em ré menor, Op. 20, 3 – P. XII: 25 (1796)
Moderato
Poco Adagio
Rondo, allegretto
Joseph Eybler (1765-1846)
XII Variations pour le Piano Forte sur le Theme “A Schüsserl und a Reinl is all
mei Kuchelgschirr”, (1797)
Josef Antonín Štěpán (1726-1797)
Capriccio em sol menor, Š.50
(intervalo)
Joseph Haydn (1732-1809)
Sonata in A-dur, Hob. XVI: 30 (1776)
Allegro-adagio
Tempo di Menuet
[Muzio Clementi (1752-1832)
Preludio alla Haydn]
Sonata em Do maior, Hob. XVI: 48 (1789).
Andante com espressione,
Presto
Saiba mais sobre o músico
Pedro Persone: nasceu em Tietê (SP), em uma família de origem italiana. Iniciou seus estudos no Conservatório de Tatuí, com a professora Maria José Carrasqueira. Foi aluno particular de Roberto de Regina, no Rio de Janeiro. Graduou-se em Cravo pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), na classe da Professora Helena Jank. Participou de vários cursos com Felipe Nabuco-Silvestre (Brasil/Portugal), Christophe Rousset (França), Emilia Fadini e Rinaldo Alessandrini (Itália).
Continuando seus estudos na Europa, em 1977 estudou com Huguette Dreyfus na ÉcoleNationale de Musique de Bobigny, França. Estudou Cravo e Fortepiano, em 1988, com Jacques Ogg, na Academie voor Oude Muziek, Amsterdam, na Holanda. Seu mais importante estudo foi sob a orientação de Mark Kroll, de quem recebeu a maior influência acadêmica e artística. Com bolsa da Fundação Vitae, participou do Primer Curso de Música Barroca Ciudad de Segovia, na classe de fortepiano de professor Patrick Cohen (França).
Foi o primeiro a reintroduzir o piano histórico ou fortepiano no circuito musical brasileiro da atualidade durante o Ano Mozart 1991. Gravou o primeiro CD com fortepiano no Brasil. Sua discografia conta hoje com sete CDs, quatro editados no Brasil, um nos Estados Unidos e dois em Portugal.
Para o Conservatório Dramático e Musical “Dr. Carlos de Campos”, Tatuí foi o criador dos Cursos de Cravo (1985) e de Fortepiano (2008) – sendo este último o primeiro curso de fortepiano da América Latina; nesta instituição foi professor de cravo, fortepiano, práticasi nterpretativas, música de câmara e baixo continuo de 1985 a 2010. Na mesma escola fundou e dirigiu o Collegium Musicum, orquestra voltada a performance de obras dos períodos barroco e clássico.
Em 1996, com bolsa de estudos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) –, recebeu seu diploma de Mestre em Artes pela Unicamp, com sua pesquisa sobre obras “non mesures” para cravo.
Como cravista e fortepianista, Persone se apresentou em recitais (solo, música de câmara – continuo e obligato – e como solista) em Amsterdam (Países Baixos), Boston (MA), Cambridge (MA), Edinburgh (Escócia), Framingham (MA), Haarlem (Países Baixos), Los Angeles (CA), Miami (FL), Milano (Itália), New York (NY), Paris (França).
No período de setembro de 2001 a maio de 2004, foi professor de group piano (MU 151, MU 152 e MU 153) na Boston University. Graças ao suporte oferecido pela Fundação Coordenação de Pessoal de Nível Superior (Capes), Persone cursou o doutorado – Doctor of Musical Arts – em Historical Performance na Boston University, sob orientação do professor Mark Kroll. O tópico de sua dissertação é “The Earliest Piano Music: Lodovico Giustini’s (1685-1743) Sonate da cimbalo di piano e forte detto volgarmente di martelletti, Firenze, 1732.” Em 2008, este estudo foi lançado em forma de livro pela editora alemã VDM-Verlag de Saabrücken.
Entre 2007 e 2010, no Instituto de Artes da Unesp, Persone desenvolveu pesquisa de pós-doutorado com bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) sobre o tema A música pianística e camerística composta entre 1790 e 1826 presente na ‘Coleção Thereza Christina Maria’: uma abordagem segundo as práticas interpretativas relacionadas ao período.A Editora Prismas de Curitiba lançou o livro com os resultados desta pesquisa com o título “O Piano era, então, ainda uma novidade: A Coleção Thereza Christina e sua performance”.
Persone é professor adjunto da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e, agora, trabalha seu segundo pós-doutorado envolvendo o cravo e o fortepiano nos tempos coloniais junto ao NAP-Cipem do Departamento de Música da FFCLRP-USP, de Ribeirão Preto, sob supervisão do professor doutor Rubens Russomanno Ricciardi.
O Museu de Arte Murilo Mendes (Mamm) fica localizado na Rua Benjamin Constant 790, no Centro da cidade.
Outras informações: (32) 3218-0336 (Centro Cultural Pró-Música/UFJF)
(32) 2102-3964 (Pró-reitoria de Cultura-UFJF)