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Terceira live do LMD discute a tecnologia da TV digital aberta e o cenário brasileiro atual

Por Monique Campos

 

A TV digital no Brasil passou por uma evolução recente, que trouxe uma série de novos recursos. Hoje pode-se considerar uma verdadeira revolução dessa tecnologia, o que está levando os pesquisadores a um repensar de todo esse sistema, a fim de fazer uma TV digital mais extensível. Com essa discussão, o professor do Departamento de Ciências da Computação da UFJF, Marcelo Moreno, conduziu a terceira edição do LMD Lives na noite de segunda-feira, 22 de junho. Moreno, que integra o quadro permanente do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Computação da UFJF, é um dos líderes do LMD e realiza vários projetos de pesquisa e desenvolvimento, sobretudo na área da TV Digital. Ele é coordenador do Grupo Técnico de Middleware do Fórum do Sistema Brasileiro de TV Digital (SBTVD) e também faz parte da União Internacional de Telecomunicações (UIT)

 

O professor destacou a TV como um veículo fascinante, que chega a um número grande de pessoas e possui confiabilidade nas transmissões. Inclusive ficou ainda mais evidente a sua importância nessa época de pandemia, em que as pessoas precisam ficar reclusas em casa e buscam, na programação televisiva, a fonte de informação confiável. Moreno disse, então, que essas características mostram o quanto a pesquisa deve persistir na busca por avanços na tecnologia de transmissão de TV.

 

Antes de abordar as “(R)Evoluções na tecnologia de TV digital aberta”, tema da discussão proposta pelo LMD Lives, Moreno apresentou um breve histórico do sistema de transmissão de TV aberta no Brasil para, em seguida, analisar o contexto atual. O país tinha um padrão de transmissão analógica, com início na década de 1950, que hoje já deu lugar para a transmissão digital na maioria das cidades. Foi uma digitalização rápida na opinião do professor, a qual começou no ano de 2007, quando ocorreu a primeira transmissão de TV digital no Brasil. Todo o sistema foi padronizado, com normas técnicas (ABNT) e especificações de transmissão, sendo que as possibilidades da digitalização ficaram bastante aparentes – e exploradas pelas emissoras – nos vídeos em alta definição, sem falhas e com áudio excelente. “De lá pra cá vimos muito mais do mesmo. Será que a TV digital era só isso? Melhor qualidade do áudio e vídeo, ainda que isso seja impactante? Ela não é só isso”, avalia Moreno.

 

De acordo com o pesquisador, juntamente à transição do padrão analógico para o digital houve a “chegada fenomenal” da web, com ampla diversidade de serviços e modelos de negócios, atrativos e bem definidos. O que trouxe, inclusive, um sistema de interação “um pra um”: o usuário de um sistema web interage diretamente com um website e esse website pode conhecer vários detalhes sobre esse usuário. Essa característica se diferencia do que experimentamos com a TV aberta, em que há transmissão de um ponto para todos os demais pontos, os espectadores. Justamente esse potencial de interatividade existente na web e que a TV digital abarca em seus recursos ainda é mal explorado, e esse não é um problema exclusivo do Brasil, conforme explica Moreno.

 

A TV digital passou por evoluções, de caráter incremental, a partir da sua criação. Os recursos de envio de aplicações interativas possibilitaram que o usuário pudesse interagir com o conteúdo da programação televisiva a partir do seu controle remoto.  Porém, a exploração da interatividade ficou limitada aos aspectos de uma informação adicional, segundo o professor, como detalhes de personagens em uma novela, resumos, nada além de um conteúdo que a emissora mandava.

 

Essa possibilidade de interatividade começou a avançar no ano de 2012, quando os televisores começaram a ser fabricados com um software acoplado –que se chama middleware– capaz de rodar as aplicações interativas. No caso da TV brasileira, esse middleware recebeu o nome de Ginga. Essa tecnologia foi padronizada, mas não teve uma proliferação grande como o que aconteceu com os smartphones e as smart TVs. Porém, em 2015, houve a licitação do espaço antes ocupado pelas emissoras nos canais analógicos, sendo disponibilizado para aquisição pelas operadoras de telefonia para a implementação da tecnologia 4G. Em contrapartida, atendendo ao edital, as operadoras de telecomunicação depositaram uma parcela da verba em um fundo para ser aplicado no desligamento do analógico e permanência apenas do sinal digital. Com esse recurso, houve a compra de receptores que foram ligados em TVs antigas e distribuídos a todas as famílias que estavam no Cadastro Único do governo federal. As cidades, então, estabeleceram um cronograma de desligamento do analógico. Moreno destaca que a interatividade suportada por esses receptores distribuídos ainda é melhor do que a dos televisores vendidos hoje, sendo que o middleware Ginga tem mais recursos –memória e aplicações interativas instaladas.

 

Ainda conforme o professor, o que foi explorado de interatividade era mais voltado ao social, a exemplo das aplicações úteis para um governo eletrônico, como o Projeto Brasil 4D.  No entanto, muitos desafios impostos à difusão dos conteúdos interativos ocorrem devido ao domínio da TV comercial sobre o ambiente de TV no Brasil. Moreno exemplifica que, nesse período de pandemia, uma ótima oportunidade seria levar conteúdos educacionais para a TV digital aberta, o que é um projeto do LMD, já que com esses receptores seria possível dar respostas a algumas questões relacionadas ao acesso a um ensino emergencial.

 

Oportunidades atuais com o DTV Play

 

Há uma nova versão de receptores de TV digital, chamados de “perfil D”, que une ainda mais o ambiente de aplicações à radiodifusão. “A ideia é de integrar”, conta Moreno, ressaltando que vários estudos, inclusive alguns protótipos de interface, já foram desenvolvidos no LMD com essa proposta. Ele explica que a integração se dá na execução direta da banda larga dentro da programação da TV e vice-versa, além dos dispositivos móveis. Um conteúdo ao vivo, como de jornalismo ou esportes, por exemplo, que vai para um grande número de pessoas, precisa dos recursos da TV digital, já que a internet não é capaz de aguentar transmissões em massa e ainda é muito caro para implementar. Em contrapartida, o direcionamento de conteúdos televisivos, propagandas e a experiência de interação “um pra um” precisa dos recursos proporcionados pela web. Portanto, a finalidade do “perfil D” é possibilitar trocas entre TV aberta e banda larga. “Temos todo um suporte no Ginga para essa nova versão que está vindo aí. As TVs devem aparecer implementadas a partir do ano que vem com esse perfil D”, comenta o professor e pesquisador. “Isso tudo vai aparecer nas TVs com o selo ‘DTV Play’. As normas foram publicadas desde 2018, e os fabricantes estão correndo atrás para implementar esse novo perfil de receptores”, acrescenta.

A evolução possibilitada pelo “perfil D” fez com que outras aplicações começassem a “descobrir” o conteúdo da TV, de forma que “a TV virou uma coisa no meio da internet das coisas (IoT)”, define Moreno. É possível integrá-la a outros dispositivos, como assistentes de voz e inteligência artificial. O pesquisador fornece outro exemplo de inovação, de como alguns serviços públicos podem estar mais desenvolvidos com recursos da TV Digital. O teleatendimento, nesse período de pandemia, poderia ser uma realidade em que o usuário utiliza uma aplicação interativa respondendo aos formulários de atendimento pela sua TV. Seria mais fácil e mais barato, pois sabe-se que uma parcela significativa da população acessa à internet via uma franquia da rede móvel.

 

Vislumbrando um futuro próximo, Moreno cita importantes revoluções tecnológicas que podem trazer novas oportunidades na TV digital, como a interação multimodal – variadas formas de interação unidas para melhor expressar um único comando, como o reconhecimento simultâneo de gesto e voz – e as interações mais avançadas, como a realidade aumentada e a realidade virtual. Outro exemplo é uma TV baseada em aplicativos, semelhante ao que se dá no ambiente da smart TV. A tecnologia oferece possibilidades de acesso ao conteúdo a partir de um aplicativo da TV, sendo que a emissora pode dar início a um conteúdo a partir da radiodifusão ou a partir da banda larga. Há também os recursos do que ficou conhecido como “mulsemedia” (multiple sensorial media) nas ciências da computação, configurando uma experiência mais imersiva de programação de TV digital. Na mesma linha pode estar um ambiente preparado para o contexto de Internet das Coisas (Internet of Things – IoT), onde tudo está conectado ao conteúdo da TV, proporcionando a sensação de imersão, de variados efeitos sensoriais. Isso a partir de conexões da TV com lâmpadas do ambiente, equipamento de ar condicionado, som com áudio 3D, smartphone, entre outros.

 

“Nós viemos participando de várias iniciativas que tanto apelam para a evolução tecnológica, a pesquisa em computação, quanto à pesquisa em comunicação social e como isso pode ser usado para trazer aqueles que estão atualmente excluídos ou que aparecem como números não excluídos no Brasil”, resume Moreno. “Sabemos que as pessoas com baixa renda não têm plano de acesso à internet com uma franquia em que possam navegar livremente e consumir todos os conteúdos”, complementa, destacando que os números não revelam a realidade. Com os recursos da TV digital, muitos desses problemas podem ser resolvidos, por isso Moreno defende que “temos que ir em frente nessas pesquisas de tecnologia”.

 

No final da terceira edição do LMD Lives, Moreno respondeu às perguntas do público. As temáticas discutidas foram: a convergência total, considerando a radiodifusão, para IP (Internet Protocol); a integração com os equipamentos domésticos; as possibilidades oferecidas pela TV digital para uma educação remota e emergencial; a democratização do acesso e da interatividade, com produção de conteúdo para serviços de educação e saúde para o público dos programas sociais. É possível acessar a íntegra da live no link do IGTV do @lab.midiadigital.

 

LMD Lives

O projeto LMD Lives é uma iniciativa do Laboratório de Mídia Digital (LMD) da UFJF que visa a realização de pequenas palestras e discussões online, transmitidas pelo Instagram do LMD. As atividades acontecem quinzenalmente, sempre nas segundas-feiras,às 19h.