Com o ingresso mais acessível ao ensino básico e às próprias universidades, que abrem suas portas para a recepção de alunos com diferentes bagagens educacionais, a capacitação mais ampla e compreensiva dos professores se torna cada vez mais necessária. É este o foco da segunda edição do Seminário de Docência do Ensino Superior, uma iniciativa da Coordenação de Licenciaturas da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) em parceria com a Pró-Reitoria de Graduação.
A pró-reitora de Graduação, Maria Carmem de Melo, afirma que o trabalho incentivado pelo evento é um desafio necessário. “É imprescindível que a formação do docente atenda o que a sociedade solicita”, coloca. “É preciso abarcar todas as situações diferenciadas. A reitoria está comprometida em ampliar discussões como essa e poder transformar seus frutos em realidade.” O organizador do evento e professor do Departamento de Física, José Roberto Tagliati, faz coro à pró-reitora: “Com um novo perfil dos educandos, precisamos estudar maneiras de tornar o estudo mais efetivo. Já foi o tempo que somente uma aula expositiva dava conta do recado. Hoje, compartilhamos conhecimento para ajudar as próximas gerações.”
“Eu tenho a força!”
Graduado em Física pela UFJF e atual professor do Departamento de Métodos e Técnicas de Ensino da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Orlando Aguiar abriu as palestras do evento discutindo sobre o ensino de física na escola básica. “Temos que dar sentido à informação e transformá-la em conhecimento através da contextualização”, aponta. “Uma estratégia de significação de conteúdo pode ser feita dessa forma; na hora de explicar o conceito de força no campo da física, por exemplo, podemos exemplificar, fazer analogias, expor fenômenos realizados através dela, trazer o conceito para a esfera da vida cotidiana do aluno”, argumenta o professor que, para demonstrar, lembra do herói de desenho animado que dizia: “Eu tenho a força!”. “E nós temos, mesmo, para mudar esse cenário”, defende.
Outro método de capacitação de futuros professores defendido por Aguiar é o incentivo às investigações científicas durante os cursos de licenciatura. “Nunca é demais o encorajamento de perguntas e questionamentos”, avalia. “É isso que fazemos na pesquisa.”
Quadro de urgência
“As concepções que regem as formações de professores de matemática são muito centralizadas, além de vir desde a época de 30”, é a vez de Antônio Vicente Garnica, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), ponderar. “Cada região do Brasil tem uma dinâmica própria para ensinar matemática, e essas singularidades devem ser respeitadas sem a pretensão de estipular um padrão fixo. Durante a pesquisa, também observamos que existem carências e urgências brasileiras nesse âmbito. Existe a criação de cursos de licenciatura que são carentes de professores, materiais, alunos, estrutura e até política pública. Como o sistema educacional do país foi criado na década de 50, notou-se a necessidade de professores ao mesmo tempo em que se construía esse processos, estabelecendo uma carência de professores para abastecer as salas de aula”, compartilha Garnica. “Eventos como o seminário de docência se tornam necessários, especialmente dentro do ambiente universitário, uma vez que as universidades são espaços que, muita das vezes, preservam modelos tradicionais de ensino.”
Aluno é o sujeito
Já o professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), Maurivan Ramos, colocou na mesa os questionamentos dos alunos. “Há cerca de 7 anos, trabalho transformando as perguntas dos estudantes em módulos de organização curricular”, explica. “Pedimos para eles formularem, em forma de perguntas, o que querem aprender. A partir daí, podemos identificar o que o aluno conhece, o que quer saber, as falhas conceituais que possui e os eventuais problemas de aprendizagem que precisamos trabalhar.”
“Dizem que existem estudantes que não têm interesse em aprender, mas isso não vai mudar enquanto não oferecermos, como professores, referências que não têm nada a ver com eles”, afirma. “O aluno não é o objeto, é o sujeito.”
Mesa de debates
Durante a mesa redonda que marcou o encerramento do Simpósio, mediada pelo professor da UFJF, Paulo Henrique Menezes, os professores Maurivan Ramos, Orlando Aguiar e Amarildo Melquiades (do Departamento de Ciências Exatas da UFJF) fizeram um balanço geral do evento. Após avaliarem os desafios para repensar o processo de educação, tanto na prática em sala de aula quanto na formação dos professores durante o curso de Licenciatura, foi aberto espaço para perguntas da audiência.
Ramos, que concluiu sua fala expondo o histórico do sistema de educação brasileiro, apontou que eventos como o Simpósio representam um espaço para a reflexão da prática educacional.
“Eventos como esse, combinados com ações continuadas, são muito importantes para nos ajudar a romper os condicionamentos. É igualmente importante as perguntas que foram formuladas durante a mesa redonda, que nos ajudam a repensar a formação de licenciatura. No novo cenário da Escola, o professor assume um papel de problematizador, para promover a pergunta do aluno em sala de aula e mediar a investigação dele, a partir de seus próprios interesses. O aluno, e sua bagagem cultural e de vivência, deve fornecer o norte para a educação”.
Já Orlando Aguiar reforçou a importância da Universidade no processo de reformulação da educação de base a partir de uma mudança nos próprios cursos de licenciatura. “Os procedimentos da Universidade podem ser bastante conservadores, preservando um certo procedimento. No caso da formação de professores, esse consiste em encarar a licenciatura como um bacharelado, com menos conteúdo e com um verniz pedagógico. Esse modelo está, evidentemente, posto em causa. Ele não forma adequadamente para as atuais necessidades. Nós temos que pensar a formação dos professores da área científica em outros moldes, com maior articulação dos conteúdos específicos com a formação do aluno como um todo. Pensar em novas abordagens. O Simpósio foi de excelente qualidade, instigante. Eu saio renovado desse debate”, concluiu.