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Acessibilidade por meio dos quadrinhos sinalizados conduz apresentações do segundo dia da HQWeek!

Por Monique Campos

 

A segunda sessão de apresentações de artigos da HQWeek! 2021 foi especialmente dedicada à temática da acessibilidade. A professora e pesquisadora do curso de Letras Libras da Universidade Federal do Paraná, Kelly Cezar, juntamente com integrantes do projeto HQs Sinalizadas, demonstraram resultados e metodologias de suas pesquisas científicas, além das suas próprias produções em quadrinhos. A HQWeek! promoveu a transmissão sinalizada da sala virtual para o canal do evento no Youtube, realizando tradução e interpretação simultânea em Língua Brasileira de Sinais (Libras).

 

O professor bilingue Germano Weniger Spelling, formado em Letras Libras pela UFPR, apresentou o processo de criação da HQ A Mulher Surda na Segunda Guerra Mundial, obra idealizada e roteirizada por ele e que foi indicada, em 2020, ao prêmio HQ Mix – considerado o “Oscar” dos quadrinhos brasileiros.

 

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Germano conta que sempre gostou de HQs e hoje pensa nos quadrinhos enquanto estratégias de ensino e na formação em Letras/Libras. Germano é judeu e pesquisa a cultura surda na Segunda Guerra desde a sua passagem pela iniciação cientifica durante a graduação. Todo o material da pesquisa realizada sobre a temática, inclusive em outras línguas, foi utilizado para a montagem do roteiro, desenvolvimento dos personagens, diálogos visuais e representações do contexto histórico para os quadrinhos sinalizados. O autor realizou levantamento bibliográfico e pesquisas em documentários e fotografias que contribuíram para o desenvolvimento das ilustrações, em um trabalho em equipe formada por ele, professores Kelly Cezar e Danilo Silva e ilustrações de Luiz Gustavo.

 

A HQ conta a história de Sara, uma mulher surda que passa por opressões e é separada da sua filha depois do parto. Na época, vigorava o conceito da deficiência e propagava-se a existência de uma raça pura na qual o(a) deficiente não pertencia, não existia. Por isso, muitos surdos foram enviados aos campos de concentração. Germano ressaltou que também pesquisou sobre as resistências da comunidade surda e teve o objetivo de divulgar o que foi esse período da história para essas pessoas. O autor comentou durante a sua apresentação que se sente gratificado com as repercussões que a HQ adquiriu e em poder divulgar tanto a HQ sinalizada quanto promover a acessibilidade da comunidade surda e a sua história.

 

Na sequência das apresentações, o tradutor e intérprete de Libras, Felipe Baléa, apresentou o trabalho com o tema “roteiro sinalizado”, de forma a explicar o que é e como é feito o roteiro dentro do processo de produção da HQ acessível. Ele também é formado em Letras Libras pela UFPR e tem pós-graduação nas áreas de ensino de Libras e ensino especial. Felipe atua em pesquisas e roteirizações de HQs sinalizadas em equipes orientadas pela professora Kelly Cezar.

 

O tradutor e intérprete de Libras elencou os pontos essenciais da produção do roteiro sinalizado. Segundo ele, a valorização da visualidade faz parte do processo de inclusão, bem como o trabalho de pesquisa bibliográfica e de traduções que vão possibilitar a criação da visualidade, principalmente por se tratar de obras de ficção que precisam valorizar as identidades linguísticas que envolvem a cultura surda. Todo o trabalho de roteirização leva em conta ainda o letramento para surdos, algo que tem relação com a construção das políticas linguísticas para a comunidade surda, o respeito aos seus artefatos culturais e o estabelecimento da educação bilíngue.

 

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Baléa apresentou a metodologia de criação de um roteiro sinalizado, apontando como exemplos os aspectos de uma narrativa criada por ele com personagens que compõem o mundo surdo. Além da estrutura bilíngue, a criação do roteiro precisa ter base em registros fotográficos, utilizar expressões faciais e corporais assim como são feitas com as marcas da escrita, bem como envolver um complemento com vídeo para auxiliar a ilustração. A caracterização dos personagens e as coletas de experiências são essenciais para o processo de representação e valorização de uma cultura. Conforme Baléa, um roteiro que visa a representatividade não pode ser criado apenas com o que a imaginação deseja para a narrativa ficcional, é necessário se colocar dentro de uma cultura.

 

A terceira e última apresentação foi a do tradutor e intérprete de Libras, Ivan de Souza, que enviou um vídeo para ser transmitido já que não pode participar ao vivo. Ele é criador da HQ sinalizada Sol, a pajé surda (no Mókere Káxe Koixómuneti) que conta, a partir da personagem protagonista, os momentos históricos do povo terena e também da língua terena de sinais. A pesquisa de base para a HQ teve início em 2017 e foi até 2020, sob a orientação da professora Kelly Cezar (UFPR).

 

O participante da HQWeek! contou com a ajuda de indígenas terenas na construção do enredo e dos personagens, para que a HQ fosse reconhecida pela comunidade como representação adequada do povo terena – atualmente a maioria se encontra na região de Mato Grosso do Sul – e do processo histórico da língua terena. Conforme explica Ivan, à pajé Sol (Káxe) é revelado o futuro do povo terena por meio de imagens. Esse enredo principal aborda tradições, religiosidade e mostra a história do povo terena de modo visual em língua de sinais, a fim de promover a compreensão de ouvintes e surdos.

 

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Ivan explicou que a maioria das pessoas só conhece a Libras, mas esta não é a única língua de sinais existente no Brasil. Atualmente são 12 as línguas de sinais já documentadas – entre elas a terena –, porém existem pesquisas que indicam a existência de mais, sejam elas urbanas, indígenas ou isoladas. A HQ levanta a discussão sobre as perdas linguísticas cada mais presentes no país e a necessidade de reconhecimento das diversas línguas de sinais enquanto patrimônio cultural da humanidade.