Usando exemplos de textos de Gabriel Garcia Marques, passando por Nelson Rodrigues, até chegar a cartas de leitores publicadas nos jornais, Sírio Possenti, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), pontuou a importância da precisão no uso das palavras. A aula, na Faculdade de Letras, lotou o auditório da unidade na noite de sexta-feira, 13.
“Põe um salzinho no texto”, propôs ele algumas vezes ao se referir ao emprego de certos termos com exatidão por parte de escritores e jornalistas. “Especula”, “confessa”, “devolve” marcam a escolha precisa feita por autores quando relatam as declarações de uma fonte em um jornal, ao contrário de verbos genéricos como “conta”, “diz”, “afirma”. É por isso, defendeu Possenti, referenciando Bakhtin, que o discurso indireto é um texto de análise.
Questões políticas e ideológicas transpareceram na fala do professor, ao problematizar, em um dos exemplos, a nomeação de Hugo Chávez como “caudilho” e “autocrata” pela Folha de S. Paulo e de Carlos Cachoeira como “empresário”. Numa busca rápida na internet, Possenti constatou que os jornais de língua inglesa se referem a Chávez apenas como “presidente”. “Não se trata de saber se ele é ou não [caudilho e autocrata]”, mas que há pessoas que assim o definem e outras que não. O mesmo acontece quando “israelitas prendem palestinos” e “palestinos sequestram israelitas” ou quando “estudantes ocupam”, “invadem” ou “tomam” a reitoria ou uma escola.
O professor, autor coluna Palavreado da revista Ciência Hoje e também do Blog do Sírio, reservou parte da aula para comentar sobre as redes sociais, citando a declaração de Umberto Eco de que elas deram o direito à fala a legiões de imbecis. “A pessoa lê um texto do tamanho de uma tuitada e vira juiz naquele assunto”. Se os conceitos de alta e baixa literatura, grande argumentação ou defesa caíram por terra na pós-modernidade, “se tanto faz”, por que as pessoas ainda fazem um curso de Letras e de Direito, leem teóricos?, refletiu.
Com tantos outros exemplos da atualidade, entre eles, o da memória ou carga negativa que a palavra golpe carrega através da história (“nem os golpistas gostam dela”), Possenti cumpriu diante do público do evento aquilo que prometeu: “a ideia básica é que a língua tem muitas facetas, e que vale a pena falar de diversas delas”.